Capítulo 31 – Condição
Lu Heng sabia o que ela queria fazer quando correu até ele, mas não esperava que a senhorita Zhao fosse tão ousada.
Será que ela pensava que, apenas abaixando a cabeça, ele aceitaria?
Ela desejava demais.
Lu Heng disse lentamente:
— Senhorita Zhao, você é filha de um ministro, criada na riqueza. Como poderia se envolver nesse tipo de serviço? Está me lisonjeando demais. Por favor, levante-se.
O coração da terceira senhorita Zhao despencou. Ele recusou. Seria o caso do pai dela tão sério a ponto de nem Lu Heng ousar intervir? Ou estaria apenas se fazendo de difícil, tentando suprimí-la propositalmente?
A terceira senhorita Zhao endureceu o coração e tentou mais uma vez com tudo o que tinha. Agarrou a barra das roupas de Lu Heng, ergueu o rosto e o olhou com súplica:
— Sei que sou filha de um criminoso e não sou digna do Mestre Lu. Esta jovem tem consciência disso, jamais pedirá qualquer posição, nem causará problemas à Senhora Lu no futuro. Se não há falta de servos ao redor do Mestre Lu, então estou disposta a ser uma escrava de um criado, até mesmo alguém que acenda o fogo para cozinhar ao lado do Mestre.
Lu Heng sorriu e deu um passo para trás, sem pressa. A terceira senhorita Zhao sentiu o delicado tecido de brocado escapando entre seus dedos, e seu coração se contraiu com força. Ele não foi rápido, mas ela já não tinha coragem de estender a mão para agarrar a roupa novamente.
Em pouco tempo, muitos ao redor notaram a cena. Uma jovem frágil e bela em desespero, e um Guarda Imperial que puxara o pai dela para o abismo com um único movimento — sempre rendiam muito falatório. Em buscas como aquela, não era incomum que moças e concubinas fossem levadas pelos Guardas. Dada a posição de Lu Heng, ele não precisava de nenhum laço formal. Bastava uma sugestão, e os eunucos que registravam os criminosos apagariam nomes da lista por ele.
Os oficiais controlavam tudo nas esferas superiores; se houvesse uma pessoa a mais ou a menos na lista de familiares femininas, ninguém iria questionar. A maioria achava que Lu Heng estava prestes a aceitar, e por isso evitavam a área onde estavam. Se ele assentisse, aquela jovem se tornaria parte da casa do Mestre Lu. A diferença entre ser filha de um ministro criminoso e uma mulher do Mestre Lu era abissal.
Mas todos subestimaram Lu Heng.
O imperador havia confiado a ele pessoalmente a tarefa de acabar com Zhao Huai, e ele estava prestes a completar a missão. Se aceitasse a filha de Zhao Huai naquele momento, o imperador talvez não o repreendesse por algo tão pequeno — mas sua avaliação sobre Lu Heng certamente cairia. E quanto valia a confiança do imperador? Essas mulheres realmente achavam que podiam competir com a carreira dele?
Sem contar que, em termos de aparência, a terceira senhorita Zhao era apenas uma garota comum. Mesmo que se tornasse uma beldade, ele não estava disposto a comprometer sua carreira por isso.
Naturalmente, esse tipo de pensamento era frio demais. Então, Lu Heng apenas abaixou a cabeça, sorriu para a jovem e disse:
— A senhorita Zhao é cheia de poesia e conhecimento. Como poderia ser alguém que acende o fogo? Agradeço o afeto, mas minha irmã está doente em casa e precisa descansar. No momento, não é conveniente adicionar mais servos. Só posso decepcioná-la.
Ao terminar, Lu Heng virou-se e foi embora, sem qualquer hesitação nos passos. O Guarda Imperial de plantão atrás dele, ao ver que o comandante havia deixado para trás aquele rosto delicado e manchado de lágrimas, ficou momentaneamente chocado.
Então era verdade o boato: o comandante realmente não gostava de mulheres.
Lu Heng ignorou as comoções que se agitavam na mansão Zhao. Sua tarefa estava cumprida. Como aquelas pessoas seriam tratadas a partir dali, e qual destino teriam, não era problema seu. Quanto às suposições inúteis, ele não se importava em refutá-las.
Somente feras não controlam seus desejos. Ele tinha assuntos mais importantes a tratar — o amor vinha depois. Por mais bela que fosse uma mulher, como poderia competir com o poder que transbordava de uma posição de prestígio?
Lu Heng riu suavemente por dentro. Por causa da terceira senhorita Zhao, não pôde deixar de pensar em outra mulher. E se, em vez dela, fosse Wang Yanqing? O que ela faria?
Se Wang Yanqing, com aquele rosto abatido, o implorasse, talvez Lu Heng hesitasse um pouco. Mas no fim, ele não se deixaria abalar. E Wang Yanqing também não usaria o próprio corpo como moeda de troca.
Ela encontraria outra forma. No mínimo, tentaria reduzir o crime de Zhao Huai. Afinal, Zhao Huai era apenas um teste, um homem menor no Ministério dos Ritos. Que valor havia em arriscar tudo por ele em nome do imperador ou dos Guardas Imperiais? Se ela fosse esperta o suficiente, saberia como avançar e morder na hora certa.
O testemunho da esposa e da filha de Zhao Huai já era convincente o bastante. Famílias de estudantes jamais acusariam seu próprio mestre, certo? Se ela realmente conseguisse algo, talvez o imperador até poupasse a vida de Zhao Huai. E mesmo que ele não pudesse mais ser oficial, ao menos poderia envelhecer com tranquilidade em sua terra natal.
Uma pena que Wang Yanqing não tenha nascido na família Zhao — e que a família Zhao não tivesse tanta sorte.
Lu Heng suspirou com leveza e cruzou o limiar da mansão Zhao. A partir daquele momento, Zhao Huai, Ministro dos Ritos, havia se tornado história na capital.
Lu Heng foi até o sul de Fusi para trocar sua roupa de corte e cavalgou até o portão sul, aguardando a entrada no tribunal. As audiências matinais eram um verdadeiro exercício físico: frequentemente tinham que esperar do lado de fora do portão do palácio ainda no horário de Yinshi, enfrentando uma hora no vento frio, até que os tambores soassem e centenas de oficiais civis e militares se alinhassem para entrar na corte pela Porta Celestial.
(Yinshi 寅时 = das 3h às 5h da manhã.)
Os Guardas Imperiais tinham sua própria sala privativa, e Lu Heng foi direto para o lado direito do velho portão após desmontar do cavalo. Os demais já estavam lá e, ao vê-lo, levantaram-se para cumprimentá-lo:
— Mestre Lu.
Com tanto alvoroço na noite anterior, toda a cidade sabia que Lu Heng havia resolvido mais um grande caso. Só não sabiam ainda qual família havia caído nas mãos dele desta vez.
Na sala privativa, os assentos eram organizados conforme a hierarquia. Os oficiais de altos cargos tinham lugares confortáveis e espaçosos. Os demais sentavam-se em fileiras ao fundo, e alguns nem conseguiam lugar — ficavam de pé. Estar de pé nem era o pior, pois havia beirais que os protegiam da chuva e do vento. Já os oficiais de menor patente que ficavam do lado de fora, sem poder falar na corte, tinham que esperar expostos ao vento gelado. E como estavam no fim do ano, suportar o frio da manhã era tarefa dura.
Lu Heng se sentou para tomar chá. Quando esvaziou a xícara, a porta se abriu.
Chen Yin havia chegado. Lu Heng largou a xícara e se levantou para saudá-lo:
— Comandante Chen Du.
Ao ver Lu Heng, o semblante de Chen Yin escureceu ainda mais. Ele lançou um olhar indiferente às roupas de Lu Heng e disse:
— Ouvi dizer que Zhao Huai confessou ontem?
Lu Heng abaixou os olhos e sorriu:
— O Comandante Chen Du está muito bem informado. A glória celestial é grandiosa, e a confissão de Zhao Huai foi apenas uma consequência natural.
Chen Yin cravou os olhos em Lu Heng, que manteve o sorriso e nem se mexeu. Fora cortado com um prego de veludo. Por mais irritado que estivesse, Chen Yin não podia continuar pressionando.
O imperador ainda nem fora informado — e Chen Yin queria correr na frente? Isso não seria o mesmo que suspeitar da própria longevidade?
Chen Yin sentou-se de cara fechada, e Lu Heng, tranquilo, acomodou-se ao lado dele e continuou tomando chá.
O tempo passou, e logo chegou o momento de ir ao tribunal. Os oficiais da sala privativa saíram em direção ao portão sul um por um. Chen Yin não queria ver o rosto de Lu Heng nem mais um segundo. Levantou-se abruptamente, empurrou a porta com força e saiu.
Depois que Chen Yin se foi, Lu Heng finalmente pousou a xícara de chá que vinha segurando há uma hora e se levantou lentamente. Ao sair, deu de cara com os homens da sala privativa da Hanlin. Vários estudiosos estavam à espera e, ao vê-lo, todos pararam.
Lu Heng tomou a iniciativa de cumprimentá-los:
— Primeiro-Auxiliar Yang. Segundo-Auxiliar Zhang. Senhores.
Quando Yang Yingning viu Lu Heng, o sorriso em seu rosto desapareceu, mas ainda assim falou com calma:
— Comandante Lu. Por que não o vi na corte anterior?
Lu Heng estava bem preparado e respondeu serenamente:
— Pedi licença ao imperador e fui a Baoding investigar um caso. Voltei apenas há dois dias. Peço desculpas se causei algum transtorno aos pensamentos do Chefe Auxiliar Yang.
Claro que Yang Yingning não sentia falta de Lu Heng. Na verdade, desejava que ele nunca mais voltasse. Como poderia sentir falta? O que preocupava Yang Yingning era o tipo de jogada que Lu Heng havia feito na Mansão de Baoding. Caso contrário, Zhao Huai já teria confessado há tempos — por que teria mudado de posição de repente?
Yang Yingning observou cuidadosamente o jovem diante dele, jovem o suficiente para ser seu neto. Havia subestimado Lu Heng. Pensava que, ao organizar tudo na capital, estaria seguro. Não esperava que Lu Heng fosse até Baoding e desmantelasse todo o jogo. Embora Yang Yingning ainda não soubesse o que Lu Heng havia tramado sob a investigação aparentemente regular da Mansão de Baoding.
Lu Heng estendeu a mão a Yang Yingning com a postura de um júnior respeitoso e cortês, e disse:
— Chefe Auxiliar, é hora de irmos para a corte. Por favor.
Yang Yingning era mais velho que Lu Heng tanto em idade quanto em antiguidade, e não foi nem um pouco cortês. Sacudiu as mangas e passou diante de Lu Heng com as mãos escondidas. Zhang Jinggong o seguiu logo atrás. Quando Lu Heng viu Zhang Jinggong, seu sorriso se aprofundou, e ainda assim falou com gentileza e polidez:
— Segundo Auxiliar Zhang. Mestre Segundo Auxiliar, por favor, vá primeiro.
Zhang Jinggong olhou para Lu Heng com um olhar significativo, depois dobrou as mangas e partiu. Após enviar os anciãos um por um, Lu Heng recolheu lentamente a mão e caminhou em direção ao portão sul.
Os oficiais já estavam posicionados dos dois lados da estrada imperial. Os uniformes oficiais em roxo escuro, vermelho vivo e azul-índigo se misturavam como uma enorme bandeja de tinta derramada. À medida que Lu Heng avançava passo a passo, os oficiais que cochichavam paravam, baixavam as mãos para não atrapalhá-lo e silenciosamente abriam um caminho.
Os oficiais civis estavam à esquerda, os militares à direita, e os nobres se posicionavam um pouco à frente dos militares. Quando Lu Heng chegou ao seu lugar, ergueu ligeiramente o olhar e percebeu, não muito longe, Fu Tingzhou o encarando com um olhar sombrio, como se quisesse rasgá-lo em dez mil pedaços. Lu Heng pensou em Qing Qing, que ainda dormia em sua casa naquele momento, e de propósito sustentou o olhar de Fu Tingzhou, arqueando as sobrancelhas e sorrindo para ele.
Fu Tingzhou viu o sorriso provocador de Lu Heng diante de todos e cerrou os punhos. Se não estivesse na corte naquele instante, teria avançado para socar o rosto dele.
No entanto, quanto mais irritado Fu Tingzhou ficava, mais satisfeito Lu Heng se sentia. Não havia dormido a noite inteira, mas não mostrava nenhum sinal de cansaço. Ao contrário, estava cheio de energia, e o brilho em seus olhos e sobrancelhas era impossível de conter.
Os tambores soaram na Torre dos Cinco Fênix, e os oficiais entraram pela pequena porta lateral, em ordem. Todos pararam ao sul da Ponte Jinshui, e ninguém ousava se mover agora. Nem mesmo Fu Tingzhou continuava a encarar Lu Heng. Todos continham a respiração, mantinham a postura e aguardavam a chegada do soberano.
O som de um chicote veio da frente, e os oficiais civis e militares atravessaram a ponte respectivamente, em grupos à esquerda e à direita. Esperaram por um tempo, enquanto sinos e tambores tocavam, e o imperador chegou ao Tianmen e tomou seu lugar. Após outro estalo de chicote, o longo canto do Templo de Honglu ecoou:
— Entrem.
Lu Heng acompanhou a multidão pela estrada imperial e se curvou à figura de amarelo brilhante oculta sob os pesados leques e sombrinhas:
— Vida longa. Vida longa ao meu imperador.
Depois que a cerimônia terminou, a corte matinal começou de fato. O Templo de Honglu apresentou os relatórios aos oficiais, que agradeceram como de costume, mas o imperador não quis recebê-los um por um — mandou que os oficiais o cumprimentassem do lado de fora do portão sul por conta própria. Imediatamente em seguida, foram relatadas questões de fronteira. Como estavam no fim do ano, era necessário redobrar a vigilância contra problemas nas fronteiras. O Ministro de Assuntos Gerais leu o relatório, e após o imperador mostrar sua preocupação de costume, chegou-se à parte mais importante da reunião.
A apresentação dos memoriais ao imperador. Esse era o verdadeiro clímax da audiência.
O memorial de hoje estava especialmente carregado. O Ministério de Nomeações lia os louvores à corte, e embora os ministros ouvissem, seus olhos se desviavam constantemente em direção a Lu Heng. Quando os oficiais do Ministério de Nomeações terminaram, Lu Heng avançou e declarou:
— Este ministro tem algo a relatar.
Ninguém se virou ou desviou o olhar, mas toda a atenção se voltou para Lu Heng. Do assento de honra, veio o longo canto do eunuco do palácio, autorizando:
— Concedido.
Lu Heng deu um passo à frente, prestou respeito e disse:
— Zhao Huai, Ministro dos Ritos, confessou ter aceitado subornos de Zhang Yong e Xiao Jing para benefício pessoal. Encontrei na casa de Zhao Huai, na noite passada, cinco mil taéis de ouro, dez mil em notas de prata e um total de dois mil e quinhentos títulos de terras e propriedades.
Assim que Lu Heng terminou de falar, o vento pareceu cessar. Imediatamente, a voz do imperador veio do alto:
— Isso é verdade?
Lu Heng tirou um documento da manga e disse:
— Esta é uma lista compilada das corrupções de Zhao Huai. Peço que Vossa Majestade examine.
Um eunuco desceu correndo da plataforma imperial, pegou o memorial das mãos de Lu Heng e o entregou com ambas as mãos. O imperador o recebeu, examinou por um momento e, ao fechá-lo, seu rosto estava cheio de ira:
— Sendo um oficial de terceiro escalão, Zhao Huai ousa se corromper e distorcer a lei, coludir com eunucos e ocupar terras agrícolas? Isso é um total desrespeito às regras de seus antepassados!
O imperador Hongwu odiava oficiais corruptos mais do que tudo na vida. Odiava latifundiários, corruptos e eunucos — e havia proibido explicitamente a participação de eunucos na política. As coisas encontradas na casa de Zhao Huai não eram poucas para os padrões da corte, embora também não fossem excessivamente escandalosas, mas o imperador, ao abrir a boca, já havia condenado Zhao Huai com base no que mais abominava.
Os oficiais presentes ficaram espantados. Entenderam de imediato que, ao estabelecer uma posição tão rígida, o imperador tornaria o caso muito sério. Após um breve silêncio, veio uma tosse do grupo dos civis. Zhang Jinggong deu um passo à frente, juntou as mãos e disse:
— Vossa Majestade, Zhao Huai é apenas servidor do Ministério dos Ritos. Não tem poder, nem comanda nada. Como ousaria coludir com eunucos? Este ministro suspeita que Zhao Huai apenas agiu sob ordens de alguém.
Essas palavras causaram ondas. Depois que Zhang Jinggong falou, os demais oficiais civis também começaram a disparar acusações, e o ambiente logo se encheu de tensão e cheiro de pólvora. Mas nada disso dizia respeito a Lu Heng. Ele retornou lentamente ao seu lugar com expressão solene, semblante respeitoso e o coração leve e renovado.
Ele sabia bem o seu papel. Era uma lâmina, incumbido de resolver os problemas do imperador e de lançar as acusações quando necessário. Quanto à definição das culpas e à condenação dos envolvidos, isso cabia a Zhang Jinggong.
Lu Heng escutou casualmente as repreensões que se seguiram. Aqueles oficiais sabiam mesmo como criticar — ficaram de pé ao vento frio, cuspindo por meia hora sem sequer parecerem sedentos. Por fim, a paciência do imperador se esgotou. Ele fechou a cara, e o oficial que se empolgava nas críticas fechou imediatamente a boca e voltou à fila. Um servo se adiantou e entoou:
— Há mais algum assunto a ser apresentado a Vossa Majestade? Caso contrário, a audiência está encerrada.
Ninguém respondeu, e a corte matinal finalmente chegou ao fim. Os oficiais do Templo de Honglu anunciaram o encerramento da sessão, o estalo nítido do chicote ecoou, e o imperador se retirou de volta ao palácio. Após a saída do soberano, centenas de oficiais civis e militares soltaram discretamente um suspiro de alívio e começaram a sair, um a um.
A enorme fila se dispersou e logo se transformou em pequenos grupos de dois ou três. Lu Heng se virou e mal deu dois passos antes de ser detido por uma voz atrás dele:
— Mestre Lu.
Lu Heng virou-se e viu Fu Tingzhou vindo em sua direção com uma expressão firme e carregada. O canto da boca de Lu Heng se curvou num leve sorriso e ele perguntou:
— O que deseja, Marquês de Zhenyuan?
Fu Tingzhou parou diante de Lu Heng, sequer se deu ao trabalho de manter a cordialidade e perguntou diretamente:
— Mestre Lu não tem nada a me dizer?
Lu Heng respondeu com um sorriso:
— O que o Marquês de Zhenyuan deseja ouvir?
Ainda fingindo ignorância. Fu Tingzhou inspirou fundo e perguntou o mais calmamente que pôde:
— No começo do mês, minha irmã estava nos subúrbios do oeste. Já se passaram dezesseis dias desde que desapareceu, seu paradeiro continua desconhecido, e até agora não há nenhuma notícia. Mestre Lu tem olhos e ouvidos por toda parte. Será que tem alguma informação sobre minha irmã?
Ele finalmente havia se decidido. Lu Heng riu por dentro, mas sustentou o olhar de Fu Tingzhou com inocência e firmeza:
— O velho marquês Fu tem um filho da esposa principal, três filhos das concubinas e quatro netas. Há pouco tempo, a senhorita da família Fu saiu para resolver assuntos — parece que todas estavam presentes. Realmente não sei a qual irmã o Marquês de Zhenyuan está se referindo.
Fu Tingzhou não aguentou mais e exclamou, exasperado:
— Lu Heng!
Ainda dentro do palácio, cercado por oficiais dispersando-se após a audiência, Fu Tingzhou chamou o nome de Lu Heng em voz firme, atraindo imediatamente muitos olhares. O sorriso de Lu Heng não vacilou; ele olhou calmamente para Fu Tingzhou, analisando-o com atenção:
— Marquês de Zhenyuan, isto é o palácio. Aconselho que se contenha.
Fu Tingzhou inspirou fundo e se forçou a lembrar que não podia perder o controle — Qing Qing ainda o aguardava para ser resgatada. Ele se acalmou com dificuldade e disse:
— Mestre Lu não precisa fingir que não entende. Você e eu sabemos o que aconteceu naquele dia. Mestre Lu vem mantendo suas tropas em espera há tanto tempo… não era exatamente por este momento que esperava? Está difícil manter a paciência? Diga logo quais são suas condições, Mestre Lu.
Na verdade, essas palavras jamais deveriam ser ditas em público — ainda mais dentro do palácio. Os olhos do imperador estavam por toda parte, e qualquer deslize poderia causar um enorme problema. Mas Fu Tingzhou não se importava. Ele queria provocar Lu Heng ali mesmo. Lu Heng acabara de encerrar um grande caso e estava no centro da tempestade. Qualquer movimento entre ele e Fu Tingzhou atrairia olhares. Mesmo que os outros não soubessem do conteúdo da conversa, inevitavelmente especulariam mais tarde. Lu Heng não poderia continuar se fingindo de morto. Fu Tingzhou queria forçá-lo a agir, mesmo que isso custasse caro — ferir o inimigo mil vezes, mas perder oitocentas no processo.
Já se haviam passado dezesseis dias, e Fu Tingzhou estava à beira do colapso. Nem por um quarto de hora ele conseguia mais se conter. Ignorou os conselhos do Marquês de Wuding e desafiou Lu Heng publicamente. Já não conseguia calcular ganhos e perdas — se Qing Qing pudesse voltar, deixaria as condições nas mãos de Lu Heng.
Fu Tingzhou desprezava Lu Heng, mas se odiava ainda mais por tudo o que fizera no começo do mês. Se pudesse voltar no tempo, espancaria a si mesmo por ter ignorado os desejos de Qing Qing e forçado-a a sair para oferecer incenso. Por que permitiu que a tratassem com negligência na mansão? Por que concordou com as palavras de sua mãe? Por que esqueceu o aniversário de Qing Qing? Se naquele dia ele tivesse ficado na cidade e a acompanhado em vez de sair para aquele ritual... nada disso teria acontecido. Qing Qing ainda estaria com ele, preparando-se para o Ano Novo.
O poder militar sobreposto, os rituais cada vez mais grandiosos, a luta feroz entre o Primeiro e o Segundo Assistente... A turbulência só aumentava. Para manter o equilíbrio da Mansão Zhenyuan, Fu Tingzhou se via constantemente exausto. Mas, ao voltar para casa, olhando ao redor, não havia uma única pessoa em toda a mansão que pudesse realmente escutá-lo. Se Qing Qing ainda estivesse ali...
Mas ela não estava. E tudo isso era culpa de Lu Heng.
Fu Tingzhou vivera dias de puro terror. Todos os dias se lembrava de ter cautela com Lu Heng, mas, ao cair da noite, Lu Heng não fazia nenhum movimento. Um sentimento de profunda frustração tomou conta de seu peito. Percebeu, então, que no fundo esperava que Lu Heng o ameaçasse.
Agora, tudo o que queria era que Qing Qing voltasse com vida. Mesmo que Lu Heng abrisse a “boca de leão”, ele aceitaria.
Fu Tingzhou vivia atormentado todos os dias, enquanto Lu Heng parecia viver sob a brisa suave da primavera, ascendendo como nuvens. A diferença entre os dois era irritante.
Fu Tingzhou pensou que Lu Heng, sendo um homem ganancioso como era, tomaria uma posição ao saber que ele havia recuado. Este não era o lugar ideal para conversarem, mas bastava que Lu Heng demonstrasse um mínimo de intenção — poderiam tratar do assunto em particular depois. Contudo, Fu Tingzhou viu o sorriso de Lu Heng desaparecer, e uma lâmina cortante cruzar seus olhos por um breve instante.
Fu Tingzhou se surpreendeu e pensou que tivesse visto errado. Lu Heng sempre mantinha um sorriso falso em qualquer lugar. Fu Tingzhou o detestava, mas... teria ele visto mesmo um desgosto verdadeiro naquele rosto?
Era mesmo Lu Heng? Mas a expressão de Lu Heng oscilou apenas por um momento. Logo voltou ao normal, e disse com um sorriso amável:
— O Marquês de Zhenyuan se preocupa muito com sua irmã, estou comovido. Contudo, entre as quatro senhoritas da família Fu, realmente não sei de qual o Marquês está falando.
Fu Tingzhou encarou friamente aquele ator. Até agora, ele continuava fingindo. Fungou com desdém e disse:
— É minha irmã adotiva.
— Ah, a Mansão Zhenyuan tem até uma filha adotiva — disse Lu Heng, como se tivesse acabado de compreender. — Não se preocupe, Marquês de Zhenyuan. Pedirei aos meus subordinados que fiquem atentos. Se houver qualquer notícia sobre a senhorita Fu, enviarei alguém para informá-lo imediatamente.
Falava sobre a senhorita Fu, mas não disse que era Wang Yanqing. Lu Heng pensou consigo mesmo. Realmente sou um homem honesto, bondoso e decente que nem sequer conta mentiras.
Esse desfecho era completamente diferente do que Fu Tingzhou esperava. Ele queria continuar falando, mas um pigarro próximo os interrompeu. Fu Tingzhou e Lu Heng viraram a cabeça e viram um eunuco de vermelho parado não muito longe. Rompendo a conversa timidamente, ele disse:
— Mestre Lu, Sua Majestade o convocou.
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Nota da autora:
Terceira Senhorita Zhao: O imperador ou a beleza, o que é mais importante?
Lu Heng: O imperador.
Capítulo 32 – Ano Novo Chinês
Quando o Assistente Zhang, que estava ao lado do imperador, se aproximou, Fu Tingzhou teve que engolir suas palavras e apenas observar Lu Heng entrar no palácio, cerrando os dentes em silêncio.
Lu Heng, isso ainda não acabou. Eu não vou desistir.
Depois que saiu do campo de visão de Fu Tingzhou, Lu Heng baixou a voz e perguntou:
— Hoje está frio... Sua Majestade está com boa saúde?
Comparado a outros oficiais, Lu Heng era quem mais via o imperador. Mas, por mais frequente que fosse sua presença no palácio, ainda não podia se comparar aos eunucos que acompanhavam o imperador o dia inteiro, cuidando de sua alimentação, vestuário, alojamento e transporte. As palavras de Lu Heng poderiam ser interpretadas como preocupação com a saúde do imperador — ou como uma tentativa de sondar seus movimentos. Ele queria ver como o Assistente Zhang responderia.
O Assistente Zhang sorriu e disse:
— O Mestre Lu sempre demonstra preocupação com a saúde de Sua Majestade. É de fato o pilar de um oficial leal. Recentemente, o imperador tomou o novo comprimido medicinal do Mestre Shaotian, e seu vigor está bem melhor que nos últimos dias. Ele acordou cedo esta manhã. Talvez o vento o tenha resfriado, e por isso voltou tossindo.
Lu Heng assentiu levemente, com o olhar pensativo. A mudança em sua expressão durou apenas um instante; logo ele voltou a sorrir e agradeceu:
— Agradeço, Eunuco Zhang. Há algum tempo, meus subordinados enviaram algumas antiguidades de Jiangnan. Dizem que são feitas de jade vermelho e de valor inestimável. Não entendo muito dessas coisas, então gostaria de pedir ao Eunuco Zhang que as avaliasse outro dia.
Assim que ouviu isso, o rosto do Eunuco Zhang se iluminou de alegria. Ele tentou disfarçar o sorriso, recuando modestamente:
— O Mestre Lu é muito versado nessas artes. Como poderia eu, de origem humilde, exibir minhas habilidades diante de um especialista?
— O Eunuco Zhang está sendo modesto — disse Lu Heng. — O senhor serviu ao lado do imperador e já viu tantas relíquias preciosas. Seu olhar certamente supera o de qualquer um. Como não posso estar presente em todos os lugares, acabo incomodando o Eunuco para me orientar.
O sorriso no rosto do Eunuco Zhang finalmente se abriu por completo. Ele uniu as mãos nas mangas e inclinou-se levemente em sinal de respeito:
— O Mestre Lu é muito cortês. Se até alguém como eu pode ser útil, então tomo coragem para aceitar o convite.
— Agradeço, Eunuco Zhang — disse Lu Heng, sorrindo.
Com o episódio da jade vermelha, a atmosfera entre os dois tornou-se harmoniosa. Pouco depois, chegaram ao Palácio Qianqing. O Eunuco Zhang entrou a passos curtos, parou diante do pavilhão leste e anunciou:
— Vossa Majestade, o Mestre Lu chegou.
A voz do imperador veio de dentro, e o Eunuco Zhang virou-se de lado, dizendo:
— Mestre Lu, por favor.
Lu Heng fez um leve gesto de agradecimento e entrou calmamente. O imperador já havia tirado as vestes formais e vestia uma túnica taoísta. Ao vê-lo, saudou-o com gentileza:
— Veio.
Lu Heng fez a saudação habitual e apresentou seus respeitos. O imperador não enrolou e foi direto ao ponto:
— Qual é a situação de Zhao Huai?
Lu Heng sabia que o imperador o havia chamado exatamente para tratar desse assunto. Já viera refletindo no caminho. Sem hesitar, expôs claramente e com fluidez a situação da família de Zhao Huai. No tribunal pela manhã ele havia omitido alguns detalhes, mas agora, diante do imperador, foi minucioso e revelou tudo o que havia descoberto.
O imperador precisava de fatos — e cabia a ele decidir o que era verdade ou não.
Após ouvir tudo, o imperador ponderou por um momento e perguntou:
— Por que Zhao Huai cedeu de repente? Como você conseguiu isso dele?
Os Guardas Imperiais tinham fama de impiedosos, mas ninguém que fosse meramente brutal ou enganoso sobreviveria por muito tempo ali. Se Lu Heng ousou liderar pessoalmente uma busca na casa de Zhao Huai, era porque tinha uma carta na manga.
Lu Heng pensou que o imperador era mesmo desconfiado — queria saber não só o resultado, mas também como o resultado havia sido alcançado. Após uma breve pausa, tomou sua decisão. Havia levado Wang Yanqing à prisão para interrogar Zhao Huai, e isso não poderia ser escondido por muito tempo. Era melhor ele mesmo contar do que deixar que outros o fizessem.
Além disso, aquele idiota do Fu Tingzhou o confrontara hoje diante do Tianmen. Era provável que o imperador já tivesse ouvido falar. Com a decisão tomada, Lu Heng não hesitou mais:
— Ele não foi interrogado por um oficial, mas por uma mulher.
O imperador, acostumado a todo tipo de bizarrices, arqueou as sobrancelhas:
— Uma mulher?
— Sim — respondeu Lu Heng. — Ela tem um talento nato para reconhecer expressões faciais e consegue detectar mentiras observando pequenas mudanças de comportamento. Ela auxiliou no interrogatório de Zhao Huai e também durante a investigação do caso de adultério em Baoding.
O imperador, curioso com a habilidade, perguntou:
— Onde encontrou essa figura tão singular?
Lu Heng hesitou por um instante e respondeu com calma:
— Ela é irmã adotiva de Fu Tingzhou. Perdeu a memória há alguns dias, e eu a acolhi.
O imperador ficou surpreso, piscou lentamente e disse:
— Amnésia?
— Sim — confirmou Lu Heng. Após dizer a primeira palavra, todo o restante saiu com naturalidade. — Além disso, ela parece ter me confundido com seu irmão.
Mesmo alguém como o imperador, acostumado a grandes tempestades, ficou sem palavras por um momento. Olhou para Lu Heng, que continuava imóvel no salão, recebendo seu olhar com serenidade.
O imperador não possuía entraves morais — para ele, bem e mal eram conceitos vazios. Havia apenas dois tipos de pessoas no mundo: os úteis e os que atrapalhavam. E mesmo ele achou que Lu Heng tinha ido longe demais.
Curioso, o imperador perguntou:
— Fu Tingzhou sabe?
Lu Heng balançou a cabeça:
— Ainda não.
O imperador compreendeu na hora. As anormalidades entre Lu Heng e Fu Tingzhou faziam sentido agora. Fu Tingzhou provavelmente o confrontou por isso. O imperador assentiu:
— Resolva como quiser, mas não atrase o andamento do caso. A família de Zhang Yong é ainda mais rica — tem mais que os 5 mil taéis de ouro de Zhao Huai. Revise os outros detidos, talvez haja mais por vir.
Lu Heng respondeu afirmativamente, entendendo que o imperador queria evidências mais sólidas, especialmente se o grupo de Yang estivesse envolvido. Ele havia colocado Wang Yanqing à vista do trono, e o imperador não a rejeitou — Lu Heng sabia que havia passado no teste.
O imperador era alguém que acreditava que a natureza humana era, por essência, má — por isso, entendia bem os males originados do desejo: ganância, luxúria, inveja, sede de poder. Quando Lu Heng contou sobre a corrupção de Chen Yin, o imperador não se importou. Porém, se ele se passasse por santo e induzisse o imperador a eliminar um rival, aí sim seria um grande erro.
Por isso, Lu Heng sempre foi direto com o imperador. Enquanto ele fosse ousado o bastante para dizer a verdade primeiro, o imperador o deixaria passar. Lu Heng entendeu que, ao aceitar sua forma de agir, o imperador inclusive ignorou quando ele armou uma emboscada contra Fu Tingzhou nos subúrbios. No futuro, mesmo que Fu Tingzhou recorresse à corte imperial, não conseguiria mais tocá-lo.
Lu Heng havia resolvido seu maior problema com Fu Tingzhou e estava satisfeito. Após se despedir do imperador, foi diretamente à prisão interrogar os demais funcionários corruptos. Não dormira a noite inteira, mas passou o dia inteiro de ótimo humor — com um leve sorriso nos lábios até o momento em que retornou à mansão ao entardecer.
Wang Yanqing o aguardava ansiosamente desde manhã. Quando ouviu a criada anunciar o retorno de Lu Heng, ficou aliviada e correu ao encontro dele. Assim que Lu Heng entrou com um sorriso no olhar, Wang Yanqing ajudou-o a desfazer a capa, dobrando-a com cuidado e entregando à criada. Depois, voltou-se para ele e perguntou suavemente:
— O que houve com o segundo irmão? Por que está tão feliz?
O caso de desvio de verbas foi resolvido, o imperador lhe confiou grandes responsabilidades e em breve ele seria oficialmente promovido a comandante... Tudo estava indo bem, mas a única coisa que mais agradava Lu Heng não podia ser revelada a Wang Yanqing. Ele segurou a mão dela e disse:
— Ontem à noite, encontrei mesmo ouro escondido na casa de Zhao Huai. Qing Qing teve um papel fundamental para resolver esse caso tão rapidamente. Sou muito grato pela sua ajuda durante esse tempo. Que recompensa Qing Qing deseja?
Wang Yanqing havia retornado após interrogar Zhao Huai no dia anterior e não viu Lu Heng o dia todo. Estava preocupada com o andamento da investigação e queria encontrar uma oportunidade para perguntar sobre o resultado. Mas, ao olhar para a expressão de Lu Heng agora, percebeu que não era mais necessário perguntar.
Ela suspirou aliviada e disse:
— Que bom que o caso foi resolvido sem problemas. Não quero nada. Já fico satisfeita por poder ajudar meu Segundo Irmão.
— Como assim? — disse Lu Heng. — Se comete erros, é punida. Se tem méritos, deve ser recompensada. Qing Qing não quer recompensa agora... está com medo de que eu a castigue quando cometer erros no futuro?
Lu Heng era o tipo de pessoa que conseguia fazer até o imperador sorrir. Falando daquele jeito, como Wang Yanqing poderia resistir? Ela não conseguiu evitar o riso e lançou-lhe um olhar irritado:
— Segundo Irmão pode me punir se quiser. Eu não vou reclamar.
— Então não quero punir — disse Lu Heng, puxando-a para sentar ao seu lado. Colocou a mão sobre o colo dela e continuou: — Ainda há alguns detentos na prisão, então não terei tempo livre nos próximos dias. Depois do Ano Novo, eu vou sair com você pelas ruas.
Wang Yanqing se surpreendeu e exclamou sem pensar:
— Sério?
Lu Heng percebeu o deslize e seu coração se aqueceu. O sorriso em seu rosto ficou ainda mais suave:
— Claro que é sério. A família deve estar unida no Ano Novo. Agora somos só nós dois na Mansão Lu. Se eu não acompanhar você, quem mais o faria?
Wang Yanqing ficou realmente tocada. Não sabia explicar por quê, mas sempre sentia que era natural ajudar o Segundo Irmão, que não deveria reivindicar créditos nem pedir nada em troca. Lu Heng fitou seus olhos distraídos e perguntou devagar:
— Qing Qing, ainda não se lembra de nada do passado?
Ela mordeu o lábio e balançou a cabeça lentamente. Lu Heng suspirou, escondendo a tristeza no olhar. Abraçou-a com paciência e ternura, dizendo:
— Não tem problema. Mesmo que não se lembre, vamos viver tudo de novo. Não importa qual fosse o festival, nós sempre comemorávamos juntos, como irmãos. Você ainda se lembra do Ano Novo do ano passado?
Wang Yanqing se comoveu com a tristeza nos olhos de Lu Heng e balançou a cabeça com cautela. Ele respirou aliviado, manteve o olhar firme e começou a inventar descaradamente:
— Ano passado fomos à capital ver as lanternas juntos. Você também pediu um Qian para saber sobre seu destino no amor. Ele dizia que seria um ano propenso a atrair más companhias e que não era apropriado falar de casamento. Você não acreditou na hora, mas veja só... acabou encontrando Fu Tingzhou no fim do ano. Neste ano vamos pedir outro Qian, e dessa vez você tem que levar a sério.
Qian (签) refere-se ao Omikuji (御神签) japonês, que é um tipo de sorte escrita retirada de uma caixa.
Wang Yanqing assentiu, um tanto confusa. Apesar de achar a história estranha, o Segundo Irmão jamais mentiria para ela. Se ele dizia que era assim, então era assim.
O inverno daquele ano na capital estava excepcionalmente frio, e o mês de dezembro era tomado por um ar gélido e incômodo. Todos preferiam ficar em casa e evitavam sair.
Nesse clima opressivo, a atuação dos Guardas Imperiais se destacava ainda mais. Com Zhao Huai como o primeiro a cair, Lu Heng rapidamente expôs outros oficiais corruptos. Pelotões dos Guardas Imperiais, trajando uniformes oficiais imponentes, patrulhavam a capital e invadiam residências por toda parte. Os pedestres se escondiam ao vê-los ao longe — ninguém ousava enfrentá-los de frente. Em seus piores dias, os Guardas saqueavam até três casas.
Muitas famílias foram empurradas para o abismo antes mesmo da chegada do Ano Novo do décimo segundo ano do reinado Jiajing.
O fogo se alastrava cada vez mais, até que enfim alcançou Yang Yingning, o auxiliar-chefe do gabinete. A disputa entre os partidos de Yang e Zhang se intensificou. Zhang Jinggong acusou Zhao Huai e outros de aceitarem subornos por ordem de Yang Yingning. A maior parte do dinheiro de Zhang Yong e Xiao Jing teria, na verdade, ido parar nas mãos de Yang Yingning.
Este tentou se defender várias vezes, mas, incapaz de suportar a humilhação, tomou a iniciativa de pedir demissão ao imperador para provar sua inocência.
O imperador o reteve, mas Zhang Jinggong logo escreveu dizendo que Yang Yingning pedia licença apenas de forma superficial — na verdade, ele recuava antecipadamente para ganhar a confiança do imperador. Yang Yingning ficou furioso e voltou a pedir dispensa, alegando motivos de saúde. Dessa vez, o imperador não recusou de imediato.
Foi então que Yang Yingning despertou. Não era Zhang Jinggong quem queria sua cabeça — era o próprio imperador quem estava insatisfeito com ele. Yang Yingning havia se oposto repetidas vezes à grande cerimônia e também ao pai e filho da família Yang Ting. Por fim, irritou o imperador.
O imperador queria conceder ao pai biológico o título de divindade, mas os antigos oficiais da dinastia Zhengde se opunham. À primeira vista, parecia apenas uma disputa sobre o título honorífico do Monarca Xingxian, mas na verdade era uma batalha de forças — quem era mais poderoso, o imperador ou seus ministros?
Mas o imperador não tolerava que ninguém ignorasse suas ordens. Se Yang Ting e Yang Yingning eram desobedientes, ele os substituiria por pessoas submissas.
Pensando assim, Yang Yingning desistiu de argumentar. Tal como Yang Ting fizera anos antes, renunciou ao cargo de auxiliar-chefe e retornou para casa, encerrando sua carreira.
Ao fazê-lo por vontade própria, ainda pôde preservar a riqueza e o prestígio de sua família. Se esperasse pelo imperador, o responsável por derrubá-lo seria Lu Heng.
Era melhor ir por conta própria.
Após a renúncia de Yang Yingning, o interminável caso de corrupção finalmente chegou ao fim — e foi quando o Ano Novo chegou.
Enquanto algumas famílias celebravam, outras choravam. Enquanto os oficiais do governo mal conseguiam dormir com as mudanças no gabinete, a Mansão Lu vivia um clima quente e harmonioso.
Na manhã do trigésimo dia do mês, Wang Yanqing levantou cedo para desejar feliz Ano Novo a Lu Heng. Em tom de brincadeira, disse:
— A Corte tirou férias desde o dia vinte e quatro, mas só hoje vi meu Segundo Irmão em casa. Por acaso o Segundo Irmão construiu outra residência para fugir de mim?
Lu Heng riu. Ele vinha investigando o partido Yang nos últimos dias e até chegou a desmaiar durante uma busca. Férias de corte eram para os oficiais comuns — para ele, enquanto o imperador precisasse, deveria estar sempre de prontidão.
Lu Heng sorriu e respondeu:
— Quem me dera poder construir uma casa dourada escondida e esconder Qing Qing lá dentro.
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Nota da autora:
Lu Heng: Sobrenome Lu, nome Heng, personagem à sombra do imperador, e nome falso de um homem perverso entre os eruditos.
O primeiro caso de corrupção + caso de adultério está basicamente encerrado. Agora deixemos Lu Heng ter um bom Ano Novo... e que o drama comece!
Capítulo 33 — O Encontro
Lu Heng era diferente dos soldados militares comuns. Seu rosto sempre trazia um sorriso, e suas palavras doces também se destacavam. Na impressão de Wang Yanqing, havia uma grande diferença entre o sorriso e o modo de falar de Lu Heng e o dos soldados. Ela riu, mas uma dúvida repentina surgiu em seu coração.
Ela era a irmã adotiva de Lu Heng, mas por que ele usou a expressão “construir uma casa dourada para escondê-la”? Lu Heng dissera isso naturalmente, o que demonstrava que, instintivamente, sentia que ela não estava segura vivendo na Mansão Lu. Mas ela não tinha morado ali pelos últimos dez anos?
Wang Yanqing achou aquilo um pouco estranho, mas afinal era véspera de Ano Novo, havia tantas tarefas a fazer... Talvez Lu Heng estivesse apenas ocupado demais. Ela não pensou muito a respeito e disse:
— Segundo Irmão, não brinque comigo. Hoje é véspera de Ano Novo e o Segundo Irmão esteve ocupado o ano inteiro, então vamos aproveitar um descanso.
Esses dois dias provavelmente eram os mais tranquilos do ano para Lu Heng. Se estivesse ocupado até no Ano Novo, só haveria mais noites e dias puxados no futuro. Como estava de bom humor, Lu Heng decidiu não pensar na Fusi do Sul, e disse:
— Tenho estado ocupado com assuntos externos esses dias e acabei negligenciando Qing Qing. Hoje tenho tempo livre. O que você quer fazer, Qing Qing?
Essa pergunta pegou Wang Yanqing desprevenida. Ela ficava na mansão o dia todo e não achava que o Ano Novo fosse tão diferente dos outros dias. A única diferença era a presença de Lu Heng. Pensou um pouco e perguntou:
— No passado, o que eu costumava fazer de divertido com o Segundo Irmão?
Depois de falar, ela olhou para Lu Heng com seriedade. Diante daqueles olhos límpidos, cheios de confiança e dependência, Lu Heng ficou sem palavras por um instante.
Por mais perfeita que fosse uma mentira, ela não podia mudar a verdade. Se eles realmente fossem irmãos adotivos que cresceram juntos, certamente teriam muitos passatempos em comum — mas Lu Heng não sabia quais.
Ele só hesitou por um momento e então respondeu com um sorriso:
— Fizemos muitas coisas juntos, depende se Qing Qing está disposta a me acompanhar.
Wang Yanqing levou a sério e disse imediatamente:
— Claro que estou. O que o Segundo Irmão quiser fazer, eu topo.
Lu Heng passou rapidamente pela lista de coisas em que era bom e concluiu que jogar xadrez era o mais apropriado para um homem e uma mulher estarem a sós. Outras atividades como leitura, arco e flecha ou artes marciais estragariam o clima.
— Faz tempo que você não joga xadrez com seu Segundo Irmão. Que tal uma partida? — sugeriu ele.
Wang Yanqing assentiu naturalmente. Ao ouvir isso, Ling Xi e Ling Luan rapidamente prepararam o tabuleiro de xadrez num canto do cômodo. Wang Yanqing se sentou ao lado do jogo, pegou uma peça branca e a observou, sentindo instintivamente que lhe era estranha.
Ela não parecia ter o hábito de jogar xadrez. Isso era estranho — o Segundo Irmão gostava de jogar. Mesmo que não fosse boa, não deveria sentir tanta estranheza assim.
Lu Heng sentou-se e, ao levantar os olhos, viu Wang Yanqing encarando a peça branca com atenção. Seu coração apertou subitamente. Ele fora descuidado. Fu Tingzhou não gostava de xadrez. Wang Yanqing provavelmente nunca havia tocado num tabuleiro antes. Será que ela percebeu algo?
Sem mudar de expressão, Lu Heng disse com calma:
— Por que essa cara? Você sempre foi relutante em jogar comigo. Agora que está crescida, ainda não gosta?
Com isso, ele insinuava que Wang Yanqing sempre fora impaciente com o xadrez. Ela achou que fazia sentido pensar por esse lado. Lu Heng devia ser muito bom e, quando criança, ela provavelmente nunca conseguia vencer — o que explicaria sua relutância. Mas, ao mesmo tempo, algo lhe pareceu estranho. Mesmo que perdesse sempre, com seu temperamento, não seria do tipo que não conseguia nem se sentar para jogar, certo?
Lu Heng não se atreveu a deixá-la pensar muito e rapidamente interrompeu:
— Certo, vamos começar. Você começa.
Wang Yanqing o lembrou:
— Segundo Irmão, você está com as pretas.
Lu Heng balançou a cabeça, indicando que ela poderia jogar primeiro. Wang Yanqing colocou uma peça, Lu Heng seguiu com outra, e quando pegou a segunda, Wang Yanqing hesitou.
Como essa jogada funciona?
Lu Heng percebeu que ela estava confusa e passou a ensiná-la aos poucos. Wang Yanqing terminou a partida sob sua orientação. Naturalmente, o resultado não foi surpresa. Mas ao final do jogo, ela já havia aprendido muitos fundamentos. Quando a segunda partida começou, já conseguia se movimentar sozinha.
Os olhos de Lu Heng demonstraram apreço, e ele disse:
— Muito bem. Você sabe deduzir os próximos passos.
Palavras doces saíam com frequência da boca de Lu Heng, e Wang Yanqing não sabia dizer se ele a elogiava com sinceridade ou apenas queria agradá-la. Ela colocou mais uma peça e respondeu, um pouco envergonhada:
— Foi o Segundo Irmão quem me ensinou. Como posso me comparar com você?
Embora tivessem jogado apenas uma partida e meia, Wang Yanqing já percebera a impressionante habilidade de cálculo de Lu Heng no xadrez. Ela até suspeitava que, se tivesse um filho, ele já teria planejado os próximos dez passos dela.
Claro que Lu Heng não a derrotaria com força, e disse com um sorriso:
— Foi Qing Qing quem progrediu muito.
Wang Yanqing também achou que não estava tão mal, e que não era tão inútil quanto imaginava. Pegou uma peça de jade aquecida com os dedos e murmurou:
— Não pareço ser tão burra assim. Por que será que não consegui aprender quando era criança?
O sorriso de Lu Heng não se alterou, mas por dentro estava perturbado. O dano já estava feito. Ele cavara um buraco e, ao tentar tampá-lo, deixara dezenas de outros. Se soubesse disso, teria estragado o clima logo com arco e flecha.
Na segunda partida, o resultado também não teve suspense, mas para deixá-la praticar, Lu Heng propositalmente cedeu algumas jogadas e a orientou. Mas toda concessão tem um limite. Quando a partida terminou, Wang Yanqing perguntou:
— Por que o Segundo Irmão gosta de jogar xadrez?
Lu Heng apontou para a própria cabeça e respondeu:
— Para exercitar isso aqui.
Treinar artes marciais lhe dava olhos atentos e reflexos rápidos, o que ajudava a sobreviver em situações perigosas. Já o xadrez o mantinha longe do perigo.
Na corte, calma e paciência eram o mais importante.
Wang Yanqing assentiu, mas cada vez se sentia mais estranha. Era de se esperar que, gostando o Segundo Irmão do que fosse, ela também gostasse — mesmo que fosse impaciente. Por que, então, se sentia completamente alheia ao xadrez?
Ela refletiu um pouco e perguntou:
— Sendo assim, por que o Segundo Irmão não me obrigou a aprender?
Lu Heng pausou por um instante e então sorriu:
— Como eu poderia forçar você? Se não gostasse, não precisava aprender. Somos irmãos, mas não precisamos ser iguais.
Será? Wang Yanqing baixou a cabeça e murmurou:
— Mas... eu queria ser igual ao Segundo Irmão.
Ao ouvir isso, os olhos de Lu Heng se moveram e ele estava prestes a responder, quando uma voz do lado de fora anunciou:
— Comandante, chegou uma visita.
Na posição de Lu Heng, havia inúmeros que tentavam se aproximar dele durante o Ano Novo. Lu Heng não queria perder tempo com essas pessoas e recusava a todos. Só havia alguns que os guardas do portão da Mansão Lu não ousavam barrar — e, vendo que até Ling Xi viera avisar...
Lu Heng lançou um olhar a Wang Yanqing e já imaginava o que era. Perguntou:
— Quem é?
— O Marquês de Zhenyuan.
Lu Heng não se surpreendeu. Seu sorriso permaneceu, mas o brilho nos olhos esfriou. Vendo o mau humor do Segundo Irmão, Wang Yanqing também franziu o cenho e perguntou:
— O que ele veio fazer?
— O de sempre. Tem gente que simplesmente não morre — disse Lu Heng, recolocando as peças na caixa. — Qing Qing, você não precisa ver moscas tão irritantes. Vá primeiro, eu te encontro depois.
Wang Yanqing assentiu, levantou-se sem dizer palavra e desejou suavemente:
— Segundo Irmão, então eu vou indo.
Lu Heng continuou sentado, observando Wang Yanqing se dirigir à porta sem dizer nada, enquanto a criada lhe colocava a capa. Ela vestia um novo traje bordado com nuvens: uma jaqueta longa de seda branca com botões dourados na gola e na frente. Por estar em casa, não usava roupas grossas, o que deixava os ombros e cintura bem marcados. A partir da cintura, a jaqueta se alargava e se abria na altura dos joelhos, revelando uma saia vermelha por baixo, com pregas finas e delicadas. A bainha da jaqueta de veludo branco se curvava levemente, acentuando sua silhueta esguia, elegante e digna.
Lu Heng brincou com as peças de xadrez por um momento, observando Wang Yanqing trocar de roupa. Depois de algum tempo, teve que admitir que ela era um colírio para os olhos. Como era Ano Novo, ela não podia usar roupas comuns, então vestira um vestido longo vermelho. Mas como o luto de Lu Song ainda não terminara, ela escolheu uma jaqueta branca longa para equilibrar o vermelho. O conjunto era feito de veludo produzido no distrito de Songjiang, com textura de alta qualidade e brilho refinado. Embora a cor fosse simples, não parecia sem graça — ao contrário, transparecia um luxo contido e discreto.
Lu Heng não gostava de mulheres tolas e impulsivas, mas ela era sensata demais nesse aspecto. Participava ativamente do luto por um pai adotivo que nem existia e, ao saber que Lu Heng receberia uma visita, saía em silêncio, sem reclamar. Será que ela sabia que quem Lu Heng receberia era o irmão que fora tão bom para ela na infância e que a procurava há tempos?
Ela era tão obediente que, às vezes, Lu Heng se sentia mal por continuar mentindo. Mas essa sensação... no fim das contas, era apenas momentânea.
Wang Yanqing vestiu uma capa de pele de raposa branca sobre a jaqueta, fez uma reverência à distância e então saiu. Lu Heng a observou partir com um leve sorriso. Depois que todos se retiraram, ele levantou-se do tabuleiro e caminhou lentamente até o salão iluminado.
Esperou um pouco, imaginando que Wang Yanqing já devia ter saído, então ordenou:
— Tragam o Marquês de Zhenyuan...
Mal terminou de falar, ouviu uma voz aflita dos criados do lado de fora:
— Marquês de Zhenyuan, espere um momento, o comandante está ocupado e não pode receber visitas agora...
O rosto de Lu Heng mudou drasticamente e ele se levantou de súbito.
Wang Yanqing ainda não tinha ido embora!
Foi extremamente grosseiro vir diretamente sem permissão, mas Fu Tingzhou não se importou nem um pouco com isso. Ele pensava que, após deixar clara sua posição, Lu Heng certamente tomaria alguma atitude. No entanto, Lu Heng voltou imediatamente à investigação do caso e à busca nas residências, sem qualquer intenção de devolver Wang Yanqing.
Fu Tingzhou achou que Lu Heng apenas estava ocupado, então esperou pacientemente por cerca de dez dias. Como resultado, o Primeiro-Ministro Yang renunciou... e Lu Heng ainda não havia dado qualquer sinal.
Fu Tingzhou entendeu, afinal. Lu Heng não pretendia devolver ninguém. Ele não aguentou mais e foi direto até a casa dele, disposto a encontrar Lu Heng e deixar clara sua intenção. A família Lu era formada por Guardas Imperiais, e até os criados sabiam um pouco de artes marciais. Mas Fu Tingzhou também viera de uma família de generais — os criados da Mansão Lu não conseguiam detê-lo e tampouco se atreviam a usar força de verdade. Só podiam enviar alguém para notificar o comandante enquanto tentavam assustá-lo com tons autoritários.
Fu Tingzhou não quis ouvir nada daquilo. Marchou direto para o pátio principal da Mansão Lu e, pelo canto dos olhos, avistou uma silhueta branca caminhando pelo corredor, saindo pela porta lateral.
Ele parou abruptamente, ficou atônito por um momento e depois deu alguns passos na direção dela:
— Qing Qing...
Nesse instante, a porta do salão principal se abriu com força, e uma voz fria ecoou:
— Marquês de Zhenyuan, esta é a residência Lu. O que pretende?
Sob as ordens de Lu Heng, os criados finalmente ousaram agir e bloquearam firmemente o caminho à frente de Fu Tingzhou. Ele contraiu o rosto, mantendo os olhos fixos na direção pela qual a mulher havia partido.
Não era que ele não pudesse forçar a passagem, mas... aquilo era a Mansão Lu. Invadir o pátio interno da família Lu lhe custaria emocional e politicamente. Ainda não era o momento de romper abertamente com Lu Heng.
No entanto, as costas daquela mulher pareciam tanto com as dela, que Fu Tingzhou não sabia se estava alucinando de tanto pensar nela... ou se de fato tinha visto Qing Qing.
Lu Heng já se aproximava da varanda, parando não muito longe e dizendo calmamente:
— Marquês de Zhenyuan.
Sua voz era baixa, pausada e carregava um traço de autoridade. Fu Tingzhou não teve escolha senão desviar o olhar e se virar com relutância. Seu maxilar se contraiu, os olhos cravados em Lu Heng, e ele perguntou:
— Lu Heng, quem era ela?
Lu Heng lançou um olhar na direção da porta lateral e respondeu com outra pergunta:
— Você invadiu o pátio interno da minha casa. Quem você acha que ela é?
Fu Tingzhou não acreditava que o mundo fosse tão cheio de coincidências assim. Continuou pressionando, pouco a pouco:
— Nunca ouvi dizer que o Mestre Lu tivesse se casado. Como uma mulher apareceu de repente na Mansão Lu?
— Estou de luto filial, não é apropriado me casar — respondeu Lu Heng, lançando-lhe um olhar com um meio sorriso. — Por quê? O Marquês de Zhenyuan agora também cuida da minha vida pessoal? Ou será que o Marquês está sofrendo de amores e, ao ver qualquer mulher, acha que é sua irmã? Acorde. Quando você invadiu, ela ouviu seu nome e sua voz, e mesmo assim se apressou em ir embora. Ela não é sua irmã, é uma das minhas.
As palavras de Lu Heng foram como um balde de água fria despejado sobre a cabeça de Fu Tingzhou. Ele não pôde evitar o desânimo. Sim, ele havia chamado “Qing Qing” de forma tão clara. Se fosse mesmo ela, como poderia simplesmente virar as costas e ir embora? Provavelmente... era apenas uma das mulheres de Lu Heng.
Haveria mesmo alguém no mundo com costas iguais àquelas?
Ao perceber que havia conseguido intimidar Fu Tingzhou e fazer Wang Yanqing sair ilesa, Lu Heng soltou um suspiro de alívio por dentro. Não sentia culpa por quase ter sua mentira desmascarada ali mesmo — ao contrário, adotou o ar de uma vítima injustiçada e disse com tom generoso:
— Hoje é feriado, não quero me irritar num dia bom, então vou deixá-lo por isso mesmo. Espero que, da próxima vez, o Marquês de Zhenyuan não cometa um ato tão grosseiro novamente. Se tiver algo a dizer, venha com educação.
Assim que terminou de falar, Lu Heng se virou. Fu Tingzhou olhou uma última vez na direção de onde ela havia ido e o seguiu, com o rosto carregado.
Lu Heng sentou-se no assento principal e, ignorando o comportamento do convidado, pegou a xícara de chá e soprou lentamente o vapor. Ao entrar no cômodo, Fu Tingzhou lançou um olhar rápido ao redor e percebeu que havia um tabuleiro de xadrez num canto da sala. As peças não tinham sido completamente guardadas — parecia que alguém estivera jogando até pouco tempo, mas algo ocorrera repentinamente e interrompera a partida.
Seus pensamentos voltaram a vacilar. Poderia mesmo ser aquela mulher... ali com Lu Heng? Mas ser concubina não era algo vergonhoso. Se um visitante viesse, naturalmente poderia esbarrar nela. Então por que Lu Heng a afastou?
A mente de Fu Tingzhou estava um caos. Depois de se sentar, perguntou com cautela:
— O Mestre Lu está tão tranquilo assim, que ainda encontra tempo para ensinar xadrez a uma mulher do pátio interno?
Lu Heng assentiu, admitindo com naturalidade:
— Sim. É um dia raro, com clima agradável e uma bela mulher ao lado... pena que foi estragado pelo Marquês de Zhenyuan.
Fu Tingzhou zombou friamente em pensamento. Estava bem que outros homens dissessem esse tipo de coisa, mas ele não acreditava que Lu Heng fosse alguém que se deixasse levar por beleza e perdesse tempo com pessoas sem importância.
Com um meio sorriso, comentou:
— Ouvi dizer que a terceira Senhorita Zhao, famosa por sua beleza e talento, ofereceu-se para ser concubina do Mestre Lu, e mesmo assim foi recusada. Desde quando o Mestre Lu passou a se compadecer de jades frágeis?
Lu Heng sorriu de forma preguiçosa e respondeu com calma:
— As minhas pessoas, naturalmente, são diferentes das outras.
Ao ver aquele leve sorriso nos olhos de Lu Heng, Fu Tingzhou sentiu um desconforto inexplicável. Puxou friamente o canto dos lábios e disse:
— Inesperadamente, a reputação do Mestre Lu é tão ilustre e, ainda assim, ele é tão afetuoso com sua família. Isso realmente abriu os olhos deste marquês. Mestre Lu deve saber por que vim aqui hoje, certo?
Lu Heng soltou um “oh” arrastado, e o brilho nos olhos se aprofundou:
— A irmã do Marquês de Zhenyuan ainda não foi encontrada?
Com tom de compaixão, Lu Heng reacendeu a raiva de Fu Tingzhou. Este respirou fundo, conteve-se e disse com calma:
— O Mestre Lu tem olhos e ouvidos por toda parte, e nenhum sopro de vento na capital lhe escapa. Agora que fez grandes contribuições novamente, em breve será promovido a comandante. Já que o Mestre Lu é tão extraordinário, quero pedir que me ajude a encontrar minha irmã.
Lu Heng sorriu. Baixou os olhos, levantou a tampa da xícara de chá, afastando lentamente a espuma, mas não bebeu, mesmo após longa espera. Fu Tingzhou aguardou pacientemente por um tempo, até não conseguir mais se conter:
— Mestre Lu?
— Sempre ouvi dizer que o Marquês de Zhenyuan é arrogante e nunca abaixa a cabeça para pedir ajuda. Se consegui fazer o Marquês de Zhenyuan me pedir um favor, eu deveria dar tudo de mim para ajudar, mas… — Lu Heng ergueu os olhos, finalmente disposto a desviar o olhar do chá, com um brilho inocente no olhar. — Mas eu realmente não sei o paradeiro de sua irmã mais nova. Entre os centros de saúde ao redor da capital, não houve nenhum relato recente de mulheres desaparecidas. Marquês de Zhenyuan, será que sua irmã não está desaparecida?
Fu Tingzhou estava sentado numa cadeira de huanghuali, os dedos se cerrando inconscientemente. Quando Lu Heng notou isso com um breve olhar, seu sorriso se tornou ainda mais sincero:
— Marquês de Zhenyuan, não quero ofendê-lo, mas sua irmã, estando em idade de noivado… será que havia outro homem em sua mente?
Diz-se que atacar é apontar o motivo oculto do outro, e Lu Heng fez exatamente isso — cutucou a ferida exposta. O rosto de Fu Tingzhou mudou na hora, e ele não conseguiu mais manter a postura, explodindo em fúria:
— Como isso seria possível? Ela sempre viveu na casa dos Fu, a Mansão do Marquês é o lar dela. Onde ela encontraria alguém?
— Isso não se pode afirmar com tanta certeza — respondeu Lu Heng, lançando sal na ferida com calma. — O Marquês de Zhenyuan mesmo disse que ela é filha adotiva. Não importa o quão bem a Mansão do Marquês de Zhenyuan a tratasse, no fim das contas ela era apenas uma jovem sem status. Quando uma filha cresce, inevitavelmente começa a ter suas próprias ideias. Talvez ela tenha desaparecido com a desculpa de oferecer incenso, mas, na verdade, tenha fugido com um homem que amava.
Lu Heng expôs, sem dúvida, o medo mais profundo de Fu Tingzhou.
Aquela já era a terceira vez que Fu Tingzhou o procurava, mas Lu Heng continuava afirmando que não sabia de nada. Mesmo que ele não tivesse certeza, não seria tão evasivo. Será que Qing Qing realmente não está com Lu Heng, mas saiu por conta própria...?
Na verdade, Fu Tingzhou já tinha esse pressentimento. Depois que voltaram do templo, a criada encontrou um mapa e uma carta de despedida no quarto de Wang Yanqing. Fu Tingzhou tinha certeza de que Wang Yanqing nunca conspirou com outro homem além dele. Fuga por amor era um absurdo. Mas... e se ela tivesse partido sozinha?
Ela já pensava em partir e até havia preparado a bagagem. O inesperado foi o ataque nos subúrbios ocidentais, que ocorreu antes do planejado. Talvez ela tenha aproveitado a oportunidade e simplesmente ido embora.
Fu Tingzhou sentiu o coração apertar ao pensar nessa possibilidade.
A família Fu antes aceitava que ele e Wang Yanqing fossem um casal, mas assim que o velho marquês faleceu, ele foi prometido a outra. Chegou ao ponto de levá-la para conhecer a nova noiva justamente no aniversário dela. Ele deveria ter imaginado que uma mulher comum não suportaria uma humilhação dessas. Wang Yanqing era orgulhosa — como poderia aceitar algo assim?
A culpa era dele. Por confiar demais na dedicação de Qing Qing, pisou sem escrúpulos nos sentimentos dela. Achava que ela jamais o desobedeceria, e Qing Qing de fato não queria causar problemas. Então, optou por ir embora silenciosamente, saindo da vida dele e da Mansão do Marquês de Zhenyuan.
Não pode ser! Só nesse momento Fu Tingzhou sentiu medo de verdade. Ele preferiria disputar com Lu Heng mil vezes do que aceitar que ela quis deixá-lo. Cerrou os punhos com força, a voz firme — ele mesmo não sabia se queria convencer Lu Heng ou a si próprio:
— Não. Ela jamais me deixaria.
Lu Heng olhou para ele com um brilho sutil nos olhos, como se estivesse ao mesmo tempo condoído e se divertindo com a situação:
— Sério? O Marquês de Zhenyuan é mesmo confiante. Se ela deixou a cidade, posso ajudá-lo a procurá-la. Mas se simplesmente desapareceu... aí não posso fazer nada.
Fu Tingzhou ainda fitava Lu Heng com desconfiança:
— Mestre Lu, não há mais ninguém aqui, você não precisa ficar rodeando. Naquele dia, você estava nos subúrbios ocidentais. Não foi você quem a levou?
— Claro que não — respondeu Lu Heng com um sorriso, abrindo as mãos num gesto de inocência. — Se fosse eu, já teria ido atrás de você há tempos. Não teria por que inventar tanta desculpa. Já se passou um mês, e qualquer mulher com algum orgulho já teria se matado. Isso não me traria benefício algum. Que sentido teria?
As palavras de Lu Heng eram cruéis, e seus cálculos, bem claros. Mas era exatamente essa frieza lógica nas relações que deixou Fu Tingzhou sem resposta.
Sim... que vantagem Lu Heng teria com isso?
Fu Tingzhou já não sabia se sentia mais arrependimento ou dor. Se ela tivesse sido levada por Lu Heng, ao menos ele ainda poderia se enganar. Ela vai voltar. Mas se ela não estivesse com Lu Heng... nem sequer haveria desculpa para se enganar.
A cabeça de Fu Tingzhou zunia, e ele se levantou como um morto-vivo. Não teve ânimo para dizer mais nada, apenas se virou e saiu.
Lu Heng o observou sair, e o sorriso em seus olhos se aprofundou. No fim, não conseguiu se conter — cobriu as sobrancelhas com a mão e riu silenciosamente.
Nunca tente adivinhar a mente de um verdadeiro vilão. Ele pode, de fato, não buscar lucros… mas é, acima de tudo, perverso.
❛ ━━━━━━・❪ ❁ ❫ ・━━━━━━ ❜
|| Nota da autora:
Fu Tingzhou: Qual o propósito dele afinal?
Lu Heng: O propósito... é a maldade.
Capítulo 34 – Perder
Depois que Fu Tingzhou foi embora, Lu Heng riu demais e foi até o pátio interno procurar por Wang Yanqing.
Wang Yanqing estava em seu quarto e já havia tirado a capa. Ao ouvir que Lu Heng estava vindo, ela largou o pincel, levantou-se e caminhou até ele:
— Segundo Irmão.
Lu Heng tirou sua própria capa na porta, respondeu com indiferença e disse:
— Volte logo, você ainda está com roupas leves. Não fique parada aí.
Wang Yanqing foi arrastada para dentro do quarto por Lu Heng. Assim que entraram, ele notou imediatamente o papel e a tinta espalhados sobre a mesa, e perguntou:
— O que você estava fazendo agora há pouco?
Ao ver a bagunça sobre a escrivaninha, Wang Yanqing correu até lá e começou a guardar os papéis:
— Não é nada. Ultimamente, quando pego o pincel, minha mão fica tão rígida que nem consigo escrever direito, então queria aproveitar para treinar um pouco sozinha.
Ela havia ido receber Lu Heng e acabou esquecendo de arrumar a mesa. Metade dos caracteres escritos no papel estavam horríveis. Wang Yanqing tentou esconder os papéis rapidamente, mas Lu Heng segurou sua mão e disse:
— Somos família. Nem o Segundo Irmão pode ver?
Wang Yanqing assistiu Lu Heng pegar os papéis e folheá-los um por um. Ela quis impedir, mas não teve coragem. Disse, envergonhada:
— Segundo Irmão, minha caligrafia está péssima. Outro dia, quando estiver melhor, eu mostro.
— Seu irmão não é um estranho, não precisa esconder. Além disso, Qing Qing fica bem até no jeito de escrever — disse Lu Heng casualmente, com palavras de consolo, enquanto folheava algumas folhas e logo compreendia o motivo da vergonha de Wang Yanqing.
Seus traços pareciam uma mistura de dois estilos diferentes. Às vezes, eram fortes e agressivos, claramente o estilo de um homem; outras vezes, eram pequenos, delicados e elegantes. Ela oscilava entre os dois estilos enquanto escrevia, sem saber qual era o certo — por isso achava que não conseguia escrever bem.
Lu Heng tinha excelente memória e, com apenas um olhar, reconheceu que o estilo robusto pertencia a Fu Tingzhou, enquanto o mais refinado e gracioso era de Wang Yanqing. Ela provavelmente costumava imitar a caligrafia de Fu Tingzhou no passado, e fazia isso tão bem que poderia enganar qualquer um. No entanto, desde que perdeu a memória, ela seguia seus instintos e alternava entre os dois estilos — uma verdadeira confusão.
O coração de Lu Heng estava claro como um espelho. Fu Tingzhou parece um cachorro por fora, mas por dentro é nojento. Até aprenderam a caligrafia um do outro? Será que Fu Tingzhou também sabia imitar a escrita de Wang Yanqing?
Repulsivo.
Lu Heng não queria nem imaginar o quão próximos deviam ter sido, e por quanto tempo conviveram para conseguirem copiar a escrita um do outro. Ele disse que qualquer caligrafia de Qing Qing era bonita, mas pegou um pincel e, com cuidado, circulou algumas palavras no papel — as que lembravam o estilo de Fu Tingzhou — e as riscou:
— Você está se recuperando bem. Sua caligrafia já está próxima do original. Mas essas aqui... não estão boas. Nem percebeu de onde aprendeu esses caracteres feios, que só atrapalham seu estilo original. Isso não é bom. O mais importante na escrita é ter coerência e estilo próprio. No futuro, você precisa eliminar essas influências estranhas para que não se deixe afetar.
Wang Yanqing ouviu com seriedade e assentiu rapidamente.
Depois de riscar as palavras escritas ao estilo de Fu Tingzhou, Lu Heng finalmente se sentiu aliviado. Ao ver o pergaminho que Wang Yanqing havia escrito com tanto esforço sendo rabiscado por ele, sentiu-se um pouco culpado. Chamou-a com um gesto:
— Venha aqui.
Wang Yanqing parou ao lado de Lu Heng. Ele molhou o pincel no tinteiro e escreveu lentamente no papel as palavras “Wang Yanqing”. Em seguida, entregou o pincel a ela:
— Escreva você mesma.
Wang Yanqing pegou o pincel, ajeitou o instrumento musical de cordas preso à manga, inclinou-se ligeiramente e começou a escrever com o pulso suspenso sobre o papel. Lu Heng ficou ao lado, observando de perfil. Percebeu que Wang Yanqing, inconscientemente, começava a imitar a caligrafia de Fu Tingzhou novamente, e a interrompeu na hora:
— Não se distraia. Escreva como você sempre fez. Não tente imitar ninguém.
Ao ser lembrada, Wang Yanqing parou de forma rígida. Lu Heng estendeu o braço, segurou-a pelos ombros, e com a outra mão guiou a dela, ajudando-a a escrever:
— Escreva o que quiser. Não precisa se preocupar se está bonito ou feio, se os outros vão gostar ou não. Apenas siga seu coração.
Lu Heng segurava sua mão enquanto ela escrevia algumas linhas. Não aplicava força, nem interferia diretamente — mas sempre que Wang Yanqing dava sinais de mudar o estilo, ele apertava sua mão como advertência. Ela foi beliscada várias vezes, até que ouviu a voz dele atrás dela:
— Se errar de novo, não será só a mão que o Segundo Irmão vai segurar.
Wang Yanqing ficou tensa de imediato. Se ele não apertar minha mão... será que vai apertar meu pescoço? Ela se distraiu e alguém apertou sua cintura. Não foi com força, mas Wang Yanqing se assustou. Tentou se esquivar por reflexo, mas Lu Heng a prendeu pelos ombros, impedindo-a de fugir:
— Concentre-se.
Com uma mão segurava a de Wang Yanqing, e com a outra pressionava sua cintura — a ameaça estava clara. Wang Yanqing, enrijecida, escreveu metade de uma folha até, aos poucos, reencontrar o ritmo da caligrafia. Lu Heng finalmente ficou satisfeito e soltou sua mão.
Ela soltou um longo suspiro de alívio, mas logo sentiu-se estranha. Se não fosse pelo lembrete do Segundo Irmão, eu nem teria percebido que estava imitando outra pessoa...
Por que isso acontecia?
Wang Yanqing pousou o pincel e, envergonhada, juntou os papéis bagunçados:
— Obrigada, Segundo Irmão. Já sou adulta, e ainda preciso do Segundo Irmão para me acompanhar na prática da caligrafia.
Lu Heng recolheu lentamente a mão e achou que esse tipo de coisa poderia acontecer mais vezes. Comentou, despreocupado:
— Qual o problema em praticar com seu irmão? Eu também te ensinei quando começou a aprender caligrafia.
Wang Yanqing não lembrava de nada disso e perguntou, curiosa:
— Sério? Mas não parece que aprendi nada do charme do Segundo Irmão. Com quem o Segundo Irmão aprendeu caligrafia?
Lu Heng foi até a cama tipo Luohan e sentou-se. Alisou as mangas e respondeu:
— Aprendi os caracteres há muito tempo. Naquela época, eu ainda estava na Mansão do Príncipe Xing e estudava com o imperador.
(Nota: Uma cama Luohan [罗汉床] é um tipo de mobília tradicional chinesa que serve como sofá e cama.)
Wang Yanqing parou por um instante, sem saber como continuar, então apenas sorriu:
— Não é à toa que o Segundo Irmão escreve tão bem.
Lu Heng fez um gesto para que ela se sentasse. Lentamente, serviu o chá, e a água borbulhou ao cair na xícara de porcelana. O vapor denso subia, e as flores e pássaros desenhados pareciam ganhar vida. Lu Heng perguntou casualmente:
— Fu Tingzhou estava enlouquecido hoje. Ele te assustou?
Ao ouvir esse nome, o sorriso de Wang Yanqing desapareceu, e ela respondeu suavemente:
— Está tudo bem.
Sua mudança de atitude foi muito evidente, e Lu Heng suspirou em nome de Fu Tingzhou. Ele nem comia nem bebia, atormentado por preocupações, dizendo que aceitava qualquer condição se ela voltasse. Mas Wang Yanqing o evitava e até franzia o cenho ao ouvir seu nome.
E tudo isso era obra de Lu Heng.
Ele não achava que estava exagerando — pelo contrário, achava até divertido. Maliciosamente, pensou: Se Fu Tingzhou descobrisse que sua irmã adotiva não apenas deixou de obedecê-lo, como também passou a vê-lo como inimigo... como seria a expressão dele? Ao imaginar esse momento, o sangue de Lu Heng até ferveu de entusiasmo.
Sorrindo, Lu Heng colocou a xícara de chá diante de Wang Yanqing e disse:
— Não fique brava, Qing Qing. Hoje aquele lunático ofendeu você, então vou usar chá no lugar de vinho para me desculpar por ele.
Wang Yanqing respondeu depressa:
— Segundo Irmão, o ladrão Fu é o verdadeiro vilão, o que isso tem a ver com você? Como eu ousaria pedir que o Segundo Irmão se desculpasse?
— Você merece — disse Lu Heng, segurando a mão dela. — Foi negligência minha permitir que ele invadisse a casa e perturbasse você. Fique tranquila, isso não vai acontecer de novo. Se não beber, então não perdoa seu irmão?
Wang Yanqing não conseguiu resistir a Lu Heng. Recuou um passo, pegou a xícara de chá e disse:
— As palavras do Segundo Irmão me deixam envergonhada. Como eu poderia culpá-lo por uma coisa tão pequena?
O coração de Lu Heng se comoveu levemente, e ele perguntou, meio em tom de brincadeira, meio a sério:
— E se fosse algo grande?
Mas Wang Yanqing balançou a cabeça e respondeu com firmeza:
— O Segundo Irmão jamais me faria mal. E mesmo que fizesse, seria para o meu bem.
Lu Heng sorriu e abaixou a cabeça. Enquanto tomava o chá, seus olhos e sobrancelhas ficaram ocultos pelo vapor — não dava para saber qual era sua verdadeira expressão.
Quando ela se entrega a alguém, é com sinceridade e sem reservas. Infelizmente... ele é um mentiroso.
·
Depois que saiu da Mansão Lu, a expressão de Fu Tingzhou mudou drasticamente. Os servos da Mansão do Marquês de Zhenyuan correram para encontrá-lo, preocupados:
— Senhor Marquês, o que aconteceu?
Fu Tingzhou sentia o peito sufocado, sem lugar para descarregar tanta frustração. Gritou “não me sigam”, puxou as rédeas, montou no cavalo e golpeou o animal com um chicote firme. O cavalo castanho-avermelhado relinchou, ergueu as patas e disparou em galope. Os guardas da mansão correram atrás, gritando:
— Senhor Marquês, para onde está indo?
Nenhuma resposta veio da frente, apenas o som acelerado dos cascos ecoando ao longe. Os servos da Mansão do Marquês de Zhenyuan se entreolharam, perplexos, sem entender o que havia acontecido. O que ele falou com o Mestre Lu? E por que saiu daquele jeito?
Fu Tingzhou não queria voltar para casa, nem conversar com ninguém, nem pensar. Cavalgou para fora da cidade, enfrentando o vento seco e gelado por uma hora inteira, até finalmente sentir que havia despertado.
Fu Tingzhou levantou a cabeça e ficou olhando para o céu, atônito. Os campos se estendiam sem fim, as nuvens se acumulavam densas, e o mundo era imenso. Quão pequenos somos nós, humanos?
Sentado em seu cavalo, ele ficou ali parado ao vento, observando por um longo tempo as nuvens que mudavam rapidamente no céu, até que sua mente ficou entorpecida e ninguém apareceu para procurá-lo.
No passado, sempre que estava de mau humor, ele dispensava os criados e se isolava. Mas toda vez, não importava onde se escondesse ou quão remoto fosse o lugar, Qing Qing sempre era a primeira a encontrá-lo.
Mas desta vez, ninguém viria.
Houve uma época em que ele não achava isso nada demais. Muitas coisas, por serem dele por tanto tempo, ele passou a tomar como garantidas. Agora que a perdera, Fu Tingzhou percebeu o quão difícil era encontrar alguém.
O mundo era tão vasto... Onde ela estaria?
Fu Tingzhou só voltou à Mansão do Marquês quando anoiteceu. Assim que entrou pela porta, um dos servos correu para recebê-lo:
— Senhor Marquês, o senhor finalmente voltou! Os criados disseram que o senhor saiu da cidade logo depois de visitar o Mestre Lu. A Velha Madame mandou gente procurá-lo. Onde esteve?
Fu Tingzhou não tinha a menor vontade de conversar, então respondeu displicente:
— Estava entediado na cidade. Só fui dar uma volta.
Depois de responder, ele já ia se dirigir ao quarto, mas o servo o deteve rapidamente, tentando persuadi-lo:
— Senhor Marquês, hoje é o Ano-Novo Chinês. A Velha Madame e as senhoras estão reunidas nos aposentos dela, esperando pelo senhor.
Foi só então que Fu Tingzhou se lembrou: hoje era a véspera do Ano-Novo, o dia do reencontro familiar. Ele mesmo não ligava para comemorações festivas, mas como pilar da Mansão do Marquês, era seu dever acompanhar as mulheres da família e deixá-las tranquilas.
Esgotado, Fu Tingzhou decidiu ir até os aposentos da Velha Madame apenas para cumprir a formalidade. No momento, Fu Chang, Chen Shi, a concubina favorita de Fu Chang, e várias jovens da família já estavam reunidos no salão. Era raro Chen Shi estar no comando e, este ano, ela estava particularmente feliz por reunir todos para celebrar o Ano-Novo. A casa estava animada, mas a pessoa mais importante da Mansão do Marquês — Fu Tingzhou — estava ausente.
Todos sabiam que ele havia ido à Mansão de Lu Heng, mas ninguém ousou dissuadi-lo. O ambiente continuava alegre, mas conforme o tempo passava, todos começaram a se perguntar: Dado o relacionamento entre os Fu e Lu Heng, será que os cumprimentos de Ano-Novo demorariam tanto assim? Chen Shi esperava, olhando de um lado para o outro, mas ninguém aparecia. Por fim, perdeu a paciência e mandou alguém investigar.
Só então souberam que Fu Tingzhou saíra da Mansão Lu bem cedo. Ele proibira que o seguissem e cavalgara sozinho para fora da cidade. O criado não teve coragem de contar isso a Chen Shi e voltou discretamente para a Mansão, achando que o Marquês retornaria logo. Mas, quando o sol já se punha no oeste, ele ainda não havia voltado, e os criados não conseguiram mais esconder — revelaram a verdade para Chen Shi.
Ao saber disso, ela ficou furiosa: tanto com os criados por mentirem, quanto com Fu Tingzhou por não lhe dar o devido respeito. É claro que ela não se atreveu a ir pessoalmente até a Mansão Lu, mas mandou vários grupos procurar fora da cidade. Ela precisava trazê-lo de volta. No entanto, apesar das buscas, ninguém conseguiu encontrá-lo. A raiva de Chen Shi tornou o ambiente nos aposentos da Velha Madame tenso. As filhas das concubinas, temendo o clima pesado, inventaram desculpas para sair e foram conversar nas alas laterais.
Finalmente, na hora do jantar, Fu Tingzhou retornou. Ao ouvirem o relatório dos criados — “O Senhor Marquês chegou” — as mulheres da família respiraram aliviadas e correram ao salão principal, tentando animar o ambiente.
Embora Fu Chang tivesse um título elevado, quem realmente comandava a Mansão Zhenyuan era Fu Tingzhou. Sua atitude influenciava diretamente o status das mulheres da família, seus dotes e até seus futuros casamentos. Para elas, agradar o irmão mais velho era mais importante do que agradar o pai ou a primeira esposa.
Várias damas correram até o salão. O ambiente já estava cheio de gente. Fu Tingzhou sentou-se ao centro e cumprimentou a avó e os pais com indiferença:
— Este filho foi desatento, fez a avó, o pai e a mãe se preocuparem. Após o jantar de véspera, mãe pode iniciar o banquete direto. Não precisam me esperar.
— Como assim? — Chen Shi não concordou. — A ceia de Ano-Novo só pode começar quando a família estiver reunida. Agora que o Senhor Marquês voltou, preparem o jantar.
Mesmo que não fosse pelo valor simbólico da reunião, a ceia da Mansão não começaria sem a presença de Fu Tingzhou. Ele era o Marquês de Zhenyuan — todos dependiam dele. Quem teria coragem de comer com o mestre ausente?
Contudo, o que Fu Tingzhou menos queria ouvir agora era a palavra “reunião”. Chen Shi se agitava para organizar o banquete, Fu Chang sorria, embriagado pelas bajulações da concubina, e as jovens da família, rodeando a Velha Madame, conversavam com vozes alegres como sinos de prata. Ninguém parecia lembrar que a vida ou morte de Wang Yanqing ainda era incerta.
Ou talvez... não era que não lembravam — apenas não se importavam.
Fu Tingzhou observava aquelas pessoas celebrando alegremente a véspera do Ano-Novo. Quanto mais riam, mais gelado ficava seu coração. Era como se uma farpa estivesse cravada bem fundo em seu peito. Invisível à primeira vista, mas que, a cada respiração, perfurava mais, até se transformar em uma dor fina e prolongada que o sufocava.
Mesmo assim, Chen Shi quis jogar sal em sua ferida, falando alto:
— Senhor Marquês, finalmente voltou! O Marquês de Yongping enviou caixas de presente para o Ano-Novo. Venha ver, ouvi dizer que foram preparadas pela Terceira Senhorita Hong.
Ao ouvir isso, todos no salão olharam para Fu Tingzhou e sorriram. Ele, sentado bem no centro de todos os olhares, não sentiu nenhuma alegria. Nem sequer sorriu. Respondeu, indiferente:
— Entendido. Deixem de lado. Amanhã irei cumprimentar o Marquês de Wuding e o Marquês de Yongping pessoalmente. Podemos falar disso depois.
As criadas, animadas com as caixas de presente, congelaram ao ouvir suas palavras. Mas o Senhor Marquês realmente não demonstrava interesse algum — nem sequer olhou para os presentes. As servas se sentiram constrangidas e recuaram apressadas, abraçando os objetos.
Chen Shi não se importou e continuou alegremente a falar sobre casamento:
— Depois de fevereiro, termina o período de luto de seu avô. Você poderá se casar com a Terceira Senhorita Hong. Ela tem nascimento nobre, é virtuosa e filial. Depois de entrar para nossa família, certamente será uma boa esposa e mãe.
Fu Tingzhou permaneceu sentado, ouvindo Chen Shi falar com entusiasmo. Seu avô nunca aprovou esse casamento. E ele estava certo em não aprová-lo. O problema era que os outros não enxergavam isso. Mas será que ele podia dizer isso em voz alta?
Interrompeu, frio:
— O luto do avô ainda não terminou. Não devo realizar banquetes ou casamentos. Mãe, cuidado com suas palavras.
Chen Shi sentiu o baque — pequenas recusas acumuladas como pregos. Só então percebeu que Fu Tingzhou estava de mau humor. Observou atentamente seu rosto e, depois de pensar um pouco, pareceu se dar conta do motivo. Com convicção, disse:
— Senhor Marquês... está preocupado com os assuntos da corte? A culpa é minha, você foi à Mansão do Mestre Lu hoje, certamente discutiram questões sérias, e eu ainda fico te puxando para conversar...
Ao ouvir aquele nome, Fu Tingzhou ficou visivelmente mais irritado e respondeu, seco:
— Não tem nada a ver com ele.
— Não foi o Mestre Lu? — Chen Shi se surpreendeu. Bateu no próprio peito e, como quem quer se exibir para a concubina ao lado, disse: — Que bom! Esse Mestre Lu não é nada fácil de lidar. Foi ele quem revelou aquele caso de corrupção, não foi? Muitas famílias da capital foram investigadas, e no fim até o Primeiro-Ministro não saiu ileso. Um verdadeiro terror.
As mulheres não sabiam muito sobre disputas políticas, mas todas ainda se lembravam com medo das buscas domiciliares que ocorreram recentemente. Reclamaram por um tempo, mas ninguém ousou mencionar o nome do Comandante Lu. Mesmo que tivesse apenas dois anos a mais que Fu Tingzhou, agora ele era um oficial de terceiro escalão. Tinha autorização para entrar e sair do Palácio Imperial. E, do ponto de vista de escolher um bom genro, era um talento muito melhor que Fu Tingzhou — mas, ainda assim, nenhuma família queria casar suas filhas com ele.
Chen Shi, mesmo tentando se exibir, sabia muito pouco sobre a corte, e logo ficou sem assunto. O tema entre as mulheres voltou ao habitual: comida, diversão e festividades.
Em poucos dias seria o Festival das Lanternas — a única chance que as mulheres tinham de sair em público de forma respeitável. As quatro jovens da família Fu esperavam ansiosamente por essa data. A filha de Chen Shi lhe deu uma dica, e ela perguntou a Fu Tingzhou:
— Senhor Marquês, já tem planos para o Festival das Lanternas?
(Nota: O Festival das Lanternas [上元节] ocorre no 15º dia do 1º mês lunar. É uma celebração tradicional em homenagem aos antepassados falecidos, com lanternas, bolinhos de arroz, fogos de artifício e outras festividades.)
— Planos? — Fu Tingzhou repetiu, confuso. — É só um festival comum. Que planos eu teria?
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|| Nota da autora:
Lu Heng: Você não tem planos, mas infelizmente eu tenho muitos.
Capítulo 35 — Alegria e Tristeza
Assim que Chen Shi ouviu aquilo, ela soube que Fu Tingzhou sequer havia aberto aquela porta. Em outras palavras, não era que ele não compreendesse homens e mulheres — era que ele não gostava da terceira Senhorita Hong.
Se fosse uma mulher de quem não gostava, naturalmente não se importaria. Mas quando alguém gosta de outra pessoa, não importa o que faça, mesmo ao ver uma folha cair, irá pensar nela.
Chen Shi não conseguia acreditar. Se Wang Yanqing estivesse aqui agora, será que Fu Tingzhou não teria organizado algo para o Festival das Lanternas?
Chen Shi suspirou por dentro. Ela realmente não conseguia entender. Era apenas uma garota órfã, sem pai, sem irmãos, sem apoio, que sequer conseguia garantir seu próprio dote. Como um fardo desses podia ser tratado como um tesouro pelo velho Marquês Fu e por Fu Tingzhou?
O velho Marquês era idoso e gostava de crianças — Chen Shi até entendia a bondade dele para com a moça. Mas quanto a Fu Tingzhou… ele crescera na capital, quantas pessoas ricas e belas ele já não tinha visto? E, ainda assim, por uma simples Wang Yanqing… como ela podia ser digna de um tratamento especial?
O rosto de Chen Shi se fechou; estava evidente que ela estava descontente. Mas, ao lembrar que era Ano-Novo, ela se conteve. Sorriu novamente e disse:
— Não há toque de recolher na noite do Festival das Lanternas. É raro que todos possam sair, e muitos jovens, solteiros e recém-casados, estarão na rua se divertindo.
Depois de falar, Chen Shi olhou para Fu Tingzhou com expectativa, prestes a dizer claramente que a terceira Senhorita Hong também compareceria. Mesmo que fosse uma tora de madeira, qualquer um entenderia a insinuação… mas Fu Tingzhou continuou indiferente:
— A senhora quase sofreu uma emboscada no começo do mês só por oferecer incenso. O Festival das Lanternas vai estar ainda mais lotado, é melhor deixar pra lá.
As criadas e moças da família Fu estavam ansiosas, mas ao ouvirem as palavras de Fu Tingzhou, desanimaram de imediato. Sabiam que naquele ano, não poderiam sair. Chen Shi ficou incomodada e seu tom ganhou um certo desespero:
— Você está com medo de que algo aconteça e, por isso, não quer sair? Ou está insatisfeito com a nora que escolhi e está se recusando de propósito?
As quatro jovens presentes se assustaram ao ouvir isso. A segunda Senhorita Fu, filha da linha principal, rapidamente olhou para o rosto de Fu Tingzhou, sorriu e puxou a manga da mãe:
— Mãe, o que está dizendo? O Segundo Irmão só está preocupado com a segurança. Está fazendo isso pelo nosso bem...
As outras criadas e moças aproveitaram a deixa para amaciar o clima. Ninguém consolava Chen Shi diretamente, mas, uma vez que alguém a puxava, o fogo em seu coração reacendia, e ela se tornava ainda mais implacável:
— Seria ótimo se ele fosse mesmo tão piedoso. Mas tenho medo de que, no fundo, ele me guarde rancor, e por isso me contrarie em tudo.
— Em um dia tão bom, ele nem se dá ao trabalho de dizer algumas palavras... — disse a Velha Madame, que até então permanecera em silêncio, mas agora falava com seriedade. — As moças já estão trancadas em casa há um ano. Não é fácil encontrar uma festividade. Deixem-nas sair e se divertir um pouco. Se você não quiser se incomodar, que seja. Chen Shi pode ir com alguns homens a mais para garantir que ninguém interfira com as jovens.
Diante das palavras da Velha Madame, o que mais Fu Tingzhou poderia fazer?
— O que a senhora está dizendo, avó? — respondeu ele. — Este neto só está preocupado com uma nova emboscada que possa ferir minha mãe e minhas irmãs. Como poderia estar com preguiça? Pode ficar tranquila. Desta vez, arranjarei escolta e irei pessoalmente com elas para garantir que ninguém tenha chance.
Fu Tingzhou finalmente cedeu. As moças presentes sorriram, e até o rosto de Chen Shi se suavizou. A concubina de Fu Chang logo correu a implorar para que ele também as deixasse ir. Fu Chang, bajulado pelas belezas, acenou com a mão, permitindo que todos saíssem juntos.
Fu Tingzhou observou a cena com frieza, achando tudo aquilo extremamente irônico. Chen Shi estava certa — ele de fato não queria lidar com a terceira Senhorita Hong, não queria acompanhá-la para ver as lanternas, por isso recusara. Mas a segurança também era uma de suas preocupações.
Ele havia recusado claramente, mas sua mãe e irmãs o ignoraram e pressionaram a avó para conseguir o que queriam. Só pensam em se divertir. Não se importam nem um pouco com o fardo que carrego. Se fosse ela...
Fu Tingzhou interrompeu o pensamento. Não podia pensar em Wang Yanqing. Se pensasse nela, não conseguiria respirar.
Desde que ela desaparecera, ele descobriu o quanto ela era importante em sua vida. Estava presente em tudo: suas roupas, comida, moradia, em cada gesto seu, ao sentar ou deitar. E foi só após seu desaparecimento que Fu Tingzhou percebeu o quão gentil, sensata e atenciosa Qing Qing era em comparação aos outros.
Ela era como a água: silenciosa e tolerante, nunca discutia, nunca exigia reconhecimento, nunca chamava atenção para si — mas cuidava de tudo por ele. Muitas vezes, nem precisava falar; Qing Qing entendia naturalmente. Fu Tingzhou dava o primeiro passo, ela compreendia, e fazia exatamente como ele desejava.
Estiveram juntos por tanto tempo que Fu Tingzhou achava que todas as mulheres do mundo eram assim. Nada de especial. Era como um peixe vivendo na água — desperdiçando os recursos ao redor. Mas, quando se acostumou, a água do lago secou. E ele, nu, foi lançado à margem, sufocando cada vez mais.
Enquanto isso, o jantar de véspera já havia sido servido pelas criadas. Uma delas, com um vestido amarelo-pálido, entrou e anunciou:
— Madame, Senhor Marquês, a mesa está pronta.
Todos se levantaram. Quando a Velha Madame se ergueu com dificuldade do leito de Arhat, as criadas e moças correram para ajudá-la a ir até a sala de jantar. As outras mulheres a seguiram, rindo, como um jardim de flores em movimento.
Fu Tingzhou veio por último, observando a cena em transe.
Comparada às famílias dos Marqueses de Wuding e Yongping — que herdavam seus títulos desde a fundação do império —, a Mansão Zhenyuan talvez não fosse tão numerosa, mas após mais de vinte anos na capital, a família Fu também era grande.
Em anos anteriores, durante os feriados, os tios vinham cumprimentar o velho Marquês Fu. Tios, tias, irmãs, todos reunidos a ponto de ninguém saber mais quem era quem. Fu Tingzhou, que detestava multidões, preferia ficar sozinho com Wang Yanqing. Afinal, o velho Marquês o favorecia, e ninguém ousava criticar sua ausência. Ele só aparecia para o banquete — mas Qing Qing sempre estava ao seu lado.
Enquanto os outros conversavam com a Madame e Chen Shi, Fu Tingzhou levava Wang Yanqing para algum recanto tranquilo. Os irmãos e irmãs tentavam se aproximar, e ele os tratava com palavras cordiais se estivesse de bom humor. Se não, partia com Wang Yanqing sem dizer nada. Para ele, ela era diferente de todos. Ela era dele. Não importava onde fosse, se ele se virasse, ela sempre estaria lá.
Mas agora… quando Fu Tingzhou se virou, não havia sinal de Wang Yanqing. Ela era como um sonho ao amanhecer — bastava o sol nascer, e desaparecia com a neblina.
Ele era o único que não conseguia deixá-la para trás. O único que não a esquecera.
Uma criada que acompanhava Chen Shi notou que o Marquês não seguira com os demais. Voltou apressada para perguntar, pedindo desculpas com delicadeza. Enquanto falava, espiava o rosto de Fu Tingzhou. Era a mesma criada que, um mês antes, levara sopa para Wang Yanqing. Agora que ela não estava mais, finalmente podia falar com o Marquês — e não conseguiu esconder sua alegria.
Mas o comportamento de Fu Tingzhou foi completamente diferente do que imaginara. Ele nem sequer olhou para ela, muito menos prestou atenção em seu corpo orgulhosamente adornado. Estava tranquilo e pensativo. E, sem dizer uma palavra, seguiu seu caminho.
A criada ficou profundamente desapontada. Olhou para sua roupa cuidadosamente escolhida, bateu o pé com raiva e correu para alcançá-lo.
Na sala de jantar, muitos já o esperavam. Quando Fu Tingzhou entrou, todos respiraram aliviados, o cumprimentaram e se sentaram. O jantar de véspera estava dividido em várias mesas. Ele e a Velha Madame ocupavam os assentos principais, enquanto os jovens mestres, moças e tias tinham seus lugares designados.
Instintivamente, Fu Tingzhou quis se dirigir à lateral, mas as pessoas ao redor insistiram para que ocupasse o assento principal. Só então percebeu — seu avô estava morto, e agora ele era o chefe da família Fu.
Sentado no lugar que antes pertencera ao avô, virou a cabeça por reflexo e, por um instante, viu uma mulher de alma pura como gelo e neve sentando-se ao seu lado. Ela usava uma saia vermelha com armadura branca e bordas felpudas. Suas roupas eram imaculadas — perfeitas ao extremo, realçadas por uma cor vibrante.
Por um momento, sua silhueta se sobrepôs à de alguém que ele vira de costas durante o dia. Fu Tingzhou tentava vê-la melhor, quando uma voz o interrompeu:
— Tirem esse vaso de flores, não veem que está atrapalhando o Marquês? Marquês, há mais alguma coisa que o desagrade?
Fu Tingzhou piscou — a mulher desaparecera. Ao seu lado, não havia mais ninguém. Apenas criadas apressadas retirando o vaso de flores. Ele desviou o olhar e fitou a mesa à sua frente, sem um pingo de apetite.
Só depois que todos se sentaram foi que notaram um par de hashis a mais. Chen Shi se irritou e mandou, em voz alta, que os tirassem. Fu Tingzhou não suportou mais:
— Por que não deixam para Qing Qing?
Assim que as palavras saíram de sua boca, o saguão barulhento silenciou. Todas as mulheres — doces, animadas, contidas ou elegantes — ficaram em silêncio.
Depois de um tempo, alguém tentou suavizar:
— Hoje é um dia feliz… como a Senhorita Wang não está aqui, talvez não seja apropriado deixar os hashis.
— Por que seria inapropriado? — Fu Tingzhou estava impassível. Seu olhar era cortante como lâminas de gelo, fixo na pessoa que falara. — Ela não é da família Fu?
Fu Tingzhou fora criado pelo próprio Fu Yue, e agora, aos vinte anos, já herdara o título e frequentava a corte. Era admirado e reverenciado por todos na Mansão Zhenyuan. Ninguém conseguia sustentar seu olhar.
Assim que voltou, a atmosfera da mansão se animou automaticamente. Mas agora, com aquela expressão fria, todos ficaram sem fôlego.
Chen Shi não conseguiu encará-lo e disse:
— Marquês, ela pode ter morrido com aquela queda… Há pessoas idosas em casa. Colocar um par de hashis vazios à mesa… se lembrar disso, é um mau presságio!
Ela pronunciou “morreu” com tanta leveza, como se cair de um penhasco não fosse nada demais.
Mas Fu Tingzhou sequer a ouviu. Parecia que uma agulha perfurara seu tímpano. Estava de mau humor, e isso se estampava em sua expressão:
— Ela caiu porque estava me protegendo de uma flecha. Se minha mãe acha isso azarado, então pensa que eu é que deveria ter morrido naquele dia?
Ao ouvir isso, o rosto de Chen Shi também se fechou. Ela largou os hashis com força sobre a mesa:
— Em pleno Ano-Novo, que história é essa de morrer ou não morrer? Bah, bah, bah! Péssimo presságio!
Fu Tingzhou não se importava com o tratamento de Chen Shi, que sempre fazia distinções tão claras, mas naquele dia, ele sentia, de fato, o coração despedaçado. Seu olhar percorreu a mesa, e todos evitaram encará-lo. Os que bebiam chá baixaram a cabeça. Havia embaraço em seus rostos, mas nenhuma tristeza.
Ninguém achava que a ausência de Wang Yanqing fosse algo relevante. Agora, no inverno gélido do décimo segundo mês lunar, a água se transformava em gelo ao tocar o chão, e ela permanecia desaparecida — enquanto todos ali desfrutavam alegremente o jantar da véspera de Ano-Novo.
Muitas coisas que Fu Tingzhou ignorara no passado começaram a lhe voltar à mente, uma após a outra: a insatisfação de Chen Shi, a conivência da Velha Madame, os cochichos das irmãs da família Fu... Na imensa Mansão do Marquês, exceto pelo velho Marquês Fu e por ele mesmo, ninguém tratava Wang Yanqing com bondade. Como ela conseguiu suportar todos esses anos?
Não… nem mesmo eu a tratei bem.
Fu Tingzhou não conseguiu mais permanecer sentado. Levantou-se bruscamente, e sua cadeira arrastou-se pelo chão com um som agudo. Seu rosto era tão frio quanto ferro, e ele falou com indiferença:
— De repente me lembrei de alguns assuntos na corte. Preciso sair. Avó, pai, mãe, fiquem.
Assim que terminou de falar, sem esperar qualquer reação dos demais, deu meia-volta e saiu a passos largos. A criada na porta tentou detê-lo, mas, antes que pudesse dizer algo, foi silenciada por um único olhar de Fu Tingzhou.
A cortina da porta foi levantada, e o vento gelado varreu o interior, dissipando instantaneamente o calor e a fumaça do ambiente. Por fim, alguém reagiu, curvou-se apressadamente diante da Velha Madame, de Fu Chang e de Chen Shi, e correu atrás de Fu Tingzhou com seu manto.
Assim que Fu Tingzhou deixou a mesa, o cômodo antes animado mergulhou em silêncio. Chen Shi atirou os talheres e os hashis sobre a mesa, o rosto pálido de raiva. Por fim, a Velha Madame bateu com sua bengala e disse:
— Já que o Marquês tem assuntos a tratar, vamos jantar. Chen Shi, cuide da refeição das crianças.
Diante da ordem da Madame, Chen Shi forçou-se a recompor a expressão e mandou abrir a mesa. Mesmo com uma criada tentando contar piadas ao fundo, a atmosfera não voltava a esquentar.
O jantar da véspera de Ano-Novo, símbolo de reunião familiar, terminou em constrangimento e estranheza. Após comerem, as criadas ajudaram a Madame a repousar no pavilhão aquecido, e os outros se dispersaram aos poucos, cada um procurando alguma distração enquanto aguardavam a chegada do novo ano.
A segunda Senhorita Fu se enroscou ao lado de Chen Shi e perguntou em voz baixa:
— Mãe, o Segundo Irmão ainda está pensando nela?
O coração de Chen Shi já ardia de raiva havia muito tempo. Ao ouvir aquelas palavras, soltou um sorriso gelado, apontando e repreendendo:
— Olhando assim, o veneno está enraizado. Não sei que tipo de sopa de felicidade aquela desgraçada fez ele tomar. É só uma órfã! Mas ele a procura como se tivesse perdido a alma. Seria até melhor se tivesse morrido na queda. Mas se sobreviveu por acaso e passou um mês nas mãos de estranhos... não estaria manchando o nome da nossa Mansão do Marquês Zhenyuan?
Ao mencionar Wang Yanqing, Chen Shi mostrou total desprezo, e a segunda Senhorita Fu não ousou responder. Ela esfregou o cinto de sua roupa, então se aproximou de repente e perguntou:
— Mãe, aquela pessoa era o Lu...?
— Psiu! — Chen Shi rapidamente repreendeu a filha, ergueu os olhos e olhou ao redor. Depois bateu na cabeça da moça com evidente nervosismo. — Você ousa mencionar esse nome?
A segunda Senhorita Fu recebeu o golpe firme, mas não ousou esfregar a cabeça, suportando a dor enquanto dizia:
— Mãe, eu errei. Não estou curiosa. Mas se for ele mesmo, então o Segundo Irmão ainda vai comemorar o Ano-Novo hoje?
Na verdade, nem Chen Shi sabia ao certo. Tudo o que sabia sobre os assuntos da corte vinha da Marquesa de Yongping. A Marquesa de Yongping era irmã mais nova do Marquês de Wuding, tinha mais conhecimento que Chen Shi, mas mesmo assim, seu alcance era limitado. Pensando nas coisas que vira e ouvira desde que chegara à capital, Chen Shi respondeu com pesar:
— Não se pode dizer nada com certeza sobre o que acontece na corte. Hoje somos inimigos, amanhã podemos ser aliados. Onde há certezas?
Chen Shi não compreendia os jogos políticos com profundidade, mas sua percepção não estava errada. A segunda Senhorita Fu, por sua vez, nem sequer compreendia o que a mãe dizia — e não se interessava por esses assuntos. O que lhe passava pela cabeça era que faltava liderança na residência.
Ela perguntou, em voz ainda mais baixa:
— Se o Segundo Irmão ainda pensa nela, o que vamos fazer quando a terceira Senhorita da Mansão do Marquês de Yongping entrar pela porta?
— O que fazer? Que mestre não aceita concubinas? — Chen Shi respondeu com desdém. — Na parte interna da Mansão Yongping, há vários filhos e filhas de concubinas. Antes do casamento, nosso Marquês não tinha concubinas nem filhos ilegítimos — é considerado um homem limpo. O fato de ele não aceitar ninguém agora é só para preservar a face da família Hong. Mas depois que a noiva entrar pela porta, você ainda quer impedi-lo de acrescentar outras pessoas ao quarto do Marquês?
Enquanto falava, Chen Shi lançou um olhar para a filha, beliscou sua orelha e disse:
— Você já tem idade para discutir casamento. Não vou mais esconder essas coisas de você. Preste atenção e aprenda bem, entendeu?
A segunda Senhorita Fu esquivou-se rapidamente da mão da mãe e assentiu várias vezes. Esfregando os lóbulos doloridos, pensava consigo: Como poderia o Segundo Irmão evitar aceitar outras mulheres só para poupar a família Hong? Era claramente por causa de Wang Yanqing.
No passado, o Segundo Irmão levava Wang Yanqing com ele aonde quer que fosse — nem mesmo a irmã mais nova conseguia se aproximar. Fu Tingzhou e Wang Yanqing eram os mais valorizados pelo velho Marquês Fu, e o prestígio dos dois superava o de Fu Chang e Chen Shi. Faziam tudo juntos, sem nunca se misturar com estranhos. Os irmãos e irmãs sentiam ao mesmo tempo inveja e ciúmes. Ninguém ousava provocar Fu Tingzhou, então, no fim, toda a inveja recaía sobre ele… e todas as setas envenenadas da inveja, sobre Wang Yanqing.
A segunda Senhorita Fu também falara muita coisa ruim sobre Wang Yanqing em particular. Como uma mulher sem qualquer laço com a família Fu podia viver melhor que essas jovens nobres legítimas? Mas, nas madrugadas silenciosas, a jovem invejava o relacionamento entre Wang Yanqing e Fu Tingzhou incontáveis vezes. Os dois eram tão próximos… Quando se casassem no futuro, a vida de Wang Yanqing seria confortável e tranquila, certo?
Até mesmo ela acreditava, no fundo, que Fu Tingzhou e Wang Yanqing formavam um casal. Quem diria que Wang Yanqing cairia de um penhasco e desapareceria?
A segunda Senhorita Fu ficou surpresa. Chen Shi, radiante de felicidade. A Velha Madame fingiu não ver, não ouvir. E a Mansão do Marquês de Yongping… estava mais que satisfeita com o ocorrido.
Todos achavam que o assunto havia se resolvido perfeitamente — mas a reação de Fu Tingzhou superou todas as suas expectativas.
Fu Tingzhou se importava com Wang Yanqing muito mais do que todos imaginavam. Neste último mês, a segunda Senhorita Fu viu com os próprios olhos: aquele Segundo Irmão, sempre reservado e introvertido, estava procurando por alguém feito um louco — e chegou até a confrontar Lu Heng. Até mesmo o Marquês de Wuding enlouqueceria se ousasse questionar Lu Heng.
Mais ainda, naquele mesmo dia, só porque sua mãe dissera algo ruim sobre Wang Yanqing, Fu Tingzhou largou os hashis e saiu diante de todos. Era a ceia da véspera de Ano-Novo, e Fu Tingzhou demonstrou claramente sua posição. No futuro, que espaço restaria para Hong Wanqing começar qualquer coisa?
A mãe de Fu Tingzhou dizia que Wang Yanqing não servia. Mas então, Hong Wanqing não perderia de forma completa diante daquela ali?
A segunda Senhorita Fu suspirou repetidas vezes em silêncio. Quando um homem se importa ou não se importa, é algo impossível de disfarçar. Sem explicação, algo a incomodava, e ela perguntou:
— Mãe, você acha que Wang Yanqing ainda está viva?
Chen Shi franziu os lábios e não respondeu. Era justamente isso o que ela mais queria saber. Não sabia explicar por quê, mas sempre sentira que Wang Yanqing não estava morta — e que não estava longe. Havia em seu coração uma inquietação inexplicável. Após um tempo, soltou um suspiro:
— Seria ótimo se ela simplesmente tivesse morrido. Um morto é um morto, e assim continuaria sendo para sempre. A terceira Senhorita Hong não teria de disputar nem com um altar ancestral. O que me dá medo... é que ela volte mais tarde.
O vento de inverno era cortante. As montanhas e rios mergulhavam no silêncio, e a majestosa e solene cidade de Pequim encontrava-se envolta pela noite. Havia quem chorasse e quem sorrisse. Mas, independente das alegrias ou tristezas, o tempo seguia seu passo, constante — e logo, o Ano Novo se aproximaria.
Fu Tingzhou permanecia no quarto de Wang Yanqing, os dedos tocando lentamente seus pertences. Ninguém morava ali havia um mês, mas o cômodo seguia limpo e arrumado, como se sua dona jamais tivesse partido. Fu Tingzhou sempre suspeitava que, a qualquer momento, ela empurraria a porta e o chamaria com um sorriso:
— Segundo Irmão.
Mas ele esperou a noite inteira... e o som que tanto desejava ouvir jamais veio.
Fu Tingzhou suspirou profundamente. Tudo ali estava impregnado das lembranças que compartilhavam, e ele facilmente conseguia reconstruir as cenas: como Qing Qing lia um livro naquele canto, como se sentava diante do divã para enfaixar seus ferimentos, como o repreendia por suas travessuras — mas, no piscar de olhos, já estava à mesa imitando sua caligrafia e copiando livros para ele.
Lembrou-se de todos os longos anos em que cresceram juntos. O velho Marquês Fu criava os filhos como se fossem soldados. A juventude de Fu Tingzhou não fora bonita — e a maioria das memórias estava ligada a surras. No entanto, por causa dela, os dias de treino sob o vento gelado da manhã, e as noites chuvosas jogado nas florestas para treinamento... se tornaram vivos e interessantes.
Ele empurrou a janela, ficou de pé diante dela e observou a noite por muito tempo.
Qing Qing, por que você quis ir embora?
Logo após se fazer essa pergunta, achou graça. No fundo, ele sabia a resposta — apenas havia subestimado os sentimentos de Qing Qing por ele.
Se soubesse de antemão que o preço por conquistar poder político seria perder Qing Qing... jamais teria feito tal escolha. Mas Qing Qing não lhe deu mais uma chance de responder.
Fu Tingzhou fitava o céu noturno com olhos intensos. Lá no alto, a lua estava escondida, e as estrelas, afundadas — tudo escuro, opaco. De repente, ouviu-se um alvoroço lá fora. O som alto e apressado de fogos de artifício explodiu, e logo, incontáveis fogos subiram ao céu, competindo para florescer no firmamento.
A hora havia chegado. Mas a primeira pessoa a lhe desejar felicidades a cada ano... não estava mais lá.
Fu Tingzhou observava com indiferença as chamas e as flores prateadas que se espalhavam no céu. Aquelas luzes eram belas, mas, após aquele instante de brilho, cairiam no silêncio eterno. Ele fitava as longas marcas feias de fumaça, perguntando-se:
Onde ela estaria agora?
Na cidade natal? Em alguma cidade desconhecida? Talvez, neste exato momento, também esteja olhando para o céu, contemplando o mesmo fragmento de poeira cósmica que eu.
Naquele instante, na Mansão Lu, Wang Yanqing estava enrolada em um manto de pele e, enfim, teve permissão para sair. Parou debaixo do beiral do telhado, sentindo desconforto no pescoço. Estava prestes a puxar o colarinho quando uma voz soou ao seu lado:
— Não afrouxe.
Wang Yanqing suspirou:
— Eu sei. Só queria dizer para meu Segundo Irmão: Feliz Ano-Novo.
Justo naquele momento, uma fileira de fogos estourou no céu, e o som crepitante abafou tudo ao redor. Lu Heng não conseguiu ouvir e se inclinou para o lado dela, perguntando:
— O quê?
Wang Yanqing se aproximou e sussurrou no ouvido de Lu Heng:
— Segundo Irmão, desejo-lhe sorte e prosperidade neste novo ano.
Lu Heng sorriu, abaixou os olhos e olhou para Wang Yanqing profundamente:
— Tudo bem. Essa é a frase que Qing Qing diz todo ano, nesta mesma noite.
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Nota da Autora:
Fu Tingzhou: A lua brilha redonda na antiga China — algumas famílias estão felizes, outras tristes. Vários casais estão sob a mesma tenda, e vários outros, espalhados por outros estados.
Lu Heng: Obrigado. As alegrias e tristezas dos seres humanos jamais são as mesmas. Na minha casa há felicidade, na sua… tristeza.
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