Capítulo 37


 Plataforma de Observação das Estrelas.

Shen Huaiwen contemplava a tempestade de neve sem fim que varria as montanhas, exalando suavemente, as sobrancelhas franzidas.

— Você quer que ambas permaneçam no Salão das Escrituras?

Ye Xiao acenou.

— A Conferência da Seita Imortal se aproxima. Ela estará mais segura aqui. Com a companhia de Suiyin, a solidão não a incomodará.

— Sempre tão protetor. Desde a última escapada dela, seus olhos não a largaram.

Shen Huaiwen observou o rosto da líder da seita se contrair antes que ele murmurasse:

— Não larguei.

Baixando os olhos com um suspiro divertido, Shen Huaiwen mudou de assunto.

— Depois da conferência, pretendo visitar o Vale dos Médicos Divinos. O veneno peculiar da Junior Sister ainda me intriga. Teorias recentes exigem a expertise deles.

— Reze para não ser o que suspeitamos.

— O Vale dos Médicos Divinos baniu estrangeiros desde o ataque dos Treze Domínios Fantasmas, há duas décadas. — Ye Xiao franziu a testa. — Podem culpar Xia Wuwei, apesar de sua inocência.

— Até os espinhos devem ser agarrados. — As palavras de Shen Huaiwen se dissolveram nos ventos da montanha, alcançando um curioso além da plataforma.

Wen Zhishu chegou trazendo o remédio de Xia Shi, o poder espiritual aquecendo o líquido enquanto ela se maravilhava com os arquivos do Salão das Escrituras. Guiada para o andar de cima, encontrou a porta da câmara de cópia entreaberta.

Lá dentro—Suiyin escrevia freneticamente, mãos manchadas de tinta borrando o pergaminho, enquanto Xia Shi reclinava com os olhos fechados, segurando a xícara de chá.

— …

A cena parecia… invertida.

— Elder Wuwei, seu remédio. — A correção de Wen Zhishu chegou tarde demais.

Xia Shi congelou. As pálpebras se abriram, revelando repulsa passageira antes que a compostura retornasse.

Colocando a tigela de remédio na mesa, Wen Zhishu observou a testa encharcada de Suiyin.

— A penalidade é realmente tão severa? Sem descanso algum?

Xia Shi contornou a borda da tigela, contemplando a crueldade da existência.

Sua vida refletia a amargura do remédio.

Do outro lado da mesa, os lábios trêmulos de Suiyin denunciavam lágrimas prestes a cair—miséria gosta de companhia.

— Mestre — a garota cantou docemente —, o remédio está esfriando.

Que devoção.

Xia Shi lançou à discípula um olhar fulminante, mas não tocou a tigela. A coragem líquida falhou.

— Wen Zhishu—ar. Abra aquela janela.

A atendente obedeceu, empurrando a vidraça selada.

Fumos amargos atacaram suas narinas.

Uma faixa pálida de luz dourada brilhou diante de seus olhos. A tigela de remédio, arremessada ao ar, desfez-se instantaneamente em pó, espalhando-se completamente enquanto o caldo medicinal evaporava em névoa marrom.

Os lábios de Wen Zhishu curvaram-se em um leve sorriso enquanto ela baixava o olhar e se afastava.

Atrás dela, Xia Shi permanecia perfeitamente imóvel, sem traço de culpa no rosto.

Sua compostura quase fazia o momento anterior parecer uma ilusão.

— Você…

Xia Shi pressionou um dedo aos lábios, sussurrando:

— Não fale.

Então—

— Xia Wuwei, buscando a morte?!

A voz gentil, porém autoritária, de Shen Huaiwen explodiu na sala silenciosa.

Xia Shi congelou, o olhar se voltando para o token de jade na cintura de Wen Zhishu.

— Irmã Sênior???

— Não me chame de Irmã Sênior. — A voz do token de jade soou novamente.

Xia Shi: “…”

Essa frase parecia familiar.

Pega em flagrante, Xia Shi endireitou-se e abaixou a cabeça.

— Minhas desculpas, Irmã Sênior.

Ousando descartar o remédio de Shen Huaiwen—ela realmente era sem precedentes.

— Hmph. — Um resmungo frio veio pelo token.

— Zhishu, volte agora.

Wen Zhishu lançou a Xia Shi um olhar de pena antes de deixar a sala.

— Mestre, o remédio deve ser tomado quente.

Ao ouvir essa frase familiar, Xia Shi ergueu os olhos e detectou instantaneamente o divertimento contido na expressão da outra.

— Divertido?

Suiyin imediatamente endireitou a expressão, balançando a cabeça.

— De forma alguma.

— Então continue escrevendo!

Xia Shi pegou seu pincel, rabiscando ocasionalmente. Ela sabia que mais remédio chegaria em breve—sem dúvida trazido pela sorridente, mas feroz, Irmã Sênior Shen Huaiwen.

Exatamente como previsto, duas horas depois Shen Huaiwen entrou com seu sorriso suave característico.

Xia Shi manteve a cabeça baixa, mas não conseguiu conter um arrepio.

Ela fingiu concentrar-se na cópia, mas o pincel deslizou desordenadamente pelo papel.

Shen Huaiwen ficou diante da mesa, segurando a tigela de remédio cujo aroma penetrante fez até Suiyin apertar o nariz.

Essa mistura… poderia ser letal?

Xia Shi olhou lentamente para cima, fingindo surpresa.

— Ah! O que traz Irmã Sênior aqui?

Sua súbita formalidade traiu medo genuíno.

Suiyin largou a caneta para observar a cena.

Shen Huaiwen ficou em silêncio, colocando a tigela de remédio enquanto seu olhar prendia Xia Shi no lugar.

O silêncio se tornou mais pesado que qualquer discurso.

Presa sob aquele olhar, Xia Shi teve de beber a mistura amarga apesar da relutância.

Suas mãos tremiam ao levantar a tigela, dividida entre temer que escorregasse e temer que não escorregasse.

Não derramar significava sofrimento. Derramar, consequências maiores.

Antes que a tigela chegasse ao nariz, a amargura cruel do remédio atacou seus sentidos, fazendo-a engasgar.

— Para você, Irmã Sênior — forçou um riso —, este remédio está… diferente hoje?

Muito mais potente que o lote que ela secretamente havia descartado antes.

Huaiwen finalmente respondeu:

— Sua condição piorou. Ajustei a fórmula—prove adequadamente.

Ajustada.

Xia Shi fitou o líquido turvo, imaginando demônios grotescos espreitando de suas profundezas.

Prometeu nunca mais contrariar Huaiwen.

Reunindo coragem, engoliu o remédio em um gole só.

A agonia amarga inundou seus sentidos. Segurando o rosto, escondeu a careta distorcida que contorcia suas feições.

Os olhos de Huaiwen suavizaram-se em aprovação enquanto ela produzia um saco de papel com castanhas cristalizadas.

— Sem mais truques.

— Nunca mais — Xia Shi raspou, a amargura ainda grudada na garganta.

Sozinha, Xia Shi chamou Suiyin com urgência.

A jovem discípula aproximou-se com compostura forçada, a coxa ainda ardendo de seu riso contido.

— M-mestre?

— Descasque estas. Agora.

Suiyin abriu o saco quente, liberando vapor doce que contrastava com o fedor medicinal. Duas castanhas robustas saíram das cascas.

Seus dedos tocaram uma umidade inesperada.

Um olhar a congelou no lugar.

Em vez de pegar as castanhas, Xia Shi inclinou-se para frente — lábios entreabertos, ponta da língua contornando o alimento. A umidade quente da língua de sua mestre roçou os dedos de Suiyin.

— Duas mais.

Suiyin imediatamente baixou a cabeça ao ouvir isso, as bochechas corando. A suavidade molhada que permanecia em suas pontas de dedos persistia enquanto ela descascava as castanhas mais rápido.

Uma…

Duas…

Dez…

Uma alimentando, outra comendo — perfeitamente harmonioso.

Só quando a amargura havia quase desaparecido é que Xia Shi retirou a mão protetora. Quando se inclinou para servir chá, uma mão surgiu à sua frente, dedos longos segurando exatamente o que ela desejava.

Essa discípula… realmente entendia.

Xia Shi aceitou o chá e bebeu com calma.

— Pegue o restante. Sua recompensa.

Suiyin descascou outra castanha e a colocou entre os lábios. Seja deliberado ou acidental, ao morder a castanha, sua língua repousada imitou o movimento de Xia Shi, enrolando-se ao redor dela.

Pontas de dedos umedecidas, e ainda assim isso inexplicavelmente perturbava Suiyin.

Ela não sentira esse desconforto poucos momentos antes.

A doçura em pó das castanhas grudava tentadoramente no paladar.

— Mestre, eu também quero chá.

Xia Shi esvaziou sua xícara e empurrou-a na direção de Suiyin sem olhar para cima.

— Sirva-se.

Suiyin encheu a xícara e bebeu na borda, seu coração acelerando sem explicação.

————

No abraço profundo da noite, quando os sonhos se tornam mais densos.

Qin An contemplava sua espada no reino do sono, a lâmina pairando em névoa branca como memória meio esquecida.

O espanto cresceu dentro dela.

Dois passos à frente — a espada recuou dois palmos.

— Essa é realmente sua espada?

A pergunta provocou uma resposta automática:

— O presente de minha Irmã Sênior torna-se meu por direito.

Só então Qin An percebeu a voz estranha.

Névoa girava ao redor dela — este não era o mundo desperto.

Quem invadiu seu sonho?

Não — quem comandava seu sonho!

A cautela afiou a voz de Qin An como gélido inverno.

— Identifique-se!

Risos ondularam pelo cenário onírico. A voz continuava seu discurso sobre a espada, ignorando sua exigência:

— Você reclama posse — mas a lâmina obedece à sua mão?

Qin An caiu em silêncio.

Ela realmente não conseguia controlá-la, e ela nunca obedecera.

— Não como Suiyin, que compartilha a mente com sua espada.

— Essa espada pertence a Suiyin, não é?

— Não! Esta é minha! — Qin An gritou. Tentou agarrar a espada para provar, mas ela se afastou cada vez mais até desaparecer na névoa.

— Viu? Ela te rejeita. Só Suiyin empunha seu verdadeiro poder. Em suas mãos, não passa de sucata!

— Cale-se! — Qin An pressionou as mãos sobre os ouvidos, mas as vozes penetravam mais fundo.

— Quer dominá-la? Quer superar Suiyin? Eu ajudarei. Apenas assinta.

Seus ouvidos zumbiam. Qin An mordeu a ponta da língua com força — a dor a despertou de choque.

Escapando do sonho, ouviu um grito furioso: Tola!

Qin An sentou-se ensopada de suor. Invisível nas sombras, fumaça azul se esgueirava por uma fresta da janela.

Enxugando a testa, percebeu a luz do dia filtrando pelas folhas. Manhã.

Foi apenas um sonho… ou algo mais sombrio?

Mas o Reino Sanqing não tolerava sujeira.

Franzindo a testa, lançou um feitiço de purificação. Vestida, seus olhos captaram a espada ao lado da cama.

Após uma pausa, suspirou suavemente e a carregou para fora.

— Bom dia, Junior Qin! — chamou uma Irmã Sênior no pátio.

Qin An assentiu distraída, flutuando como um fantasma em direção ao Salão das Escrituras.

Parou diante de suas portas.

A espada importava apenas porque a Irmã Sênior a dera.

Ainda assim…

Ela não podia comandá-la.

Respirou fundo. Decisão tomada, Qin An marchou para dentro.

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