Capítulo 25 a 27


 Capítulo 25 – O Acordo

Rong Ke olhou para Xiao Jingduo com um sorriso. Embora sua expressão não tenha mudado, toda a sua postura se transformou drasticamente, deixando de parecer uma garotinha inofensiva para assumir o ar da filha do Príncipe Herdeiro, a Princesa Yangxin.

— Vamos fazer um acordo? Eu ajudo você a resolver o problema que sua madrasta criou e garanto sua segurança durante esses três anos de luto.

Xiao Jingduo a encarou em silêncio, as sobrancelhas se contraindo levemente:

— Você quer aquelas abelhas venenosas?

— Sim — Rong Ke assentiu com franqueza. — E também quero aquela sua roupa.

Xiao Jingduo ficou um pouco constrangido, mas rapidamente se tranquilizou: Deixa pra lá. Ela ainda é jovem e não entende as regras entre homens e mulheres.

A oferta de Rong Ke era extremamente generosa. Xiao Jingduo hesitou por apenas um instante antes de aceitar. Voltou à mansão para pegar as abelhas venenosas de Wu Junru e também trouxe as roupas de luto embebidas em mel. Quanto ao que Rong Ke faria com abelhas tão letais e indetectáveis, isso já não era mais da conta dele.

Quando retornou ao Pátio Qingze, foi direto ao quarto lateral. Qiuju, ao ouvir o barulho, correu para segui-lo:

— Jovem Mestre, onde o senhor esteve agora há pouco? Sua prima veio procurá-lo.

— Ela? — Xiao Jingduo remexia em armários e gavetas. Ao ouvir Qiuju, franziu a testa, confuso. — O que ela queria?

— Não sei. Sua prima foi muito gentil comigo. Esperou bastante no pátio, mas como não encontrou o senhor, teve que ir embora. Disse para avisá-la assim que o senhor voltasse. — Qiuju abaixou a voz, sussurrando: — Jovem Mestre, também ouvi dizer que sua prima implorou ao Marquês para deixá-lo ficar na mansão e cumprir o luto aqui, em vez de ser mandado para um templo. Não acha que essa é uma boa oportunidade? Por que não aproveita para se aproximar dela?

— Favores sem motivo são traiçoeiros ou interesseiros. Se ela realmente se importasse comigo, não teria me ignorado esses dias. Agora aparece, do nada, com gentileza? Mesmo que eu não saiba o que ela quer, coisa boa não é. Não dê atenção a ela. — A confusão causada por Cheng Huizhen nem havia passado pela cabeça de Xiao Jingduo. Ele encontrou as roupas de luto e o pote, e então se preparou para sair.

— Ah, Jovem Mestre, o senhor acabou de voltar, vai sair de novo?

Saindo da mansão pelo mesmo caminho por onde entrou, Xiao Jingduo logo viu Rong Ke à distância, de pé na rua vazia, com cinco ou seis guardas vestidos de preto atrás dela. Apesar da estatura pequena, ela não parecia deslocada diante dos homens altos e robustos — ao contrário, parecia absolutamente natural, como alguém que nasceu para ser seguida. Os raios inclinados do pôr do sol desciam atrás de Rong Ke, banhando-a com uma luz dourada que realçava ainda mais seus cabelos escuros e a pele branca como a neve — como uma beleza esculpida em jade.

Ao ver Xiao Jingduo voltar, Rong Ke não se apressou. Apenas ficou ali, sorrindo suavemente:

— Conseguiu os itens?

Xiao Jingduo lançou um olhar aos cinco guardas e compreendeu ainda melhor. Como a filha do Príncipe Herdeiro sairia sozinha? Aqueles homens provavelmente já estavam ali antes, escondidos sob as ordens de Rong Ke. Certamente, quando o cavalo se assustou, já estavam a caminho — ele só foi mais rápido por acaso. Mesmo que Xiao Jingduo não estivesse lá, Rong Ke não estaria realmente em perigo.

Ele se recompôs e se aproximou com cautela. A garota diante dele não era a mesma que ouvira seus desabafos momentos antes — ou talvez fosse. Talvez essas duas versões sempre fossem a mesma pessoa.

Xiao Jingduo estendeu a mão, entregando o pote com as abelhas. Um homem, que parecia ser o chefe dos guardas, pegou o recipiente, examinou-o e, com as duas mãos, o apresentou a Rong Ke.

Rong Ke pegou o pote, girou-o entre os dedos e depois o aproximou da orelha. Ao ouvir algo, arqueou as sobrancelhas, surpresa, e lançou um olhar direto a Xiao Jingduo:

— Duas?

— Sim. A outra picou a ama da minha madrasta e morreu na hora. Quer essa também?

Rong Ke sorriu de maneira enigmática:

— Claro.

Ela entregou os itens ao guarda e disse:

— Espere pacientemente pelos próximos dias. Eu mesma cuidarei da questão com sua madrasta.

Um pensamento passou pela mente de Xiao Jingduo:

— Você achou que eu entregaria só uma?

Rong Ke apenas sorriu, sem confirmar nem negar. Em seguida, com seus cinco guardas — e talvez mais ocultos —, virou a esquina e desapareceu no fim da rua longa.

Só então Xiao Jingduo compreendeu o sorriso estranho de Rong Ke. Havia três abelhas no total, uma morrera naquele dia. Rong Ke presumiu que ele entregaria apenas uma — afinal, insetos tão perigosos poderiam servir como trunfo para salvar a própria vida. Quem entregaria todos de uma vez?

Talvez, ela até tivesse se preparado para que ele tentasse renegociar no último instante.

Xiao Jingduo achou aquilo incrível. Como ela foi criada? Seus pensamentos são tão complexos...

Com o anoitecer, ele voltou lentamente ao Pátio Qingze. Qiuju o aguardava ansiosa no portão. Ao vê-lo, correu em sua direção:

— Jovem Mestre, más notícias! A Marquesa quer mandar o senhor para um templo isolado!

— Hum. — Xiao Jingduo assentiu. — Eu sei.

— Mas como pode estar tão calmo?! — Qiuju estava aflita. — Num lugar assim, nem o céu nem a terra ouvirão seus gritos. Até uma pessoa normal enlouqueceria! Por favor, pense em algo!

— Já fiz o que podia. Agora, o resto deixo nas mãos do destino. — Xiao Jingduo respondeu com serenidade, caminhando em direção ao quarto lateral. Antes de entrar, disse:

— Vou para o estúdio. Não me incomode, a menos que seja urgente.

Qiuju ficou sozinha, andando de um lado para o outro, inquieta.


No dia seguinte, alguém do pátio principal veio avisar que a Marquesa solicitava a presença de Xiao Jingduo.

Ele seguiu o mensageiro até o pátio principal. Wu Junru estava à porta, olhando para ele com arrogância.

Ao se cruzarem, Xiao Jingduo ouviu Wu Junru sussurrar em seu ouvido:

— Viu? No fim, você ainda perdeu pra mim.

Xiao Jingduo achou essa frase ridícula. Ignorou Wu Junru e seguiu diretamente até o estúdio.

Xiao Ying estava sentado no assento principal. Ao ver o filho, assentiu levemente:

— Você ouviu aquele dia: o mestre disse que sua aura assassina é muito forte, o que é prejudicial para a casa. Como chefe da família, devo pensar no bem do clã. E como você também precisa cumprir o luto pela sua mãe, por que não ir para um templo? Use esses três anos para refinar esse seu espírito rebelde. Depois desse período, eu mesmo o trarei de volta.

— Qual templo?

— Um templo da família na Vila Dafeng. O monge-chefe tem ligações com a família Wu. Se você for para lá, o abade poderá cuidar de você.

Vila Dafeng? Aquele lugar era cercado por montanhas e sem recursos. Ir para lá era o mesmo que exílio. Mais importante ainda, perder três anos num local remoto desses atrasaria completamente seus estudos e treinamento. Tentar os exames imperiais depois seria como tentar subir aos céus.

A jogada de Wu Junru era realmente cruel.

Ao ver o silêncio de Xiao Jingduo, Wu Junru se sentiu vitoriosa e quis provocá-lo ainda mais:

— Não se preocupe, Jovem Mestre. Embora Dafeng seja isolada, sua tranquilidade, afastada do mundo, é perfeita para um luto em paz...

Antes que ela terminasse, ouviram passos do lado de fora. Um servo correu para dentro do estúdio, ofegante e desarrumado, anunciando às pressas:

— Marquês, chegou um emissário do Príncipe Herdeiro!

— O Príncipe Herdeiro mandou alguém? — Xiao Ying ficou surpreso. Ele não tinha nenhum contato com o Palácio Leste. Por que o Príncipe Herdeiro enviaria alguém repentinamente para a mansão do Marquês Dingyong?

Apesar da confusão, Xiao Ying não se atreveu a negligenciar. Levantou-se imediatamente e ordenou em voz alta:

— Rápido, tragam-no para dentro!

Wu Junru também saiu para recebê-los. Xiao Jingduo veio por último — mas agora, seu rosto antes impassível carregava um leve sorriso. Rong Ke havia agido mais rápido do que ele imaginava. Resolvera tudo em apenas um dia.

O atendente do Palácio Leste estava no pátio, sem entrar na casa. Após as saudações a Xiao Ying, foi direto ao assunto:

— Marquês Dingyong, Marquesa, o Jovem Mestre está presente?

O rosto de Wu Junru se crispou:

— O que desejam com ele?

Xiao Ying lançou um olhar repreensivo para Wu Junru e pediu desculpas ao emissário:

— Perdoe a grosseria da minha esposa. — Então elevou a voz: — Xiao Jingduo, venha aqui rapidamente!

Os criados abriram caminho para Xiao Jingduo. Ele se aproximou do emissário e fez uma reverência apropriada:

— Atendente.

— Hum. — O homem retribuiu a saudação com um leve sorriso e disse:

— Fomos informados de que ontem o Jovem Mestre salvou a Princesa. O Príncipe Herdeiro está profundamente grato por seu gesto nobre e me enviou para expressar seus agradecimentos. Também soubemos que a mãe do Jovem Mestre faleceu. Sua Alteza ficou comovida. Ele também perdeu recentemente sua mãe e lamenta até hoje não ter podido cumprir luto pela falecida Imperatriz. Ao saber da sua situação, Sua Alteza se compadeceu e decretou especialmente que o Jovem Mestre vá ao Templo Qingyuan cumprir o luto por sua mãe. Assim, ele também expressa sua própria piedade filial pela Imperatriz falecida.

—Ele salvou a Princesa? E Sua Alteza está permitindo que ele cumpra o luto no Templo Qingyuan? — A fala do atendente do Palácio Oriental trazia informações demais, e Wu Junru não sabia em qual ponto focar. Desde quando Xiao Jingduo se envolveu com a Princesa do Palácio Oriental? E ela ouvira certo? Xiao Jingduo vai mesmo para o Templo Qingyuan?

Xiao Ying também ficou chocado, mas seus anos como oficial lhe deram mais compostura que Wu Junru. Ele rapidamente se recuperou e aproveitou a chance para bajular o Príncipe Herdeiro:

— É uma bênção para a família Xiao servir a Sua Alteza. Posso perguntar que tipo de susto a Princesa Yangxin sofreu ontem? Ela está bem agora?

— A Princesa está bem, agradeço sua preocupação, Marquês Dingyong — o atendente fez uma leve reverência e acenou para que um jovem eunuco trouxesse alguns itens. Prosseguiu:

— A piedade filial do jovem mestre em ir ao Templo Qingyuan para velar por sua mãe é louvável. No entanto, a vida no templo é austera, e considerando que ele ficará lá por três anos, precisará de alguns suprimentos. Como o Príncipe Herdeiro e a Princesa não conhecem as preferências do jovem mestre, prepararam alguns presentes modestos para sua jornada.

— O Príncipe Herdeiro e a Princesa são bondosos demais. Que virtude meu indigno filho possui para merecer tamanha consideração de Sua Alteza? — disse Xiao Ying, tomado por honra, e logo fez sinal para que seus criados recebessem os presentes.

O atendente, tendo cumprido sua missão, retirou-se. Xiao Ying o acompanhou pessoalmente até a saída, perguntando sem parar sobre o Príncipe Herdeiro. O atendente apenas sorria, sem dizer muito. Inspirado, Xiao Ying então passou a perguntar sobre a Princesa Yangxin. A expressão do atendente suavizou-se, e ele passou a conversar com mais abertura.

À medida que Xiao Ying e o enviado do Palácio Oriental se afastavam, o estúdio ficou em silêncio. Wu Junru olhava para os presentes do Palácio, que preenchiam metade do pátio, depois virou-se para Xiao Jingduo, tão irritada que nem conseguia falar.

A névoa da manhã acabara de se dissipar, e a luz do sol inundava o chão, deixando todo o pátio claro e aquecido. Xiao Jingduo estava em pé sob essa bela luz, sorrindo para Wu Junru:

— Senhora, a senhora acabou de dizer que, no fim das contas, eu não poderia derrotá-la. Parece que falou cedo demais.

Wu Junru apertou os lábios, o rosto rígido de raiva e incredulidade.

Apesar de ambos envolverem ir a um templo para cumprir o luto, ir para a Vila Dafeng e ir para o Templo Qingyuan eram conceitos completamente diferentes.

A Vila Dafeng era desolada e inabitada; qualquer um mandado para lá perderia tempo e teria a vontade desgastada. Mas o Templo Qingyuan era diferente. Era um templo imperial, lar de incontáveis monges ilustres e talentos, incluindo o renomado Mestre Mingjue. Muitos filhos de famílias nobres, acadêmicos e grandes intelectuais confucionistas adoravam ir até lá para estudar e debater filosofia. Dizia-se que todos os que passavam por ali se tornavam estudiosos mais refinados, colhendo frutos para a vida inteira. Por isso, os quartos de hóspedes no Templo Qingyuan eram altamente disputados, sendo difíceis até mesmo para pessoas com bons contatos — que dirá para filhos de oficiais comuns.

Wu Junru soubera que um tio da família Wu ficara lá por apenas quinze dias graças a uma conexão com a família Cui de Qinghe, e ainda se gabava disso até hoje. E agora, Xiao Jingduo recebera um decreto do Príncipe Herdeiro para permanecer no Templo Qingyuan por três anos?

Wu Junru sentia-se sufocada só de pensar. Planejara tudo com tanto cuidado, gastara recursos, conexões, dinheiro... E justo quando Xiao Jingduo estava prestes a ser mandado embora, no último segundo, aparece um decreto do Príncipe Herdeiro que anulava todo o seu esforço. Como Xiao Jingduo pode ter tanta sorte? Não apenas se conectou ao Príncipe Herdeiro, como ainda recebeu tamanho prestígio?

Em contraste, Xiao Jingduo agora sentia-se muito mais leve. A nuvem escura que pairava sobre ele nos últimos dias finalmente se dissipara. Ele soltou um longo suspiro de alívio. Sua mãe já se fora, e se pudesse ter formado seu próprio lar, já teria deixado a mansão do Marquês Dingyong há muito tempo. Agora, poder viver fora — e ainda por cima no renomado Templo Qingyuan — era mais do que ele poderia desejar.

Assim, com um sorriso no rosto, ordenou que os servos carregassem os presentes do Palácio Oriental. Diante de Wu Junru, retornou ao Pátio Qingze de forma grandiosa, quase como se batesse tambores e gongos para anunciar sua partida.

Ele finalmente deixaria aquela mansão sombria. Xiao Jingduo refletiu profundamente: Xiao Ying, Wu Junru e os demais que lhe causaram tantas dores ficariam para trás. Uma nova vida se abria lentamente à sua frente.

A notícia de que Xiao Jingduo havia recebido a recomendação do Príncipe Herdeiro e iria para o Templo Qingyuan para cumprir o luto se espalhou rapidamente.

Durante a refeição, a Velha Senhora trouxe o assunto:

— Ir a um templo imperial é uma coisa boa. Lá é calmo, perfeito para cultivar o temperamento. Ouvi de Xuelan que está cheio de monges eruditos. Será que não dá pra levar mais uma pessoa?

Sem dúvida, ela queria que Xiao Jinghu fosse junto.

— Estou indo velar minha mãe. Por que o Segundo Jovem Mestre iria? — respondeu Xiao Jingduo, indiferente. — É ordem do Príncipe Herdeiro. Eu não ouso desobedecer.

— Como você pode falar assim! — exclamou a Segunda Tia Xiao, insatisfeita. Aos seus ouvidos, as palavras de Xiao Jingduo soavam extremamente agourentas.

Xiao Jingduo não se deu o trabalho de responder. Diante da firmeza dele, Xuelan tentou apaziguar:

— Velha Senhora, talvez seja melhor deixarmos como está! O Templo Qingyuan fica no Monte Zhongnan. A viagem de ida e volta leva dois dias. Se o Segundo Jovem Mestre for também, a senhora não conseguirá vê-lo com frequência.

— É verdade — a Velha Senhora imediatamente recuou. Fora influenciada pelas palavras da Segunda Tia, mas agora o pensamento de sentir saudades do neto prevalecia. — Então deixa pra lá. Que Duo’er vá sozinho.

A Segunda Tia também não queria se separar do filho, então não reclamou quando a Velha Senhora mudou de ideia. Com um leve tom azedo, comentou:

— Ouvi dizer que o Primeiro Jovem Mestre recebeu vários presentes. São coisas do palácio, não? Já que não pode usar tudo sozinho, por que não mostra pra gente?

Qiuju, que havia ido ao Salão Gaoshou com Xiao Jingduo, ficou boquiaberta, a raiva subindo de imediato. Xiao Jingduo acenou levemente, pedindo que ela se contivesse, e respondeu:

— Não se pode recusar presentes de pessoas respeitadas. Se a Segunda Tia os quer, por favor, fale com Sua Alteza, o Príncipe Herdeiro.

O rosto da Segunda Tia ficou vermelho com a resposta. Até mesmo a Velha Senhora reclamou, descontente:

— Como você pode falar assim, menino! Sua Segunda Tia não quer roubar suas coisas. Por que essa avareza? Presentes do palácio são sempre bons itens. Hu’er está crescendo, será que não tem nada que sirva pra ele...?

Xiao Jingduo permaneceu em silêncio. Como ele não respondeu, a Velha Senhora perguntou, irritada:

— Você realmente não vai dar nada?

— Não. Não vou.

— Você... — A Velha Senhora ficou furiosa. Se não fosse por sua posição como matriarca da casa do marquês, já teria começado a esbravejar como uma camponesa. Mas agora, Xiao Jingduo não era mais o mesmo. Ele iria ao Templo Qingyuan sob decreto do Príncipe Herdeiro. Por mais autoritária que fosse, ela não ousaria se opor a um decreto real. Como Xiao Jingduo não estava disposto, realmente não havia o que fazer.

A Velha Senhora se conteve, respirou fundo e resmungou:

— Já que você não quer abrir mão dessas coisas, não vamos insistir. Mas francamente, o Príncipe Herdeiro exagerou. Foi só ajudar a Princesa, e ele mandou tanta coisa. Seria melhor guardar isso pro próprio filho!

Xuelan riu:

— Velha Senhora, a senhora talvez não saiba, mas essa Princesa Yangxin é bem famosa aqui em Chang’an. Não é só o Príncipe Herdeiro; até Sua Majestade atende todos os desejos dela. Dizem que o imperador nem pega os próprios filhos no colo, mas a princesa fica o dia inteiro no colo dele. Quando ela escreve, Sua Majestade segura a mão dela. Ele é rigoroso com os príncipes, mas mima a Princesa Yangxin sem limites. Na guerra, ele até a levava para a tenda militar. Agora, quando discute assuntos de Estado com os ministros, ela brinca ao lado. Dizem que os ministros veem mais a Princesa do que os próprios netos.

— Mas uma menina um dia vai se casar. Se for mimada assim, como vai servir a família do marido? — disse a Velha Senhora, balançando a cabeça. — Com tanta energia, seria melhor dar mais atenção aos filhos e netos homens.

— Dizem que a Princesa é precoce, inteligente desde pequena. Por isso, Sua Majestade e o Príncipe Herdeiro a valorizam tanto.

— Ainda assim, é só uma menina — murmurou a Velha Senhora.

Xiao Jingduo não conseguia entender por que sua avó e a Segunda Tia nutriam tanto preconceito contra mulheres. Eram mulheres também, como podiam ter tanto desprezo por meninas? Ele realmente achava boa a situação de Rong Ke — capaz de fazer e aprender o que quisesse. Dizem que meninas devem ser valorizadas, e para Xiao Jingduo, era assim que uma família verdadeiramente cuidava de seus filhos.

Mas então ele se lembrou da agulha escondida na montaria de Rong Ke, e rapidamente afastou aquela ponta de inveja. Ninguém vive só de glórias sem perigos. Cada um tem seu destino. Não há motivo para comparações.

Depois da visita do enviado do Palácio Oriental, embora ainda vivesse no Pátio Qingze, o status de Xiao Jingduo mudara visivelmente. Os criados o tratavam com mais respeito e gentileza, e até Xiao Ying passara a ser mais contido. Tal é o poder da influência.

Com o dia da partida se aproximando, Xiao Jingduo passou os dias arrumando seus pertences, evitando multidões e não saindo do pátio. Mesmo assim, não conseguia paz.

Depois de se livrar de um grupo de visitas, Qiuju mal teve tempo de respirar quando o portão do Pátio Qingze foi batido novamente.

Qiuju suspirou e, resignada, foi atender.

Cheng Huizhen estava do lado de fora, espiando curiosamente:

— Vim ver o Primo Mais Velho. Onde ele está?

— O Jovem Mestre está no quarto lateral.

Tendo obtido a informação, Cheng Huizhen nem respondeu e já foi entrando, passando por Qiuju:

— Primo! Vim conversar com você!

Dentro do quarto, Xiao Jingduo esfregou a testa. Essa tola da Qiuju... por que a deixou entrar?

Mas Cheng Huizhen, alheia ao desconforto de Xiao Jingduo, tagarelava animadamente, como se não notasse sua frieza. Ou talvez tivesse notado e simplesmente não ligasse — afinal, conquistar um futuro alto funcionário não seria tarefa fácil, certo?

— Primo mais velho, como homem, você provavelmente não é bom em arrumar bagagem. Por que não deixo que eu mesma organize suas coisas?

— Não precisa.

Cheng Huizhen ainda disse muitas outras coisas, mas a atitude de Xiao Jingduo continuava distante. Por fim, Cheng Huizhen comentou, um pouco abatida:

— Primo, você ainda está bravo comigo? Eu realmente tentei interceder por você naquele dia, mas a palavra do tio é final, e eu realmente não consegui convencê-lo. Além disso, embora a vida no templo seja austera, ficar no Templo Qingyuan só vai te trazer benefícios. Você deveria entender isso!

Xiao Jingduo olhou para ela com estranheza:

— Eu sei.

Esse resultado era exatamente o que ele havia se esforçado para conseguir; Cheng Huizhen achava mesmo que ele não percebia isso?

Cheng Huizhen sentiu-se desanimada. A vida de Xiao Jingduo estava exatamente igual à de sua vida passada — naquela outra existência, ele também fora para o Templo Qingyuan, então isso não a surpreendia. O que a deixava triste era o fato de que não o veria com frequência nesses próximos três anos. O caminho para cultivar esse relacionamento ainda seria longo e difícil.

— Primo, vou sentir sua falta quando você for. Vou te escrever com frequência. Por favor, não se esqueça de mim!

As sobrancelhas de Xiao Jingduo se moveram ligeiramente, e seus olhos revelaram um leve traço de vigilância.

Se sua prima tivesse sido calorosa e gentil com ele desde o início, ele não pensaria muito a respeito. Mas a mudança de atitude de Cheng Huizhen fora repentina — e isso antes mesmo da chegada do enviado do Príncipe Herdeiro. Isso era motivo de alerta. O que exatamente Cheng Huizhen sabia para estar se comportando assim?

Quanto mais entusiasmada Cheng Huizhen era com ele, mais cauteloso Xiao Jingduo se tornava. Cheng Huizhen achava que estava pouco a pouco se aproximando de Xiao Jingduo, sem perceber que seu comportamento causava o efeito contrário.

Afinal, só a sinceridade consegue realmente tocar as pessoas. Ninguém é mais tolo que outro — normalmente, percebe-se se as intenções são genuínas ou não.

Depois de finalmente se livrar de Cheng Huizhen, Xiao Jingduo soltou um longo suspiro.

Quando Qiuju entrou correndo, encontrou o Jovem Mestre olhando para ela com uma expressão nada amigável.

Qiuju ficou confusa. O que havia acontecido? Quem tinha irritado o Jovem Mestre?

Ela pensou por um momento, mas não conseguiu chegar a nenhuma conclusão, então logo deixou o assunto de lado. Falou animada:

— Jovem Mestre, os ramos segundo e terceiro da família mandaram muitos presentes de despedida, e várias senhoras também enviaram coisas. O senhor quer ver?

— Não vou olhar.

Xiao Jingduo não tinha o menor interesse nas intenções de pessoas como Xiao Yufang e Xiao Yuli — aquelas que o ignoraram quando era fraco, mas que agora corriam atrás dele com bajulações. Além disso, a família imperial não era chamada de “família imperial” à toa — eles eram generosos. Os presentes enviados pelo Palácio Oriental eram mais do que suficientes para que ele passasse os próximos três anos com conforto.

Xiao Jingduo achava, em seu íntimo, que a decisão do Príncipe Herdeiro de colocá-lo no Templo Qingyuan, e ainda por cima mandar presentes em nome de gratidão, devia-se em grande parte aos esforços de Rong Ke. Por isso, com pessoas como Rong Ke — que tinham tantas camadas de pensamento — não se devia jogar joguinhos mentais. Se ele tivesse tentado ser esperto naquela hora e realmente guardado a abelha venenosa ou tentado negociar com Rong Ke, a situação agora provavelmente seria muito diferente.

Qiuju acompanhava Xiao Jingduo enquanto ele arrumava suas coisas. Por fim, ela não pôde deixar de suspirar:

— Jovem Mestre, o senhor é tão inteligente... por que precisa ter uma vida tão difícil? Mesmo sendo um templo real, não vai ter ninguém lá para servi-lo. Vai ter que fazer tudo sozinho. Quanto sofrimento isso vai trazer!

Xiao Jingduo sorriu levemente, sem saber se devia rir ou chorar por estar sendo chamado de inteligente por Qiuju.

Qiuju não entendeu o motivo do sorriso sem explicação de Xiao Jingduo. Ela ainda estava imersa na tristeza da despedida. Qiuju, no início, achava cruel mandar um jovem são e salvo para um templo, mas como era uma ordem do Príncipe Herdeiro, acabou achando que devia ser algo bom. No fim, ela mesma não sabia se essa jornada era boa ou ruim para Xiao Jingduo.

Finalmente, Qiuju soltou um longo suspiro e forçou um sorriso ao dizer:

— É bom ir embora. Pelo menos, o senhor não vai mais precisar se preocupar com essas confusões de casa. Mesmo que a Senhora saiba, com certeza ficará feliz.

Ao ouvir essas palavras, Xiao Jingduo, que até então estava ansioso para partir, também ficou cabisbaixo. Depois de um longo tempo, respondeu:

— Não estarei aqui para te proteger nesses três anos, então você precisa se cuidar. Não se destaque em nada, tente ficar o máximo possível dentro do Pátio Qingze. Sua cabeça não vai conseguir vencer a dos outros.

— Tá bom...

Qiuju assentiu, olhando para Xiao Jingduo com olhos brilhantes:

— Jovem Mestre, eu sei que o senhor tem grandes ambições. Quando voltar, com certeza será uma pessoa completamente diferente. Isso é maravilhoso. A falecida Senhora e eu estamos esperando por esse dia!

Qiuju pensava com certa amargura que, se Zhao Xiulan soubesse disso lá do outro mundo, ficaria em paz.

O Templo Qingyuan ficava no Monte Zhongnan, construído na encosta da montanha, com pátios sobrepostos, bambuzais e árvores densas, exalando uma atmosfera profunda de zen. Quando Xiao Jingduo chegou, os sinos do templo ecoavam suavemente pelas montanhas. O ar puro e fresco da montanha, misturado com o aroma de incenso, acalmou imediatamente seu coração.

As pessoas da Mansão do Marquês Dingyong acompanharam Xiao Jingduo até o salão para visitar o monge-chefe do templo. Um jovem monge informou que o mestre estava em oração matinal. Eles se curvaram diante da sala de meditação e foram conduzidos por esse jovem monge.

Ele levou Xiao Jingduo até o quarto de hóspedes, fez uma reverência com as mãos juntas e se retirou. Os criados da mansão ajudaram a descarregar as coisas. Como não era apropriado que ficassem muito tempo, despediram-se de Xiao Jingduo e foram embora.

Depois que todos se retiraram, Xiao Jingduo finalmente teve tempo para examinar o lugar onde passaria os próximos três anos. O quarto de hóspedes não era particularmente grande, com mobília simples. Fora uma cama, uma mesa e um divã, não havia mais nada — mas os pertences de Xiao Jingduo estavam espalhados pelo chão. Parado naquela sala silenciosa de meditação, ele podia ouvir o som do vento soprando pelas folhas de bambu.

Pelos próximos três anos, será aqui que vou viver...

Xiao Jingduo tomou fôlego e se preparou para sair e buscar água, depois organizar o quarto com calma. Quando estava voltando, antes mesmo de chegar à hospedaria, ouviu dois jovens monges conversando na esquina:

— É naquele quarto de hóspedes que vai ficar a pessoa mencionada pelo Príncipe Herdeiro?

— Sim.

— O Mestre Mingjue disse que o carma de morte dessa pessoa é pesado demais. Por que o monge-chefe e o mestre ainda assim permitiram que ele ficasse aqui

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Nota da autora:

Ceninha extra:

Parabéns a Xiao Jingduo por completar a fase e conquistar a conquista [Sair Vivo da Mansão do Marquês Dingyong]. A fase "Mansão Dingyong" está encerrada.

Próxima fase: Templo Qingyuan.

O Sistema do Primogênito lembra: aproveite o tempo no Templo Qingyuan para cultivar seus pontos de habilidade.

A fase "Mansão Dingyong" estará sempre esperando para você voltar e dominar.



Capítulo 26 — Crescimento

Xiao Jingduo reuniu suas energias e planejou sair para buscar água, depois limpar o quarto a fundo. Quando voltou, antes mesmo de se aproximar de sua morada, ouviu dois jovens monges conversando atrás da esquina.

— A pessoa confiada pelo Príncipe Herdeiro está hospedada naquele quarto de hóspedes.

— Sim.

— O Mestre Mingjue disse que o carma de matança dele é muito pesado. Por que o abade e o mestre ainda permitiram que alguém assim ficasse aqui?

— Talvez seja... ah, Patrono Xiao — disse um dos noviços, cutucando o companheiro, e ambos se viraram para cumprimentar Xiao Jingduo.

Xiao Jingduo respondeu com um aceno de cabeça. Os dois noviços disseram:

— Ainda temos estudos a fazer, então não tomaremos mais do seu tempo. Com licença, Patrono Xiao. Cuide-se.

Os dois jovens se afastaram rapidamente, como se ele estivesse realmente contaminado com um carma de matança imperdoável. Xiao Jingduo olhou ao redor e percebeu que outros monges e clérigos também evitavam aquela área sempre que podiam. Mesmo quando cruzavam com ele, embora mantivessem atitudes gentis e educadas, havia um certo distanciamento e rejeição.

Xiao Jingduo suspirou. Ele também estava confuso. O Mestre Mingjue era um monge de alta reputação, conhecido em todo o mundo. Não era alguém que falasse levianamente ou criasse problemas sem motivo. Então por que ele teria dito que o carma de matança de Xiao Jingduo era tão pesado, a ponto de se recusar a compartilhar o mesmo espaço?

Depois de limpar novamente sua morada, o sol já se punha no oeste. Um jovem noviço colocou a refeição vegetariana sobre a mesa, fez uma breve reverência com as mãos unidas e saiu às pressas, como se não quisesse manter muito contato.

Diante dessa situação, Xiao Jingduo só pôde se consolar: Com o tempo, a natureza das pessoas se revela. Ele não levou para o lado pessoal o leve desprezo dos moradores do Templo Qingyuan. Após terminar a refeição, à luz da lamparina, começou a copiar sutras budistas para sua mãe.

Apesar de já ter copiado diversos volumes, na verdade, Xiao Jingduo não compreendia o conteúdo. Ele nem mesmo reconhecia todos os caracteres. Aprendera alguns ideogramas comuns nos livros de medicina, mas esse conhecimento era disperso, e ele nunca havia estudado de forma sistemática. Finalmente tivera a chance de aprender com Chu Shuxin, mas, após poucos meses, Zhao Xiulan adoeceu devido às provocações de Wu Junru. Na época, ele precisou cuidar da mãe e, ao mesmo tempo, manter-se atento a Wu Junru, o que o deixou sem energia para os estudos. Depois que Zhao Xiulan faleceu, em abril daquele ano, Xiao Jingduo abandonou completamente os livros para cumprir o período de luto. Na verdade, era a primeira vez em meses que conseguia sentar-se em paz para copiar textos e praticar caligrafia.

Muitos sutras budistas eram traduções do sânscrito, com significados profundos e obscuros, além de conterem inúmeros caracteres raros. Xiao Jingduo só havia estudado o Clássico dos Mil Caracteres, o Clássico da Piedade Filial e os Quatro Livros, o que estava longe de ser suficiente para compreender os sutras. Então, embora copiasse com dedicação, ele não compreendia o sentido — fazia apenas um trabalho mecânico e básico.

Depois de terminar uma página, colocou o pincel de lado. Estava alongando o pulso quando ouviu o som suave de monges entoando sutras do lado de fora.

Xiao Jingduo permaneceu sentado por um momento, depois deixou o pincel e caminhou em direção ao leste.

O Templo Qingyuan era vasto, com pátios sobrepostos e mais de mil cômodos. A área leste era onde os monges viviam, estudavam, recitavam sutras e prestavam culto a Buda. Não recebia visitantes externos. A parte oeste era destinada a hóspedes e tarefas diversas.

Xiao Jingduo morava na ala oeste. Seguindo o som, atravessou vários pátios até chegar ao local onde os noviços recitavam sutras. Com seu excelente senso de direção, logo encontrou o salão principal. Muitos monges estavam sentados, entoando preces e marcando o ritmo com o peixe de madeira, sob a liderança do abade. Sem ousar interromper, Xiao Jingduo ficou do lado de fora do salão, tentando memorizar os sutras que eram recitados.

A lição noturna só terminou quando já estava escuro. Xiao Jingduo voltou primeiro e, ao chegar em seu quarto, pegou o livro de sutras que os monges haviam recitado e tentou reconhecer palavra por palavra.

Ele tinha uma leve sensação de que seu comportamento poderia ser considerado aprendizado não autorizado, mas como ninguém no templo parecia se importar, continuou, sem vergonha alguma. Esse estilo de vida persistiu por muito tempo. Durante o dia, ouvia os monges recitando; à noite, tentava reconhecer os caracteres com base na memória. Embora fosse um método difícil, gota a gota, forma-se o oceano, e ele começou a aprender muitos ideogramas raros.

Certa noite, enquanto ainda decifrava os caracteres à luz da lamparina, ficou tão concentrado que se esqueceu do ambiente ao redor. Quando finalmente percebeu algo estranho e levantou o olhar, viu um mestre vestindo uma kasaya sorrindo para ele.

Xiao Jingduo se assustou e levantou-se rapidamente:

— Saudações, Mestre Mingjue.

Mingjue era justamente o monge que havia o criticado por carregar um carma de matança muito pesado.

Mingjue juntou as palmas e fez uma reverência, depois disse:

— Este pobre monge viu que a luz em seu quarto permanecia acesa por muito tempo e, ousadamente, veio verificar. Não esperava interromper seus estudos. A culpa é minha.

— O senhor é gentil demais, mestre. Eu perdi a noção do tempo. Posso perguntar... minha luz atrapalhou o descanso dos outros mestres?

— De forma alguma — respondeu Mingjue, olhando para o sutra nas mãos de Xiao Jingduo com interesse. — Não esperava que um patrono tão jovem já tivesse tanta dedicação aos ensinamentos budistas. Quais sutras você conhece bem?

— Mestre, o senhor está sendo muito generoso. Nem sequer reconheço todos os caracteres, quanto mais compreendê-los — disse Xiao Jingduo com um sorriso amargo.

— Os sutras budistas são traduções do sânscrito. Este volume, Oferenda de Alimentos Mengshan, é profundo demais para iniciantes. Se quiser começar, recomendo o Sutra do Coração.

— Entendido — respondeu Xiao Jingduo, surpreso e honrado.

— Quais caracteres você ainda não reconhece? Este humilde monge pode explicar alguns — disse Mingjue com as mãos unidas, gentilmente.

Xiao Jingduo arregalou os olhos, incrédulo. Quando se deu conta, afastou-se rapidamente e apresentou o sutra ao Mestre Mingjue:

— Agradeço muito por sua orientação, Mestre.

Fiel à sua reputação, após as explicações de Mingjue, a mente de Xiao Jingduo clareou, e muitos pontos antes obscuros se tornaram compreensíveis. Mingjue permaneceu até a meia-noite explicando os sutras. Ao acompanhá-lo até a saída, Xiao Jingduo se sentia muito culpado:

— Tenho usado as luzes do templo para ler sem permissão e o atrapalhei até essa hora. Estou verdadeiramente envergonhado.

— Patrono, seu empenho e sua piedade filial são virtudes. Por que se envergonhar? — disse Mingjue. — Estudar sozinho nem sempre é o melhor caminho. Se quiser realmente aprender os sutras, por que não participa das aulas matinais com os monges? De manhã, o abade e outros mestres explicam histórias budistas e seus significados profundos. Isso pode ser muito útil para você.

Xiao Jingduo ficou ainda mais grato e fez uma profunda reverência:

— Muito obrigado, Mestre.

Com a permissão especial de Mestre Mingjue, finalmente pôde entrar e sair livremente do pátio leste. Todas as manhãs, assistia às aulas e recitava sutras com os noviços. À tarde, enquanto eles meditavam, ele voltava ao quarto para copiar textos e praticar a escrita. Sempre que o papel estava prestes a acabar, um novo maço aparecia no dia seguinte. Xiao Jingduo ficava constrangido — papel e tinta não eram baratos. Já estava sendo hospedado, e agora ainda consumia recursos do templo. Sentindo-se incomodado, ofereceu-se para ajudar os noviços a buscar água.

Dois meses se passaram assim. Ele ficou mais próximo dos noviços, e estes já não o evitavam como no início. Com o tempo, até brincavam com ele.

Certa noite, enquanto Xiao Jingduo revisava os estudos, ouviu uma batida suave na porta.

Era o Mestre Mingjue.

— O empenho do patrono é admirável — disse Mingjue com um sorriso, parado do lado de fora do quarto.

Xiao Jingduo ficou sem graça. Se não soubesse que o Mestre Mingjue não era esse tipo de pessoa, pensaria que ele estava sendo irônico. Durante esse tempo, ninguém o supervisionava, e ele podia organizar sua própria rotina. Passava o dia vagando pelo templo e, à noite, acendia a lamparina para ler, consumindo sabe-se lá quanto óleo. Tentou várias vezes oferecer dinheiro em compensação, mas os noviços que traziam suas refeições sempre recusavam.

Xiao Jingduo era verdadeiramente grato por aquele lugar tão tolerante e acolhedor.

Mestre Mingjue fez algumas perguntas casuais sobre os sutras, e Xiao Jingduo respondeu fluentemente a todas. Mingjue assentiu com satisfação e suspirou:

— Patrono, você esteve no Templo Qingyuan por tão pouco tempo, mas sua base já é mais sólida do que a de noviços que praticam há um ano. Este humilde monge se sente envergonhado.

Xiao Jingduo corou levemente:

— Só decorei. Ainda há muitas partes que só entendo pela metade.

Mesmo com as palestras diárias dos mestres, não era fácil para Xiao Jingduo compreender tudo plenamente. Mas ele sempre fora rígido consigo mesmo. Qualquer conteúdo abordado nas lições matinais, entendesse ou não, ele memorizava por completo. Assim, não demonstraria fraqueza diante do Mestre Mingjue.

— A determinação do patrono é firme, e ele é extremamente aplicado. Isso é realmente raro — suspirou Mingjue. — Este humilde monge tem algum conhecimento das escrituras budistas. Se o patrono não se importar, pode me trazer, da próxima vez, os sutras que não entender.

— Obrigado, Mestre. — Desta vez, Xiao Jingduo foi mais esperto e aceitou a oferta sem hesitar.

Ele estava extremamente animado e sentia como se finalmente estivesse sendo reconhecido. Antes, quando o Mestre Mingjue o havia criticado por carregar pecados de morte muito pesados, Xiao Jingduo tentara convencer a si mesmo a não se importar, mas ainda assim se sentia constrangido, especialmente por estar no templo onde o mestre residia. Desde que entrara no Templo Qingyuan, vinha sendo quase severo demais consigo mesmo, apenas para provar que não era alguém marcado por tais pecados. Felizmente, o céu recompensa o esforço, e seus empenhos não foram em vão.

No início, Mestre Mingjue e os monges do templo apenas observavam Xiao Jingduo à distância, pretendendo avaliar seu caráter. Dia após dia, Xiao Jingduo ouvia os cantos dos sutras, voltava ao quarto para estudar e lia até tarde da noite. Mingjue admirava sua diligência e sua piedade filial para com a mãe, por isso lhe deu uma oportunidade de se juntar aos noviços nas lições matinais. Ao longo desses meses, embora Mingjue não aparecesse com frequência, sempre prestava atenção às ações de Xiao Jingduo. Quando percebeu que ele era ainda mais esforçado que os próprios monges do templo, finalmente se comoveu.

As oportunidades são sempre deixadas para os inteligentes e diligentes. Com a perseverança e determinação de Xiao Jingduo, mesmo que houvesse ódio em seu coração, Mingjue estava disposto a lhe estender a mão.

Mingjue recitou silenciosamente o nome de Buda em seu coração. Buda é misericordioso; esperava que este período no Templo Qingyuan suavizasse a ferocidade de Xiao Jingduo e impedisse que ele cometesse grandes pecados de morte no futuro.

Xiao Jingduo ouvira muitas vezes as pessoas dizerem que os templos eram bons lugares para o cultivo interior, mas antes não acreditava. Achava que, se tivesse determinação, poderia se aprimorar em qualquer lugar. Só depois de viver no templo foi que teve de admitir: de fato, era diferente.

O templo era frequentado por estudiosos e letrados. De tempos em tempos, grandes eruditos confucionistas vinham debater ideias com os monges superiores. Mesmo os jovens noviços à beira do caminho eram alfabetizados e passavam o dia todo cercados por escrituras. Esse ambiente era verdadeiramente propício aos estudos. Vale lembrar que os tempos caóticos haviam terminado recentemente, e a nova dinastia ainda estava se estabilizando. A maioria das pessoas fora dos templos era analfabeta, então estar em um ambiente repleto de pessoas instruídas era algo de enorme valor para Xiao Jingduo.

Seguindo o Mestre Mingjue, os horizontes de Xiao Jingduo se elevaram imediatamente, e seu conhecimento antes superficial começou a se aprofundar. O templo tinha uma vasta coleção de livros, e ele passava a maior parte do tempo ali. Certa vez, enquanto copiava um texto, um mestre viu sua caligrafia e não conseguiu suportar — teve de instruí-lo pessoalmente. Xiao Jingduo sabia que nunca havia recebido treinamento formal em escrita, e sua caligrafia era considerada pobre entre os especialistas. Por isso, aceitou a crítica com tranquilidade e passou a praticar ainda mais em segredo.

Vale dizer que praticar caligrafia não era algo barato. Xiao Jingduo estava morando e comendo de graça no Templo Qingyuan e, agora, ainda usava seu papel, tinta e pincéis. Sentia-se culpado por dentro, então tomou a iniciativa de perguntar ao Mestre Mingjue:

— Mestre, há algo em que eu possa ajudar o templo?

Mingjue apenas sorriu:

— Não é necessário.

E não era apenas cortesia. O Templo Qingyuan era um templo real. Além das generosas doações anuais da família imperial, o templo possuía muitas terras, arrendatários e servos. Essas pessoas dependiam do templo e só pagavam tributos a ele, então o Templo Qingyuan não sofria por falta de recursos — muito menos com as pequenas despesas geradas por Xiao Jingduo.

Mesmo assim, Xiao Jingduo insistiu. A indiferença de Mingjue era problema do mestre, mas retribuir era responsabilidade dele próprio. Xiao Jingduo nunca confundia essas duas coisas. Vendo sua persistência, o mestre cedeu:

— Já que insiste, então venha comigo amanhã até a enfermaria e me ajude com algumas tarefas triviais.

Ao ver a expressão de Xiao Jingduo, Mingjue achou estranho:

— O que foi?

Xiao Jingduo não sabia se estava mais surpreso por o templo ter uma enfermaria ou por o próprio Mestre Mingjue tratar pacientes. Hesitou e perguntou, curioso:

— Mestre, o senhor também entende de medicina?

— Não diria que entendo, apenas consigo tratar pessoas comuns. Muitos no templo conhecem medicina, e há vários melhores do que eu — respondeu Mingjue com um sorriso. — A enfermaria é, em sua maioria, voltada para os pobres. Muitos já estão doentes há muito tempo e sem tratamento, tornando-se casos terminais, e muitos são contagiosos. Se não quiser ir, pode dizer.

— Não, Mestre, eu quero ir — respondeu Xiao Jingduo. — Quando eu era pequeno, passei um tempo com meu avô materno, que era um médico conhecido na região. Então tenho algum conhecimento sobre remédios comuns. Ajudá-lo seria algo muito adequado para mim.

Mingjue também ficou surpreso ao saber desse passado e assentiu:

— Isso é muito bom.

A maioria dos templos possuía enfermarias. Como diz o ditado, “não há filhos piedosos diante de um leito prolongado de enfermidade.” Quando as famílias não podiam ou não queriam mais cuidar de parentes doentes, enviavam-nos aos templos próximos. Os templos dispunham de pátios específicos para abrigar esses pacientes, e monges com habilidades médicas os tratavam regularmente. O lugar onde Mingjue levou Xiao Jingduo era justamente a enfermaria do Templo Qingyuan.

Havia muitos quartos no pátio, cada um com vários pacientes. A maioria era magra, com rostos amarelados — claramente pessoas pobres sofrendo de doenças. Ainda assim, muitos se esforçavam para se levantar e cumprimentar Mestre Mingjue assim que ele entrava.

Mingjue sorria e acenava para todos. Entrou primeiro no cômodo oeste e, sem se importar com a poeira no chão, ajoelhou-se para verificar o pulso de um paciente. Xiao Jingduo o seguiu de perto. Por ter visto seu avô tratar pacientes na infância, estava familiarizado com o processo. Muitas vezes, antes mesmo de o Mestre Mingjue pedir algo, Xiao Jingduo já lhe entregava o que era necessário.

Passaram o dia inteiro na enfermaria, só saindo ao anoitecer. Caminhando pela trilha da montanha, Mingjue perguntou:

— Muitos dos que estavam hoje na enfermaria não eram pacientes comuns. Tinham doenças altamente contagiosas. Ficar ali por muito tempo pode fazer com que você contraia algo. Você não tem medo?

— Não tenho. Venho de uma família de agricultores, sei como a vida é difícil para o povo comum. Agora que tive a sorte de ser acolhido pelo Templo Qingyuan, sinto-me honrado por poder fazer algo por todos.

Mingjue apenas assentiu, sem dizer mais nada. Havia nevado há alguns dias, e a luz clara da lua refletida na neve deixava o mundo puro e nítido, o tempo passando em silêncio. Xiao Jingduo seguia, passo a passo, ao lado de Mingjue pela trilha coberta de neve.

Muitos anos depois, quando muitos detalhes do passado já estivessem borrados, Xiao Jingduo ainda se lembraria daquela noite nevada, daquela trilha silenciosa na montanha. Haviam acabado de sair da enfermaria. O céu nevava, a estrada estava escorregadia. Mingjue era velho e frágil, não ousava andar depressa, então Xiao Jingduo acompanhava seu benfeitor, caminhando devagar pelo pequeno caminho.

Não era exagero dizer que o Mestre Mingjue — ou melhor, o Templo Qingyuan — foi como um segundo pai para Xiao Jingduo. O tempo parecia ter parado nas montanhas, e foi nesse ambiente que ele passou seu luto de três anos.

Ao pé da Montanha Zhongnan, logo pela manhã, a fumaça das chaminés subia de muitos quintais de camponeses, e sons metálicos ecoavam aqui e ali. Um homem com aparência de caçador tratava peles de animais no quintal. Sua esposa cozinhava, resmungando sem parar:

— Eu fico aqui preocupada com você, e quando volta, nem me avisa primeiro, vai logo ajudar a viúva Lin. Me diga, cansou desta casa? Se não quer mais ficar, diga logo. Podemos nos separar agora mesmo. Acha que ainda vou te mimar?

— Já falei que não é isso. Para de inventar coisa. — O caçador, ao ouvir falar de separação, também se irritou. Ia dizer mais alguma coisa quando viu uma figura surgir dobrando a trilha da montanha. O recém-chegado vestia roupas brancas simples, era alto e esguio, e parecia carregar algo. Apenas pela silhueta, já se via que era um jovem bonito.

O caçador sibilou para a esposa:

— Para com isso, o Jovem Mestre Xiao está chegando!

— O Jovem Mestre Xiao?! — Os olhos da mulher brilharam e, na hora, esqueceu da briga com o marido. Imediatamente olhou em direção à montanha.

Quando Xiao Jingduo chegou à casa do caçador, percebeu que o clima estava estranho, mas achou que era apenas uma briga doméstica e não deu importância. Em vez disso, sorriu e disse ao caçador:

— Tio Li, vai à cidade esses dias?

— Sim, sim, estou indo para Chang’an vender peles. O Jovem Mestre Xiao pegou mais algum animal raro nas montanhas?

— Nada disso — respondeu Xiao Jingduo com um sorriso. — Capturei algumas raposas nos meus momentos livres. Não tenho utilidade para elas, então pensei em deixá-las com o Tio Li.

— Raposas? — Os olhos do caçador brilharam. Ele pegou o saco das mãos de Xiao Jingduo e tirou as raposas bem amarradas de dentro, elogiando sem parar: — Céus, os nobres de Chang’an adoram essas coisas. Esta aqui tem a pele inteira, vai render um bom preço. Ah, essa ainda está viva!

Depois de examinar os animais, o caçador esfregou as mãos e começou a negociar o preço com Xiao Jingduo. Vivendo nas montanhas, não era conveniente para Xiao Jingduo ir até a cidade, então ele recorria ao caçador do sopé da montanha para levar algumas coisas por ele até lá. Em troca, vendia a caça capturada para ganhar algum dinheiro de bolso.

O caçador propôs um valor, e Xiao Jingduo assentiu, concordando. Ele caçava mais para treinar suas habilidades do que por dinheiro. Além disso, vivia no Templo Qingyuan, onde alimentação e hospedagem eram garantidas. Somando-se a isso os presentes enviados pelo Príncipe Herdeiro três anos atrás, Xiao Jingduo agora tinha uma situação financeira bem melhor do que antes.

Por isso, ele se importava ainda menos com o valor oferecido pelo caçador.

Enquanto o caçador examinava as raposas com entusiasmo, sua esposa olhava disfarçadamente para Xiao Jingduo. Fazia só alguns dias que não o via... como é que o Jovem Mestre Xiao parecia ainda mais bonito?

Nos últimos anos, Xiao Jingduo se tornara bastante conhecido na região. Todos ao pé da montanha sabiam que um jovem de Chang’an estava vivendo no Templo Qingyuan e oferecendo tratamento médico gratuito. Ele descia a montanha com frequência, e se alguém tivesse dor de cabeça ou febre, podia chamá-lo. Ele não só tratava gratuitamente, como trazia ervas das montanhas na visita seguinte. Além disso, conforme Xiao Jingduo crescia, tornava-se mais alto, e seus traços amadureciam, revelando um ar cada vez mais refinado, belo e imponente como jade. Todos apreciam a beleza, e gradualmente a reputação de Xiao Jingduo cresceu. Primeiro, eram as esposas e mulheres que falavam sobre ele. Depois, até os homens, ao ouvirem tais comentários, criaram certa antipatia. Mas, ao verem como ele tratava os doentes e dominava bem a caça, os homens do vilarejo também precisaram admitir que Xiao Jingduo era realmente uma pessoa de valor.

A esposa do caçador já nem lembrava mais do marido. Convidou Xiao Jingduo calorosamente a entrar, correu para buscar água para ele. Mas Xiao Jingduo ainda tinha tarefas no alto da montanha e não podia demorar, então recusou educadamente a hospitalidade e logo voltou a subir.

Ele havia aprendido a caçar por necessidade. Todos os monges do Templo Qingyuan eram vegetarianos e evitavam carne. Xiao Jingduo podia aguentar isso por um ou dois meses, mas a longo prazo, acabaria enlouquecendo. Por isso, tomou a iniciativa de aprender com os caçadores do vilarejo — era para seu próprio bem. Depois, com o aprimoramento das técnicas de caça, passou a ter excedente para trocar por dinheiro. A essa altura, saciar o apetite tornou-se algo secundário; o mais importante era o treinamento prático.

De fato, a dinastia Xuan valorizava o poder marcial. Da família imperial aos ministros e ao povo comum, todos se orgulhavam de serem corajosos e habilidosos em combate. Os duzentos anos que antecederam a dinastia Xuan foram um período caótico. O povo precisava de força para se defender de bandidos e soldados renegados; já os nobres e senhores da guerra dependiam de poder militar para proteger seus territórios — ou mesmo conquistar outros. A família Rong, do Duque de Xuan, era o melhor exemplo disso: tomaram Chang’an com força militar, eliminaram outros senhores da guerra e pacificaram o país. Conhecida por sua beleza e bravura, a família Rong se orgulhava disso e constantemente exibia suas habilidades em torneios de polo e arqueirismo, mostrando ao mundo sua excelência em equitação e artes marciais. Com essa origem forjada na guerra e o incentivo da família real, a cultura da dinastia Xuan tornou-se extremamente combativa. Homens rústicos ou jovens delicadas, todos tinham pavio curto e estavam prontos para brigar por qualquer coisa.

Nesse ambiente, Xiao Jingduo naturalmente priorizava o aprimoramento de suas habilidades marciais. O Templo Qingyuan era sereno e elegante, com todos falando em voz baixa e agindo com calma. Por isso, ele só podia treinar fora. Embora nunca tivesse estudado artes marciais de forma sistemática, seus anos de caça nas montanhas o ensinaram técnicas práticas e diretas de combate, o que tinha grande valor.

Logo, Xiao Jingduo subiu a montanha sem sequer suar. Os monges do Templo Qingyuan o cumprimentaram com sorrisos. Um jovem noviço correu até ele, sorrindo, e disse:

— Jovem Mestre Xiao, a família que você tratou da última vez subiu a montanha para trazer um presente de agradecimento. Como você não estava, esperaram bastante antes de irem embora.

Xiao Jingduo sorriu.

— Está me provocando de novo. Foi o Mestre Mingjue quem os curou. Como posso aceitar o mérito?

Durante esses três anos, Xiao Jingduo estudou e praticou caligrafia sob orientação do Mestre Mingjue, ajudando ocasionalmente na enfermaria. No primeiro ano, ele só auxiliava, mas depois passou a tratar casos simples sozinho. Xiao Jingduo se arrependia de não ter aprendido medicina com seu avô materno, mas acabou suprindo essa lacuna no Templo Qingyuan. O templo estava repleto de monges com conhecimentos médicos, e com a orientação de Mingjue, Xiao Jingduo rapidamente aprendeu as teorias médicas que havia perdido. Com os livros deixados por seu avô, ele agora tinha uma base sólida. Embora não ousasse se comparar a médicos imperiais ou curandeiros milagrosos, ele era mais do que capaz de tratar doenças comuns das pessoas do vilarejo.

O noviço sabia que aquelas eram apenas palavras educadas, então não discutiu.

— Tá, tá, não quero ouvir seus agradecimentos. O Mestre Mingjue pediu para você ir vê-lo quando voltasse. Melhor ir logo.

Ao ouvir que o mestre o havia chamado, Xiao Jingduo não ousou demorar e se dirigiu imediatamente à sala de meditação de Mingjue.

O mestre estava sentado, recitando sutras. Ao ver Xiao Jingduo entrar, fechou o livro devagar e apontou para a esteira de palha à sua frente:

— Sente-se.

Xiao Jingduo obedeceu, sentando-se com postura reta.

— Mestre, por que me chamou?

Mestre Mingjue o observou atentamente e suspirou:

— Você chegou ao Templo Qingyuan no segundo ano de Qiyuan. Agora estamos no quinto. Sem perceber, já se passaram três anos.

Xiao Jingduo também ficou sério. Tinha um pressentimento, e antes que pudesse perguntar, Mingjue continuou:

— Seu luto de três anos chegou ao fim. Ontem, o Marquês de Dingyong enviou uma carta convocando seu retorno.

Xiao Jingduo suspirou. Não estava surpreso, mas tampouco animado. Sentia-se dividido. Havia tanto que queria dizer a Mingjue, mas no fim apenas se prostrou profundamente, prestando uma reverência solene.

— Mestre, sua bondade para comigo é como a de um segundo pai. A graça que o senhor e o Templo Qingyuan me concederam, Xiao Jingduo jamais esquecerá.

Mestre Mingjue olhou para o jovem inteligente e determinado à sua frente, tomado por emoções complexas. Não pediu que ele se levantasse e, em vez disso, disse:

— Lembra-se do que eu lhe disse há três anos?

— Claro que sim.

— Quando li seu rosto naquela época, vi um traço de sangue, e soube que você causaria muitas mortes no futuro. A princípio, hesitei em aceitá-lo, mas o abade e eu vimos que sua mente era firme, pura e piedosa, então abrimos uma exceção. Lembre-se: não importa para onde seu caminho o leve, nunca vá contra sua consciência. Jamais quebre o voto que fez ao entrar no templo. Se conseguir isso, já será um mérito para o Templo Qingyuan.

Xiao Jingduo encostou a testa no chão.

— Este discípulo gravará suas palavras no coração e jamais se esquecerá.

— Muito bem. Já está tarde, e você deve partir cedo amanhã. Vá arrumar suas coisas.

Partir amanhã...? Xiao Jingduo ficou surpreso. Levantou o rosto, confuso, mas viu que Mingjue já havia fechado os olhos, deixando claro que não queria mais conversar. Só pôde se levantar e sair. Antes de ir embora, deu uma última olhada para o Mestre Mingjue.

Ele amava profundamente aquele lugar sereno e puro, e era imensamente grato ao mestre respeitado. Mas sabia que nada daquilo lhe pertencia. Um dia, teria de voltar a Chang’an, à Mansão do Marquês de Dingyong — àquele lugar repleto de intrigas, escuridão e ódio.

Na manhã seguinte, Xiao Jingduo partiu em silêncio, sem incomodar ninguém. A mansão havia enviado dois criados para buscá-lo. Eles o aguardavam com uma carruagem na entrada do templo. Ao vê-lo, correram para recebê-lo:

— Jovem Mestre, sua bagagem já foi carregada. Gostaria de entrar na carruagem?

— Não é preciso — disse ele, acenando, e montou diretamente num cavalo.

Sentado, lançou um último olhar ao Templo Qingyuan.

Os pavilhões em camadas, o incenso flutuando no ar, a luz da manhã tocando os beirais do Salão do Buda — tudo parecia ainda mais radiante, como um paraíso na terra.

Xiao Jingduo virou o rosto, sem mais hesitar. Cravou os calcanhares no flanco do cavalo:

— Hyah!

Galopou pela trilha da montanha. Atrás dele, os sinos do Templo Qingyuan começaram a soar — longos, tranquilos, ecoando pelo vale.

Xiao Jingduo sabia que aquele era o adeus silencioso de todos no templo.

A nebulosa Montanha Zhongnan ficou para trás, dando lugar à capital imponente: Chang’an.

Chang’an. A Mansão do Marquês de Dingyong. Xiao Ying. Wu Junru — ele estava de volta.


Capítulo 27 – Fantasmas e Demônios
Xiao Jingduo cavalgava às pressas pela estrada até puxar as rédeas do cavalo no portão da cidade. Chang’an continuava magnífica e imponente, com pessoas indo e vindo sem parar. Os guardas da cidade, completamente armados, mantinham-se vigilantes e austeros, observando atentamente cada pessoa que entrava.
Era agora o quinto ano da era Qiyuan, seis anos desde a fundação da Dinastia Xuan. Durante esses seis anos, os senhores da guerra regionais haviam sido derrotados um a um pelo clã imperial Rong. No ano anterior, o Rei de Yi’an, em Lingnan, fora vencido e se rendera. A partir de então, a Dinastia Xuan unificou os territórios Han, alcançando a primeira unificação do império em duzentos anos.
Com tal poderio militar, o povo do reino não teve escolha a não ser se submeter. Embora o território estivesse unificado, o sustento da população ainda era precário, e o preço do arroz permanecia alto. Anos de guerra haviam deixado os campos em ruínas e o povo deslocado. Agora que os conflitos haviam cessado, era tempo de reconstrução em larga escala. Após subir ao trono, o imperador dedicou atenção especial à agricultura, emitindo um decreto de anistia geral e isentando os impostos por três anos. O povo ficou em júbilo, e a jovem Dinastia Xuan conquistou o apoio popular, gradualmente entrando nos trilhos e se fortalecendo.
Além da agricultura, a nova dinastia também demonstrava ambição notável na seleção de oficiais. No terceiro ano de Qiyuan, o Príncipe Herdeiro propôs, em corte matinal, o sistema de exames imperiais para recrutar talentos de todo o império. O imperador elogiou imensamente a ideia e, no quarto ano, os exames foram realizados na primavera e no outono, permitindo que estudiosos de origens humildes se tornassem oficiais. No início, as pessoas eram céticas, mas quando dois príncipes participaram do exame de outono e conquistaram cargos com base nos resultados, os estudiosos comuns se inspiraram a se inscrever para o exame do quinto ano. Com a família imperial tomando a dianteira, o sistema se difundiu entre o povo. Os preços do papel dispararam em Chang’an, estudiosos deixavam suas casas para estudar, e até crianças de sete ou oito anos recitavam poesia e clássicos. Toda a dinastia exalava um novo vigor.
Com paz no império, foco na agricultura, promoção da educação e valorização do poder militar, esse jovem império começava a alçar voo, demonstrando ao mundo suas ambições crescentes.
Xiao Jingduo havia estado isolado nas montanhas por três anos. Embora tivesse ouvido falar sobre Chang’an pelos moradores do sopé, não passava de boatos. Agora, viajando, ele testemunhava pessoalmente as mudanças e percebia o quanto a nova dinastia era surpreendente. O mais espantoso era que o sistema de exames imperiais havia sido implementado tão rapidamente.
Parado ao pé da muralha de Chang’an, ele olhava para os imponentes portões. Ouviu dizer que o Portão Danfeng era o maior do mundo, e que a praça à sua frente era onde se reuniam os oficiais, capaz de comportar dez mil pessoas. Ele se perguntava quando teria a sorte de presenciar tal cena.
Com os exames abertos, o caminho rumo ao funcionalismo que ele esperava havia cinco anos finalmente poderia começar.
O coração de Xiao Jingduo se enchia de emoção. Sentia-se feliz com a implementação do sistema de exames e admirado com a melhoria de vida dos cidadãos de Chang’an. Ficou ali, esperando sua empolgação passar até que seu coração estivesse calmo como água parada. Ainda assim, a fila para entrar na cidade não havia andado.
Xiao Jingduo não pôde evitar esticar o pescoço para frente. Não havia tanta gente assim — por que a inspeção era tão lenta?
Perguntou a um senhor mais velho na fila, que parecia ser dono de uma loja. O rosto do homem mudou de repente. Olhou ao redor e abaixou a voz:
— Jovem senhor, você deve ser novo em Chang’an. Nos últimos anos, muitos estudiosos como você vieram fazer os exames, então é comum não conhecer bem a cidade. Mas permita-me aconselhá-lo: na capital, sob os pés do imperador, há coisas que se podem dizer... e outras que nem devem ser mencionadas.
Xiao Jingduo ficou surpreso. Fiquei fora por só três anos e já não consigo entender o que o povo fala? Continuou perguntando, e o lojista lhe contou, com ar misterioso:
— Jovem senhor, você é novo em Chang’an e não sabe. Recentemente, muitas pessoas morreram ao sul da cidade. Gente de todo tipo, com diferentes origens e classes sociais... mas todas com marcas de mãos negras no corpo, como se tivessem sido mortas por fantasmas. É assustador. Agora, corre um boato na cidade: o Príncipe Min voltou.
Príncipe Min... Se Xiao Jingduo se lembrava corretamente, quando o imperador subiu ao trono, o fez por meio de um golpe militar repentino. Matou o irmão mais velho, forçou o imperador anterior a abdicar e tornou-se o novo soberano em meio a muita controvérsia. Mesmo com o tempo no trono, os rumores não cessaram. Mais tarde, incapaz de resistir à pressão dos oficiais, o imperador concedeu postumamente ao irmão mais velho o título de Príncipe Herdeiro, com o nome póstumo de “Min” (que significa “lamentável”).
Pelo título póstumo, era evidente que o imperador não sentia culpa por matar o irmão e usurpar o trono. Aquilo era apenas um gesto simbólico para apaziguar a opinião pública.
No entanto, controlar a opinião pública não era tarefa simples. Com as mortes misteriosas em Chang’an, todas marcadas por supostas mãos fantasmagóricas, o povo estava profundamente perturbado. Além de rezar desesperadamente a deuses e budas, começaram a circular boatos sobre o retorno do Príncipe Min.
Alguns diziam que, por ter ascendido de forma desonrosa, o imperador causara a morte injusta do príncipe, que agora retornava com soldados fantasmas para se vingar.
Outros diziam que o Príncipe Min queria que toda Chang’an fosse enterrada com ele, para aliviar sua mágoa.
As versões variavam, mas todas giravam em torno de uma ideia: a família real atual cometeu crimes contra os céus, enfurecendo os espíritos e trazendo calamidades ao povo. Sem conseguir lidar com tantas mortes, a população apavorada só podia se apegar ao sobrenatural. Como resultado, os rumores se espalharam como fogo. Quando a corte imperial tentou reagir, já era tarde demais para silenciá-los.
Mas os membros da corte eram diferentes do povo comum. Enquanto os leigos acreditavam nas histórias de fantasmas, os velhos raposas do palácio não. Estava claro que alguém manipulava tudo por trás, com intenções muito bem definidas. O imperador então ordenou o controle rigoroso nos portões da cidade, com inspeções meticulosas de quem entrava e saía.
Foi por isso que a fila andava tão lentamente.
Quando Xiao Jingduo finalmente entrou na cidade, o sol já estava no alto. Dois criados da Mansão do Marquês de Dingyong lhe perguntaram:
— Jovem mestre, devemos retornar à mansão agora?
— Não é necessário. Voltem vocês. Quero ir até o sul da cidade dar uma olhada — disse Xiao Jingduo, ainda intrigado com os rumores das marcas fantasmas. Por curiosidade médica, estava determinado a ver com os próprios olhos.
Os criados trocaram olhares preocupados. O sul da cidade estava cheio de mortos e talvez... de coisas impuras. Eles não queriam ir. Tentaram dissuadi-lo:
— Jovem mestre, está ficando tarde. A velha madame e a senhora estão esperando na mansão. Devemos voltar primeiro...
Xiao Jingduo ignorou. Virou seu cavalo e seguiu em direção ao sul da cidade. Ao ouvir os chamados atrás, respondeu sem olhar para trás:
— Estou indo para o sul. Se não quiserem, podem voltar.
Como criados, não podiam permitir que o mestre andasse sozinho. Lamentaram internamente, mas foram obrigados a segui-lo. Guiaram a carruagem atrás de Xiao Jingduo, gritando:
— Jovem mestre, vá mais devagar! É perigoso adiante. Deixe-nos ir primeiro!
De fato, como o lojista dissera, a situação ao sul da cidade era sombria. Todos estavam apreensivos, com expressões pesarosas. As ruas estavam assustadoramente silenciosas, nada parecidas com a animada Chang’an. Os poucos que passavam apressavam o passo, temendo serem levados por soldados fantasmas.
Forasteiros como Xiao Jingduo eram ainda mais raros. Assim que apareceu, muitos olhares se voltaram para ele — tanto de moradores quanto de oficiais escondidos.
Xiao Jingduo notou diversas barracas de mingau na rua principal. Apontou, curioso:
— Quem está distribuindo mingau?
O criado olhou e respondeu com orgulho:
— Aquela é a Marquesa que está distribuindo. Desde que começaram as mortes no sul, a senhora teve compaixão dessas pessoas doentes e solitárias. Montou essas barracas, oferecendo mingau duas vezes por dia. Também distribui artemísia. A senhora diz que defumar casas e roupas com ela pode evitar doenças e afastar fantasmas. Sempre que vamos da mansão ao sul, tudo some rapidamente. Nossa senhora foi a primeira a fazer isso, e agora outras também imitam. Copiam até o mingau. Na minha opinião, ela tem o coração de um bodisatva. Já é generoso dar mingau de graça, mas ela ainda se preocupa com a saúde dos pobres, então coloca vegetais selvagens no mingau. Como se chama isso mesmo... ah! 'nutricionalmente balanceado.'
O criado estava cheio de admiração. As pessoas ao redor, ao ouvirem que vinham da Mansão de Dingyong, logo se reuniram para elogiar a generosidade de Wu Junru. Xiao Jingduo achou tudo aquilo risível.
A generosidade de Wu Junru? Se soubessem o que ela já fez comigo, não falariam assim.
Sem interesse em ouvir mais, ele ia entrar quando, de repente, viu alguém do outro lado da rua cambalear e cair no chão, sem conseguir levantar.
A multidão ao redor se dispersou na hora, gritando em pânico:
— Corram! Os soldados fantasmas estão pegando gente!
Os criados da mansão ficaram apavorados. Tremendo, disseram:
— Jovem mestre, vamos embora! O senhor acabou de voltar, não sabe... quem se aproxima desses doentes adoece em até três dias. Sem exceção!
— Absurdo — murmurou Xiao Jingduo, indo rapidamente até a pessoa caída.
Nos últimos anos, visitara com frequência a enfermaria do Templo Qingyuan e vira muitos casos de peste. Com base no que ouviram e descreveram, ele tinha quase certeza: os chamados "soldados fantasmas" eram, na verdade, uma peste — e das que se espalhavam rápido. Por isso tantos haviam morrido. Achava ridículo falarem em fantasmas e espíritos. Anos atrás, quando o curandeiro itinerante não conseguiu curar Zhao Xiulan, dissera que ela estava possuída. Agora, diante dessa praga em Chang’an, médicos que jamais viram algo parecido se apressavam a culpar o sobrenatural. Era puro disparate.
Vendo Xiao Jingduo caminhar diretamente em direção ao doente, as pessoas da Mansão do Marquês de Dingyong ficaram desesperadas de preocupação. Não ousavam se aproximar e só conseguiam gritar repetidamente. Até os transeuntes escondidos nas redondezas gritavam para Xiao Jingduo:
— Volte rápido! Essa doença não tem cura. Não arrisque sua vida!
Xiao Jingduo os ignorou. Aproximou-se depressa do doente, cuidadosamente o virou e então verificou seu pulso.
Aos poucos, a testa de Xiao Jingduo se franziu. Após um longo instante, ele retirou a mão e disse aos servos, pensativo:
— Tragam a caixa de madeira dura da carruagem. Vou aplicar acupuntura nele primeiro.
Os servos ficaram longe, pegaram a caixa da carruagem, mas recusaram-se terminantemente a levá-la até ali.
Não suportando mais, Xiao Jingduo se levantou. Ao se aproximar, a multidão ao redor se dispersou como abelhas, e até os dois servos da mansão recuaram. Xiao Jingduo não deu atenção. Pegou sua caixa médica e, sem hesitar, agachou-se ao lado do paciente para aplicar a acupuntura.
Xiao Jingduo aplicava as agulhas com método. Nesse momento, os parentes do paciente chegaram, se aproximando cautelosamente. Ele lançou-lhes um breve olhar, mas logo voltou à sua tarefa, elevando um pouco a voz:
— Trata-se de um desequilíbrio de calor e umidade, com toxinas invadindo o corpo. Junto com a idade avançada e a saúde fraca do paciente, isso o fez desmaiar na rua. Estou aplicando acupuntura para despertá-lo. Vocês devem levá-lo para casa, preparar comida leve para ele, garantir boa ventilação e deixá-lo descansar bem.
Enquanto falava, Xiao Jingduo tirou uma caneta e escreveu rapidamente uma receita:
— Ainda não compreendo a causa exata da doença, por isso não ouso prescrever nada pesado. Por enquanto, só posso indicar um remédio para fortalecer a saúde em geral. Deve ser tomado duas vezes ao dia, uma tigela pela manhã e outra à noite. Use essa receita para nutrir a saúde dele, e eu mudarei o tratamento assim que descobrir algo melhor.
Depois de escrever, Xiao Jingduo entregou a receita aos parentes do velho. Estendeu a mão, mas por um instante ninguém ousou avançar para pegá-la.
Ele arqueou a sobrancelha, mas ficou em silêncio, esperando que a família respondesse. Felizmente, não demorou. Uma jovem que parecia ser neta do velho se adiantou para pegar a receita, curvando-se para Xiao Jingduo:
— Obrigada, jovem mestre.
Xiao Jingduo assentiu satisfeito. Nesse momento, o paciente começava a recobrar a consciência lentamente. Xiao Jingduo ajudou rapidamente o velho a se levantar, e a neta correu sem hesitar para apoiar o outro braço do avô.
— Cuidado ao levá-lo para casa — disse Xiao Jingduo. — Lembrem-se do que falei. Embora essa receita não cure totalmente a doença, certamente pode atrasar seu avanço por alguns dias.
Ao ouvir as palavras de Xiao Jingduo, a neta ficou radiante:
— Jovem mestre, quer dizer que sua receita pode tratar os soldados fantasmas?
— Que soldados fantasmas? Isso é só uma epidemia comum — Xiao Jingduo desprezou a ideia. Mas como ainda não tinha certeza do tratamento, acrescentou: — Ainda não posso curar essa epidemia, mas se o velho descansar direito e seguir a receita, certamente não vai piorar nos próximos dias.
Mesmo assim, aquilo trouxe alegria. Era a primeira vez que a neta ouvira alguém dizer que a doença podia ser tratada. Seu avô ainda tinha chances de viver. Curvando-se profundamente a Xiao Jingduo, falou com voz embargada:
— Obrigada, jovem mestre. Sua grande bondade e virtude, eu, senhorita Yu, jamais esquecerei.
— Não precisa, só fiz o que devia — disse Xiao Jingduo, indiferente. — Onde vocês moram? Quando eu preparar o remédio, voltarei para trocar o tratamento do seu avô.
A senhorita Yu, emocionada e com lágrimas nos olhos, deu rapidamente as instruções. Depois de memorizá-las, Xiao Jingduo se preparou para partir. Após alguns passos, voltou-se e perguntou:
— Você sabe onde guardam os corpos daqueles que morreram dessa doença? Quero ver com meus próprios olhos o que são essas tais marcas de mãos fantasmas.
A senhorita Yu, ao ver Xiao Jingduo voltar, achou que ele tinha algo a mais a dizer. Surpresa com a pergunta, respondeu, assustada:
— Jovem mestre, não pode! Os soldados fantasmas são extremamente malignos. Se você só estiver doente, ainda há esperança, mas se estiver marcado com uma mão fantasma, a morte é certa. Você não pode ir!
Xiao Jingduo sentiu algo estranho:
— Está dizendo que nem todos que adoecem desenvolvem essas marcas de mãos fantasmas após a morte?
— Sim, dizem que só aqueles que cometeram pecados são levados pelos soldados fantasmas.
Uma luz de entendimento brilhou na mente de Xiao Jingduo, aumentando sua curiosidade sobre essas marcas. Ele insistiu:
— Deixe o resto de lado. Quero só saber onde posso ver alguém marcado com uma mão fantasma.
Vendo que sua tentativa de persuadir era inútil, a senhorita Yu falou relutante:
— Os corpos marcados foram todos recolhidos pelo governo. Até os cadáveres foram levados para a funerária no sul da cidade. Quem está lá dentro não pode sair, e ninguém de fora pode entrar.
Xiao Jingduo suspirou. Sabia que, como as marcas estavam ligadas ao Príncipe Min, a corte não permitiria que os boatos se espalhassem livremente. Um pouco desapontado, despediu-se da senhorita Yu e do avô dela, e continuou pela rua.
Enquanto Xiao Jingduo se aprofundava naquela área da epidemia, os dois servos da Mansão do Marquês de Dingyong quase choravam de medo. Só podiam segui-lo com receio, mantendo distância constante atrás dele.
Xiao Jingduo planejava ir mais longe para observar mais pacientes e estudar essa estranha praga. Contudo, não tinha andado muito quando dois homens o pararam.
Eles vestiam uniformes oficiais, claramente soldados da guarnição responsáveis por patrulhar e manter a ordem. Pareciam surgir do nada, bloqueando o caminho de Xiao Jingduo. Com tom agressivo e inflexível, disseram:
— Você está perturbando a ordem da cidade. Venha conosco.

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