Capítulo 97: A Aliança Se Rompe
Quando o pessoal do Pátio Qingqiu viu Han Yan retornar, ficaram naturalmente radiantes de alegria. Afinal, Han Yan agora era a Princesa Consorte de Xuanqing, e a atitude do Príncipe Xuanqing para com ela era evidente. À medida que o status da mestra crescia, os que a rodeavam também se tornavam mais confiantes. Em apenas um ano, Han Yan havia conquistado uma posição não dita na Mansão Zhuang, e aqueles que no passado haviam zombado dela e de sua mãe já não se atreviam a menosprezá-las tão facilmente.
Ao voltar para seu quarto, Han Yan procurou primeiro por Mamãe Chen. Ao ver que Han Yan estava bem, Mamãe Chen soltou um suspiro de alívio e a abraçou, conversando por um bom tempo. Só parou quando Han Yan sorriu e perguntou:
— Aconteceu algo importante na mansão nesses dias?
Mamãe Chen relatou tudo como era. Aparentemente, durante a ausência de Han Yan da Mansão Zhuang, as coisas haviam se mantido relativamente calmas. Concubina Mei repousava tranquila durante a gravidez, e Concubina Zhou andava cuidando da saúde, raramente saindo do Pátio Yongtong. No entanto, o relacionamento entre Madame Zhou e Zhuang Shiyang havia se tornado um tanto escancarado. Ainda assim, os criados não ousavam comentar muito, principalmente porque o temperamento de Zhuang Shiyang se tornara cada vez mais sombrio. Nesse ponto, Mamãe Chen achou estranho:
— Nem a Concubina Mei nem a Concubina Zhou são fáceis de lidar. Com o Mestre e a Madame Zhou tão próximos, mesmo que Concubina Zhou hesite em falar da irmã, como a Concubina Mei poderia aceitar isso facilmente?
Han Yan sorriu levemente. A Concubina Mei estava em uma situação delicada, com o ventre crescendo a cada dia. Para os de fora, parecia que o filho estava prestes a nascer, mas Han Yan sabia que ela não havia concebido o filho do mestre. Ela estava tentando encontrar um jeito de encobrir aquilo, sem dar muita atenção à Madame Zhou.
No momento, parecia que a Concubina Mei não tinha intenção de adotar uma criança de fora. Estaria ela planejando outro caminho? Enquanto refletia sobre isso, Han Yan franziu a testa e perguntou:
— Mamãe Chen, a tia Zhou tem falado com a tia Mei esses dias?
Mamãe Chen pensou com cuidado antes de responder:
— Agora que a senhorita comentou, lembro sim que a Concubina Zhou visitou o Jardim Furong algumas vezes recentemente. Os criados dizem que é porque ela percebeu que não tem mais esperança de se tornar esposa principal e então foi bajular a Concubina Mei. Talvez a Concubina Mei achasse que a Concubina Zhou não era mais uma ameaça, por isso passou a tratá-la com cordialidade. Mas ultimamente, elas voltaram a se afastar.
Mamãe Chen olhou para Han Yan, notando sua expressão pensativa, e acrescentou:
— A senhorita desconfia de algo?
Han Yan balançou a cabeça e disse:
— Mamãe Chen, apenas fique de olho nos movimentos da tia Zhou e da tia Mei. Assim que estiverem juntas, mande duas criadas para segui-las.
Embora Mamãe Chen não entendesse completamente, assentiu em concordância. Depois que ela saiu, Han Yan se voltou para Ji Lan e Shu Hong:
— O que acham disso tudo?
Ji Lan inclinou a cabeça, pensativa:
— Concubina Mei e Concubina Zhou nunca se deram bem; esse papo de cordialidade não faz sentido. Ainda mais agora, com a Concubina Mei grávida, ela deve estar ainda mais rancorosa.
Shu Hong interrompeu:
— Senhorita, ambas têm interesses ligados à senhora. Precisamos agir com cautela.
Han Yan suspirou profundamente:
— Subestimei ela. O coração humano é imprevisível; ela está tentando cortar laços.
E então sorriu novamente:
— Nesse caso, lidaremos com as duas juntas.
Seu rostinho redondo havia afinado um pouco, agora parecia caber na palma de uma mão, e seus olhos brilhavam com uma frieza cortante.
Ji Lan e Shu Hong trocaram olhares, sentindo uma pontada de alegria. Por algum motivo, desde que sua senhorita passara mais tempo com o Príncipe Xuanqing, parecia ter adquirido uma arrogância nobre, já não recuando perante ninguém. Suas ações estavam muito mais decididas do que antes, e ela exalava uma audácia singular. Como criadas, elas se alegravam com essa mudança em Han Yan; sua senhorita havia suportado demais. Já era hora de aquelas pessoas verem quem ela realmente era.
Naquela tarde, a Concubina Zhou chegou ao Jardim Furong, acompanhada por duas criadas.
A mobília do Jardim Furong havia se tornado muito mais requintada do que antes, adornada com muitos objetos luxuosos. Desde que a Concubina Mei engravidara, os presentes do mestre vinham chegando sem parar. No momento, a Concubina Mei estava reclinada em um divã, sorvendo debilmente o chá floral trazido por uma criada. Esse chá fora especialmente preparado pelo mestre, infundido com muitas ervas preciosas. Quanto mais bebia, mais irritada se sentia, olhando para seu ventre, que se assemelhava a uma almofada redonda, como se realmente estivesse grávida.
Ela não pôde evitar cerrar os punhos e socar o ventre algumas vezes, mas ainda não havia nada ali dentro. Toda vez que o mestre vinha visitá-la, a Concubina Mei ficava nervosa, temendo que ele descobrisse algo. Felizmente, Zhuang Shiyang havia se encantado por Madame Zhou, o que lhe dava um respiro. Ainda assim, ela se sentia inquieta; cada vez que pensava na possibilidade de sua farsa ser exposta, não conseguia evitar suar frio. A criada, Jiao Meng, se assustou e rapidamente a deteve:
— Senhora, a senhora não pode...
A Concubina Mei lançou-lhe um olhar irritado:
— Medo do quê? No fim das contas, não tem nada...
Só por não ter nada no ventre já era obrigada a sustentar o título de grávida, e fazia tempo que não tinha intimidade com o mestre. Ela ouvira os rumores sobre os escândalos entre o mestre e a Madame Zhou. Embora se sentisse aliviada por Madame Zhou lhe conceder mais tempo, só de pensar no mestre nos braços daquela mulher todos os dias, seu coração se enchia de ciúmes. Quando achava que já havia se livrado da Concubina Zhou, outra Senhora Zhou aparecia. Aquela família Zhou estava mesmo cheia de feiticeiras sedutoras.
Jiao Meng balançou a cabeça:
— Senhora, se alguém de fora vir isso...
Antes que pudesse terminar, uma criada entrou para anunciar:
— A Concubina Zhou está aqui.
Concubina Mei rapidamente ajeitou as roupas, recostando-se delicadamente no divã e fingindo cansaço... Afinal, grávidas eram conhecidas por ficarem sonolentas. Mas ela se sentia um tanto confusa sobre o motivo da visita da Concubina Zhou. Dias atrás, Concubina Zhou havia aparecido, agindo com humildade e até mencionando a ascensão de Han Yan no favor do mestre, embora não desse para entender o que aquilo realmente significava. Ela não quis se envolver, mas ao ouvir que o status elevado de Han Yan também poderia beneficiar Zhuang Hanming, ficou inquieta. Essa inquietação a levou a conversar com a Concubina Zhou todos os dias, tentando arrancar informações sobre a situação atual de Han Yan.
Ela sabia que a irmã mais velha da Concubina Zhou, Madame Zhou, era bastante habilidosa e tinha muitos ouvidos dentro da Mansão Zhuang. Por estar grávida, não podia visitar o Jardim Furong com frequência.
Enquanto pensava nisso, viu a Concubina Zhou entrar com o rosto coberto por um lenço, chorando baixinho.
—O que houve? —perguntou Concubina Mei, surpresa.
Concubina Zhou não respondeu, apenas se sentou na pequena cadeira em frente ao divã, enquanto sua criada resmungava com raiva:
— Nossa senhora está aborrecida por causa da Quarta Senhorita.
Han Yan? Os olhos de Concubina Mei cintilaram. Ela ouvira dos criados que Han Yan havia retornado à mansão no dia anterior e que Zhuang Shiyang agora não ousava mais agir de maneira leviana diante dela. Então Concubina Zhou estava perturbada por causa de Han Yan? Concubina Mei não acreditava que ela estivesse realmente chorando de raiva; provavelmente, Concubina Zhou pretendia usar essa situação para obter alguma vantagem.
Ela sorriu levemente:
— Se há algo que a incomoda, irmã Zhou, você deve me contar. Só assim posso ajudar a aliviar suas preocupações.
Suas palavras transbordavam de preocupação, mas, ao ouvi-las com atenção, havia uma pitada de escárnio — uma risadinha condescendente. De fato, o status de Concubina Zhou na Mansão Zhuang não chegava aos pés do de Concubina Mei. Lembrando-se de como Concubina Zhou outrora tentara provocá-la, apoiada no favor do mestre, e agora a via calada e respeitosa, Concubina Mei sentia uma satisfação inexplicável.
Concubina Zhou percebeu o sarcasmo nas palavras dela e sua expressão escureceu levemente. Quando levantou a cabeça, seus olhos estavam cheios de mágoa, com lágrimas prestes a cair:
— Irmã, com a Quarta Senhorita de volta, parece que não há mais lugar para nenhuma de nós nesta casa.
Concubina Mei fez uma pausa discreta ao servir o chá, mas manteve a expressão inalterada:
— O que quer dizer com isso?
Concubina Zhou enxugou as lágrimas:
— Ontem, quando a Quarta Senhorita retornou, fui cumprimentá-la com o mestre. Não esperava que ela me zombasse logo de início, e quando não consegui me conter, retruquei. Mas então... ela realmente me ameaçou.
Após alguns soluços, continuou:
— O mestre não disse nada... Irmã, você não acha que a Quarta Senhorita agora é quem dá a palavra final na Mansão Zhuang?
Concubina Mei observava tranquilamente seus dedos pintados, o branco delicado contrastando com o esmalte vermelho vivo, parecendo especialmente requintados. As palavras de Concubina Zhou claramente lhe eram dirigidas. Tudo o que Concubina Zhou dizia hoje... seria apenas uma queixa simples? Não necessariamente. Ela sorriu e olhou para Concubina Zhou:
— A Quarta Senhorita agora é a Princesa Consorte de Xuanqing, então certamente tem mais influência. Mas o que quer dizer com essas palavras, irmã?
Percebendo a calma de Concubina Mei, um arrepio percorreu o coração de Concubina Zhou; aquela mulher havia se tornado bastante astuta. Felizmente, Lady Zhou a havia instruído bem. Concubina Zhou sorriu suavemente:
— Sozinha, não posso fazer muita coisa. Mas se me aliar a você... acredito que a Quarta Senhorita nos mostraria algum respeito.
Ela está tentando se aliar a mim, esperando que eu a ajude a lidar com Zhuang Han Yan, pensou Concubina Mei, mas apenas sorriu e disse:
— Gostaria de saber o que faz a irmã Zhou pensar que eu a ajudaria.
Concubina Zhou, no entanto, parecia inabalável. Limpando as lágrimas com um lenço, sorriu:
— A Quarta Senhorita é alguém que guarda rancores. Desde que entrei nesta casa, ela tem nutrido ódio por mim. Depois dos conflitos recentes com Yu'er, agora que ascendeu ao poder, veio se vingar. Posso perguntar, Concubina Mei, você também não ofendeu nossa Quarta Senhorita?
Concubina Mei ficou surpresa, subitamente recordando como costumava maltratar Han Yan e sua mãe. Naquela época, era jovem e bela, e o mestre a favorecia bastante. A Senhora Wang não representava ameaça, mas seu status como esposa legítima era, de fato, incômodo. Por isso, Concubina Mei inventava todo tipo de artimanha para atormentá-las — um dia as caluniava, no outro tramava contra elas. Zhuang Hanming e Han Yan frequentemente eram punidos e forçados a se ajoelhar no salão ancestral por causa dela. Ela ouvira que Han Yan era extremamente protetora; não deixava ninguém encostar sequer em sua criada. Tendo prejudicado a mãe e o irmão de Han Yan no passado, não seria ela culpada além do perdão? Se Han Yan estava sendo tão implacável com Concubina Zhou, não seria ainda mais perigosa para ela?
Ao ver a expressão de Concubina Mei suavizar, Concubina Zhou aproveitou a oportunidade:
— Agora que a Quarta Senhorita é a Princesa Consorte de Xuanqing... Ela ainda nem se casou oficialmente, mas já é tão arrogante. Quando se casar, não vai ficar ainda mais sem restrições? Nessa hora, nem mesmo o mestre poderá controlá-la. Me diga: que lugar restará para nós, irmãs, nesta casa?
Concubina Mei franziu o cenho. Concubina Zhou tinha razão. Quando Concubina Zhou se tornara sua rival, Han Yan estivera ao seu lado. Mas naquela época, Concubina Zhou era uma oponente formidável; agora, parecia fraca e indigna de preocupação, enquanto Han Yan se tornava cada vez mais difícil de lidar. Uma aliada assim é assustadora. Se um dia Han Yan a visse como inimiga, que chance ela teria de sobreviver? Tinha receio de acabar em situação ainda pior do que Concubina Zhou — afinal, esta ao menos tinha uma filha. Concubina Mei, por outro lado, nunca dera ao mestre um filho, tampouco uma filha. Estando com Zhuang Shiyang por tanto tempo, ela entendia bem que, embora ele já a tivesse favorecido e ainda a tratasse com certa decência, se algo acontecesse com ela, ele não moveria um dedo para protegê-la.
Concubina Mei começou a sentir um medo crescente, rompendo em suor frio.
Vendo isso, Concubina Zhou se tranquilizou por completo:
— Irmã, não estou te criticando. Essa Quarta Senhorita está subindo muito rápido, e no futuro, o Príncipe Xuanqing terá um poder imenso. Com essa pressão, o Mestre tratará bem o jovem mestre. Agora que você está grávida, se for um menino, não seria como ter um irmão para dividir os favores? — Ao notar a expressão atônita de Concubina Mei, ela sorriu: — Nós, mulheres... no fim das contas, tudo se resume a ter um filho para nos dar apoio, não é? Eu já perdi o meu. Irmã... você precisa pensar bem no seu futuro.
Concubina Mei ficou pensativa. O que Concubina Zhou dizia era, de fato, verdade. Toda a sua vida havia sido voltada para garantir um apoio. Mesmo que não estivesse realmente grávida, ela não podia simplesmente assistir Zhuang Hanming crescer e, um dia, assumir o controle da família Zhuang. Quando aquele irmão e aquela irmã tivessem poder real sobre a família... que dias bons ainda lhe restariam?
Concubina Zhou sorriu, sacudiu a roupa com elegância e se levantou:
— Irmã, você está com o corpo pesado, então vou me retirar, para não atrapalhar seu descanso.
Dizendo isso, levantou-se, virou-se e caminhou em direção à saída.
— Espere — disse Concubina Mei de repente.
Concubina Zhou já estava à porta. Ao ouvir as palavras de Concubina Mei, um sorriso se abriu em seu rosto. Virou-se lentamente para encará-la:
— O que foi?
— Qual é o seu plano?
A expressão de Concubina Mei já não era apenas de preocupação; o olhar que lançou a Concubina Zhou perdera qualquer vestígio de desprezo. Em vez disso, brotava um temor verdadeiro pelo próprio futuro.
Concubina Zhou fez um gesto para que as criadas se retirassem e fechou a porta, mantendo apenas sua aia pessoal por perto. Em seguida, sentou-se à beira da cama e serviu-se de uma xícara de chá:
— Irmã, a situação é bastante simples...
Capítulo 98: Uma Teia de Mistérios
Depois que Concubina Zhou partiu, Jiao Meng massageava as pernas de Concubina Mei e perguntou:
— A senhora pretende mesmo colaborar com ela?
Concubina Mei zombou. O plano de Concubina Zhou era realmente bom — ao menos para lidar com Zhuang Han Yan —, mas não faria sentido ela trabalhar duro sem obter nada em troca. Olhou para o próprio ventre, pousando a mão com leveza sobre ele:
— Quero tentar algo que mate dois coelhos com uma cajadada só.
Han Yan fechou os olhos, escutando o relatório de Ji Lan, que contava que Concubina Zhou havia entrado no Jardim Furong e dispensado todos para ter uma conversa secreta com eles. Ji Lan disse com ansiedade:
— Senhorita, a senhorita acabou de retornar à residência e a Concubina Zhou já está fazendo esse tipo de movimentação. Tenho medo de que estejam tramando algo contra a senhora.
Han Yan ponderou por um momento:
— Você disse que além da Concubina Zhou e da Concubina Mei, havia outros nos espionando?
Ji Lan respondeu:
— Também estava lá a criada substituta da Concubina Mei, Jiao Meng. — Ao ver Han Yan franzir o cenho, Ji Lan apressou-se em acrescentar: — Jiao Meng é a criada acompanhante da Concubina Mei, dizem que é sua confidente. Essa garota é dura na queda e não se rende fácil, é extremamente leal à Concubina Mei.
Ji Lan conhecia bem todos os criados da residência Zhuang e sabia de todos os mexericos:
— Mas Jiao Meng é realmente difícil de lidar; nem as criadas do Jardim Furong gostam dela. Só que como a Concubina Mei a favorece, ninguém ousa incomodá-la.
Han Yan assentiu com a cabeça. Então Jiao Meng era tão leal à Concubina Mei... Como poderia fazê-la traí-la de bom grado? Respirou fundo e perguntou a Ji Lan:
— Você sabe se Jiao Meng tem alguém na família?
Ji Lan fez uma pausa, pensou um pouco e respondeu:
— Jiao Meng tem um pai idoso e um irmão. O irmão dela vende chá na capital e parece estar se saindo bem.
Han Yan refletiu e então ordenou:
— Ji Lan, preciso que você faça algo muito importante.
Ji Lan ficou surpresa:
— O que seria?
Han Yan se inclinou, sussurrou algumas palavras no ouvido da criada, e Ji Lan assentiu antes de sair apressadamente. Shu Hong permanecia quieta ao lado. Embora seus ferimentos já tivessem melhorado bastante, Han Yan ainda não queria que ela realizasse tarefas pesadas. Ao vê-la tão tranquila, e recordando as palavras de Ji Lan, Han Yan sentiu um impulso travesso e falou em voz alta:
— Shu Hong, você tem dezesseis anos, não é?
Shu Hong foi pega de surpresa com a pergunta repentina e ficou momentaneamente atônita antes de assentir:
— Sim.
— Já está na hora de começar a pensar em casamento. Tem alguém de quem goste? — perguntou Han Yan de modo casual, fazendo com que o rosto de Shu Hong se tingisse de vermelho instantaneamente.
— Senhorita... eu nunca pensei em me casar — respondeu ela, atrapalhada.
Ver Shu Hong, que costumava ser tão contida, ficar nervosa daquele jeito só aumentou o interesse de Han Yan. Ela sabia que, quando partira, Fu Yunxi havia enviado Mu Yan para protegê-la, e provavelmente ele estaria escondido por perto, ouvindo a conversa.
— Como assim não vai se casar? — disse Han Yan com seriedade. — Se for o caso, quando eu me tornar Princesa Consorte de Xuanqing, posso pedir ao Príncipe que te aceite como concubina.
Era apenas uma brincadeira. Mesmo que Fu Yunxi aceitasse, Han Yan jamais empurraria uma mulher para ele de livre e espontânea vontade.
Para sua surpresa, ao ouvir aquilo, Shu Hong ajoelhou-se de repente diante dela, com a voz embargada:
— Senhorita, se esse for o seu desejo, temo que Shu Hong não poderá cumprir esse papel. Shu Hong... preferiria morrer.
Aquilo foi completamente inesperado para Han Yan — e até Mu Yan, que observava do telhado, ficou pasmo. Afinal, tornar-se concubina do próprio mestre era o sonho de muitas criadas. Muitas delas se infiltravam nos leitos dos senhores esperando subir de status. Diversas moças da nobreza aceitariam de bom grado ser concubinas de Fu Yunxi, e nem era apenas por seu título — seu charme por si só já bastava para encantar. E ainda assim, Shu Hong preferia morrer a se tornar concubina dele?
Shu Hong ergueu a cabeça e declarou com firmeza:
— Prefiro ser uma esposa humilde do que uma concubina de alto status. Senhorita, tenho seguido a senhora há tantos anos e vi o suficiente da dinâmica desta casa... a disputa entre concubinas prejudica não só os filhos. Nesta vida, não busco riqueza ou nobreza. Só quero continuar ao seu lado e ver a senhorita viver em paz e alegria — isso já seria suficiente para mim.
Suas palavras vinham do fundo do coração, e Han Yan sentiu uma pontada de comoção. Não suportava ver uma garota tão boa desperdiçando a juventude ao seu lado. Não bastava que apenas ela fosse feliz; a verdadeira felicidade era ver os que a cercavam também realizados. Com isso em mente, Han Yan disse a Shu Hong:
— Você vai ter que se casar um dia. Mesmo que não queira, eu não suportaria te manter presa a mim para sempre. Shu Hong, você tem estado ao meu lado por tantos anos; sua vida não pode girar só ao redor de mim. Você merece sua própria felicidade. O mesmo vale para Ji Lan. Vocês podem continuar comigo, mas também precisam se casar. Uma mulher precisa encontrar seu próprio apoio.
Shu Hong e Ji Lan haviam acompanhado Han Yan por duas vidas; na anterior, sacrificaram a própria felicidade por ela. Criadas leais como elas eram raras, e Han Yan estava decidida a garantir-lhes um futuro feliz. Ao ouvir aquilo, Shu Hong quis recusar, mas o olhar sério de Han Yan a silenciou:
— Não precisa dizer mais nada; já tomei minha decisão. Shu Hong, se você for se casar... que tipo de família deseja encontrar?
Shu Hong ficou um pouco constrangida de falar sobre isso com a senhorita pela primeira vez. Suas bochechas coraram levemente enquanto ela respondia com firmeza:
— Se for para me casar, não busco riqueza nem posição. Só quero que ele seja honesto e bondoso. Que não tome concubinas, e que possamos envelhecer juntos. — Ao notar que Han Yan não parecia discordar, ela continuou: — Todos dizem que é absurdo a Senhorita querer que o Príncipe tenha só a senhora como esposa. Mas eu não acho. Na verdade, eu tenho o mesmo desejo. É raro encontrar um companheiro para a vida inteira, e se ele tiver várias concubinas, nossa casa nunca terá paz.
Mu Yan ficou parado, atônito, escondido nas sombras do telhado, espiando pela janela para Shu Hong. Ficou surpreso ao ouvir que ela expressava um desejo semelhante ao da Princesa. Na verdade, quando a Princesa Consorte exigiu que seu marido jamais tivesse uma concubina, não apenas o Príncipe — até mesmo alguém tão reservado quanto ele achou a exigência absurda. É comum que os homens tenham várias esposas... como a Princesa pode falar de ciúmes com tanta naturalidade? Mais surpreendente ainda foi o fato de que o Príncipe, geralmente tão independente, havia aceitado. E agora, uma simples criada da Princesa Consorte dizia a mesma coisa. Será que todas as pessoas ao redor dela são assim tão únicas?
A luz do sol caía sobre o rosto levemente corado de Shu Hong, sua pele delicada a fazia parecer uma beleza gentil e compreensiva. E, no entanto, era justamente essa beleza quem havia acabado de expressar o desejo de monopolizar o marido. Mu Yan abaixou a cabeça, recordando-se da primeira vez que viu Shu Hong. Naquela época, ela pensou que estavam tentando roubar a Princesa Consorte dela e chegou a cravá-lo com um grampo de cabelo. Ele sempre se orgulhara de seu comportamento frio; normalmente, as criadas nem ousavam falar com ele, mas Shu Hong havia sustentado seu olhar, recusando-se a recuar. Ficou surpreso e impressionado — tamanha lealdade em uma criada era rara.
Nos encontros seguintes, ele a via com frequência ao lado da Princesa. A Princesa Consorte era sábia, e Shu Hong também não era nada tola. Talvez todas as pessoas ao redor da Princesa Consorte tivessem alguma capacidade — Ji Lan era astuta, e Shu Hong era firme. Mais tarde, durante uma discussão entre Zhuang Hanming e Han Yan, Shu Hong se feriu. Naquela ocasião, ao carregá-la, ele percebeu como ela era leve. Apesar de sua postura sempre serena, ela era tão delicada quanto as outras criadas da residência do Príncipe Xuanqing.
Aos poucos, foi sentindo uma espécie de compaixão por ela — uma que nem sequer reconhecia.
Hoje, ao ouvir Han Yan dizer que queria casar Shu Hong, sentiu-se inexplicavelmente nervoso. Não sabia o motivo, e mesmo agora ainda não compreendia. Acontece que a pessoa que Shu Hong gostaria de ter ao seu lado era alguém assim — íntegro e honrado. Riqueza e status pouco importavam; o que importava era um coração dedicado somente a ela.
Han Yan sorriu e perguntou:
— Shu Hong, o que você acha de Mu Yan?
Com isso, tanto os que estavam dentro do quarto quanto o que estava no telhado se espantaram.
Shu Hong apressou-se em balançar a cabeça:
— Senhorita, o que está dizendo? Eu não tenho nada a ver com o Guarda Mu Yan.
Ao ouvir Shu Hong negar prontamente qualquer ligação, Mu Yan sentiu uma sensação desagradável crescer no peito. Não sabia por que estava com raiva, mas naquele instante, aquele homem de pedra finalmente demonstrou um leve traço de emoção. Virou-se e saltou do telhado, sem mais observar a cena no interior.
Han Yan não sabia o que Mu Yan estava pensando, mas achou tudo aquilo divertido. Ao lado de Fu Yunxi, Mu Feng era animado, e Mu Yan tinha algumas semelhanças com Fu Yunxi. Alguém em quem Fu Yunxi confiava certamente era digno, mas ela se perguntava se havia algum destino entre Shu Hong e ele.
Com esse pensamento, Han Yan começou a rir. Shu Hong não entendeu por que Han Yan ria e, desconcertada, deu uma desculpa e ficou em silêncio.
Na estalagem, uma linda garota vestida de amarelo brincava com uma pequena cobra na mão, olhando para o homem que tratava seus ferimentos ali perto.
— Gege, por que você quer salvá-la?
— Yi Lin Na — disse Zhuo Qi friamente —, você está se intrometendo demais.
Yi Lin Na fez um biquinho. Deus sabia o quanto ela ficou feliz ao ver Han Yan quase morrer; se Han Yan morresse, Fu Yunxi poderia se casar com ela. Mas Zhuo Qi ajudou Han Yan às escondidas, e como resultado, Zhuang Han Yan foi salva por Fu Yunxi no final. Vendo seus planos desmoronarem, Yi Lin Na quase chorou de frustração. Ainda assim, sempre teve medo do irmão e só pôde resmungar para si mesma.
— Gege, ela é a Princesa Consorte de Xuanqing. — Yi Lin Na franziu o cenho. Mesmo assim, era excepcionalmente bela e encantadora, seu charme superava em muito o de Han Yan. Podia-se dizer que metade dos jovens do mundo enlouqueceriam por sua beleza.
Zhuo Qi balançou a cabeça, um sorriso surgindo nos lábios — um sorriso carregado de um forte senso de posse.
— Ela é minha.
Lembrou-se da imagem da garota frágil em pé em uma poça de sangue, empunhando uma grande faca sem demonstrar medo algum. A primeira vez que a viu, pensou que ela era extremamente astuta, mas havia nela uma calma que parecia de outro mundo. Era uma força silenciosa forjada pelas provações da vida. Cada vez que a via depois disso, sentia uma complexidade nela — uma infinidade de máscaras que o faziam se perguntar qual seria seu verdadeiro eu. E naquele dia, sob as tentativas de assassinato, seu olhar era penetrante, sem sinal de recuo ou desespero; ao contrário, emanava uma vitalidade cortante, fria e feroz. Naquele momento, ele sentiu como se ela fosse uma águia orgulhosa das estepes, o que despertou nele o desejo de domá-la.
Que importância tinha o Príncipe Xuanqing ou a Princesa Consorte de Xuanqing em seu caminho? Desde que colocasse os olhos em algo, ele o conseguiria. Um sorriso confiante se espalhou pelo rosto de Zhuo Qi; ele tinha a sensação de que, ao conquistar essa garota, obteria a conquista mais gratificante de sua jornada pelo mundo.
Yi Lin Na não conseguia adivinhar o que Zhuo Qi estava pensando. Ao ouvir aquelas palavras, hesitou e perguntou:
— Gege, você gosta dela?
Zhuo Qi sorriu sem responder. Yi Lin Na confirmou suas suspeitas e passou a odiar ainda mais Han Yan. Zhuo Qi sempre fora mais próximo dela, mas aquela mulher inútil não apenas roubou o homem que ela amava, como também fez seu querido irmão repreendê-la. Yi Lin Na decidiu silenciosamente que, da próxima vez que visse Han Yan, independentemente da opinião de seu irmão, ela a eliminaria. Uma mulher como aquela representava uma ameaça tremenda à existência de Yi Lin Na.
Enquanto isso, na residência do Príncipe Xuanqing, tudo estava estranhamente calmo.
— Você adivinhou certo. — Cheng Lei apoiava o queixo sobre a mão. — Quem salvou sua pequena Princesa não foi outro senão o Príncipe da Região Oeste.
Fu Yunxi estava sentado com a cabeça baixa, os trajes brancos arrastando-se pelo chão, a expressão fria. Ao ouvir as palavras de Cheng Lei, estendeu calmamente dois dedos e bateu na xícara de chá diante de si.
— Ele não sabe no que está se metendo.
Cheng Lei soltou uma risada.
— Afinal, ele é o salvador da sua cunhada. Por que falar com tanta frieza? Acho que ele realmente tem sentimentos por ela.
Fu Yunxi franziu levemente a testa, enquanto sua mente evocava o rosto sorridente de Han Yan. Agora que o brilho dela chamava atenção dos outros, atraía todo tipo de gente, tornando as coisas bastante complicadas. — Se ao menos eu pudesse escondê-la... — Pensar nisso o surpreendeu, e ele não pôde deixar de soltar uma risada contida.
Cheng Lei observava o amigo, que ora franzia a testa, ora esboçava um sorriso, e suspirou interiormente. Parecia que o amor era mesmo uma palavra traiçoeira. Antes, ele achava o comportamento frio de Fu Yunxi assustador, mas agora, suas emoções imprevisíveis eram ainda mais alarmantes.
— Como está a investigação em Shu? — perguntou Cheng Lei. Na última vez, Fu Yunxi havia ordenado que seus subordinados vasculhassem o Clã Tang, o que o surpreendeu, pois ela nunca demonstrara interesse por essas coisas do mundo marcial. Depois, ao saber que fora por pedido de Han Yan, ficou intrigado. Afinal, uma jovem protegida investigando uma seita marcial era algo bem incomum.
A expressão de Fu Yunxi mudou um pouco ao lembrar dos relatórios dos subordinados. O lenço bordado era um produto exclusivo do Clã Tang, e o caractere “Qiao” nele não estava relacionado a nenhuma pessoa conhecida do clã. Após novas investigações, descobriram que a filha mais nova do atual chefe do clã se chamava Tang Qiao, carinhosamente chamada de Xiao Qiao. Contudo, Xiao Qiao havia morrido de doença prolongada vinte anos atrás. Os espiões de Fu Yunxi visitaram seu túmulo e o encontraram vazio.
Fu Yunxi não conseguia entender por que o Clã Tang criaria um túmulo vazio, mas seus agentes relataram que o clã desconfiava muito da corte e nutria um ódio profundo por ela. Eram peritos em venenos, o que deixava os espiões cautelosos para não serem descobertos ao investigarem mais a fundo.
— Está relacionado à corte — disse ele solenemente.
Cheng Lei ficou surpreso. — Seitas marciais e a corte geralmente mantêm distância. Se é isso que a cunhada quis que você investigasse, isso significa que ela tem alguma ligação com a corte? — De repente, mudou o tom. — É realmente estranho. Cunhada é só filha de um oficial de quinta classe; como poderia ter alguma ligação com o palácio? Mas desde que ela apareceu no banquete da corte, Wei Ru Feng, o Sétimo Príncipe, e a Imperatriz Viúva vêm prestando atenção aos seus movimentos. Isso não faz sentido.
Naquela época, Han Yan ainda não era Princesa Consorte de Xuanqing, sendo apenas filha de um oficial comum. Porém, Wei Ru Feng queria pessoalmente casá-la como esposa do herdeiro Wei, e a Imperatriz Viúva até cogitava um casamento arranjado. Haveria algo mais nessa conexão?
Fu Yunxi fitava a xícara de chá à sua frente, as folhas verdes rodopiando na água. A corte era um mar revolto, e parecia determinada a arrastar Han Yan para suas intrigas — seus motivos estavam longe de ser puros.
Cheng Lei então disse, — A propósito, Yunxi, tem mais uma coisa.
Fu Yunxi levantou o olhar, curioso.
Cheng Lei continuou, preocupado, — Mandei algumas pessoas vigiar a residência dos Zhuang dia e noite, e descobrimos que alguém mais também está observando o local.
Isso era realmente estranho. Se fosse só para vigiar Han Yan, faria sentido, mas por que alguém observaria tão de perto a residência dos Zhuang? Estariam escondendo algum segredo?
O tom de Fu Yunxi esfriou. — Não podemos ficar de braços cruzados.
Algo crucial poderia estar escondido naquela residência. Fu Yunxi suspeitava disso há algum tempo, mas só agora tinha confirmação. Han Yan havia sofrido várias tentativas de assassinato, e aquela concubina favorita do Grande Tutor Zhang permanecia na casa dos Zhuang há tanto tempo — certamente estava ligado a algo mais. Enquanto Han Yan permanecesse ali, seu destino estaria entrelaçado a esse mistério.
Ele não podia permitir que ela corresse perigo. O tempo escapava, e aquelas pessoas estavam inquietas, provavelmente agindo em breve. Antes de sair, precisava garantir que Han Yan estivesse em um ambiente seguro. Embora ela soubesse se defender, agora que era sua Princesa Consorte, não podia permitir falhas.
Cheng Lei percebeu a determinação nos olhos de Fu Yunxi e sorriu. Quando essa pessoa aparentemente fria tinha sentimentos, tornava-se ferozmente protetor. Cheng Lei ficou realmente feliz por ele, embora aquela Princesa Consorte que escolhera não parecesse nada comum. Esqueça os interesses complicados; só a capacidade de dizer algo tão marcante como “Uma vida inteira juntos, um só par” já era notável.
— A Imperatriz Viúva não desistirá tão fácil. Cunhada atrapalhou os planos do Sétimo Príncipe; ele deve odiá-la profundamente agora — lembrou Cheng Lei com gentileza.
— Agora ele está fora do Palácio, orando por bênçãos. — Fu Yunxi escureceu a testa, o rosto sério. — Enviei guardas secretos para protegê-la. Se alguém ousar tocar nela, farei com que sofram um destino pior que a morte.
Capítulo 99: Comprando a Empregada
A residência dos Zhuang andava estranhamente silenciosa ultimamente. Han Yan não saíra de casa, e Zhuang Hanming apareceu algumas vezes, mas foi dispensado com a desculpa dela estar cansada. O pátio parecia assustadoramente deserto. Diziam que a Concubina Zhou e a Concubina Mei estavam especialmente próximas, enquanto a nova favorita, Lady Zhou, parecia se afastar de Zhuang Shiyang.
— Eu realmente não sei o que eles estão pensando; meu coração está tão inquieto — Ji Lan não se conteve e reclamou. De fato, aquela ambiguidade dava a impressão de que algo grande e conspiratório estava se formando. Han Yan acenou com a mão, dispensando o assunto: — Não é nada. Deixe-os.
Zhuang Shiyang se afastara de Lady Zhou depois de ouvir suas palavras anteriores, o que era esperado. Homens, afinal, buscam novidades; por mais que ele gostasse de Lady Zhou, logo priorizaria seu próprio futuro.
Ji Lan de repente falou: — A propósito, senhorita, aquela coisa que você me mandou resolver há pouco… já foi resolvida?
— Tão rápido? — Han Yan ficou surpresa.
Ji Lan assentiu: — O irmão de Jiao Meng perdeu todo o dinheiro da família. Agora os credores querem usar a casa de Jiao Meng como garantia.
Han Yan concordou: — Nesse caso, preciso ir vê-la.
No maior cassino da capital, um jovem magro estava sendo expulso. Os lábios sangrando denunciavam que tinha sido gravemente ferido, mas ele ainda gritava desafiador dentro do cassino: — Vocês estão passando dos limites!
— Cai fora! — um homem corpulento pisou nas costas dele. — Moleque, vai logo arrumar suas coisas. Sua casa já está hipotecada comigo, haha! Dou três dias. Se não pagar, vou tomar sua herança!
Chen’er gritou furioso: — Eu vou recuperar tudo!
O homem riu alto, como se tivesse ouvido a maior piada do mundo. — Recuperar? Com o que você vai ganhar? Nem dinheiro você tem e ainda quer apostar? Haha! Ouvi dizer que você tem uma irmã… que tal?
Chen’er respondeu, enfurecido: — Nem pense em tocar na minha irmã!
— Pare com essa baboseira. — O homem franziu a testa. — Joguem ele para fora!
Os servos avançaram, empurrando Chen’er para fora. Ele cambaleou até a velha casa e a encontrou revirada, como se tivesse sido saqueada por ladrões. Alarmado, entrou e ouviu soluços baixos de uma mulher e o choro de um homem idoso.
Ao entrar, viu sua irmã Jiao Meng chorando no colo do pai de oitenta anos. Ao notar Chen’er, ela parou de chorar e gritou irritada: — Por que você voltou? Por que não morreu naquela mesa de jogo?
Chen’er baixou a cabeça, sentindo uma mistura de respeito e apreensão por ela. Lançou um olhar implorante ao pai, o velho Chen, que gostava muito dele. Vendo o filho tão aflito, mesmo bravo, não pôde evitar amolecer. Falou para Jiao Meng: — Para, afinal, ele é seu irmão.
Jiao Meng riu sarcasticamente, furiosa: — Irmão? Que irmão é esse? Não só jogou fora as economias difíceis da família, como agora perdeu nossa casa ancestral também. Pai, você não pensa onde vamos morar sem uma casa? Ele quer nos mandar para a rua?
Chen’er corou com as palavras da irmã, mas ela estava certa. Ele tocava um pequeno negócio com sucesso até que, um dia, um amigo o convidou para o cassino. Ele não pensou muito, só queria conhecer o mundo. Para sua surpresa, teve sorte, ganhando sempre. Quanto mais ganhava, mais queria ganhar, e logo virou viciado em jogo. Infelizmente, a sorte acabou; recentemente, perdeu tudo que havia ganhado, até suas economias, inclusive a casa da família.
Jiao Meng continuou e rompeu em lágrimas: — Eu trabalho duro todos os dias servindo a concubina na casa do mestre, fazendo todo o trabalho de empregada para quê? Não era para melhorar nossa vida? E eu me esforço enquanto você nos afunda. De que adianta ter um irmão como você? Melhor nem ter!
Chen’er, ansioso, respondeu: — Irmã, você não pode me abandonar assim. Agora só nós dois restamos na família. Mesmo que me odeie, não pode abandonar o pai. Além disso, eu nunca te tratei mal, não é?
Era verdade; quando Jiao Meng era mais nova, eles eram bem próximos. Antes do vício, Chen’er era uma pessoa decente que se importava muito com ela. Caso contrário, não teria ficado tão bravo quando o homem do cassino sugeriu usar Jiao Meng como garantia para as dívidas.
Ouvindo o irmão, Jiao Meng hesitou. Apesar de sentir pena da desgraça dele e raiva da irresponsabilidade, não conseguia ignorá-lo por completo.
O velho Chen suspirou: — Jiao Meng, se tiver alguma ideia, fale.
As lágrimas de Jiao Meng ameaçavam cair. Que ideia poderia ter? Desde que soubera das enormes dívidas de Chen’er, estava em pânico. Procurara a Concubina Mei discretamente, na esperança de ajuda, mas até nossa casa ancestral, que parecia pouco, exigia muito dinheiro para manter; caso contrário, o velho Chen não a valorizaria tanto. Concubina Mei não queria emprestar tanto dinheiro, e como empregada, Jiao Meng não tinha como levantar essa quantia. Pensar nisso a mergulhava em desespero profundo. O pai não queria deixar a casa, e, mais importante, se a perdessem, Chen’er e o velho Chen ficariam sem lar. O velho Chen era idoso; se algo acontecesse no meio desse turbilhão, não seria desleal e ingrata?
Mas tanto Chen’er quanto o velho Chen olhavam para Jiao Meng com olhos cheios de esperança. De fato, ela era a pessoa mais capaz e esperta da família, por isso havia se tornado a criada pessoal da Concubina Mei. Cerrou os dentes e disse: — Vou pensar em um jeito.
Na residência dos Zhuang, Han Yan tomava seu chá calmamente, enquanto Shu Hong comentava: — Senhorita, a Jiao Meng pareceu muito abatida a tarde toda. As pessoas do Jardim Furong disseram que ela até derrubou uma xícara de chá que era para a Concubina Mei. Deve estar em pânico.
Han Yan sorriu levemente. — Em pânico? Perfeito, é justamente a hora certa para ajudá-la a se acalmar. — Ela então se levantou. — Vamos, o sol está agradável lá fora; vamos dar uma volta.
Shu Hong assentiu.
No jardim da residência dos Zhuang, Jiao Meng estava curvada, mexendo distraidamente nas flores de camélia à sua frente. O riso zombeteiro das outras criadas chegava suavemente aos seus ouvidos, consequência de ela ter derrubado o chá da Concubina Mei e levado uma boa bronca. Sabia que a Concubina Mei andava bastante preocupada ultimamente, mas ela também estava. Os cobradores de dívidas pressionavam pesado, e no dia seguinte viriam tomar a casa — ela não conseguiria arrecadar aquela quantia enorme. Normalmente, Jiao Meng se apoiava na proteção da Concubina Mei e desprezava as outras criadas, então não tinha com quem se abrir no Jardim Furong. Pensar nisso só fazia crescer sua mágoa contra a Concubina Mei. Afinal, havia servido a ela por anos, ajudando-a a ganhar espaço na casa e o favor de Zhuang Shiyang. Se a Concubina Mei a ajudasse, dinheiro não seria problema algum.
Jiao Meng esmagava as pétalas da camélia com as mãos, perdida em pensamentos.
— Embora as camélias sejam lindas, se você continuar esmagando assim, só vão ter um destino triste — uma voz clara chamou de repente atrás dela.
Assustada, Jiao Meng se virou rápido e viu Han Yan alguns passos atrás, sorrindo. Embora a relação entre a Concubina Mei e Han Yan tenha melhorado recentemente, Jiao Meng notava que, desde a chegada da família Zhou, a antes tímida e facilmente intimidada Quarta Senhorita havia mudado. Enquanto a Concubina Mei talvez não percebesse, Jiao Meng sim. Desde que os Zhou entraram na casa, a Quarta Senhorita andava sempre sorrindo — e pessoas assim eram as mais perigosas. A Concubina Zhou, Zhuang Yushan e até Wei Ru Feng — todos que se opunham à Quarta Senhorita — pareciam inicialmente ter vantagem, mas no fim nenhum deles saía vencedor contra ela. Mesmo que a Concubina Mei fizesse aliança com a Quarta Senhorita, Jiao Meng ainda sentia um pouco de insegurança, pois a Quarta Senhorita era realmente inescrutável. Se tivessem um inimigo em comum, tudo bem, mas se não, facilmente se voltariam uma contra a outra. Que bom resultado a Concubina Mei poderia esperar?
Han Yan observava as expressões que mudavam no rosto da jovem criada, sem pressa. Ji Lan havia dito que Jiao Meng era a criada mais confiável da Concubina Mei, inteligente e astuta entre suas iguais. Com uma oponente tão esperta, manipulações sutis seriam muito trabalhosas; era melhor agir diretamente e achar seus pontos fracos.
A Concubina Mei jamais sacrificaria tanto dinheiro por uma criada. Jiao Meng se via como parte indispensável da vida da Concubina Mei, mas no fundo a senhora tinha um forte senso de hierarquia e nunca a enxergaria como amiga íntima. A relação entre patroa e criada é inerentemente desigual, e a Concubina Mei não faria tais sacrifícios por ela.
A forma mais fácil de comprar alguém é quando ela não tem nada e se sente desesperada. Jiao Meng não tinha amigos na casa, e a Concubina Mei deixara claro que não ajudaria. Uma criada que se sente afastada da patroa é a mais vulnerável a ser influenciada nesse momento.
Sentindo-se um pouco culpada diante do olhar gentil, porém cheio de significado, de Han Yan, Jiao Meng apressou-se a dizer: — Desculpe! Estava distraída e esqueci das camélias.
Han Yan, ainda gentil, disse: — Distraída? Por que não me conta o que está pensando? Talvez eu possa ajudar.
A fala foi clara, e Jiao Meng hesitou, surpresa com Han Yan. Como poderia ser...
Mas Han Yan continuou calmamente: — É sobre as dívidas?
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