Capítulo 11 – O Vilão Jiang Xu
Na manhã seguinte,
Liu Mufeng levantou-se cedo. Depois de acordar, dobrou os cobertores que estavam estendidos no chão e, na ponta dos pés, foi até atrás do biombo para verificar a situação da pessoa deitada na cama.
Ao perceber que o outro ainda não havia acordado, Liu Mufeng abaixou-se e puxou o cobertor sobre ele, saindo do quarto logo em seguida.
Ao ouvir o som da porta sendo aberta e fechada, a pessoa na cama abriu os olhos lentamente. Olhou para o cobertor que o cobria e, inexplicavelmente, uma onda de calor surgiu em seu coração. Um leve sorriso se formou no canto de sua boca.
Liu Mufeng lavou-se rapidamente e foi preparar o café da manhã. Só depois de deixar tudo pronto e colocado à mesa, ele voltou até atrás do biombo.
— Ei, o café da manhã está pronto, porquinho preguiçoso.
Ao ouvir a voz de Liu Mufeng, a pessoa na cama abriu os olhos e lançou-lhe um olhar descontente.
— Meu nome não é porquinho preguiçoso! É Jiang Xu. Jiang de rios e lagos¹, Xu de sol nascente!
— Jiang... Jiang Xu? — Ao ouvir esse nome, a expressão de Liu Mufeng mudou drasticamente. Ficou verde por um momento, depois pálido, em constante transformação. Jiang Xu? O vilão Jiang Xu? Eu realmente encontrei o Jiang Xu, o vilão do livro?
Ao pensar em Jiang Xu, Liu Mufeng se lembrou de que, como mencionado na obra, os Seis Heróis de Zhenbei foram mortos por esse vilão. Droga, um enredo tão importante e eu ignorei.
Jiang Xu é o principal vilão do livro. Cresceu com o protagonista como amigos de infância e sempre o amou profundamente. Ambos ficaram órfãos, e Jiang Xu desenvolveu uma personalidade excêntrica e isolada, nunca se encaixando bem entre os outros. Por isso, seu relacionamento com as seis esposas do protagonista sempre foi péssimo. Mais tarde, o amor virou ódio, e Jiang Xu tomou o caminho oposto ao do herói, sendo eventualmente morto por ele e suas seis mulheres.
— Você... você me conhece? — Ao ver a expressão estranha de Liu Mufeng, Jiang Xu perguntou desconfiado.
— Não, não conheço! — balançando a cabeça, Liu Mufeng negou rapidamente. Se eu contasse tudo o que sei, esse vilão provavelmente me mataria. Droga de boca agourenta!
Ao ouvir isso, Jiang Xu resmungou friamente:
— Obviamente conhece, por que fingir que não? Todo mundo em Jialan me conhece. Você, não saber, é que é estranho demais!
Ao dizer isso, Jiang Xu ficou um pouco abatido. Esse cara tem uma cara de que sabe e ainda quer fingir, que hipócrita.
Ao ouvir isso, Liu Mufeng ficou surpreso. Todo mundo em Jialan sabe? Matar os Seis de Zhenbei foi algo que Jiang Xu fez aos treze anos. Ou seja, o que todos sabiam, provavelmente era o fato de ele ter sido expulso da família.
Se for isso, também é um destino cruel. O avô de Jiang Xu tinha dois filhos. O pai de Jiang Xu era o segundo, e morreu cedo, deixando-o como único herdeiro. Já o tio tinha um casal de filhos. O primo mais velho, noivo de uma jovem de uma grande família, tentou molestar
Jiang Xu ao vê-lo tão bonito. Jiang Xu o espancou, mas o canalha inverteu a história, alegando que Jiang Xu o seduziu. Resultado: o tio e o primo o expulsaram de casa sem nem escutar sua versão.
Pelo tempo, esse incidente deve ter ocorrido há uns três meses. Contudo, no livro original, após matar os Seis de Zhenbei, Jiang Xu ficou gravemente ferido e foi atrás do protagonista, que o acolheu. Mas agora, Jiang Xu veio por causa dos cinco anéis dimensionais. Ou será esse o tal efeito borboleta?
— Na verdade, como você, também fui expulso pela minha família — suspirou Liu Mufeng, querendo que Jiang Xu entendesse que ele não o desprezava. Afinal, Jiang Xu não tinha culpa de ter sido expulso.
— Por quê? — Jiang Xu se surpreendeu.
— Sou um Wulinggen². Meus pais morreram quando eu tinha cinco anos. Sem apoio nem talento, meu tio me mandou cultivar a terra neste vilarejo — disse Liu Mufeng, com certo desânimo.
— De que família você é?
— Da família Liu, em Shuangyang. Não é uma grande família, é de terceiro escalão. Nem se compara à família Jiang. Jialan é uma cidade de primeira classe, com um senhor no Reino do Rei Espiritual. Já Shuangyang é de terceira classe, e o líder é só um Mestre Espiritual. São mundos diferentes. E naturalmente, as famílias também.
Ao ouvir isso, Jiang Xu resmungou:
— Tudo farinha do mesmo saco. — Família grande ou pequena, todos são iguais. — É verdade! — concordou Liu Mufeng, balançando a cabeça.
— Não é sua culpa ter talento ruim. Eles não deveriam te tratar assim — disse Jiang Xu, olhando para Liu Mufeng com certa indignação pela injustiça sofrida.
Ao ver Jiang Xu defendendo-o, Liu Mufeng sorriu.
— Acha que somos parecidos?
Jiang Xu ficou surpreso.
— Bastante — respondeu. Sem pai, sem mãe, abandonados pela família. Iguais mesmo.
— Chega de coisas tristes. Vamos, vou te ajudar a levantar pra comer — disse Liu Mufeng, inclinando-se para ajudá-lo a sair da cama.
Sentado, Jiang Xu viu Liu Mufeng agachado calçando seus sapatos. Apertou os punhos sem perceber e, reunindo coragem, murmurou:
— Obrigado... obrigado!
— Hã? — Liu Mufeng levantou a cabeça, sem entender direito.
Constrangido, Jiang Xu desviou o olhar.
— Fique sentado. Vou buscar uma toalha pra limpar seu rosto e as mãos. Depois comemos! — disse Liu Mufeng, saindo.
Assim que ele saiu, Jiang Xu apoiou-se na cama, segurando o ferimento no abdômen, e foi cambaleando até a porta.
— O que está fazendo? — vendo Jiang Xu mancando em direção à porta, Liu Mufeng correu para ajudá-lo.
— E-eu... — disse Jiang Xu, envergonhado.
— Quer ir ao banheiro, né? — Liu Mufeng logo entendeu.
— En... — assentiu Jiang Xu, todo corado.
— Eu te ajudo, com calma — disse Liu Mufeng, devolvendo a toalha à bacia e ajudando Jiang Xu a sair.
Com o rosto abaixado, Jiang Xu não ousava encará-lo.
— Nada de ir até o chalé, fica aqui mesmo. Eu te espero ali — disse Liu Mufeng, ao levá-lo para um canto.
— Tá bom... — Jiang Xu respondeu baixinho.
Sorrindo, Liu Mufeng se afastou. Esse é o vilão cruel, frio e impiedoso do livro? Não vejo crueldade alguma. Só o acho fofo e bonito demais!
Se alguém tem culpa, é o protagonista idiota. Insistiu em empurrar alguém que tanto o amava para a loucura. Não... na verdade, um garanhão como aquele nunca mereceu um vilão tão puro e adorável. Um canalha desses, que se apaixona por qualquer uma, não merece Jiang Xu!
— Liu Mufeng...
O chamado o trouxe de volta à realidade. Liu Mufeng voltou rápido e ajudou Jiang Xu a entrar.
Sentado na cadeira, Jiang Xu pegou a toalha que Liu Mufeng lhe deu e limpou as mãos e o rosto. Olhou para a mesa cheia de pratos.
— Eu não sabia do que você gostava, então fiz o que eu gosto. Se não curtir, me fala que faço algo do seu gosto depois — disse Liu Mufeng, entregando-lhe os talheres.
— Não precisa. Isso está ótimo — respondeu Jiang Xu, tomando um gole do mingau. Tenho que admitir: ele cozinha muito bem! Já havia percebido isso na noite anterior. E agora, com aquele mingau, não restavam dúvidas.
— Não fique só no mingau, coma umas verduras também. Quanto mais comer, mais rápido se recupera — disse Liu Mufeng, servindo-lhe vegetais.
— Tá bom — assentiu Jiang Xu, comendo em pequenas mordidas.
Depois da refeição, Liu Mufeng ajudou Jiang Xu a deitar novamente.
— Fique quietinho por dois dias. Quando melhorar, pode andar. Agora vou regar as ervas no campo. Coloquei o penico ali no canto, use aqui mesmo se precisar. Volto logo.
— Tô bem, pode ir — disse Jiang Xu, olhando de canto para o penico com vergonha.
— Certo. Cuide do ferimento. Ao meio-dia, volto pra cozinhar algo gostoso e trocar seu curativo. Acredito que amanhã ou depois já vai estar melhor — Liu Mufeng lançou-lhe mais um olhar e saiu.
Jiang Xu levantou o rosto e ficou olhando o outro se afastar. Por algum motivo, sentiu-se vazio.
Notas de rodapé:
1. Jiang de rios e lagos (江), Xu de sol nascente (旭) — Uma forma tradicional chinesa de explicar o significado dos caracteres do nome, comum em apresentações formais ou poéticas.
2. Wulinggen (五灵根) — Literalmente, “cinco raízes espirituais”. Em xianxia, refere-se a um tipo de afinidade com os cinco elementos, considerada fraca ou ineficiente para cultivo, por ser dispersa demais.Capítulo 12 – Conversando
Após o almoço, Liu Mufeng ajudou Jiang Xu a aplicar o remédio novamente. Apesar de ser a segunda vez, Jiang Xu ainda se sentia constrangido. Continuava virando o rosto e evitando o olhar do outro, visivelmente envergonhado.
Liu Mufeng aplicou o remédio e fez a bandagem de forma rápida e habilidosa. Depois, ajudou Jiang Xu a vestir-se.
— O ferimento está cicatrizando bem. Amanhã troco o curativo e vai estar quase bom — disse com naturalidade.
— En! — respondeu Jiang Xu com um leve aceno.
— Você ficou deitado a manhã toda. Está cansado? Posso massagear seus ombros — disse Liu Mufeng com um sorriso, olhando para ele.
— Não, não precisa! — Jiang Xu negou rapidamente, sacudindo a cabeça. Ao ver a expressão envergonhada de Jiang Xu, Liu Mufeng achou engraçado.
— Está com medo de quê? Eu não vou te bater. Ainda está com receio que eu vá fazer alguma coisa?
— Não, não... Eu sei que você não é uma má pessoa! — murmurou Jiang Xu, lançando um olhar tímido para ele.
— Então tudo bem — disse Liu Mufeng, já posicionando as mãos nos ombros do outro e começando a massagear devagar.
— Você... quer me conquistar, é isso? — Jiang Xu perguntou, sem jeito. — Mas você nem é uma mulher, né? — respondeu Liu Mufeng, divertido, encarando-o. — Eu... eu sou um shuang¹. E eu quero me casar como uma mulher!
Na verdade, muitos shuang no Continente Lingwu eram criados como garotas. Só que a mãe de Jiang Xu faleceu durante o parto, então o pai decidiu criá-lo como um menino, na esperança de que ele se casasse, tivesse filhos e continuasse o legado da família. Infelizmente, seu pai também morreu, e Jiang Xu acabou sendo expulso da família.
— Isso não é garantido. Talvez você acabe se casando com uma mulher. Não tem muitos shuang que também casam e formam família?
— Não, eu quero me casar com alguém! — disse Jiang Xu, corando ao pensar na pessoa que tanto amava.
Ao ver a expressão romântica no rosto de Jiang Xu, Liu Mufeng pensou: Deve estar pensando no protagonista. Jiang Xu cresceu com ele, ama esse homem profundamente.
Está completamente apaixonado por esse cafajeste! Com o corpo todo machucado por causa dele... Não vale a pena! Como pode amar um idiota desses?
— Tá certo. Se você quer se casar, então que case. Quando eu ficar mais forte e tiver pedras espirituais, também quero me casar. Com um shuang bonito e fofo, como você — disse Liu Mufeng, sorrindo.
Ao ouvir isso, Jiang Xu o encarou com uma expressão estranha.
— Você? Quer se casar com um shuang?
— Ué? Qual o problema? — Liu Mufeng perguntou, confuso.
— No Continente Lingwu, shuang não têm o mesmo status que as mulheres. Geralmente, filhos de grandes famílias não se casam com shuang. Quando muito, tomam como concubina. Ninguém casa oficialmente. Porque a fertilidade deles não é tão boa quanto a das mulheres. Alguns nem conseguem ter filhos.
Ao ouvir isso, Liu Mufeng deu de ombros, sorrindo.
— Com a minha situação, eu não tenho como criar um monte de filhos. Além disso, mulher é muito sensível e barulhenta, não gosto. Só quero viver uma vida tranquila com meu parceiro. Ter filho ou não, tanto faz. De qualquer jeito, a gente tem que cultivar e ganhar pedras espirituais. Nem teria tempo pra criar criança.
Como homossexual, herdeiros nunca foram uma prioridade para Liu Mufeng. Na sociedade moderna, havia pressão por trabalho, estudo, e expectativas sociais. Não só gays, mas muitos casais héteros também escolhiam o estilo de vida DINK². Então, descendência nunca foi algo importante pra ele.
— Você... sua forma de pensar é muito diferente — comentou Jiang Xu, intrigado.
— Sou um pouco egoísta. Só quero viver feliz, do meu jeito. Não me importo com o que os outros pensam.
— Não, é assim mesmo que se deve viver. Não tem por que se forçar pra agradar os outros — concordou Jiang Xu, com convicção.
— Você também pensa assim? — Liu Mufeng arqueou a sobrancelha, sorrindo.
— Sim. Sua vida é sua. Viva como quiser. Por que se preocupar com a opinião dos outros? — respondeu Jiang Xu. Se meus pais ainda estivessem vivos, talvez eu tivesse que seguir os desejos deles. Mas... eles já morreram. Não tenho mais ninguém. Não preciso me preocupar com mais ninguém.
Liu Mufeng sorriu ao ver aquela expressão decidida.
— Isso aí, falou bonito.
Talvez por isso, no livro original, digam que o vilão é esquisito e fora dos padrões. No fundo, é só alguém com ideias próprias. Que os outros não conseguem aceitar!
Envergonhado com o elogio, Jiang Xu corou.
— Vira de lado, vou bater nas suas costas — disse Liu Mufeng, ajudando-o a se virar. — Você... não tem que ir à livraria hoje? Já está de tarde — perguntou Jiang Xu. Liu Mufeng riu.
— Na verdade, fui comprar livros aquele dia. Não sou funcionário da livraria. Só conheço bem o dono, e costumo ir lá. Aconteceu que o filho do balconista pediu folga porque a mãe ficou doente, então fui ajudar a escolher um livro.
Jiang Xu deu uma risadinha.
— Então você não trabalha lá! Mas por que me disse “obrigado, senhor”?
— Ora, você me deu uma recompensa, né? Claro que eu agradeci! Além disso, estava ajudando o dono da livraria, então tinha que fazer direitinho.
— Ah, entendi — Jiang Xu assentiu. Então me enganei mesmo. Sabia que era estranho uma loja tão pequena contratar um cultivador de quatro estrelas só pra trabalhar lá.
— Quando fui expulso da família, me mandaram pra essa vila. Essa casa e uma pequena plantação de ervas espirituais foram dadas pela própria família. Eu não sei fazer outra coisa, só aprendi a cultivar ervas medicinais. Então, desde que cheguei aqui, vivo disso. Aquela erva que usei no seu ferimento foi plantada por mim. O pessoal da minha família me considera inútil, não gosta que eu vá até a cidade, então... mesmo se eu quisesse trabalhar lá, eles não deixariam — Liu Mufeng suspirou. Pelo comportamento de Liu Cheng e Liu Zhen’er já dá pra ver o quanto me desprezam.
Jiang Xu ficou visivelmente irritado.
— Hmph! Esse povo da sua família não presta! Tudo um bando de canalhas. Você não fez nada de errado. Por que não pode entrar na cidade?
— Hehe... — Liu Mufeng coçou o nariz, sem jeito. Incluindo eu mesmo, viu? — Eu não tô falando de você! Falo dos que moram lá em Shuangyang!
— Eu sei. Você só está tentando me defender. Mas, sinceramente, é melhor assim. Lá, eu só era menosprezado e humilhado. Aqui, posso viver em paz.
Jiang Xu fez um biquinho descontente, ainda achando a família Liu um lixo completo. — Ah, tem uma coisa... eu queria te contar! — disse Jiang Xu, de costas, hesitante. — O que é? — Liu Mufeng perguntou com um sorriso, encarando a nuca do outro.
— Aquele dia, na floresta... quando o chefe Xue ameaçou você com a faca no seu pescoço... na verdade, eu queria te salvar. Tava com uma espada na mão direita e uma adaga na esquerda. Se ele fizesse qualquer movimento, eu cortaria o braço dele na hora. Falei tudo aquilo só de propósito, fingindo que não me importava... pra não deixar ele te matar! — Jiang Xu se virou devagar, nervoso com a reação do outro.
Liu Mufeng apenas sorriu.
— Não precisa explicar. Eu entendi. E, olha... a gente era só dois estranhos que se encontraram duas vezes. Mesmo se você não tivesse me salvado, eu não te culparia.
Mesmo no mundo moderno, ninguém ajuda ninguém. Tem medo de ser acusado, de cair em golpe. Se já é assim por lá, imagine aqui, num mundo onde vidas não valem nada? Aqui, matar pra roubar tesouro é normal. A exceção é quem salva alguém. Muitos aproveitam a luta entre cultivadores pra atacar os dois e pegar seus anéis espaciais. Então, Jiang Xu, você nem chegou a fazer isso. Já tem mais coração que muito outro por aí.
— Você... — Jiang Xu se sentiu ainda mais culpado.
— Não precisa se sentir mal. Você não é meu pai nem meu filho. Não tem obrigação de me salvar. A gente mal se conhecia. Se eu não tivesse subido na carruagem por acaso, talvez você tivesse vencido os seis mais fácil. Talvez nem tivesse se machucado. Foi só coincidência. Nós dois só fomos... pegos no mesmo rolo — disse Liu Mufeng, ajudando-o a se deitar de novo e começou a massagear suas pernas.
— Não, não foi coincidência. Eu procurei por eles e fui atrás pra matar. Vi que você era um quatro estrelas do Reino Mortal e pensei em me juntar a você. Mas... não esperava... — Jiang Xu parou, sem coragem de continuar.
— Não esperava que eu fosse tão fraco, né? — Liu Mufeng riu, sem ressentimentos. — Hehe... — Jiang Xu ficou envergonhado com a sinceridade do outro.
— Treinei na minha família desde pequeno. Fui mandado pra cá aos 13 anos. Nunca lutei com monstros nem cultivadores. Então... eu sei que não fui bem mesmo.
Ao ouvir isso, Jiang Xu franziu o cenho.
— Assim não dá. Como vai sobreviver sendo tão fraco? Precisa ir pras Montanhas das Feras Espirituais e matar mais monstros... e cultivadores. Começa com os mais fracos. Depois vai subindo de nível.
Liu Mufeng piscou, surpreso com a frieza.
Moço bonito, será que dá pra não falar de matar gente como se fosse fazer compras? Como viajante, ainda não me acostumei com isso!
— Tudo bem. Eu vou me treinar! — respondeu Liu Mufeng, assentindo.
— Quando eu melhorar, levo você pra matar monstros. Vai ver como é fácil depois que se acostuma!
— Oh... — Acostumar com matar monstros, até vai... Agora matar gente? Isso ainda vai demorar.
Notas de rodapé:
1. DINK – Sigla para “Double Income, No Kids” (Dupla Renda, Sem Filhos), comum entre casais modernos que optam por não ter filhos.Capítulo 13 [013] – Promessa de Ajudar
Alguns dias depois...
Sob os cuidados meticulosos de Liu Mufeng, o ferimento de Jiang Xu melhorava a cada dia. Ele voltara a ser o mestre formidável de antes, mas, ao falar, já não era tão frio e rígido quanto antes.
Na mesa do café da manhã, Liu Mufeng e Jiang Xu comiam juntos.
Ao saborear a comida deliciosa do prato, Jiang Xu sentia certa relutância em ir embora dali. Mesmo indo a um restaurante famoso, talvez nem encontrasse um cozinheiro espiritual tão habilidoso quanto Liu Mufeng. No entanto, ele estava vivendo na casa do outro enquanto Liu Mufeng dormia no chão, o que o fazia se sentir um pouco confortável demais. Antes, não conseguia sair por conta da gravidade dos ferimentos, mas agora que estava curado, não era certo continuar na casa de outra pessoa!
— Liu Mufeng, isso é pra você! — disse Jiang Xu após a refeição, tirando um anel espacial e colocando-o sobre a mesa.
Baixando os olhos, Liu Mufeng olhou para o anel e viu que havia cinco mil pedras espirituais lá dentro. Para alguém como ele, que mal tinha o suficiente para sobreviver, cinco mil pedras espirituais era uma verdadeira fortuna. Porém, Liu Mufeng não queria aquele dinheiro. Sabia que Jiang Xu lhe entregava as pedras porque pretendia partir.
Ficou encarando o anel sobre a mesa por um longo tempo. Com a testa franzida, levantou o olhar para o homem à sua frente.
— Você vai embora?
— É... Não existe banquete eterno neste mundo. Já morei na sua casa por tempo demais, está na hora de ir — respondeu Jiang Xu, com naturalidade. Não era o tipo de pessoa sem vergonha que esperava ser expulsa para então sair por conta própria.
Ao ouvir isso, Liu Mufeng assentiu.
— Tudo bem... Quer que eu te leve até a cidade?
— Não, eu tenho um cavalo fantasma comigo. Pode ficar com a carruagem. Com ela, será mais fácil pra você ir até a cidade.
— Certo. Obrigado, vou aceitar a carruagem. Mas não posso aceitar isso — disse Liu Mufeng, devolvendo o anel espacial.
— Por quê? Você me ajudou a despistar aquelas pessoas, me acolheu e cuidou de mim. Esse pagamento é merecido — disse Jiang Xu, confuso.
— Eu me arrisquei com aquelas pessoas porque queria salvá-los. Cuidei de você porque quis, não por causa de pedras espirituais. Além disso, você vive correndo por aí como
caçador de recompensas. Não é uma vida fácil... Como eu poderia querer o seu dinheiro? — Liu Mufeng sabia muito bem como era a vida de um "fracassado" expulso de casa.
— Mufeng...
— Não quero as pedras espirituais. Mas, se realmente quiser me retribuir, pode fazer uma coisa por mim. Depois disso, vai se sentir melhor e não vai achar que me ficou devendo — explicou Liu Mufeng com seriedade.
— Você quer que eu ensine uma lição à Família Liu? — perguntou Jiang Xu, erguendo uma sobrancelha e sorrindo.
— Não. Aqueles são apenas figurantes insignificantes pra mim. Não vale a pena perder tempo com eles.
— Então... o que você quer? — perguntou Jiang Xu, curioso.
— Quero firmar um contrato com uma besta espiritual. Mas você conhece minha força... Então, quero que me ajude — respondeu Liu Mufeng, um pouco constrangido. Se fosse sozinho tentar firmar contrato com o inseto original espiritual, talvez acabasse morto. Mas com a ajuda de Jiang Xu, haveria uma boa chance de sucesso.
— Contratar uma besta? Que tipo de fera espiritual você quer? — Jiang Xu imediatamente se interessou.
— Estou pensando em firmar contrato com o rei dos insetos espirituais originais¹ — disse Liu Mufeng.
— Inseto espiritual original? Nunca ouvi falar disso — Jiang Xu coçou a cabeça, confuso.
— Esses insetos são comumente chamados de "insetos inúteis". Insetos que nunca conseguem avançar para o Reino Espiritual¹ — explicou Liu Mufeng. Poucos sabiam o nome oficial da espécie, mas todos conheciam os "insetos inúteis".
— O quê? Inseto inútil? Como você pode querer contratar uma praga dessas? Esses insetos nunca vão avançar no cultivo, são como... — Jiang Xu interrompeu-se no meio da frase, visivelmente constrangido. — Eu... eu não quis dizer você...
— Eu entendo. Esses insetos são como eu, com cinco raízes espirituais. Nunca vão chegar ao Reino Espiritual. Mas, com minha aptidão, não faz sentido contratar uma fera com talento excepcional. Os insetos inúteis vivem em bandos. Se eu firmar contrato com o rei, é como firmar com todo o grupo. Assim, não serei mais tão vulnerável lá fora — explicou Liu Mufeng. Na verdade, ele achava esses insetos excelentes: além de poderem ajudá-lo a lidar com o problema de suas raízes espirituais, também seriam úteis no combate.
— Que tal eu te ajudar a contratar um filhote de tigre listrado de ouro? — sugeriu Jiang Xu, após pensar um pouco. — Seria muito mais forte.
— Não. Preciso firmar contrato com os insetos inúteis. Eles têm grande utilidade pra mim! — respondeu Liu Mufeng com firmeza. Seu objetivo não era apenas ter uma besta espiritual, mas resolver seu problema com as raízes espirituais.
— Ah... Então tudo bem. Vamos agora mesmo até a floresta atrás da montanha. Esses insetos são comuns, com certeza vamos achar por lá! — Jiang Xu já se levantava para sair.
— Calma. Primeiro vou até a cidade comprar tudo o que for necessário. Só partiremos quando estivermos prontos. Cada ninhada tem pelo menos duzentos ou trezentos insetos. Se não nos prepararmos bem, talvez não consigamos concluir o contrato de uma só vez — respondeu Liu Mufeng com convicção. Ou não fazemos... ou fazemos direito.
Jiang Xu pensou um pouco e assentiu.
— É verdade... Então vá se preparar! Vai levar alguns dias?
Ao ouvir isso, Liu Mufeng franziu a testa.
— Se estiver com pressa de ir embora, eu posso...
— Não, não, não estou com pressa. É só que você só tem uma cama... e já está dormindo no chão há vários dias — disse Jiang Xu, um pouco envergonhado.
— Não tem problema. Depois, vou à cidade comprar outra cama. Quer vir comigo? — Não precisa. Vou ficar aqui treinando com a espada. Pode ir.
— En! — Liu Mufeng assentiu, lançou um último olhar ao outro e então se levantou para sair.
Notas de rodapé:
1. Insetos espirituais originais (ou original spirit insects) são popularmente chamados de insetos inúteis por serem incapazes de progredir no cultivo. Apesar disso, possuem características úteis em grupo e podem formar colônias protegidas por um "rei" do enxame, com quem se firma o contrato espiritual, parecido com um enxame de abelhas.Capítulo 14 [014] Expulsando à Força
Depois que Liu Mufeng partiu, Jiang Xu praticou espada no pátio por um tempo, depois voltou para seu quarto para cultivar.
Uma hora depois...
Ao ouvir o som da porta do pátio sendo empurrada, Jiang Xu, que estava sentado na cama, abriu imediatamente os olhos.
Mu Feng voltou? Não deveria ser... Mesmo que Mu Feng tenha ido de carruagem até a cidade, não poderia ter voltado tão rápido!
Levantando-se, Jiang Xu saiu do quarto e viu alguém vestido de forma espalhafatosa entrando no pátio — era Zhang Cui.
Ao perceber que não se tratava de Mu Feng, mas de uma mulher maquiada exageradamente e com cheiro forte de pó de arroz por todo o corpo, Jiang Xu franziu a testa. Primeiras impressões são importantes, e por algum motivo, Jiang Xu se sentiu incomodado assim que viu essa mulher. Não gostou dela de imediato.
— Quem você está procurando? — perguntou friamente, encarando a mulher.
— Você? Quem é você? Por que está na casa do Irmão Liu? — Zhang Cui também franziu a testa ao ver aquele rapaz de beleza incomparável saindo do quarto. Ele parecia um jovem comum, sem nenhum indício de força espiritual. Um ressentimento imediato cresceu dentro dela.
Não é à toa que aquele idiota do Liu Mufeng não me procurou ultimamente. Ele está escondendo esse homem bonito aqui dentro, como um amante secreto. Agora entendo por que me ignorou!
— Isso não tem nada a ver com você — respondeu Jiang Xu, com frieza. Irritada com o ar arrogante e indiferente dele, Zhang Cui explodiu:
— Você não se ache tanto! Não pense que eu não sei o que você é! Veio de um bordel, não é?
Ela o encarou com desprezo, completamente enojada.
Ao ouvir isso, a raiva de Jiang Xu subiu de vez.
— Está pedindo pra morrer! — disse ele, antes de acertar um soco direto que arremessou Zhang Cui para longe.
Ela foi jogada mais de três metros no ar e caiu no chão cuspindo uma grande quantidade de sangue. A bandeja de petiscos que havia trazido também voou do cesto que carregava.
— V-Você... — gaguejou Zhang Cui, olhando para Jiang Xu com puro ódio.
Antes, eu não conseguia sentir nenhum nível de cultivo vindo desse sujeito... Pensei que fosse um inútil qualquer. Quem diria que estava escondendo sua verdadeira força! Nojento!
— Cai fora. Se não sair agora, eu mato você — disse Jiang Xu, com os olhos frios.
Ele não havia usado toda sua força naquele soco. Ao ver Zhang Cui, percebeu de imediato que ela era apenas uma cultivadora de segundo nível no Reino Espiritual Mortal. Ele usou apenas 10% de sua força[¹]. Se tivesse batido pra valer, ela já estaria morta.
— Seu bastardo, me aguarde! — Zhang Cui gritou antes de fugir, cambaleando. Jiang Xu bufou com desdém, virou-se e voltou calmamente para dentro do quarto.
Uma hora depois, Liu Mufeng retornou trazendo duas gaiolas de galinhas. Assim que entrou no pátio, viu manchas de sangue, um cesto jogado no chão e uma bandeja de petiscos quebrada. Assustado, largou as gaiolas e correu para dentro da casa.
— Jiang Xu! Jiang Xu! — chamou aflito, empurrando a porta e olhando ao redor, em busca do rapaz.
— Está de volta? — Jiang Xu apareceu de trás do biombo, olhando para Liu Mufeng com expressão tranquila.
— Você se machucou? — perguntou Liu Mufeng, alarmado, examinando-o com os olhos.
— Não. Apenas expulsei uma mulher daqui — respondeu Jiang Xu, dizendo a verdade sem rodeios.
— Mulher? Que tipo de mulher? — Liu Mufeng franziu o cenho, confuso.
— Não sei. Também não a conheço. Estava toda enfeitada, com voz melosa, me perguntando o que eu estava fazendo aqui. Respondi que não era da conta dela, e então ela me chamou de prostituto de bordel. Aí... dei um soco leve nela, e ela cuspiu sangue — explicou Jiang Xu, meio resignado. — Não foi minha culpa. Ela era fraca demais.
— Talvez... talvez tenha sido a Zhang Cui. Uma cultivadora de dois níveis no Reino Espiritual Mortal, certo? — ponderou Liu Mufeng. — Aposto que ela me viu saindo com a carroça hoje cedo. Deve ter pensado que fui vender ervas espirituais na cidade e veio aqui pedir empréstimo de pedras espirituais. Só que, por azar dela, deu de cara com você.
— Zhang Cui? É sua mulher? — Jiang Xu perguntou, desconfiado. Lembrava que a mulher havia o chamado de “Irmão Liu” com certa intimidade.
Ao ouvir isso, Liu Mufeng balançou a cabeça imediatamente.
— Não, não! Ela é só alguém da vila. Não tenho nenhum envolvimento com ela. Jiang Xu sorriu, vendo a rapidez com que Liu Mufeng se explicou.
— Você parece ter medo dela.
— Sim... Ela sempre vinha pedir pedras espirituais emprestadas. Nunca devolvia. Quando a vejo, já fico com dor de cabeça — suspirou Liu Mufeng. Por que as dívidas amorosas do antigo dono do corpo vieram cair sobre mim? Eu não sou ele!
— Ela pedia pedras espirituais emprestadas? — Jiang Xu arregalou os olhos, intrigado.
— Sim. Ela é considerada a “flor da vila”, sabe? Costuma ir atrás dos homens solteiros pra pedir emprestado. Já me pediu três vezes. Eu emprestei porque era difícil recusar, vivendo na mesma vila. Mas ela ficou viciada nisso. Toda vez que me vê indo vender ervas na cidade, aparece querendo mais. Já recusei uma vez. Hoje, deve ter me visto sair e correu pra tentar de novo — explicou Liu Mufeng, suspirando.
— Que mulher sem vergonha! Fica pedindo sem devolver? Hmph! Ela acha que é alguma cortesã famosa? Só por mostrar o rosto acha que vai ganhar pedra espiritual?
Liu Mufeng deu um sorriso amargo diante da indignação de Jiang Xu.
— Esquece. Esse tipo de pessoa não vale a pena discutir. Quanto mais você fala com ela, menos ela percebe o próprio lugar.
— É muito fraca. Não ousei bater com força. Tive medo de que, se acertasse de verdade, o pátio ficasse com mau cheiro — suspirou Jiang Xu. Na verdade, tenho um talismã de fogo comigo, mas aquele custa 300 pedras espirituais! É um item pra salvar a vida. Não vou desperdiçar um desses só pra queimar um cadáver.
— Oh! — exclamou Liu Mufeng, observando o comportamento calmo e casual de Jiang Xu. É como dizem, o ambiente molda a pessoa. Nesse lugar, matar alguém é tão trivial quanto matar uma galinha ou porco. Jiang Xu não hesitou em machucar, e o único motivo para não matar foi... evitar sujeira no quintal e o trabalho de enterrar o corpo. Isso sim é assustador!
— Mu Feng, estou sentindo muitas pessoas se aproximando deste lado! — alertou Jiang Xu. Sendo um cultivador de nove estrelas no Reino Espiritual Mortal, seus cinco sentidos eram extremamente aguçados.
Ao ouvir isso, Liu Mufeng franziu as sobrancelhas.
— Zhang Cui deve ter trazido mais gente para arranjar confusão. Vamos sair e ver o que está acontecendo!
— Oh! — Jiang Xu assentiu levemente e seguiu Liu Mufeng para fora do quarto.
Notas de rodapé:
[¹] No contexto da novel, cultivadores possuem diferentes "estrelas" dentro de cada reino. Um ataque com apenas 10% da força de um cultivador de nove estrelas pode ser fatal para alguém de duas estrelas.Capítulo 15 [015] Batendo na porta
Quando Liu Mufeng e Jiang Xu entraram no pátio, os quatro membros da família Zhang, o chefe da vila e alguns moradores de duas e três estrelas do Reino Espiritual Mortal apareceram, entrando em grupos no quintal de Liu Mufeng.
— Tio Chefe da Vila! — disse Liu Mufeng, fazendo uma reverência profunda ao se aproximar.
— Jovem Mestre Liu, a Zhang Cui disse que houve ladrões na sua casa e que ela foi agredida, por isso trouxe os moradores para verificar! — disse o chefe da vila com uma expressão séria.
— Foi ele, aquele desgraçado! — gritou Zhang Cui, apontando com raiva para o nariz de Jiang Xu.
— Tio Chefe da Vila, houve um engano. Não há ladrão nenhum. Esse é meu primo, que veio me visitar. Ele não é nenhum ladrão! — explicou Liu Mufeng, tentando esclarecer a situação.
Ao ouvir isso, Jiang Xu inflou as bochechas, pensando: Nós dois temos 13 anos, e ele me chama de primo? Quer dizer que eu pareço mais velho que ele?
— Ah, então é o primo do Jovem Mestre Liu! — assentiu o chefe da vila, observando Jiang Xu de cima a baixo. Percebeu que o rapaz usava roupas luxuosas, incluindo o cinto e os acessórios. Era claramente um jovem mestre de família rica. Mas, curiosamente, não conseguia sentir a força espiritual dele. Será que ele é só um bom ator? Ou talvez... já esteja no Reino Espiritual?
— Mesmo que não seja ladrão, ainda assim não pode sair batendo nos outros assim, né? — disse Zhang An, irmão mais velho de Zhang Cui, olhando para Jiang Xu com desagrado.
— E qual o problema de bater nela? Gente suja merece uma surra! — retrucou Jiang Xu, sem o menor constrangimento.
— Jovem Mestre, isso não é... — o chefe da vila hesitou, parecendo incomodado.
Jiang Xu lançou um olhar gelado ao chefe da vila, o mais forte entre os presentes. Depois bufou:
— Embora você seja forte, não é páreo pra mim. Posso te matar com um único golpe de espada. Então, se quer viver, é melhor não tentar me enfrentar.
Ao dizer isso, Jiang Xu retirou do cinto um pingente de jade. No mesmo instante, a aura de um cultivador de nove estrelas do Reino Espiritual Mortal se espalhou pelo ar.
Aquele era um pingente ocultador de jade, que escondia a força do usuário. Mufeng havia contado a ele que o mais forte da vila era o próprio chefe, com cinco estrelas. Por isso,
Jiang Xu usava o artefato para evitar causar problemas. Nunca imaginaria que, mesmo tentando manter o perfil discreto, acabaria sendo chamado de vagabundo por uma mulher vulgar — e ainda acusado de ladrão por um bando de camponeses ignorantes.
— Vo-você...
Todos os cultivadores presentes ficaram boquiabertos. Ver Jiang Xu revelar uma força de nove estrelas no Reino Espiritual Mortal os deixou em choque.
Zhang An, especialmente, arregalou os olhos. Uma inveja furiosa brotou em seu olhar. Maldito! Como pode nascer em uma família rica e ainda ser um gênio? Eu, nascido em família comum, com 15 anos ainda sou só um cultivador de quatro estrelas... Não aceito isso, não aceito!
— Chefe da vila, tem mais alguma coisa que queira me dizer? — perguntou Jiang Xu, encarando o homem idoso.
O chefe da vila sacudiu a cabeça apressado:
— N-não, não. Eu só... vim verificar mesmo!
Vendo o sorriso forçado no rosto do chefe da vila, Liu Mufeng suspirou internamente. Esse mundo realmente só respeita quem tem o punho mais forte... É a lei do mais forte, sem disfarces!
— Se já terminou, então pode ir embora. Um bando de gente fedorenta parado aqui me irrita. E quando estou irritado, gosto de matar! — disse Jiang Xu friamente, olhando para a multidão.
— C-claro! Vamos embora agora mesmo! — disse o chefe da vila, já dando meia-volta.
— Espera aí. Zhang Cui, não vai embora não! — disse Jiang Xu de repente, chamando-a pelo nome.
— V-você... o que vai fazer? — perguntou Zhang Cui, recuando assustada.
— Meu primo disse que você pegou pedras espirituais emprestadas dele três vezes e nunca devolveu. Quando vai pagar?
— E-eu... — o rosto de Zhang Cui ficou ainda mais pálido.
Jiang Xu virou-se para o chefe da vila:
— A família da Zhang Cui é muito pobre? Eles têm casa, terras espirituais?
— Bem... não, na verdade a família dela é uma das mais abastadas da vila. Têm casa própria e terras espirituais! — respondeu o chefe da vila, sem esconder a verdade.
— A família dela tem quatro pessoas, seis casas e vinte acres de terra espiritual. Bem melhor do que eu! — disse Liu Mufeng com um sorriso irônico. — E ainda dizem que são pobres...
— Com tudo isso, por que ela precisaria pegar pedras espirituais emprestadas? — Jiang Xu franziu a testa, achando aquilo muito suspeito.
— Talvez estivesse passando por dificuldades temporárias — respondeu Liu Mufeng, sorrindo levemente.
Os outros moradores olharam para a família Zhang com desdém. Quem anda demais à beira do rio, uma hora acaba molhando os pés. Dessa vez, se deu mal. Será que ainda vai continuar enganando os outros?
— Zhang Cui, devolve as pedras espirituais pro meu primo agora, ou eu espanco toda a sua família, vendo você pra um bordel, e liquido suas terras e casas pra pagar a dívida! — Jiang Xu falou com naturalidade.
— E-eu... — Zhang Cui olhou apavorada para o pai.
— Jovem Mestre, eu não sei quanto minha filha pegou emprestado do Jovem Mestre Liu. Por favor, diga quanto é, que eu pago! — disse o pai dela, tremendo.
— Quanto foi mesmo? — Jiang Xu perguntou, virando-se para Liu Mufeng.
— Três vezes, no total de 85 pedras espirituais! — respondeu Liu Mufeng após pensar um pouco.
— Ótimo! — disse o pai Zhang. Sem hesitar, tirou 85 pedras espirituais e as entregou a Liu Mufeng.
— Zhang Cui, escuta bem. Você está proibida de vir à casa do meu primo de novo. E nem pense em pedir mais pedras espirituais emprestadas. Se ousar aparecer aqui outra vez, eu vou te espancar até a morte, toda vez!
— N-não, jamais! Eu juro! — Zhang Cui quase chorava de medo.
— Certo, podem todos ir embora! — disse Jiang Xu, abanando a mão. Os moradores bateram em retirada imediatamente, aliviados.
Mais tarde, no quarto de Liu Mufeng...
Sentado numa cadeira, Jiang Xu observava Liu Mufeng com um olhar estranho. — O que foi? — perguntou Liu Mufeng, sorrindo ao ver a expressão do outro. — Por que você disse que eu era seu primo? Eu sou tão velho assim?
— Eu disse isso pra evitar que os moradores ficassem com ideias erradas sobre a gente. Foi só da boca pra fora. Se soubesse que você se incomodaria tanto, teria dito que você é meu irmão mais novo — respondeu Liu Mufeng com um sorriso calmo. Ele sabia que naquela região, mesmo os homens se importavam muito com a reputação. E um rapaz de
13 anos morando sozinho com outro poderia gerar fofocas. Mas, como primos, ninguém diria nada.
— Humpf! Eu sou dois meses mais novo que você! — Jiang Xu respondeu emburrado, inflando as bochechas.
Liu Mufeng riu. Apesar da pose madura, Jiang Xu ainda era só um garoto de 13 anos — e, como tal, não podia esconder completamente seu lado infantil.
— Eu sei que você é mais novo. Mais novo, mais talentoso, e ainda me ajudou a recuperar as pedras espirituais. Você é incrível! — disse Liu Mufeng, levantando o polegar.
Envergonhado com o elogio sincero, Jiang Xu corou.
— Você comprou tudo? Vi que trouxe muitas galinhas. E a carruagem? Vendeu?
— Comprei tudo. Como estava sem espírito de sobra, vendi a carruagem. As galinhas são pra você comer. Você ficou comigo meio mês, comendo só vegetais. Tá ficando mais magro que quem come carne!
— Se não tinha pedras espirituais, por que não me falou? Eu tenho! — Jiang Xu o repreendeu.
— Já está tudo resolvido — disse Liu Mufeng, colocando sobre a mesa os itens que havia comprado.
— Você comprou uma bola de cristal? — perguntou Jiang Xu, curioso. — Sim. É para testar a raiz espiritual.
Sem esperar, Jiang Xu colocou a mão na bola de cristal. Um feixe dourado surgiu imediatamente.
— Raiz espiritual do tipo ouro. Sua aptidão é mesmo incrível! — disse Liu Mufeng, com inveja. Jiang Xu, como o protagonista vilão da história, tinha raiz espiritual única — e era cultivador de espada, assim como o protagonista principal.
— Sua vez! Testa aí! — disse Jiang Xu, entregando-lhe a bola.
Liu Mufeng colocou a mão sobre a bola. Cinco feixes de luz surgiram — dourado, verde, azul, vermelho e marrom — representando as cinco raízes espirituais: metal, madeira, água, fogo e terra.
— Você tem cinco raízes espirituais. A principal é madeira. Por isso é tão bom cultivando ervas espirituais! — observou Jiang Xu, vendo o feixe verde ser o mais forte.
— Ah, mas não importa se a principal é madeira. Ainda é uma raiz quíntupla inútil! — suspirou Liu Mufeng.
— Mu Feng, não se desanime. Um dia você pode conseguir uma Pílula de Purificação Espiritual¹! Se tomar essa pílula, sua raiz principal vai se fortalecer, e talvez você consiga avançar para o Reino Espiritual de verdade!
— É... Eu vou me esforçar para cultivar!
Na verdade, o antigo dono de seu corpo tinha exatamente esse plano — mas acabou perdendo a vida tentando conseguir essa pílula...
Notas de rodapé:
1. Pílula de Purificação Espiritual (Qingling Pill) – Artefato alquímico raro que, segundo lendas desse universo, purifica e fortalece a raiz espiritual principal de um cultivador, aumentando suas chances de avanço nos reinos espirituais.
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