Capítulo 10 a 12


 Capítulo 10: Exame Imperial

No dia em que Xiao Jingduo e Xiao Ying romperam de vez, Xiao Ying, com a intenção de dar uma lição no garoto, de fato cancelou suas aulas de literatura e artes marciais. Queria forçá-lo a se curvar dessa forma.

Mas Xiao Jingduo não estava disposto a ceder tão fácil. Sabia muito bem a diferença entre ser educado e ser ignorante. Educação básica não podia ser interrompida. Precisava encontrar um jeito de seguir adiante mesmo sob o bloqueio imposto por Xiao Ying.

Pensou por um momento, então decidiu mirar seu próximo passo em Xiao Jinghu.

Ao entrar no Salão Gaoshou, Xiao Jingduo encontrou Xiao Jinghu brincando no pátio com uma espada de madeira, gritando alto. Várias criadas o observavam nervosamente, com medo de que ele se machucasse.

Xiao Jingduo parou por um instante, depois caminhou diretamente até o garoto.

— A vovó ainda está aqui dentro. Que comportamento é esse, gritando no pátio?

— E daí? A vovó deixou eu brincar aqui! — Xiao Jinghu já tinha ouvido alguns rumores vindos da segunda tia e sabia que a posição de Xiao Jingduo havia caído. Sentia-se mais ousado e já não tinha medo do irmão mais velho.

As criadas ficaram visivelmente desconfortáveis. Como esperado, Xiao Jingduo franziu a testa e repreendeu:

— Se continuar com essa bagunça, vou pedir pra vovó te mandar pra academia e colocar o tutor mais rigoroso pra te ensinar bons modos!

— Você... — Xiao Jinghu ficou furioso. Odiava estudar e fugia da academia até mesmo quando estavam na aldeia. Só de ouvir falar em tutor já ficou possesso. Correu até Xiao Jingduo e o empurrou, depois saiu correndo.

— Jovem Mestre... — As criadas correram para perto. Xiao Jingduo acenou com a mão, dizendo que estava tudo bem.

— Estou bem. Vão cuidar do Segundo Jovem Mestre.

Apesar de pequeno, Xiao Jinghu era forte. Se tivesse empurrado uma criada desprevenida daquele jeito, ela certamente teria caído. Mas Xiao Jingduo se manteve firme, ileso. As criadas não conseguiam entender como. Curvaram-se rapidamente e estavam prestes a correr atrás de Xiao Jinghu quando ele as chamou novamente:

— O Segundo Jovem Mestre está agitado e ainda segurando uma espada de madeira. Se se machucar, a vovó com certeza vai culpar vocês. Acho melhor levá-lo pra um espaço mais aberto onde ele possa gastar essa energia.

Xiao Jingduo apontou para uma área aberta e sugeriu:

— Aquele lugar ali parece perfeito.

As criadas olharam na direção indicada: uma clareira cercada por árvores, um espaço ideal para brincar e observar uma criança. Agradecidas, curvaram-se novamente:

— Agradecemos a sugestão, Jovem Mestre.

Depois que elas saíram, Xiao Jingduo sorriu levemente e entrou na residência.

A velha madame estava dentro, ocupada com livros de contabilidade. Acostumada a dar ordens e controlar tudo, mesmo vivendo na mansão do filho marquês, insistia em manter o comando. A Senhora Wu, presa à sua imagem de esposa virtuosa, não ousava disputar esse controle abertamente, e as outras duas noras da família Xiao não se importavam. Na verdade, achavam até vantajoso — enquanto a velha estivesse no comando, podiam desviar dinheiro sem chamar atenção.

Ao ver Xiao Jingduo entrar, a velha madame, que já estava tonta de tanto olhar números, acenou para ele:

— Duo’er, o que te traz aqui hoje?

Era raro Xiao Jingduo aparecer, pois passava a maior parte do tempo no Pátio Qingze. A visita repentina a surpreendeu.

— Vim cumprimentar a vovó — disse ele, desviando do assunto com leveza, e então comentou casualmente: — Ouvi a voz do Segundo Irmão lá de fora. Tão cheio de vida, parece um tigrezinho.

— Isso mesmo! — O rosto da velha senhora se iluminou ao ouvir sobre seu neto preferido. Instintivamente, olhou ao redor do pátio, procurando Xiao Jinghu, mas logo se assustou:

— Onde está o Hu’er? Ele estava bem aqui!

Xiao Jingduo levantou a mão e apontou pela janela dos fundos.

— Olhe, vovó. Ele está ali.

— Mandei ele brincar no pátio, por que foi tão longe? — resmungou ela, descontente. — O que essas criadas estão fazendo, levando o Hu’er pro jardim? Não consigo vê-lo de lá! E se ele se machucar?

— Talvez tenham pensado em não incomodar a senhora — sugeriu Xiao Jingduo com calma. Então, franziu levemente a testa, hesitando. — Vovó, tem algo que não sei se devo comentar...

— Pode falar. Comigo você não precisa de formalidades.

— Quando cheguei, vi o Segundo Irmão quase se ferindo com a espada de madeira. Falei algumas palavras pra alertar, mas ele não escutou e ainda me empurrou. Só foi obedecer quando as criadas intervieram. Veja — apontou pela janela —, ele já largou a espada e está brincando de esconde-esconde com as servas.

A velha madame observou a cena com atenção. Sua expressão se contraiu. As matriarcas geralmente possuem um forte senso de posse sobre seus descendentes. Querem que filhos e netos dependam delas, mas não gostam de vê-los próximos a outras mulheres.

Ela jamais imaginaria que tudo aquilo fora cuidadosamente arquitetado por Xiao Jingduo. Bastou inverter ligeiramente a ordem dos acontecimentos para que tudo parecesse o oposto da realidade.

Xiao Jingduo continuou:

— O Segundo Irmão é esperto e animado, mas passar tanto tempo nos aposentos femininos pode não ser bom. A Segunda Casa está cheia de mulheres. Tanto Yufang quanto Yuli dependem dele, e ele vive cercado por criadas. Essas mulheres fazem tudo por ele. Temo que, com o tempo, ele se torne fraco, sem espírito viril.

— Tem razão. Não podemos deixar que estraguem o meu Hu’er — a velha senhora concordou, balançando a cabeça e tentando encontrar uma solução. — E agora? Deveríamos arrumar colegas de brincadeira pra ele, de fora da residência?

— Vovó, como pôde esquecer? — disse Xiao Jingduo, vendo que ela ainda não tinha chegado onde ele queria, então conduziu a conversa com suavidade. — A academia está cheia de crianças da idade dele. Não seria melhor mandar o Segundo Irmão para lá? Com professores guiando, aprendendo a ler e escrever, seria muito mais útil do que ficar enclausurado em casa.

— Certo, certo... Como não pensei nisso? — murmurou a velha senhora. Apesar da mudança de status, sua mentalidade ainda estava presa ao passado. Ainda pensava como se fossem uma família pobre da vila, sem recursos pra educar os filhos. Com o lembrete de Xiao Jingduo, percebeu que agora tinham condição de mandar o neto pra escola.

No entanto, justo quando estava prestes a decidir, Xiao Jingduo lançou uma semente de dúvida:

— Embora as crianças na academia briguem bastante, o Segundo Irmão é forte. Mesmo que entre numa briga, desde que não seja cercado por muitos, não vai se machucar muito.

— Isso... — A velha senhora se alarmou. — Eles brigam mesmo?

— Crianças são assim, vovó. Até na aldeia, meninos de sete ou oito anos viviam brigando, mesmo com adultos por perto. Na academia, com tantos meninos juntos, é natural que brigas aconteçam.

— Não! — recusou-se com firmeza. — Meu Hu’er é precioso. Nem um arranhão pode acontecer. Como posso mandá-lo pra ser espancado por filhos de gente comum? De jeito nenhum!

Não muito tempo atrás, a própria família Xiao era de origem comum, mas agora olhavam de cima os filhos dos plebeus. Xiao Jingduo sentiu uma leve ironia, mas fingiu ser convencido pelas palavras da avó.

— A senhora tem razão. Mandar o Segundo Irmão pra uma academia externa não é adequado. Ouvi dizer que, aqui em Chang’an, famílias de nobres e oficiais contratam professores eruditos para darem aulas em casa. Por que não fazemos o mesmo?

— E quanto isso vai custar?! — A velha senhora já ia recusar no ato, pensando no gasto. Mas a menção de que as famílias importantes faziam o mesmo a fez hesitar.

Xiao Jingduo, percebendo sua dúvida, fingiu surpresa:

— É tão caro assim? Achei que fosse acessível. Ouvi falar de um estudioso pobretão que mora duas ruas depois, no Beco Tongshan. Anos atrás, quando o governo anunciou os exames imperiais, ele correu pro capital pra prestar. Mas antes de ser aprovado, estourou a guerra. O antigo império mal conseguia se sustentar, não tinha recursos pra apoiar os candidatos. Ele ficou preso em Chang’an, vivendo na miséria e muitas vezes passando fome. Achei que, com o tanto de dificuldade que os estudiosos enfrentam, contratar um professor não seria tão caro assim.

O imperador fundador da dinastia anterior havia tido a ideia ousada de criar o sistema de exame imperial, permitindo que até plebeus bem instruídos virassem oficiais. Esse sistema causou alvoroço, enfrentando resistência das famílias nobres e escárnio dos burocratas. Após a morte do imperador fundador, seu sucessor, o Imperador Chen Wang, foi ambicioso demais, convocando tropas continuamente e gerando revolta geral. O sistema de exames caiu em desuso. Com o avanço das guerras, nem a capital conseguia se manter — quanto mais realizar provas. Muitos candidatos ficaram à deriva.

O estudioso Chu Shuxin era um deles.

A velha senhora escutava, já tocada pela história.

— Jingduo, quem é esse estudioso de quem você fala? Qual é a situação da família dele?

— Seu nome é Chu Shuxin. Ouvi dizer que quase foi aprovado no exame imperial, então não deve faltar conhecimento. Mas agora a situação está feia. A esposa está doente, o filho é pequeno. Ele só consegue ganhar algum trocado copiando livros. Mas em tempos tão caóticos, quem tem cabeça pra comprar livros? Ganha muito pouco e, até hoje, só consegue pagar o aluguel. — Depois de falar, Xiao Jingduo suspirou. — Uma pena. Tanta sabedoria e virtude, mas vive na miséria.

A velha madame teve uma ideia brilhante. Bateu o joelho de empolgação e disse animadamente a Xiao Jingduo:

— Jingduo, que tal convidarmos esse estudioso para vir ensinar o Hu’er aqui em casa? Assim, ajudamos esse erudito com as despesas domésticas e nosso Hu’er pode estudar bem sem precisar sofrer na academia. É bom para os dois lados. O que você acha?

Xiao Jingduo sorriu, como se também tivesse acabado de pensar naquilo:

— Vovó, a senhora está absolutamente certa. Seu neto se envergonha de não ter pensado nisso antes.

— Essa ideia é boa… — murmurou a velha madame para si mesma, ficando mais animada à medida que pensava mais. Em seguida, elevou a voz e ordenou à criada do lado de fora: — Rápido, tragam o Hu’er até mim!

Quando Xiao Jinghu voltou e ouviu que a velha madame estava organizando a vinda de um tutor severo para lhe dar aulas, ele lançou um olhar furioso para Xiao Jingduo e imediatamente começou a fazer birra, chorando alto:

— Eu não quero! Não quero! Não quero ir pra escola! Eu quero brincar com as irmãs criadas! Eu não quero estudar!

— Criança inútil! — Ao ouvir Xiao Jinghu gritar que queria brincar com as criadas, a velha madame se convenceu ainda mais de que a culpa era das servas, e ficou ainda mais determinada a mandá-lo estudar. O que ela não sabia era que a resistência de Xiao Jinghu aos estudos vinha inteiramente das ameaças que Xiao Jingduo havia feito mais cedo. Furiosa, a velha madame cutucou a testa do neto com força:

— Está decidido. Vou mandar alguém convidar o erudito Chu da família Chu. É bom você se preparar e parar de brincar com as criadas todos os dias.

— Eu não vou! — gritou Xiao Jinghu, jogando-se no chão e esperneando.

— Você... — A velha madame ficou tão irritada que quase desmaiou, e Xiao Jingduo correu para ampará-la. Ao ver o neto, ela se acalmou um pouco.

— Esse encrenqueiro desobediente ainda vai me levar pro túmulo! Se ao menos fosse metade sensato como seu irmão mais velho...

Felizmente, a velha madame não fazia ideia de que todos os acontecimentos daquele dia tinham sido orquestrados justamente pelo neto que ela considerava sensato. Foi Xiao Jingduo quem instruíra as criadas a levarem Xiao Jinghu para fora, mas agora ele dizia que elas eram as culpadas por tirá-lo de perto. Foi ele quem ameaçou Xiao Jinghu com a história do tutor, e agora fingia ser o pacificador.

Só de ouvir o nome de Xiao Jingduo, Xiao Jinghu já ficava irritado. Ele tinha acabado de ser ameaçado com um tutor, e agora sua avó estava realmente dando ouvidos. Só de lembrar das técnicas rígidas dos professores da vila, Xiao Jinghu se arrepiava inteiro. Lançando um olhar furioso para Xiao Jingduo, levantou-se e saiu correndo.

— Hu’er! — A velha madame o chamou várias vezes, mas Xiao Jinghu nem olhou para trás. Tremendo de raiva, ela se apoiou em Xiao Jingduo e, então, voltou-se para ele com uma nova ideia.

— Jingduo, você é o irmão mais velho e deve cuidar do mais novo. Que tal acompanhar o Hu’er na escola? Não tomará muito do seu tempo. Assim, você poderá vigiá-lo para garantir que ele não se machuque.

Xiao Jingduo assentiu, com uma expressão respeitosa e filial:

— Está bem. É meu dever aliviar as preocupações da avó.

Fora do alcance dos olhos dela, ele permitiu-se um leve sorriso.

Objetivo alcançado.

Xiao Jingduo refletia com frequência sobre por que Xiao Ying se atrevia a agir com tanta arrogância. À primeira vista, parecia ser porque Zhao Xiulan era filha única, o pai havia falecido e a família não tinha irmãos homens — o que a deixava à mercê de Xiao Ying, incapaz de se opor, mesmo sendo destituída de seu posto de esposa principal. Mas, no fundo, a raiz do problema era outra: Xiao Ying era um oficial, enquanto a família Zhao era de plebeus.

Pobres não devem contender com os ricos, e ricos não devem contender com oficiais. Esse princípio é válido desde os tempos antigos até os dias de hoje.

Para resistir a Xiao Ying — e até enfrentá-lo de igual para igual —, ele também precisava se tornar um oficial. Hoje em dia, tornar-se um oficial depende do status familiar e das conexões dos antepassados. Se o avô ou o tio ocuparem cargos no tribunal, é fácil para os descendentes entrarem no governo. No entanto, como a família Xiao não é nobre e Xiao Jingduo não queria depender de Xiao Ying, teria que trilhar um caminho muito mais difícil.

Apesar de o sistema de exames imperiais da dinastia anterior ter durado poucos anos, foi uma oportunidade revolucionária para inúmeros plebeus. Por milhares de anos, oficiais continuaram sendo oficiais e plebeus continuaram sendo plebeus, geração após geração, sem chance de mudar de posição. Mas o método inédito do imperador anterior abriu uma via de ascensão para inúmeros filhos de famílias humildes. Mesmo que as chances fossem mínimas, oferecia uma centelha de esperança para mudar o próprio destino.

Agora, uma nova dinastia assumira o trono e renomeara a terra. Embora o sistema de exames imperiais ainda não tivesse sido restabelecido, Xiao Jingduo tinha uma intuição quase inabalável de que a nova família imperial — bela e guerreira — não abandonaria esse caminho.

O poder das famílias nobres fora grande demais por centenas de anos, ocupando posições de alto escalão e tomando riqueza e poder de forma impiedosa, impedindo outros de ascenderem. Essas famílias implementaram um sistema de seleção baseado em linhagem, o que prejudicava severamente os humildes. Restava aos plebeus apenas aproveitar oportunidades durante tempos caóticos para tentar mudar de vida — algo extremamente perigoso tanto para o país quanto para o soberano.

Por isso, Xiao Jingduo estava certo de que o sistema de exames imperiais seria restaurado. E o que ele precisava fazer era se preparar com antecedência, estudando e praticando caligrafia, para que, quando os exames voltassem, ele pudesse se inscrever e entrar na corte como oficial. Ele manipulou a situação para que a velha senhora convidasse Chu Shuxin à mansão justamente por causa do passado acadêmico do estudioso. Para isso, provocou intencionalmente Xiao Jinghu, garantindo assim uma desculpa legítima para assistir às aulas.

Às vezes, Xiao Jingduo sentia que ele mesmo era uma pessoa assustadora. Sua mãe já estivera à beira da morte várias vezes, e embora Xiao Ying fosse claramente o principal culpado, a velha madame também havia sido cúmplice. Ainda assim, ele conseguia sentar-se na mesma sala que ela, mantendo uma relação nem próxima nem distante. Ele sabia que a velha madame sentia culpa em relação a ele, então mantinha-se levemente afastado, fazendo-a acreditar que, com um pouco mais de esforço, poderia quebrar a barreira em seu coração. Como resultado, ela sempre o favorecia.

O mais estranho, no entanto, era que, enquanto conseguia manter essa fachada com a velha madame — que ajudara o vilão —, ele não estava disposto a ceder um milímetro sequer diante de Xiao Ying. De fato, ele nem precisava passar por todos esses problemas. Se pedisse, alguém certamente arranjaria um bom tutor para ele, e até mesmo um cargo futuro. O único pré-requisito seria abaixar a cabeça e se submeter a Xiao Ying.

Mas Xiao Jingduo se recusava a fazer isso.

Então só lhe restava usar todas as suas forças e recorrer aos métodos mais incomuns para alcançar seus objetivos.

Xiao Jingduo não escondia que usava meios pouco ortodoxos. Admitia que suas intenções não eram puras — mas, enquanto existisse a menor possibilidade de sucesso através dos exames imperiais, enquanto houvesse uma chance de obter um cargo oficial, ele estaria disposto a dar tudo de si.

A jornada para se tornar um oficial havia apenas começado.

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Nota da autora:

Ceninha:

Velha Madame: Essas criadas são um problema, só sabem brincar com meu neto o dia inteiro!

Criada: ?

Velha Madame: E o que mais me irrita é que o Tigre (Xiao Jinghu) nem me ouve, mas é só elas falarem que ele larga a espada de madeira e vai brincar lá fora! Isso me deixa furiosa!


Capítulo 11 – O Tutor
Em poucos dias, Chu Shuxin enviou uma resposta concordando em ir até a Mansão do Marquês Dingyong para lecionar.
Xiao Jingduo não se surpreendeu com esse desfecho. Depois que a criada da velha madame o informou de que as aulas começariam formalmente no dia seguinte, ele passou toda a tarde arrumando as coisas no Pátio Qingze.
Apesar da nova dinastia já ter sido estabelecida, os preços continuavam altos. Dez litros de arroz custavam até oito mil moedas, tornando-se inacessíveis até mesmo para os ricos — quanto mais para o povo comum. Já os materiais de escrita, como pincéis, tinta, papel e pedras de tinta, que nunca foram baratos, tiveram sua produção drasticamente afetada pelos anos de guerra, fazendo o preço do papel disparar.
Como Xiao Jingduo fora relegado a um pátio remoto, era natural que ninguém preparasse suprimentos de estudo para ele. Tudo o que possuía até agora tinha sido adquirido com muito esforço, pouco a pouco, com o dinheiro que ele mesmo havia ganhado fora da mansão.
Qiuju organizava os pincéis e a tinta de Xiao Jingduo, sem conseguir conter suas queixas:
— O marquês é mesmo cruel. O jovem mestre vai conhecer seu tutor amanhã e nem sequer pergunta sobre isso, quanto mais preparar os materiais. Esta tinta grosseira não condiz com o jovem mestre...
Xiao Jingduo, no entanto, sorriu levemente:
— Não há necessidade.
— Hã? — Qiuju ergueu os olhos, confusa. — Por quê? Mesmo que ainda esteja ressentido com o marquês, não deveria implicar com o dinheiro! Papel e tinta estão caríssimos.
Xiao Jingduo não explicou mais nada. Seu olhar se desviou para a janela enquanto mergulhava em pensamentos profundos.
As palavras de Qiuju o fizeram lembrar de um ponto importante: o custo do papel necessário para seus estudos era, por si só, uma despesa significativa. Como Xiao Ying não lhe daria esse dinheiro — e ele também não queria usar o dinheiro de Xiao Ying — encontrar uma forma de cobrir esses custos tornou-se seu problema mais urgente.
Quando foi à capital, Xiao Jingduo ainda não havia rompido com Xiao Ying. Naquela época, os criados lhe deram muitos itens de ouro, prata e jade, que ele ainda guardava. Contudo, apesar de valiosos, esses bens não resolviam seu problema imediato. O dinheiro em espécie que tinha à mão era inferior a quinhentas moedas.
Além de seus próprios materiais de escrita, ele ainda precisava custear o tratamento médico da mãe. Embora um médico viesse à mansão a cada dez dias para verificar seu pulso — economizando assim parte dos custos —, Xiao Jingduo não queria desmerecê-lo, mas a verdade era que o médico era medíocre. Sua abordagem médica era muito inferior à de seu avô materno, e qualquer que fosse a doença, sua única solução parecia ser expulsar os espíritos malignos.
Xiao Jingduo tolerara esse médico incompetente por tempo demais. Por fim, decidiu buscar uma alternativa e passou a usar seu próprio dinheiro para preparar suplementos medicinais para a mãe. Infelizmente, seu avô materno faleceu cedo; se ele próprio tivesse aprendido medicina, não precisaria depender de médicos externos.
Comparado à doença da mãe, seus próprios gastos eram insignificantes. Por isso, ao ir às ruas comprar pincéis e tinta, ele não escolheu os melhores, mas sim os mais econômicos.
Por conta disso, Qiuju não parava de dizer:
— Jovem mestre, o senhor está sendo duro demais consigo mesmo. As ferramentas de escrita são como o seu rosto na escola. O senhor é o filho mais velho da casa do marquês; como pode passar vergonha?
Xiao Jingduo, porém, não se importava:
— É só fama vazia.
Ele tinha coisas mais importantes a fazer.
Qiuju olhou para Xiao Jingduo, e lágrimas subiram repentinamente aos seus olhos:
— Jovem mestre, o senhor só tem nove anos. Qual criança nessa idade não gosta de brincar e competir? E mesmo assim o senhor é tão sensato... — Qiuju enxugou as lágrimas com força, falando com firmeza, como se tentasse convencer a si mesma mais do que a ele — Jovem mestre, o senhor certamente alcançará grandes feitos no futuro!
Xiao Jingduo achou graça em Qiuju. Ele assentiu e disse:
— Vou considerar isso um bom presságio.
Qiuju olhou para o sorriso de Xiao Jingduo e pareceu ficar atônita por um instante:
— Jovem mestre, o senhor sorriu! Já fazia tanto tempo que não sorria...
— É mesmo? — disse ele, e, ao falar, inconscientemente reprimiu o sorriso, retornando à sua expressão fria e indiferente.
Então, ao ver que Qiuju — a chorona — estava prestes a cair no choro de novo, Xiao Jingduo ficou um tanto perdido e se levantou rapidamente:
— Continue com o que estava fazendo. Vou ver como está minha mãe.
Assim que terminou de falar, não ousou olhar para o rosto de Qiuju e saiu correndo num piscar de olhos.
No aposento principal, Zhao Xiulan estava recostada na cama, olhando distraidamente as folhas que caiam do lado de fora da janela.
— Já é outono...
Assim que Xiao Jingduo entrou, viu sua mãe com aquele semblante apático. Seu coração apertou por um instante, mas ele forçou um sorriso, aproximou-se e disse, fingindo leveza:
— Mãe, amanhã começo a estudar com o tutor.
— É mesmo? — Zhao Xiulan esboçou um sorriso fraco — Que maravilha... meu Duo’er agora vai poder estudar também.
Estudar sempre fora um privilégio das famílias nobres. Para os plebeus com melhores condições, saber reconhecer caracteres já era algo notável — que dirá ler os clássicos confucionistas e taoistas. Além disso, muitos livros não circulavam no mercado. Eram mantidos dentro das famílias aristocráticas, passados de geração em geração como patrimônio, e jamais mostrados a estranhos.
Foi apenas na dinastia anterior que tornou-se possível tornar-se um oficial por meio dos estudos, e com isso as escolas começaram a se popularizar entre o povo. Caso contrário, se ler e escrever fossem inúteis, por que alguém comum gastaria fortunas para educar os filhos?
Como o pai de Zhao Xiulan era médico, ela aprendeu a ler, mas não compreendia os Quatro Livros e os Cinco Clássicos — obras que só as famílias aristocráticas tinham o direito e a chance de acessar.
Graças a Zhao Xiulan, Xiao Jingduo também aprendera a ler, mas nunca teve uma educação formal. Assim, ter um tutor era algo extremamente benéfico.
Enquanto conversava com Zhao Xiulan para lhe fazer companhia, Xiao Jingduo logo percebeu que a mente dela estava distante. De tempos em tempos, ela cobria a boca e tossia discretamente — claramente sofria de uma doença crônica difícil de curar.
O coração de Xiao Jingduo afundou. Ele sabia que só possuía um conhecimento básico de medicina, bem longe do suficiente para tratar alguém. Mesmo assim, ousadamente, receitava e preparava os remédios da mãe com base apenas em livros de medicina. Fora isso... ele não sabia o que fazer.
Mesmo assim, a saúde de Zhao Xiulan piorava a cada dia. Era claramente uma doença do coração — uma tristeza profunda —, e nenhum tônico que Xiao Jingduo lhe desse era capaz de curá-la.
— Mãe — ele não pôde evitar de segurar a mão gélida de Zhao Xiulan, reafirmando mais uma vez — eu vou crescer rápido e tirar você daqui o quanto antes. Mãe, eu vou buscar justiça por você. Por favor, aguente firme e viva para ver esse dia ao meu lado.
— Tudo bem. — Zhao Xiulan sorriu e assentiu, depois o incentivou a descansar — Já está tarde. Vá descansar. Amanhã você tem que ver o tutor.
Xiao Jingduo soltou um longo suspiro e saiu conforme ela pediu.
À luz da lamparina, ele acariciou os pincéis, a tinta, o papel e a pedra de tinta. Em seus olhos, brilhou uma luz intensa.
Ele estava determinado a cumprir a promessa feita à mãe: alcançar fama e prestígio o quanto antes, restaurar a honra da marquesa para ela e, por fim, tirá-la daquele lugar sufocante.
Ele acreditava firmemente que esse dia não estava tão distante.
Na manhã seguinte, Xiao Jingduo chegou cedo à sala de estudos, à espera da chegada de Chu Shuxin.
No meio da hora Chen (entre 7h e 9h), um estudioso de meia-idade, usando um robe azul, entrou lentamente vindo de fora.
Xiao Jingduo levantou-se apressado e fez uma reverência respeitosa ao mestre:
— Xiao Jingduo saúda o mestre.
Chu Shuxin assentiu levemente. Pelo visto, já sabia algo sobre a situação da família Xiao. Lançou um olhar breve e reconheceu Xiao Jingduo:
— Você é o jovem mestre mais velho da família Xiao?
— Sim, senhor.
Chu Shuxin assentiu mais uma vez e não disse mais nada. Aquele ex-candidato aos exames imperiais era magro e desleixado, mas seu semblante era indiferente, como se nada lhe importasse. Xiao Jingduo não ousou falar precipitadamente, temendo desagradar o mestre.
Depois de mais algum tempo, Xiao Jinghu chegou. Xiao Jingduo ouviu o alvoroço de longe. Xiao Jinghu vinha impaciente à frente, seguido por diversos criados — alguns da velha madame, outros da Segunda Tia Xiao e até das irmãs Xiao Yufang e Xiao Yuli. O Segundo Tio Xiao caminhava ao lado de Xiao Jinghu, ainda lhe passando algumas instruções.
Comparado a isso, Xiao Jingduo sozinho era realmente eficiente.
O Segundo Tio Xiao levou Xiao Jinghu até Chu Shuxin, trocaram algumas formalidades, e então Xiao Jingduo e Xiao Jinghu se curvaram diante do mestre, reconhecendo-o como tutor. Em seguida, apresentaram os presentes, ajoelharam-se para prestar homenagem a Confúcio e, quando toda essa cerimônia terminou, já era bem tarde. O Segundo Tio Xiao lançou mais um olhar de advertência a Xiao Jinghu e, por fim, retirou-se com os criados, deixando o espaço apenas para o mestre Chu e seus alunos.
Com todos os desnecessários fora da sala, Chu Shuxin sentou-se na posição principal e perguntou sobre o nível de alfabetização de Xiao Jingduo e Xiao Jinghu:
— Vocês sabem ler?
Xiao Jinghu balançou vigorosamente a cabeça, enquanto Xiao Jingduo respondeu com cautela:
— Meu avô materno e minha mãe me ensinaram um pouco; conheço os caracteres mais usados.
— Muito bem — Chu Shuxin assentiu com indiferença e então disse — Abram o Clássico dos Mil Caracteres. Hoje, começaremos com o reconhecimento dos ideogramas.
— Céu e Terra, escuros e amarelos; o universo, vasto e selvagem. Sol e lua, crescem e minguam; estrelas e constelações espalham-se pelo céu. O frio vem e o calor parte; o outono colhe e o inverno armazena...
Depois que Chu Shuxin os guiou na recitação uma vez, começou a partir da primeira linha, explicando o significado e a estrutura de cada caractere. Suas explicações eram detalhadas e bem fundamentadas, revelando uma base sólida. Embora Xiao Jingduo já tivesse aprendido alguns caracteres por meio de livros de medicina, ele nunca havia estudado de forma sistemática. Agora, ouvindo as explicações de Chu Shuxin, ele se sentia iluminado, pensando: “Então é assim que funciona.”
Chu Shuxin ensinava os caracteres usando o Clássico dos Mil Caracteres. Embora isso exigisse um alto nível de conhecimento por parte do professor, talvez fosse entediante demais para crianças. E, de fato, não demorou muito até que Xiao Jinghu começasse a se remexer no tapete de junco, visivelmente impaciente.
Chu Shuxin percebeu, mas fingiu não ver — o que agradou bastante a Xiao Jingduo. O professor ignorar Xiao Jinghu acelerava bastante o ritmo da aula, o que era extremamente benéfico para ele.
Ao mesmo tempo, Xiao Jingduo teve ainda mais certeza da sua suspeita: o Mestre Chu provavelmente não queria dar aulas para crianças na Mansão do Marquês, mas foi forçado pelas circunstâncias financeiras.
Meia hora depois, Xiao Jinghu já não aguentava mais. Como era a primeira aula, Chu Shuxin generosamente encerrou a lição, permitindo um pequeno descanso.
Assim que o professor deixou seu assento, os criados que esperavam do lado de fora entraram apressadamente, cercando Xiao Jinghu. Ofereciam água, abanavam — e ele, acostumado, distribuía ordens sem hesitação.
Não tinha se passado muito tempo, e ele já estava mimado daquele jeito. Xiao Jingduo balançou a cabeça por dentro. Não quis se envolver com a agitação ao redor de Xiao Jinghu e virou-se para recitar diligentemente o conteúdo ensinado.
Xiao Jingduo só queria estudar em paz, mas não teria essa sorte. Suas três primas de alguma forma souberam que a aula de Xiao Jinghu havia terminado e correram para bajulá-lo. Xiao Yufang trouxe um prato de doces, enquanto Xiao Yumang foi ainda mais longe — apareceu com uma tigela de sopa fria, dizendo que era para refrescar Xiao Jinghu. As três cercaram o menino, demonstrando preocupação enquanto sutilmente excluíam os outros. Mesmo de longe, Xiao Jingduo achava aquele comportamento impressionante.
Estavam ali por se preocupar com o irmão mais novo que acabara de começar a estudar? Obviamente não. Xiao Jingduo sabia muito bem que o verdadeiro objetivo das três era agradar a velha madame. Afinal, era ela quem detinha o poder na Mansão do Marquês. Se queriam ter uma vida confortável, só lhes restava bajular a avó. No passado, a atenção de Xiao Yumang para com ele tinha exatamente esse propósito. Mas depois que Xiao Jingduo rompeu com Xiao Ying, essas três primas espertas perceberam que ele não era mais útil — então passaram a se esforçar para agradar Xiao Jinghu.
Tudo isso aconteceu em questão de poucos meses. Como membro daquela família, Xiao Jingduo sentia profundamente as variações do comportamento humano. O poder, de fato, era algo valioso — bastava ter uma leve conexão com ele para atrair toda sorte de atenções.
Xiao Jingduo já compreendia bem as sutilezas entre as mulheres do pátio interno. Naquele momento, até se sentia um pouco sortudo por ser homem — poderia sair de casa, construir sua própria carreira, sem precisar gastar toda sua energia tentando agradar o chefe da família. No pátio interno, o status não importava; só o poder contava. O mundo é mesmo assim.
O forte se apoia no próprio esforço. O interesse de Xiao Jingduo pelas disputas do pátio interno esfriava cada vez mais. Decidiu não desperdiçar mais energia com aquilo e abaixou a cabeça, recitando em silêncio a lição do dia.
— Céu e Terra, escuros e amarelos, o universo vasto e selvagem...
Enquanto Xiao Jinghu era cercado por criados e três belas primas dizendo palavras agradáveis, a área de Xiao Jingduo permanecia deserta. O contraste era gritante. Embora ninguém ousasse se aproximar dele, todos observavam secretamente suas reações. Ao verem que sua expressão não mudava nem um pouco do início ao fim, e que ele apenas mantinha a cabeça baixa, lendo, acharam aquilo sem graça. Mas junto da decepção, surgiu um pouco de admiração.
Tão jovem, e o jovem mestre já tinha uma compostura admirável, capaz de suportar tamanha diferença de tratamento com tanta dignidade.
Felizmente, o caos na sala de estudos não durou muito. Logo, Chu Shuxin retornou. Ao ver o professor voltar, Xiao Yufang e suas irmãs, mesmo contrariadas, tiveram que sair. Não podiam correr o risco de serem acusadas de atrapalhar os estudos do jovem mestre.
Enquanto se retiravam, olhando para trás repetidamente, o Mestre Chu fingiu não notar. Sem esperar que todos se sentassem, abriu seu livro e retomou a aula.
Xiao Jingduo forçou-se a concentrar e mergulhou na leitura.
Na segunda metade da aula, Xiao Jinghu estava extremamente impaciente. Provava os docinhos que Xiao Yufang trouxera enquanto olhava ao redor, entediado, torcendo para que a aula acabasse logo. Quando viu Chu Shuxin parar e parecer guardar os livros, não esperou pelo encerramento — saiu correndo na hora.
Xiao Jingduo sentiu-se envergonhado e pediu desculpas ao mestre:
— Meu irmão mais novo é impulsivo. Por favor, não se incomode, professor.
Chu Shuxin acenou com a mão:
— Não tem problema.
Após dizer isso, já se preparava para sair.
Xiao Jingduo não perdeu tempo organizando os materiais e correu atrás dele:
— Mestre, ouvi dizer que o senhor já participou dos exames imperiais da dinastia anterior. Posso perguntar quais clássicos caíam nessas provas?
Chu Shuxin lançou-lhe um olhar estranho, sua voz ainda fria, demonstrando desinteresse:
— Você é o neto mais velho da família do Marquês, filho do próprio Marquês. Não precisa prestar exame imperial. Para que se preocupar com isso? Além do mais, os exames imperiais nem existem mais.
Xiao Jingduo sorriu amargamente. Não queria revelar sua situação familiar a um estranho, então apenas se curvou respeitosamente:
— Por favor, professor, não me negue sua orientação.
Chu Shuxin também suspirou profundamente:
— Você não quer falar, e eu não quero ouvir. Mas os exames imperiais foram abolidos na dinastia anterior, então não cultive esperanças. As pessoas devem aceitar seu destino. Se o Céu permitiu que você nascesse como cidadão comum, não deve ser ganancioso e querer voar alto demais. Sua família tem privilégios herdados, no futuro você pode conseguir um cargo por meio do seu pai. Não há necessidade de se preocupar com essas coisas.
Depois de dizer isso, Chu Shuxin pareceu não querer continuar a conversa e apressou o passo. Porém, não tinha dado nem meia dúzia de passos quando ouviu a voz do jovem atrás de si:
— Mestre, se a nova dinastia restaurasse os exames imperiais... o senhor realmente desistiria?
Os passos de Chu Shuxin hesitaram por um instante, mas logo continuou andando. Suspirou por dentro, achando que os jovens mestres de hoje em dia eram mesmo difíceis de lidar.
Ao anoitecer, quando tudo se aquietou, muitos já estavam em seus sonhos. Mas a luz no quarto leste do Pátio Qingze ainda permanecia acesa.
Xiao Jingduo segurava um pincel, escrevendo caractere por caractere sob a luz da lamparina.
Tinha começado a estudar tarde, então, para alcançar os outros, só lhe restava dobrar o esforço.
Naquela noite, a luz do Pátio Qingze permaneceu acesa até a meia-noite, antes de finalmente se apagar. Àquela altura, a velha madame no Salão Gaoshou, Xiao Ying e Wu Junru no pátio principal — e até toda Chang’an — já dormiam profundamente.
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Nota da autora:
Parabéns por coletar todos os fragmentos; você desbloqueou uma bela imagem:
“Xiao Jingduo, que desenvolveu preconceitos contra mulheres e o pátio interno por causa das experiências amargas na juventude.jpg”


Capítulo 12 – Legítimo e Ilegítimo
Logo cedo pela manhã, Wu Junru se arrumava com a ajuda da ama Wei.
— Ouvi dizer que a velha madame chamou um candidato reprovado nos exames imperiais para ser tutor de Xiao Jinghu, e Xiao Jingduo foi junto? O Marquês não havia arranjado aulas para ele? Por que não foi com o Marquês?
— Esta velha serva também não sabe ao certo. Ouvi das criadas da velha madame que, ao que parece, ela achou que o segundo jovem mestre não conseguiria se concentrar, então pediu que o jovem mestre mais velho fosse com ele para supervisionar. Talvez o tutor convidado pelo Marquês ainda não tenha chegado, então o jovem mestre só foi acompanhar o irmão nos estudos — respondeu a ama Wei sem dar muita importância, apenas especulando.
— Não, tem algo errado aí — murmurou Wu Junru, sentindo algo estranho no ar. — O Marquês não é alguém indeciso. É só um tutor, por que demoraria tanto? Será que a relação entre pai e filho não é como eu pensava?
Wu Junru ficou inquieta. Se a relação entre Xiao Ying e Xiao Jingduo for realmente distante, então por que eu pedi à família Wu que pressionasse? Se Xiao Ying não tinha intenção de passar o título para Xiao Jingduo desde o início, eu podia muito bem ter aceitado isso. Por que tive que me meter e me tornar a vilã?
— Isso é péssimo! — exclamou Wu Junru, cada vez mais ansiosa, temendo ter agido por impulso. Perdera a paciência com a criada que arrumava seus enfeites de cabelo e ordenou apressadamente à ama Wei:
— Aquele bilhete que mandamos da última vez... para onde foi enviado? Vá buscá-lo agora, rápido!
— Ai, céus... — respondeu a ama Wei, apressada, mas antes que pudesse sair do quarto, uma criada do dote entrou alegremente:
— Madame, chegou uma carta da família Wu!
— O quê? — Wu Junru se levantou num salto, afastando a criada que ainda arrumava seu penteado, e rapidamente abriu a carta, passando os olhos pelas linhas.
Ao terminar a leitura, seu rosto ficou ainda mais sombrio:
— É tarde demais. Meu pai já tocou no assunto com o Marquês, ameaçando que, sob nenhuma circunstância, Xiao Jingduo pode se tornar o legítimo filho mais velho...

Cena muda para Xiao Jingduo
Xiao Jingduo, já sem paciência, disse:
— Qiuju, minha mãe estava te chamando agora há pouco.
— Hã? — Qiuju ficou confusa. — Sério? Eu não ouvi nada.
— Chamou, sim. Você que não escutou direito. Vá logo ver.
— Ah, tudo bem. — Qiuju virou-se e foi verificar no quarto de Zhao Xiu Lan.
Com isso, os ouvidos de Xiao Jingduo finalmente tiveram paz. Ele rapidamente juntou seus livros e saiu do quarto silenciosamente.
Chegou cedo à sala de estudos, que ainda estava vazia. Sentado naquele ambiente calmo, começou a revisar o conteúdo que havia decorado no dia anterior, com as mãos inconscientemente imitando o movimento da escrita.
Desde pequeno, Xiao Jingduo era forçado pelo Doutor Zhao a memorizar receitas médicas. Se ele conseguia decorar aquelas fórmulas secas palavra por palavra, o Clássico dos Mil Caracteres era quase divertido em comparação. Molhou o dedo e começou a escrever silenciosamente sobre a mesa.
Depois de um tempo indefinido, uma voz surgiu atrás dele com um suspiro:
— Não se pode ser tão descuidado ao praticar caligrafia.
Xiao Jingduo se assustou e levantou-se de imediato:
— Mestre Chu!
Chu Shuxin mantinha seu ar frio e indiferente, mas dessa vez pediu que Xiao Jingduo pegasse o pincel:
— Escreva dois caracteres no papel para eu ver.
Na verdade, Xiao Jingduo nunca havia aprendido caligrafia formalmente. Praticar sozinho na noite anterior era uma coisa, mas escrever diante dos outros era totalmente diferente. No entanto, como o professor havia pedido, não tinha escolha. Reuniu coragem, pegou o pincel e escreveu os caracteres “céu” (天) e “terra” (地) no papel.
A expressão de Chu Shuxin era difícil de decifrar. Ele suspirou:
— Não sei por que você tem tanta pressa em estudar e praticar caligrafia, mas lembre-se: excesso é tão ruim quanto escassez. Se não construir uma base sólida agora, será você quem sofrerá no futuro.
Xiao Jingduo ficou sério. Percebeu que vinha sendo impaciente e que o mestre havia percebido. Baixou a cabeça e agradeceu sinceramente:
— Agradeço pela orientação, mestre.
Chu Shuxin fez um gesto com a mão, impaciente com formalidades. Pegou o pincel das mãos de Xiao Jingduo e, ao lado da caligrafia desajeitada do aluno, escreveu dois caracteres grandes e perfeitos:
天 (Céu), 地 (Terra).
— Um prédio de mil andares começa no chão. Sei que você tem grandes ambições. Quando alcançar seus objetivos no futuro, espero que não se esqueça dos primeiros caracteres que escreveu. Levante a cabeça sem vergonha diante do céu, abaixe-se sem desonra perante a terra. Espero que saiba se conduzir com retidão.
A expressão de Xiao Jingduo tornou-se totalmente séria.
— Este aluno se lembrará com cuidado.
Ao ver a atitude respeitosa de Xiao Jingduo, a expressão de Chu Shuxin suavizou. Ele virou o pincel e escreveu no papel uma lista de títulos:
— Esses livros de caligrafia têm boa técnica e são ideais para iniciantes. Quando puder, vá aos mercados Leste ou Oeste e compre alguns.
— Obrigado, mestre — respondeu Xiao Jingduo com gratidão. Aquilo não fazia parte do trabalho do professor, e ele se sentia afortunado por receber tal orientação. Chu Shuxin era um estudioso profundo e exímio calígrafo. Receber indicações de leitura dele era muito melhor do que procurar às cegas.
Chu Shuxin fez mais algumas perguntas e viu que Xiao Jingduo respondia fluentemente, mostrando claramente que havia estudado após voltar para casa. Embora seu rosto permanecesse impassível, o mestre estava bastante satisfeito por dentro. No início, não queria ensinar filhos de nobres, mas agora, vendo esse aluno tão dedicado, não pôde evitar sentir alegria.
De bom humor, Chu Shuxin foi ainda mais atencioso ao orientar Xiao Jingduo. Os dois engajaram-se numa longa sessão de perguntas e respostas, até que Xiao Jinghu chegou e iniciaram a aula do dia.
Xiao Jingduo estava radiante por ter ganhado a aprovação de Chu Shuxin. Apesar de maduro para sua idade, ainda era uma criança. Sua avó era indiferente, seu pai cruel, e a nova madrasta era uma cobra em pele de cordeiro. Todos ao seu redor eram egoístas. Por ter vivido nesse ambiente por tanto tempo, até ele começava a duvidar de si mesmo. Será que o tratamento cruel de meus parentes é culpa minha?
Mas o elogio do mestre naquele dia foi algo extremamente precioso para Xiao Jingduo, que há muito estava encurralado, e restaurou sua confiança.
Não era ele que tinha defeitos... apenas teve muito azar por estar cercado por pessoas tão vis.
Contudo, o bom humor de Xiao Jingduo não durou muito antes de ser interrompido por uma visita inesperada.
Ao final da aula, quando Xiao Jingduo estava prestes a se aproximar mais do Mestre Chu — ou melhor, buscar conselhos sobre como conduzir sua vida — viu um oficial se aproximando. Seu alvo era claro: ele e Chu Shuxin.
— Mestre Chu, Jovem Mestre — saudou Xiang An com uma reverência.
Xiao Jingduo o reconheceu como um dos ajudantes de confiança de Xiao Ying. Sua expressão mudou de imediato, perdendo todo traço da cordialidade anterior.
Chu Shuxin retribuiu a saudação:
— Oficial Xiang. O que o traz à sala de estudos hoje? O Marquês deu alguma ordem?
— De forma alguma, o Mestre Chu é muito educado — respondeu Xiang An com um sorriso ambíguo, lançando um olhar insinuante a Xiao Jingduo. — Vim hoje tratar de assuntos relacionados ao jovem mestre mais velho da casa.
— Oh? — Chu Shuxin lançou um olhar a Xiao Jingduo e comentou: — O jovem mestre é inteligente e aplicado, certamente fruto da excelente orientação do Marquês. Que o Marquês envie alguém para se informar sobre seus estudos mostra grande dedicação.
Xiao Jingduo soltou um leve riso irônico. Sabia que, quando Xiao Ying mandava alguém, dificilmente era algo bom. Só não sei o que ele está tramando agora.
Xiang An prosseguiu:
— O jovem mestre foi criado no antigo vilarejo e, por conta dos compromissos militares, o Marquês não pôde acompanhá-lo. Agora que as coisas se estabilizaram, o Marquês deseja compensar o filho mais velho. A intenção do nosso senhor é que, independentemente da origem, todos os filhos da família Xiao recebam boa educação para se tornarem homens íntegros. Este é o sincero desejo de um pai. Mestre Chu, o jovem mestre mais velho dependerá muito de sua orientação no futuro. Venho agradecê-lo em nome do Marquês.
Chu Shuxin lançou a Xiao Jingduo um olhar curioso e respondeu com uma leve reverência:
— O oficial é muito gentil.
A essa altura, o rosto de Xiao Jingduo estava carregado. Apesar do tom educado, as palavras de Xiang An eram cortantes. “Independentemente da origem”? Isso era claramente uma insinuação de que ele não era filho da esposa legítima — um lembrete de que era apenas um bastardo.
Seus dedos se contraíram com força, os nós ficando brancos. O que Xiao Ying pretendia com isso? Era um aviso? Ou um sinal de que as negociações com a família Wu haviam fracassado?
Será que a família Wu recusou registrá-lo como filho legítimo e, para evitar conflitos, Xiao Ying decidiu reconhecê-lo publicamente apenas como filho ilegítimo, um bastardo deixado no vilarejo, que não atrapalharia o caminho dos filhos legítimos de Wu no futuro?
Antes, o status de Xiao Jingduo permanecia ambíguo. Ninguém ousava discutir se ele era legítimo ou não. Mas agora... será que Xiao Ying e a velha madame pretendiam oficializar sua queda de status?
O coração de Xiao Jingduo apertou. Se deixarem isso se estabelecer, será quase impossível reverter no futuro. Ele não podia permitir que Xiao Ying alterasse sua identidade como legítimo herdeiro assim. Seu rosto permanecia sereno, mas a mente girava em busca de uma estratégia.
Quanto mais pensava, mais frio seu coração se tornava. Xiao Ying e a velha madame controlam tudo nessa casa. Quem ousaria desafiá-los?
Perdido em pensamentos, Xiao Jingduo ficou em silêncio por muito tempo. Chu Shuxin, observando esse aluno que tanto admirava, começou a compreender. Então é isso... mesmo sendo o primogênito, ele é apenas um filho ilegítimo.
Chu Shuxin suspirou. Famílias nobres escondem muitos segredos. Como forasteiro, pouco posso comentar. Ao entender a situação, despediu-se com um gesto e saiu da sala.
Assim que ele se foi, Xiang An suspirou para Xiao Jingduo:
— Jovem Mestre, por que o senhor insiste em agir assim?
Xiao Jingduo ignorou-o e apressou o passo.
Xiang An, no entanto, continuou tagarelando atrás dele:
— Por que contrariar o Marquês? Ele arranjou bons tutores e mestres de artes marciais, e mesmo assim o senhor se recusa a ir. Em vez disso, procura um acadêmico fracassado? Isso é uma oportunidade que muitos implorariam para ter, e o senhor simplesmente recusa?
— Meus assuntos não lhe dizem respeito — respondeu Xiao Jingduo, frio.
— Ah, Jovem Mestre! — chamou Xiang An, mas Xiao Jingduo nem se virou. Frustrado, Xiang An coçou o nariz:
— Realmente não entendo esses jovens mestres nobres. Os mais velhos preparam cargos oficiais para eles, e eles recusam? O Marquês tem título de segundo grau; por lei, seus descendentes podem entrar direto para a guarda. Uma chance dessas, e ele joga fora como sapato velho, sonhando em passar por exames imperiais? Em vez de seguir um caminho pronto, prefere se matar por um quase impossível... — suspirou. — Eu, como pobre que sou, não entendo mesmo esses nobres.
— Mestre Chu! — chamou Xiao Jingduo, calculando o caminho para alcançá-lo. Parou em sua frente, mas então travou, sem saber o que dizer.
Chu Shuxin entendeu seu dilema e sorriu levemente:
— Pode se comportar normalmente diante de mim. Não sou alguém que julga os outros pela origem.
— Eu sei — respondeu Xiao Jingduo com certo amargor. Eu sou o filho legítimo... mas mesmo que eu diga isso, o senhor não acreditaria. Então para que explicar?
Preferiu não entrar em detalhes e foi direto ao ponto:
— Mestre, serei franco. Quero participar dos exames imperiais no futuro. O senhor teria alguma recomendação de leitura?
O rosto antes simpático de Chu Shuxin imediatamente ficou severo:
— O que eu lhe disse esta manhã? Já esqueceu? Pressa demais leva ao fracasso. Sua base ainda é frágil. Nem mesmo dominou o Clássico dos Mil Caracteres e já quer estudar os textos para o exame? Não volto a falar nisso. Não direi quais livros ler para isso.
E com isso, Chu Shuxin virou-se e partiu, a manga do robe balançando com firmeza.
Xiao Jingduo sabia que o mestre falava por seu bem. Por mais que quisesse mudar sua situação atual, precisava fazer isso passo a passo.
Suspirou fundo, pensando:
“Muito bem... por enquanto, só me resta reforçar minha base com honestidade.”
Mas, comparado aos exames imperiais, o maior problema de Xiao Jingduo naquele momento...
...era a crise em torno de sua identidade.
Ele precisava encontrar uma forma de proteger seu status como filho legítimo.

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