Ye Jingchuan não esperava que Ye Chutang mencionasse de repente o assunto do casamento arranjado pelo imperador, fazendo-o sentir como se seus planos tivessem sido expostos antes mesmo de tomarem forma.
Ele pigarreou e retrucou:
— Onde você ouviu esse tipo de fofoca inútil?
— Pai, apenas me diga: é verdade ou não?
— O Imperador soube que o Príncipe Chen pediu a você um pedaço de caligrafia e presumiu que ele tivesse se interessado por você. Por isso, pretendia arranjar um casamento entre vocês dois. Mas o Príncipe Chen nem sequer olhou para a Princesa Anping — como poderia se interessar por você? O coração dele pertence apenas à Médica Feiticeira de Miaojiang, que certa vez salvou sua vida.
Ouvindo a desvalorização proposital de Ye Jingchuan, Ye Chutang sorriu e perguntou:
— Tirando o status, Pai, em que aspecto você acha que sou inferior à Princesa Anping?
Depois de dizer isso, ela tomou uma decisão.
Embora não pudesse mudar seu nascimento, certamente poderia elevar sua posição!
Ye Jingchuan tinha ido até Ye Chutang para pedir que tratasse de sua mãe doente, então, naturalmente, não se atreveu a desprezá-la por completo.
— Você é, claro, mais notável que a Princesa Anping. Mas ela tem um status nobre — uma única palavra dela pode decidir sua vida ou morte. Não a provoque no futuro.
Ye Chutang arqueou a sobrancelha.
— Até o Imperador precisa de um pretexto para executar alguém. Desde quando a Princesa Anping possui mais poder do que Sua Majestade?
Sem conseguir vencê-la no argumento, Ye Jingchuan mudou de assunto:
— Chu’er, o que você acha do Príncipe Chen?
— O Príncipe Chen é belo, virtuoso, defende as fronteiras, protege o povo e permanece fiel à mulher que ama. É um homem raro e excepcional.
Se o Príncipe Chen não tivesse já uma amada e não fosse uma pedra no sapato do Imperador, eu certamente o perseguiria.
Infelizmente, ambos os casos eram verdade.
Ao ver Ye Chutang falar tão bem do Príncipe Chen, Ye Jingchuan percebeu uma oportunidade para a aliança matrimonial.
— Já que você admira tanto o Príncipe Chen, gostaria de se casar com ele?
Ye Chutang sentiu o cheiro de conspiração.
Ela deixou cair a colher dentro do mingau de abóbora e entrou no jogo:
— Você mesmo não disse que o Príncipe Chen rejeitou a proposta do Imperador porque não se interessava por mim?
— Ele rejeitou, sim, mas você ainda tem uma chance. O Imperador deu ao Príncipe Chen meio mês para escolher uma jovem nobre da capital para se casar.
— Mas o Príncipe Chen não está apaixonado pela Médica Feiticeira de Miaojiang? Ele não deveria se casar com ela?
— O Príncipe Chen disse que o povo de Miaojiang normalmente se casa apenas entre seus próprios clãs e que ela não deixaria sua terra natal para vir à capital.
Ao ouvir isso, Ye Chutang percebeu que o Príncipe Chen estava, na verdade, protegendo a Feiticeira.
Se o Imperador descobrisse que ela era sua fraqueza, certamente a atacaria.
Ainda assim, ela não acreditava que o Príncipe Chen fosse o tipo de canalha que se casaria com outra mulher apenas para proteger sua amada.
Seus planos de casamento certamente enfrentariam turbulências.
Claro, fosse ele se casar com a Feiticeira ou com uma nobre, nada disso tinha a ver com ela.
— Pai, não vou me casar com um homem cujo coração pertence a outra.
Ye Jingchuan ficou exasperado.
— Que homem não vacila entre afeições ou toma várias esposas e concubinas? Com esse tipo de mentalidade, você vai acabar uma solteirona rejeitada!
Ye Chutang não era nenhuma antiga de mente feudal. Se não encontrasse o homem certo, preferiria ficar sozinha.
— Melhor solteirona do que casada com um canalha.
Ao dizer isso, seu sorriso não alcançou os olhos enquanto olhava fixamente para Ye Jingchuan, claramente zombando dele.
Incapaz de continuar a conversa, Ye Jingchuan se levantou.
— Vou esperar por você no pátio.
Ye Chutang pegou novamente a colher e retomou seu mingau de abóbora.
Depois de terminar o café da manhã com calma, saiu do refeitório e disse a Dan’er:
— Vou sair da mansão mais tarde. Não prepare o almoço para mim.
Em seguida, voltou-se para Ye Jingchuan:
— Primeiro, vamos dividir o dote.
Não havia a menor chance de ela tratar a Velha Senhora Ye — isso mancharia seu carma!
Ye Jingchuan sabia que Ye Chutang era teimosa. Se não cedesse, ela deixaria todos sem sossego.
— Está bem. Já que Ling’er vai se casar com o Eunuco De, o dote não pode ser muito pobre. Preciso separar algumas coisas boas para ela.
— Pai é realmente muito bom em ser generoso com as coisas dos outros. Vamos.
Vendo que ela não se opôs, Ye Jingchuan respirou aliviado.
Deixe que me insulte. Não é a primeira vez, nem será a última.
Ao sair do Pátio Ningchu, ele disse aos guardas que esperavam do lado de fora:
— Chamem a Madame e Ling’er, a Concubina Jiang e Yin’er para o Salão do Buda, e mandem também vinte guardas para lá.
Os baús do dote eram grandes e pesados. Seria preciso muita gente para movê-los.
Ye Chutang ficou sem palavras mais uma vez.
Até o próprio Buda ficaria exausto com esse canalha!
O pátio onde ficava o Salão do Buda chamava-se Pátio Fanyin, localizado no canto noroeste da Mansão do Ministro, e era bastante amplo.
Além do Salão do Buda, havia também um jardim e uma Torre Pega-Estrelas para apreciar a paisagem do pátio.
Quando Ye Chutang e Ye Jingchuan chegaram ao Pátio Fanyin, Kong Ru, Ye Anling, Concubina Jiang e Ye Siyin já esperavam na porta.
Os guardas estavam dispostos em ordem. A cena era bastante grandiosa.
Havia marcas evidentes de palmadas no rosto de Kong Ru, e seus quadris ainda estavam feridos. Sua postura de pé era desajeitada.
A Concubina Jiang mal conseguia conter a excitação, e o sorriso em seus lábios não podia ser disfarçado.
Ye Jingchuan foi o primeiro a entrar no pátio e dirigiu-se ao Salão do Buda.
Disse aos guardas:
— Arranquem o piso e retirem os baús de dote que estão embaixo.
Sob o piso do Salão do Buda, havia várias camadas de tecido impermeável.
Após removê-las, podia-se ver os baús de dote dispostos de forma ordenada.
Havia duas camadas, totalizando trinta e dois baús.
No jardim, havia uma varanda conectada a um pavilhão.
Baús de dote de dois andares estavam colocados embaixo, num total de sessenta conjuntos.
Os baús restantes estavam sob o piso da Torre Pega-Estrelas.
Ye Chutang ficou impressionada com a habilidade de Ye Jingchuan em esconder o dote.
Se fosse por ela procurar, realmente não teria conseguido.
Isso porque os baús não estavam diretamente enterrados no solo.
Exceto pela camada superior, que era o piso, os outros lados eram selados com pedras.
Mesmo se usasse seu poder sobrenatural de manipulação da terra para detectar, pensaria apenas que fazia parte da fundação.
Os sessenta e quatro baús da camada superior foram retirados e colocados no jardim.
Ye Jingchuan abriu um deles casualmente e disse:
— Dividam o dote em quatro partes. Cada uma das três filhas receberá uma parte, e a parte restante será deixada para Zhi’er e Jun’er usarem quando se casarem.
— O dote pertence a Wanning. Embora ela tenha dito antes de morrer que queria dividi-lo igualmente entre todos os filhos, Chu’er é sua única filha, então darei mais a ela. Yin’er é filha de concubina, por isso darei menos. Alguma objeção?
Claro que Kong Ru e Concubina Jiang não tinham objeções.
Qualquer item do dote de Tang Wanning era um tesouro precioso. Recebendo mais ou menos, ainda assim lucrariam.
— O Mestre decide.
Vendo que Ye Chutang permanecia em silêncio, Ye Jingchuan rapidamente tentou agradá-la:
— Chu’er, não se preocupe. O dote que reservo para você será certamente abundante e excelente.
Ye Chutang assentiu.
— Está bem, divida.
De qualquer forma, tudo era esforço inútil. Ninguém conseguiria levar nem um único item!
E ela aproveitaria essa oportunidade para verificar quanto o dote nos baús diferia da lista original.
Ye Chutang nasceu em uma família de artes marciais com séculos de tradição e já tinha visto sua boa parte de tesouros.
Ainda assim, quando pôs os olhos sobre o dote dentro dos baús, ficou atônita.
Cento e vinte e oito baús de dote, cada um quatro vezes maior que os comuns, repletos de uma quantidade espantosa de riquezas.
Qualquer item retirado ao acaso valia mais de mil taéis de prata.
Os tesouros mais raros podiam chegar a dezenas de milhares.
Ye Jingchuan levou mais de uma hora para dividi-los.
Os três filhos de Kong Ru ficaram com metade do dote, sendo que Ye Anling levou trinta e dois baús.
Ye Siyin recebeu vinte e quatro, deixando os quarenta restantes para Ye Chutang.
Ye Jingchuan lançou um olhar para Ye Chutang, que permanecera em silêncio o tempo todo, e sentiu um leve desconforto.
— Chu’er, se houver algo nos dotes de Anling ou Siyin que você queira, pode trocar.
Concubina Jiang se intrometeu com um sorriso:
— Senhorita mais velha, esse dote foi deixado pela Madame Tang — deveria ser, em sua maior parte, seu.
— “Em sua maior parte” meu? Então, já que não desejo dividi-lo, vocês vão me devolver tudo?
O sorriso de Concubina Jiang se enrijeceu, sua voz soou forçada:
— Esta humilde não ousaria ir contra o último desejo da Madame Tang.
— Último desejo que você afirma? Eu nunca ouvi falar disso.
Vendo a resistência de Ye Chutang, Kong Ru se apressou em intervir:
— Chu’er, quando sua mãe estava gravemente doente, muitas criadas cuidaram dela. Todas podem testemunhar.
Ye Chutang zombou:
— Os contratos delas estão em suas mãos. Vocês podem fazê-las dizer o que bem quiserem.
Ye Jingchuan, sem querer que a divisão cuidadosamente preparada se transformasse em mais discórdia, interveio de forma firme:
— A divisão está feita. Ficará assim.
Então, voltando-se para Ye Chutang, acrescentou:
— Quando você se casar, acrescentarei mais ao seu dote.
Ignorando sua promessa vazia, Ye Chutang deu um tapinha em um dos enormes baús.
— Ouvi dizer que o dote da minha mãe esvaziou metade dos cofres da família Tang, cada baú cheio até a borda. Então, por que alguns estão apenas dois terços completos?
Naturalmente, Ye Jingchuan havia desviado os itens que faltavam.
Sem demonstrar o menor traço de culpa, respondeu:
— Boatos são pouco confiáveis. Além disso, sua mãe vendeu muito do dote para garantir a posição da família Ye na capital e facilitar minha carreira.
Ye Chutang não acreditou em uma só palavra, mas não insistiu.
Tinha seus próprios meios de recuperar tudo.
— Entendido. Esses dotes permanecerão no salão ancestral ou serão levados para nossos pátios?
Justo quando Ye Jingchuan estava prestes a sugerir que fossem guardados coletivamente no salão, Concubina Jiang se adiantou:
— Mestre, a Segunda Senhorita se casará em breve, e a vez de Siyin não está distante. Por que não mandar suas partes para seus pátios e colocar guardas?
Ela dormiria melhor com os tesouros sob sua vigilância.
Ye Anling concordou:
— Pai, esses baús são grandes demais e já estão gastos. Gostaria de substituí-los por outros menores e mais novos. Depois, com os acréscimos do senhor e da mãe, poderemos completar os cento e vinte e oito. Isso honrará a Mansão do Ministro e agradará o Eunuco De.
Ye Jingchuan achou a ideia excelente:
— Muito bem, está decidido.
A mais feliz com isso foi Ye Siyin.
Ela fez uma reverência graciosa:
— Obrigada, Pai. Obrigada, Irmã Mais Velha.
Ye Jingchuan a ajudou a se levantar com a mão.
— Somos uma família. Não há necessidade de tanta formalidade.
O olhar de Ye Anling permaneceu sobre a mão de apoio de seu pai no braço de Ye Siyin, e seus olhos gelaram.
Quem diria que essa meia-irmã, antes negligenciada, um dia conquistaria seu favor?
— Pai, já está tarde. Deixe os guardas levarem os dotes agora.
Ye Chutang foi a primeira a falar:
— Antes de levarem o dote, é preciso primeiro fazer um inventário e assiná-lo com as impressões digitais. Preciso queimá-lo para minha mãe, para que saiba que vocês cumpriram o tal “último desejo”.
— Portanto, é melhor não mentirem para mim, ou minha mãe não os deixará em paz.
Ao ouvir isso, os rostos de todos se contraíram de desconforto.
Ye Jingchuan forçou um sorriso rígido:
— Chu’er, como eu poderia enganar você? Só acho desnecessário tanto trabalho. Podemos simplesmente mencioná-lo quando formos prestar respeitos à sua mãe.
— O inventário deve ser feito, e as assinaturas dadas — caso contrário, nenhum item do dote sairá deste lugar!
Dito isso, Ye Chutang bateu a palma da mão sobre o baú.
Num instante, o baú afundou fundo no chão.
Não apenas Ye Jingchuan e os outros ficaram atônitos, até mesmo os guardas treinados suaram frio.
Se aquela força tivesse atingido uma pessoa, teria sido fatal!
As pernas de Kong Ru quase cederam de susto, e ela rapidamente disse:
— A ideia de Chu’er é excelente. Vamos fazer como ela diz.
Ye Jingchuan assentiu às pressas:
— O inventário deve ser escrito, e as assinaturas dadas!
Satisfeita, Ye Chutang acenou com a cabeça:
— Pai, sem minha mãe você não estaria onde está hoje. Deve ser você o responsável por escrevê-lo.
— Está bem, eu escrevo.
Ye Jingchuan ordenou que os guardas trouxessem uma mesa, cadeiras e materiais de escrita.
Ele escreveu a lista, Concubina Jiang moeu a tinta, e Kong Ru recitou os itens do dote — a coordenação entre eles era perfeita.
A essa altura, já se aproximava do meio-dia, e o sol ardia impiedosamente.
Ye Anling e Ye Siyu imediatamente mandaram os guardas buscarem sombrinhas para protegê-las do calor.
Ye Chutang, alegando que queria praticar combate, entregou a tarefa de segurar as sombrinhas para suas duas irmãs ardilosas.
Os guardas, apavorados com a possibilidade de serem esmagados até virar pó pela palma de Ye Chutang, se apressaram em bajulá-la.
— As artes marciais da Jovem Senhorita são incomparáveis. Não somos páreo para você e admitimos derrota humildemente.
— Nossas habilidades são ridículas comparadas às suas, Jovem Senhorita. Não somos dignos de praticar com você.
— Jovem Senhorita—
Ye Chutang os interrompeu:
— Não tenham medo. Vamos apenas praticar técnicas — sem energia interna. O dano não será tão grave.
Ela tinha apenas começado a cultivar energia interna e não conseguiria muito em pouco tempo.
Mais cedo, quando afundou o baú do dote no chão, não fora arte marcial, mas sim sua habilidade de manipular a terra.
Sem saber a verdade, os guardas ficaram petrificados.
Ainda assim, não ousaram desobedecer às ordens de Ye Chutang, então se prepararam com firmeza e avançaram.
Embora jamais ousassem feri-la, ela não mostrou a menor contenção.
Em menos de quinze minutos, Ye Chutang havia espancado todos os vinte guardas até que estivessem se arrastando pelo chão.
Sua ferocidade assustou tanto Ye Anling quanto Ye Siyin, que nem sequer ousaram lançar um olhar ao redor, fazendo o máximo para não serem notadas.
Enxugando o suor da testa, Ye Chutang cutucou o guarda mais próximo com o pé.
— Vá pedir ao Mordomo Chen algumas frutas, bolinhos e chá. Estou cansada, com fome e com sede.
— Sim, Jovem Senhorita.
O guarda se levantou com dificuldade e saiu mancando.
Pouco depois, criadas chegaram trazendo refrescos.
Ye Chutang comeu e bebeu tranquilamente enquanto observava as outras cinco sofrerem sob o sol escaldante.
Ao meio-dia, Ye Jingchuan finalmente terminou de registrar o inventário do dote.
Massageando o punho dolorido, disse:
— Ling’er, Yin’er, assinem e deixem as impressões digitais nas partes do dote que lhes foram atribuídas.
Kong Ru assinou em nome de Ye Anzhi e Ye Anjun.
Assim que os três assinaram, Ye Jingchuan entregou a lista a Ye Chutang.
— Chu’er, está satisfeita agora?
Ye Chutang pegou a lista, conferiu cuidadosamente e então assentiu em aprovação.
— Segunda Jovem Senhorita Ye e Terceira Jovem Senhorita Ye, podem agora levar as partes do dote que lhes foram atribuídas.
Dito isso, virou-se e foi embora.
Ye Jingchuan ordenou que os guardas vigiassem o dote antes de correr atrás dela.
— Chu’er, o dote já foi dividido. Vai ver sua Avó agora?
Ye Chutang não interrompeu os passos:
— Não. Pessoas problemáticas vivem para sempre — ela não vai morrer tão facilmente.
Com isso, deixou a Mansão do Ministro e seguiu para o Pavilhão dos Versos, refúgio favorito de estudiosos e poetas.
A Torre da Poesia era um local refinado para compor poemas e criar antíteses poéticas.
Ela fora fundada pela maior academia do Reino de Beichen — a Academia Huating.
Estudiosos de todas as regiões se reuniam ali, juntamente com literatos e artistas.
Discutiam conhecimentos, compartilhavam ideias, criticavam ensaios, escreviam poesia e criavam antíteses eternas.
Restauravam partituras perdidas, resolviam enigmas de xadrez impossíveis e exibiam técnicas de pintura há muito esquecidas.
Tudo relacionado às artes acadêmicas podia ser encontrado na Torre da Poesia.
Dizia-se que todo estudioso de destaque no Reino de Beichen havia deixado sua marca ali.
Um provérbio até circulava entre o povo: "Se você ainda não entrou na Torre da Poesia, não merece se chamar de estudioso."
Ye Chutang veio em busca de um atalho para o auge do mundo acadêmico.
Mesmo que o maldito imperador quisesse sua morte, teria de medir as consequências!
Mas não era fácil entrar na Torre da Poesia — era preciso passar por um teste.
O desafio mudava diariamente, definido pela Academia Huating.
Ye Chutang ergueu os olhos para o enorme pergaminho pendurado no quinto andar.
"O céu como tabuleiro de xadrez, as estrelas como peças — quem ousa jogar?"
[Nota: Citação de um diálogo entre Zhu Yuanzhang e Liu Bowen.]
Essa era a primeira metade de uma antítese. Para entrar, era preciso compor a segunda metade correspondente.
Se alguém criasse uma obra-prima reconhecida por todos, a Torre da Poesia exibiria a antítese com seu nome por um dia.
Depois, ela seria pendurada permanentemente no terceiro andar.
Ye Chutang não tinha habilidade em compor poesia — sua mente já estava cheia de poemas Tang, letras Song e canções Yuan, sem espaço para originalidade.
Mas ela se destacava em criar antíteses, tendo dominado fóruns online em sua vida passada antes do apocalipse.
Rapidamente encontrou uma resposta.
Quando estendeu a mão para pegar o pincel, uma voz conhecida e zombeteira soou atrás dela.
— Senhora Ye, a Torre da Poesia não é lugar para quem possui apenas um conhecimento literário raso.
Era a Princesa Anping.
Ye Chutang revirou os olhos em exasperação.
A capital era pequena demais — não se podia ir a lugar algum sem topar com uma víbora!
Virou-se, forçando um sorriso educado, e fez uma reverência.
— Saudações, Princesa Anping.
Após a cortesia, endireitou-se e disse:
— Vossa Alteza tem razão. Aqueles com apenas migalhas de aprendizado podem não entrar, mas aqueles sem nenhum conhecimento certamente não entram.
A Princesa Anping percebeu a crítica velada à sua própria falta de talento literário.
Ela desejava chicotear Ye Chutang, mas a Torre da Poesia tinha regras rígidas — nada de violência, dentro ou fora.
— Senhora Ye acha que pode entrar na Torre da Poesia?
A antítese de hoje era notoriamente difícil. Muitos estudiosos renomados já haviam falhado.
Ye Chutang olhou para o pergaminho.
— Esta humilde moça é do interior, com aprendizado modesto. Esta antítese… é bastante desafiadora.
A dificuldade não estava na estrutura, mas em capturar a grandiosidade do original.
A Princesa Anping zombou.
— Para responder a esta antítese é preciso visão e sabedoria — coisas que você não possui, Senhora Ye.
No banquete de retorno, Ye Chutang a humilhou com poesia. Hoje, revelaria sua fraude.
Ye Chutang apenas sorriu.
— Esta humilde moça é de fato uma caipira — sem visão, sem sabedoria e sem graça. Naturalmente, não posso me comparar a Vossa Alteza.
A Princesa Anping percebeu imediatamente seu erro.
Esta patife estava armando uma cilada!
Como esperado, Ye Chutang continuou:
— Uma antítese tão majestosa certamente exige uma resposta à altura de uma prodígio real como Vossa Alteza.
Ela elevou a Princesa Anping a uma altura impossível.
Uma resposta comum não seria suficiente — apenas uma obra-prima serviria para uma princesa de sua estatura.
Uma multidão se reunira, ansiosa para bajular a realeza. Rapidamente, começaram a se manifestar.
— Vossa Alteza, incomparável em beleza e brilho, resolveria isso facilmente!
Você está louca? Se eu pudesse responder, ainda estaria aqui fora?
— Vossa Alteza, abençoada pelas estrelas e dotada da sabedoria imperial, certamente comporia uma obra-prima eterna!
Feche a boca! Nem o maior estudioso ousaria reivindicar tal título!
— Vossa Alteza—
A Princesa Anping não suportou mais.
— Chega! Tenho assuntos urgentes a tratar — não há tempo para brincadeiras.
Ye Chutang se moveu de lado, bloqueando sua fuga.
— Vossa Alteza permaneceu aqui tanto tempo que deve ter composto a resposta perfeita. Esta humilde moça não ousaria atrasá-la — apenas recite em voz alta, para que todos possamos nos deleitar com seu brilho.
A multidão, alheia à expressão sombria da princesa, concordou com entusiasmo.
Ye Chutang percebeu algo errado.
Seu olhar se voltou para a esquina da rua — a tempo de ver Qi Yanzhou desaparecer.
Encurralada, a Princesa Anping não podia avançar nem recuar.
Mas não tinha resposta. Recaiu em sua desculpa:
— Ousa me impedir de tratar de assuntos imperiais urgentes?
Ninguém ousou confrontá-la diretamente. Todos abaixaram a cabeça, evitando seu olhar.
Ela empurrou Ye Chutang de lado e saiu em fúria.
Ye Chutang sacudiu as mangas e pegou o pincel.
— Esta garota indigna tentará a antítese. Posso?
Sua voz chegou claramente à Princesa Anping, agora se afastando.
Ela ardia de vontade de ficar e ver Ye Chutang falhar, mas não podia sem se contradizer.
Cada passo afastando-se era um tormento.
O atendente da mesa rapidamente preparou a tinta.
— Aguardamos sua sabedoria, senhorita.
Ye Chutang mergulhou o pincel na tinta e escreveu:
"Montanhas e rios como tabuleiro, o povo como apostas — quando o jogo terminará?"
[Nota: Fonte online.]
O atendente ergueu reverentemente o papel ainda molhado.
— Por favor, aguarde um instante, senhorita.
Ele se virou e passou o pergaminho por uma pequena janela.
Os estudiosos da Torre julgariam seu valor.
Um mestre, ao lê-lo, ficou tão impressionado que saiu pessoalmente.
— Senhora Ye, seu talento é extraordinário. Por favor, entre.
Os estudiosos reunidos esticaram o pescoço, ansiosos para ver a resposta que merecera tanto respeito.
O mestre sorriu.
— A resposta será exibida em breve.
O significado era claro — a antítese de Ye Chutang seria exibida como obra-prima.
Ele a conduziu para dentro.
A Torre da Poesia lembrava uma versão em miniatura de um edifício tradicional em pátio — quadrada, estreitando-se no topo.
O primeiro andar era para refeições, dividido em salão principal e quartos privados.
Os andares superiores eram reservados às atividades acadêmicas.
O mestre perguntou:
— Senhora Ye, veio para encontrar colegas estudiosos ou para jantar?
— Jantar primeiro, depois conversar.
Ele indicou os quartos privados.
— Por aqui, Senhora Ye.
Mas Ye Chutang vinha em busca de fama. Escolheu o salão principal.
— Prefiro companhia animada.
Ela ocupou uma mesa vazia e pediu dois pratos com sopa.
O mestre aguardou, então disse:
— Sua antítese foi selecionada para exibição. Mais tarde, solicitaremos sua assinatura.
Ye Chutang tomou um gole de chá.
— Posso escrever eu mesma?
Sua caligrafia já era lendária entre os estudiosos. O mestre concordou imediatamente.
— Claro. Aguarde — irei buscar o pergaminho e os materiais de escrita.
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