Capítulo 35 Parte 1 – Toque (I)


 Quando Wei Liang se aproximou, o coração de Lin Jiu disparou. Seu manto preto estava cheio de buracos de vários tamanhos e, através do tecido rasgado, uma mancha vermelho-escura era claramente visível por baixo — parecia, à primeira vista, que ele vestia uma túnica interna da cor do sangue sob o manto externo.

Mas Lin Jiu sabia que aquele homem nunca usava túnica interna. Então tudo aquilo só podia ser sangue dele.

Segurando a juba na nuca de Doulong, ela pulou de suas costas e caminhou até Wei Liang.

O corpo inteiro de Doulong havia ficado mole. Ele encolheu sua cabeça felpuda e desproporcional, recolheu as quatro patinhas gordinhas e, com cautela, recuou até ficar fora do alcance de Wei Liang.

A criatura rechonchuda olhou para a expressão de Wei Liang e depois se jogou no chão, como um pato achatado, com as patas traseiras abertas, a boca escancarada, a língua pendurada e arfando pesadamente. A mensagem era mais ou menos: “Você mandou eu cuidar dela, e eu cuidei. Se ela quer me provocar desse jeito, o que eu posso fazer? Olha como estou exausto!”

Lin Jiu também sentiu um leve formigamento no couro cabeludo. Wei Liang havia enfrentado um inimigo difícil enquanto ela se divertia com Doulong. De qualquer forma, aquilo parecia um pouco inadequado...

Embora o rosto dele permanecesse sem expressão, Lin Jiu sentia uma intensidade pesada no olhar que ele lançava sobre ela. Além disso, ele não fazia o menor esforço para conter sua presença — seu aroma frio e único, misturado ao fedor do sangue, fluía em direção a ela como um tsunami, como se pudesse penetrar em sua própria alma.

Seus olhos se prenderam à testa dele, onde havia uma ferida de tamanho moderado, provavelmente causada por uma lâmina afiada. Uma gota de sangue escorria pela pele jadeada, deslizando diagonalmente da borda do olho como uma lágrima carmesim, acrescentando um estranho fascínio ao rosto frio e bonito. Normalmente, quando usava aquela expressão vazia, parecia uma escultura de jade impecável — bela, sim, mas sem a vitalidade de um ser vivo. Mas, à medida que ela interagia mais com ele, aquela casca fina de perfeição começava a revelar algo mais profundo.

A garganta de Wei Liang contraiu-se levemente, como se fosse falar, mas seus lábios finos permaneceram firmemente pressionados, e os cantos se curvaram sutilmente para baixo.

Para Lin Jiu, aquilo era insuportavelmente estranho. Ela acabara de rir alto, e ainda sentia que aquela risada ecoava pela pagoda vazia, pairando sem cessar.

Mas... eles não podiam continuar ali parados, tão rígidos.

Após um momento de hesitação, Lin Jiu quebrou o silêncio:

— M-marido, você voltou?

Os olhos de Wei Liang se arregalaram levemente. Após uma pausa, sua garganta se moveu e ele soltou um baixo “Mm”.

E então a atmosfera congelou novamente.

Lin Jiu quis se dar um tapa. Sempre o chamava pelo nome completo, Wei Liang. Agora que decidira confiar nele, percebeu que era indelicado chamá-lo assim tão direto, mas, num momento de confusão mental, acabara de dizer “marido”!

Ela poderia simplesmente ter dito um simples “Você voltou” para aliviar a tensão, depois perguntar sobre a situação lá fora, e as coisas teriam fluído naturalmente.

Mas um único passo em falso virou um arrependimento duradouro, e a atmosfera na pagoda ficou dez vezes mais constrangedora do que quando ele acabara de entrar.

— Me ajuda a tirar a roupa — finalmente falou Wei Liang, após um longo olhar.

O coração de Lin Jiu bateu forte. Ela se preparou, deu um passo à frente e alcançou o cinto na cintura dele.

‘...Não consigo desatar.’

Era um nó estranho, trançado numa forma quadrada intrincada, sem começo nem fim visíveis. Depois de mexer um tempo, só conseguiu puxar o cinto um pouco para o lado.

Ouviu um riso baixo e abafado de Wei Liang.

No instante seguinte, uma mão fria e grande cobriu sua palma. Ele colocou a mão sobre a dela e lhe ensinou como desatar o cinto.

Lin Jiu sentiu um turbilhão de emoções, o coração batendo descontroladamente no peito.

À sua frente, Wei Liang parecia não se importar com a impropriedade. Depois de desatar o cinto, ele tirou suavemente o manto preto externo, revelando o peito bem esculpido. Lin Jiu se assustou e virou-se rapidamente, de costas para ele.

Naquele breve vislumbre, viu que o corpo dele estava mesmo coberto de feridas — algumas ainda sangrando, outras parcialmente cicatrizadas, mas claramente recentes, dos últimos dias.

Ela torceu as mãos nervosamente e esperou em silêncio, sem saber o que ele faria a seguir. Com aquele homem, tudo era possível.

Então não se surpreendeu quando sentiu sua presença bem atrás dela. O queixo dele repousava no topo da sua cabeça, os braços a envolviam por frente, e seu corpo frio e firme pressionava-a com força.

Ele não estava se comportando direito. Uma mão deslizou pela gola dela e entrou bem fundo, amassando com firmeza duas vezes num gesto severo.

Lin Jiu quase gritou. A respiração acelerou antes que ela pudesse controlar, nervos à flor da pele, dentes apertando o lábio inferior. O calor se espalhou por seus meridianos, influenciado pelo Sutra do Coração de Jade. Essa reação também fez seu corpo rígido amolecer involuntariamente, inclinando-se impotente contra ele.

Sentiu o peito dele tremer levemente, e um riso abafado veio do alto — profundo e agradável.

Então ele a soltou. Ouviu o farfalhar do tecido e, um momento depois, ele chamou:

— Venha aqui.

Lin Jiu ajeitou a gola e virou-se. Wei Liang vestia uma túnica marrom escura. A cor, normalmente associada à monotonia, ficava elegantemente marcante nele, criando uma paisagem impossível de desviar o olhar.

Seu corpo tremia levemente; os lugares por onde a mão fria dele havia passado ainda estavam quentes. Lin Jiu estava envergonhada demais para encarar os olhos dele e manteve o olhar na região do queixo e da mandíbula.

Ele guiou suas mãos, ensinando-a a amarrar o cinto.

— Você está tão fria — ela perguntou suavemente. — É por causa dos seus ferimentos?

— Não. É porque minha alma está instável. Não é nada. Passa em uns vinte dias — respondeu casualmente.

‘O que Wei Liang quer dizer com isso?’ O coração de Lin Jiu disparou outra vez, mas ela não teve coragem de perguntar — antes de entrarem no reino secreto, Qin Yunxi revelara que os resquícios da vontade do Senhor Demônio desapareceriam em vinte e oito dias.

Wei Liang abaixou o olhar para ela. Nas paredes ao redor, flores de geada emitiram um brilho pálido e frio, iluminando seu rosto levemente corado com uma clareza suave e cristalina. Ela parecia um pouco aflita, os olhos se movendo ao redor, sem se fixar em nada sólido. Parecia totalmente diferente da garota vibrante e despreocupada que rira tão alto poucos momentos antes.

Seus olhos pousaram brevemente na gola ligeiramente desalinhada dela, o olhar escurecendo.

— Você jogou fora o corvo? — perguntou de repente.

Lin Jiu se assustou, depois balançou a cabeça, apontando para o canto onde havia juntado um monte de pelos que Doulong soltara, amontoado e feito uma pequena cova felpuda para o corvo.

— Que consideração — disse ele, com tom um tanto incomum. — Se eu morrer, você vai buscar meu corpo também?

Lin Jiu não soube dizer se ele estava insinuando algo ou apenas expressando insatisfação, então não respondeu.

Um incômodo a invadiu. Afinal, ela não sabia nada sobre ele. Se quisesse esmagá-la, seria tão fácil quanto pisar numa formiga.

Sentiu-o se aproximar, os dedos emanando aquele frio agora familiar ao beliscar suavemente seu queixo.

Logo o toque dos lábios dele seguiu.

Entre beijos lentos e espaçados, ele murmurou:

— Tô brincando. Eu. Não. Vou. Morrer. Nunca.

Embora seus lábios se abrissem levemente, ele ainda, como da última vez, não foi além. Quando o calor da respiração começou a aumentar, ele deu um beijo suave na ponta do nariz dela e a soltou.

Lin Jiu arfou baixinho, recuperando o fôlego devagar.

— Seus ferimentos são graves? — não pôde deixar de perguntar.

A sobrancelha de Wei Liang se contraiu muito levemente, mas o tom continuou o habitual despreocupado:

— Nada. Posso matar Wang Chuan’en quando quiser.

Ele virou as costas, a voz fria:

— Ele matou minha sogra e meu cunhado. Depois, vou ajudar você a se vingar com as próprias mãos.

Lin Jiu congelou por um instante e perguntou hesitante:

— Você quer dizer que Wang Chuan’en matou Zheng Ziyu e Lin Dong?

— Mm.

— Ele não é algum tipo de poder antigo? Por que mataria cultivadores do Estabelecimento da Fundação? — Lin Jiu estava profundamente confusa.

Wei Liang virou-se devagar e trancou os olhos nos dela.

— Você não está triste?

— Ah! — Lin Jiu deu um pequeno sobressalto.


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