Capítulo 50.2


 Sem mais demora, os seis taparam nariz e ouvidos com chapéus e lenços para se proteger da areia amarela que voava por todo o céu, então começaram a pisar na areia com um pé fundo e o outro colocado de leve.

Não demorou muito para Jiang Zheng notar que o secretário do partido e o homem da vila que estavam conversando com eles agora pouco haviam desaparecido, como se tivessem evaporado no ar.

#Mãe, o que tá acontecendo? Fiquei olhando para a tela e nem percebi como eles sumiram.
#Péssimo, péssimo. “Cidade Wuyou” foi um terror sanguinário zumbi, “Ilha Paraíso” um terror psicológico de seita. Isso aqui parece algo sobrenatural e metafísico.

Jiang Zheng já tinha filmado no deserto antes, então entendia suas características. Eles poderiam andar ali no máximo meia hora; os mais fracos teriam que parar para descansar. O que o diretor queria era o senso de participação e as formas de resolver problemas, não torturá-los. Então, a tal cidade de barro devia estar perto.

Mas, depois de meia hora andando, não havia sinal algum da cidade de barro, apenas dunas de areia cada vez mais contínuas.

Nem mesmo as pessoas nos comentários ao vivo aguentavam, imagine os seis convidados andando no deserto real.

Quando todos estavam prestes a perder o fôlego, uma tempestade de areia soprou de repente.

Esse vento não era uma brisa suave de primavera sobre o chão plano — machucava ao atingir o corpo.

Ji Muye estendeu os braços, abraçou Jiang Zheng por inteiro, protegendo-a, enquanto a areia caía com um som de crepitar sobre eles.

Do outro lado, sem iniciativa de He Xiao, Liang Xiaoduan, que ainda gritava de sede e não conseguia andar, lançou-se rápido nos braços de He Xiao, buscando abrigo consciente.

Ke Cancan era uma cabeça mais alta que Xiao Cheng; os dois trocaram sorrisos constrangidos, se abraçaram e ficaram em silêncio.

A tempestade passou, então Ji Muye abriu os olhos e olhou ao longe — de repente, apareceu uma cidade de barro naquele vazio, com muralhas e pagodas.

Jiang Zheng se virou para olhar e franziu a testa, sentindo que o vento de areia soprava com uma maldade incomum.

Agora que tinham o objetivo, os poucos seguiram na direção da cidade de barro.

De longe, parecia pequena, mas ao entrarem, perceberam que haviam subestimado. A muralha estava parcialmente destruída, mas ainda tinha uns dez metros de altura, mostrando a imponência que devia ter quando construída.

Como o antigo Reino de Loulan[1] ou a Cidade Heishui na Mongólia Interior[2], essa cidade de barro já fora próspera em comércio. Depois, por mudanças drásticas no meio ambiente, o rio secou ou mudou de curso. Assim, a cidade foi abandonada e enterrada sob a areia amarela.

Jiang Zheng olhou para o sol e deduziu que a cidade estava orientada no eixo leste-oeste. Agora eles estavam no portão oeste.

Metade do portão estava desabada, e pelo vão era possível ver plataformas altas de terra empilhadas. Nem imaginavam onde estaria o tal secretário.

Eles temiam ficar cegos com o brilho.

Liang Xiaoduan tinha medo dessas zonas silenciosas e desertas. Na Cidade Wuyou pelo menos se ouviam os uivos dos zumbis. Aqui só havia o som do vento e da areia, parecia um lugar abandonado pelo mundo, com uma solidão e desconforto indescritíveis.

Ji Muye achou um bom lugar para pisar e subiu na muralha remanescente.

A área da cidade era pequena, e dali dava para ver o portão leste, simétrico ao oeste, e a pagoda icônica no canto nordeste.

A pagoda era diferente das pagodas de eaves densas ou estilo pavilhão do Budismo Han[3]. Tinha a forma de uma tigela coberta, parecida com a Pagoda Branca do Templo Miaoying em Pequim[4]. Só que a pagoda ali estava desabada, restando apenas o corpo da torre, sustentando sua última dignidade.

O resto do lugar era cheio de casas de barro em ruínas.

Jiang Zheng acenou para Ji Muye descer e mandou todos se dispersarem.

Desde que o secretário disse que ela era professora de arqueologia, já imaginava que o tema seria relacionado a saque de tumbas.

Arqueologia investiga relíquias históricas expostas e culturais com permissão legal, para proteção e pesquisa. Já o saque de tumbas é como mosca que só sente o cheiro, visando só pilhar e lucrar. Para esses saqueadores, localização, forma, arquitetura e importância histórica da cidade de barro não importavam. Queriam apenas os supostos tesouros.

Como esperado, ela viu várias pegadas frescas no portão da cidade.

Provavelmente, antes deles chegarem, alguém já tinha entrado na cidade de barro.

#O saqueador tá aqui.
#Uma cidade tão grande de barro, deve ter muita coisa boa pra cavar, claro que os saqueadores querem a parte deles.
#Esse episódio vai seguir a rota de terror com fantasmas? Vai sair um zongzi gigante pulando daqui a pouco?
#Não tem casco de burro nem arroz glutinoso com sangue de cachorro na mochila.

Ji Muye se ajoelhou, examinou por um tempo e concluiu que sete ou oito homens adultos já tinham entrado antes.

Mandou todo mundo prestar atenção nos pés, ficarem em silêncio e seguirem, sem assustar a cobra. Nunca se sabe se eles estariam armados.

Ao passar pelo portão, só se via os restos das casas de barro, algumas altas, outras baixas, empilhadas, lembrando a antiga cidade de Kashgar, em Xinjiang[5].

Provavelmente, os construtores usaram o loess (terra amarela) comum dali para erguer casas resistentes, conforme as condições locais. Milhares de anos depois, as casas ainda tinham restos, mas as estruturas de madeira dos telhados tinham sumido com o tempo.

De repente, uma estela na beira da estrada chamou atenção.

Jiang Zheng, como “grande arqueóloga”, observou primeiro.

A inscrição estava incompleta, restando só uma pequena parte no topo. A palavra “posta” (estação postal) estava escrita em chinês tradicional. Isso indicava que era uma cidade de barro da Dinastia Han, não dos hunos, Tubo ou Xixia.

Provavelmente, essa cidade tinha alta importância militar e comercial na fronteira entre regiões nômades e agrícolas. Em tempos de paz, as pessoas vinham e iam para o comércio, convivendo mesmo sendo inimigos. Em guerra, era terra arrasada, cidades destruídas, população deslocada e sofrida.

Jiang Zheng agachou, virou a estela com força e viu três grandes caracteres gravados do outro lado: Cidade Chiyou.

#Parabéns pelo lançamento oficial do terceiro episódio “Cidade Chiyou”.
#Equipe do programa arrasou. A produção dos cenários está muito realista.
#Protejam seus corpos, aviso de alta energia!

Quando ouviu um rangido repentino, Liang Xiaoduan ficou pálida e olhou para baixo.

— Ah... — Antes do terceiro grito, He Xiao tapou sua boca de repente, impedindo o resto do som.

Jiang Zheng correu para ver. A coitada da Liang Xiaoduan tinha pisado num osso branco e quebrado um crânio.

#Ai ai ai, o grupo do programa é cruel, fez um crânio de mentira pra assustar a galera.
#Será que rolou um assassinato aqui e os mortos não foram enterrados?
#Se não fosse o calor e a baixa umidade de Chiyou City, nem os ossos teriam sobrevivido.

Os olhos de Liang Xiaoduan estavam cheios de lágrimas. He Xiao não ousava soltar ela, com medo que ela gritasse de novo.

Ele abaixou a cabeça e disse baixinho:

— Você pisar no osso de morto é muito melhor que eu.

Liang Xiaoduan: — ... Não me confortou, obrigada.

#Chick Liang: Para de me enganar, solta minha boca logo.
#Ah ah ah, não esperava que o primeiro momento fofo do terceiro episódio fosse com esses dois.
#He Xiao andando na frente da Liang Xiaoduan com personalidade tsundere e autoritária.

Enquanto Jiang Zheng examinava os ossos, um bando de pássaros negros cortou o silêncio no céu, batendo as asas enquanto voavam sobre a estação.

Jiang Zheng gritou, chamando todos para se esconderem atrás do muro de barro.

Ji Muye olhou para eles e se escondeu, então rapidamente alisou as pegadas no chão com as mãos.

Como previsto, três pessoas vestidas de preto caminharam apressadas. O som dos passos ecoou nos ouvidos.

Os três pararam na frente da estela e olharam ao redor.

— O chefe disse que tem tesouro nessa cidade e que vamos cavar pra vender. Mas já estamos aqui um dia e uma noite e não vimos nada.

— Nesse lugar onde até fantasma não aparece não tem nada bom. Tô morrendo de sede, me mata. Tem água ainda? — disse um, pegando a garrafa do companheiro e bebendo tudo.

Liang Xiaoduan olhou pelo buraco e lambeu os lábios ressecados.

— A água do poço aqui é doce demais.

— É estranho mesmo. Tem água de poço nesse lugar seco onde eu tô fumando? Que estranho.

— Vamo embora, vamo embora. Onde é que tem gente? Só fantasma mesmo.

Eles cochichavam, mas revelavam muita coisa.

O esconderijo dos seis era provavelmente a cozinha da estação postal. Dois pilares centrais estavam caídos, e os outros dois seguravam a estrutura nua.

Ji Muye tocou levemente o ombro de Jiang Zheng.

Jiang Zheng não sabia o porquê, mas o acompanhou até um pilar.

Ji Muye evitou a câmera e falou baixo:

— Sobre seu irmão... não fique brava.

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O autor tem algo a dizer: Jiang Ran: Não te ouvi direito por causa do vento, fala de novo.

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Notas de rodapé:

[1] Loulan, também chamada Krorän ou Kroraina, foi um antigo reino em torno de uma importante cidade oásis da Rota da Seda, já conhecida no século II a.C., na borda nordeste do Deserto de Lop.

[2] Heishui City, localizada no rio Heishui, é chamada Harahot na língua mongol local. A cidade fica na parte baixa do rio, na borda sul do deserto.

[3] Budismo Han: tradição do budismo predominante na China, com pagodas típicas de múltiplos níveis e beirais.

[4] A Pagoda Branca do Templo Miaoying é uma famosa pagoda em Pequim, com formato de tigela coberta.

[5] Kashgar, em Xinjiang, tem uma antiga cidade histórica com arquitetura de barro semelhante.


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