Capítulo 41. Príncipe Wen.


 O Festival da Lótus Azul em Shengjing era ainda mais animado do que o Festival da Primavera e o Ano Novo, atraindo não só o povo comum, mas também famílias nobres e oficiais.

Na parte sul da cidade, a Mansão do Príncipe Wen também estava iluminada intensamente naquela noite.

O Príncipe Wen, Mu Cheng, havia herdado o título do pai. O antigo Príncipe e o falecido Imperador eram tão próximos quanto irmãos. Com o favor do imperador pelo ex-Príncipe, a mansão do atual Príncipe gozava de uma distinção e honra especiais.

O pátio estava silencioso, iluminado apenas pela luz das lanternas de vento esmaltadas. Uma babá vestida de verde carregava uma bandeja de madeira pelo pátio, desviava da cortina de contas e entrava no aposento interno.

Uma almofada macia enfeitava uma poltrona de sete biombos feita de madeira de Guanghan. Uma beleza, com os cabelos presos num coque, estava sentada ali, vestindo um vestido de cetim rosa mel bordado com fios prateados. Brincos de pérolas cor-de-rosa realçavam suas bochechas rosadas.

Ela era a filha legítima mais velha do Duque Zhaoning, agora a Princesa Consorte do Príncipe Wen, Pei Yunshu.

Pei Yunshu e o herdeiro do Duque Zhaoning, Pei Yunhuan, eram irmãos da mesma mãe, sendo Pei Yunshu dois anos mais velha.

A babá colocou a bandeja de madeira sobre a mesa, tirando uma tigela de porcelana branca contendo uma sopa medicinal marrom. O cheiro amargo era perceptível mesmo antes de se aproximar.

Pei Yunshu franziu o nariz com desgosto.

A babá sorriu:

— Princesa, este é o remédio para prevenir aborto.

A Princesa Consorte do Príncipe Wen tocou a barriga lisa, franzindo a testa:

— Deixe aqui. Vou beber depois.

A babá, sem se intimidar, pegou a tigela e levou uma colherada à boca:

— Senhora, não se importe com o amargor. Sua Alteza Real ordenou isso. Beba enquanto está quente.

Os olhos de Pei Yunshu ficaram frios. Sua criada estava prestes a falar quando alguém do lado de fora anunciou:

— Princesa, o herdeiro do Duque Zhaoning chegou!

O rosto de Pei Yunshu se iluminou. Ela pegou a tigela da babá e a colocou sobre a mesa. Quando ia se levantar, sua criada Fangzi a apoiou apressadamente. Mal dera dois passos para fora quando viu alguém se aproximar na escuridão.

O pátio banhava-se na luz brilhante da lua, com lanternas lançando um brilho tênue. Na penumbra, uma figura surgiu. Quando se aproximou, as lanternas sob o beiral iluminaram um jovem.

Vestia roupas luxuosas, um robe de brocado preto bordado com padrões dourados. O cabelo longo estava preso por uma coroa dourada, realçando sua beleza. Naquela fria noite de primavera, ele brilhava como uma pérola reluzente.

Enquanto a Princesa Wen, auxiliada por Fangzi, avançava, o jovem sorriu ao vê-la, segurou seu braço e a conduziu para dentro da casa.

Quando a Princesa Wen se sentou novamente, Pei Yunhuan não pôde deixar de dizer:

— Não te avisei antes? Irmã, você é delicada; não devia ter saído para me receber.

— Acabei de engravidar, ainda nem aparece barriga, que delicada eu sou? Nem alguns passos posso dar? — retrucou a Princesa Wen.

Pei Yunhuan olhou ao redor da sala e riu baixinho, com um tom de escárnio:

— Você é uma princesa digna. Com a gravidez confirmada, deveria ter mais pessoas a seu serviço, além de Fangzi. Você realmente não é “mimada” o bastante.

— Normalmente, quando a dona da casa está grávida, precisa de mais cuidados. Surpreende-me que a Mansão do Príncipe tenha caído tão baixo.

Embora sorrisse, seu tom era frio, congelando a expressão da babá que trouxera o remédio.

A princesa, filha legítima do Duque Zhaoning, era bonita e de boa família, mas não era gentil nem atenciosa, o que a tornava desfavorecida pelo Príncipe. Sua gravidez era recente, e naquela mansão Pei Yunshu possuía apenas o título vazio de Princesa Consorte, frequentemente ofuscada por outra mulher.

Grávida, mas sem o cuidado do Príncipe, os servos da mansão a negligenciavam. Normalmente, Pei Yunshu escondia isso, mas hoje foi pega pelo herdeiro do Duque Zhaoning.

Havia que dizer: o herdeiro do Duque Zhaoning, o Comandante Pei da Guarda Imperial, parecia caloroso e bonito, mas era na verdade astuto e esperto. Até o Príncipe precisava ficar atento a ele. Sem a proteção do Comandante Pei, o status da princesa seria ainda menor.

A babá refletia, percebendo que o Comandante Pei sequer lançara um olhar para ela desde que entrou. Ele estava propositalmente dificultando as coisas. Ela só podia curvar-se com um sorriso, sem ousar irritá-lo.

O olhar de Pei Yunhuan pousou na tigela de remédio marrom sobre a bandeja de madeira.

A babá explicou apressadamente:

— Este é o remédio que o Príncipe ordenou à cozinha para a Princesa Consorte.

— Remédio para gravidez... — pensou Pei Yunhuan, aproximando-se da mesa. Pegou a tigela do remédio, cheirou e seus lábios se curvaram levemente.

Pei Yunshu o observava atentamente.

A babá parecia incomumente nervosa.

O jovem sorriu e levantou o braço delicadamente, derramando a tigela de remédio no bonsai de lótus d’água no canto da mesa.

— Não serve — disse baixinho. — Está amargo demais. Faça outra tigela.

A babá sentiu um alívio repentino e sorriu.

— Alteza, como remédio pode não ser amargo? Remédio bom é sempre amargo...

Pei Yunhuan a olhou, seu sorriso caloroso contrastando com o tom gelado.

— Então prepare até não ficar amargo.

A babá ficou sem palavras.

Pei Yunshu ficou em silêncio por um momento e disse:

— Babá, pode ir agora. Preciso falar com meu irmão.

A babá, agradecida pela desculpa, saiu rapidamente levando a tigela vazia, deixando o ambiente um pouco mais leve.

Pei Yunshu lançou um olhar atravessado para o irmão.

— Por que assustou ela daquele jeito?

— Assustar? — Pei Yunhuan sorriu despreocupado. — Se eu a tivesse matado na frente de todo mundo na mansão do Príncipe hoje, aí sim seria assustar.

— Você está falando besteira de novo — Pei Yunshu mudou de assunto. — Por que veio hoje? Não estava ocupado com assuntos oficiais?

Pei Yunhuan sorriu.

— A fazenda enviou algumas cestas de lichia fresquinha especialmente para você. Mas, pela sua condição delicada, não abuse.

Pei Yunshu ficou surpresa.

— Acabei de terminar as ameixas que você mandou antes, e agora lichias? Você acha que eu sou um porco? — riu de si mesma. — Mas as ameixas estavam ótimas. Uns dias atrás, eu estava tão mal que não conseguia sair da cama. Depois que comi suas ameixas, me senti muito melhor. Meu estômago não está mais ácido.

— Eram ameixas recém-colhidas, claro que são boas — disse Pei Yunhuan, arqueando a sobrancelha. — Fico feliz que tenha gostado.

— Claro que gostei. Mesmo que antes não tivesse gostado, agora gosto — disse Pei Yunshu, e um pensamento lhe ocorreu. — Ah, já está quase na hora do Festival da Lótus Azul. Estou grávida este ano, então acho que não vou poder ir com você.

Desde a morte da Duquesa de Zhaoning, Pei Yunshu e Pei Yunhuan acendiam todos os anos as lanternas de lótus no Templo Wan En durante o Festival da Lótus Azul para orar por bênçãos. Mas, por sua condição, ela só podia mandar preparar incensos, velas e óleo de arroz e pedir que Pei Yunhuan os levasse.

Pei Yunhuan suspirou.

— Já esperava isso há muito tempo — disse, olhando para Pei Yunshu com um tom nada calmo. — Não se preocupe, eu vou dizer tudo em seu nome. Que o Bodhisattva abençoe seu filho para ser vivo e saudável, que nasça em segurança. Que mãe e filho fiquem bem por muitos anos.

Pei Yunshu beliscou o braço dele, irritada.

— Besteira! O que eu pedi claramente foi que aquele meu irmão inútil encontre logo uma garota de que goste e se case o quanto antes. Se não, quando todo mundo tiver família e ele ficar sozinho, não vai ficar solitário e infeliz?

— Ei — Pei Yunhuan zombou, apontando para si mesmo. — Olhe para minha cara. Preciso da bênção do Bodhisattva com essa cara? Toda vez que venho à sua mansão, lenços voam para cima de mim pra todo lado.

Ao ouvir isso, Pei Yunshu riu alto.

Era a verdade. Toda vez que Pei Yunhuan ia à mansão do Príncipe, as criadas ficavam especialmente atentas, todas arrumadas competindo pela atenção dele. Por isso, depois ele parou de deixar o porteiro anunciar sua chegada em voz alta.

Pei Yunshu olhou para a pessoa à sua frente e suspirou em seu íntimo. Sem falar em outras coisas, a aparência e o porte do irmão mais novo eram realmente muito atraentes. Quando ela se casou na mansão do Príncipe, todo mundo sabia que ela não era favorecida. Toda vez que as madames davam um banquete, ela não se dava bem com as outras nobres. Só Pei Yunhuan... Essas madames até tentavam descobrir sobre o casamento do herdeiro do Duque Zhaoning.

Infelizmente, enquanto as flores queriam, a água corrente não. O herdeiro do Duque Zhaoning tinha padrões altos. Cresceu todos esses anos sem gostar de ninguém, desperdiçando a cara bonita.

Depois de conversar um pouco com Pei Yunhuan, a princesa Wen Yunshu foi ficando cansada. Depois de ser ajudada por Fangzi a deitar para descansar, Pei Yunhuan foi escoltado para fora do pátio por Fangzi.

A lâmpada de vidro balançava ligeiramente com o vento noturno. O sorriso no rosto do jovem desapareceu, e seus olhos negros ficaram mais escuros que a noite.

Fangzi o seguia atrás, sussurrando:

— … Os outros servos do pátio foram mandados embora pelo pessoal da concubina. Só eu fiquei. A princesa tinha medo de causar problemas e não trouxe ninguém. Mas isso provavelmente não vai durar. O chá, a sopa e o remédio no quarto não foram tocados. A princesa os jogou fora secretamente...

Fangzi havia sido enviada por Pei Yunhuan para entrar na mansão.

Pei Yunshu era filha legítima do Duque Zhaoning. Mesmo que não fosse mais favorecida pelo Príncipe, as pessoas na mansão não ousariam machucar sua vida. Porém, uma princesa consorte grávida era diferente.

Se a princesa consorte desse à luz um filho, ele seria o herdeiro do Príncipe. Neste mundo, riqueza vinha com perigo. Enquanto o benefício fosse grande o bastante, não havia nada que alguém não fizesse.

Por isso, Pei Yunhuan ordenou que Fangzi entrasse na mansão para proteger Pei Yunshu secretamente.

Ele parou sob uma lâmpada.

— Daqui a alguns dias, mandarei entrar mais duas pessoas.

Fangzi respondeu respeitosamente:

— Sim.

— Tem muita gente na mansão, e alguém pode reconhecer sua identidade. Se alguém te pegar, poderá me denunciar.

— Sim.

— Se alguém quiser fazer mal à princesa consorte, proteja-a primeiro. O importante é que Mu Cheng não seja morto.

— Sim.

Ele fez uma pausa antes de continuar:

— Mesmo que ele seja morto, não importa.

Na escuridão da noite, as flores estavam exuberantes e parecia haver sombras de pessoas se movendo.

Ele olhou para trás e sorriu. Seu tom era casual e cruel:

— Se ele for morto, eu assumirei a responsabilidade.


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