Jiang Zheng ficou surpresa:
— Irmão? Que irmão?
Ji Muye desviou o olhar.
— Aquele que eu xinguei… o canalha!
Jiang Zheng ficou atônita. Não era à toa que Ji Muye parecia meio desconfortável ao vê-la hoje.
Ela murmurou:
— Mais tarde, talvez a gente acabe pendurado na muralha pelos saqueadores, secando a carne humana… Professor Ji, você ainda tem cabeça pra se preocupar com essas trivialidades?
Ji Muye abaixou a cabeça. Para ele, aquilo era algo importante.
Ele forçou-se a resolver o constrangimento:
— Tenho medo de morrer com arrependimentos.
Jiang Zheng não conseguiu conter o riso diante do tom e da expressão sofrida dele. Então estendeu a mão e deu um tapinha no ombro dele:
— Quem não sabe, é inocente. Meu irmão tem um péssimo temperamento — e um fedor pior ainda. Professor Ji, por minha causa, por favor, tenha paciência com ele.
Ao ouvir isso, Ji Muye iluminou-se na hora. Balançou a cabeça repetidamente.
— Tudo bem, tudo bem. Esse é meu irmão. Não vou guardar mágoa.
Jiang Zheng: — … Irmão dele? Da onde que isso surgiu?
Ji Muye ergueu a mão:
— Na verdade… eu admiro muito o nosso irmão há um bom tempo… Espero que um dia a gente possa beber junto.
Jiang Zheng não sabia se ria ou chorava.
— Vamos primeiro sair vivos dessa Cidade Chiyou, pode ser?
Os outros quatro estavam vidrados observando os três saqueadores do lado de fora da estalagem. O público da transmissão ao vivo foi o primeiro a perceber que Jiang Zheng e Ji Muye haviam sumido da câmera.
#Cadê eles?
#Foram esconder alguma comida?
#Sussurrar escondido não é habilidade, se tiver coragem fala na frente da câmera.
Depois de muita especulação no chat, Jiang Zheng e Ji Muye voltaram para a câmera um atrás do outro.
Com toda calma, Ji Muye tirou um pacote de biscoito comprimido da mochila, abriu e entregou para Jiang Zheng comer.
Os saqueadores estavam rondando por perto. Talvez fossem se encontrar com eles cara a cara logo. Se ainda tinham tempo, era melhor recuperarem as energias.
Os três homens de preto do lado de fora reclamaram por um bom tempo. Diziam que o chefe tinha feito drama por nada — era só um bando de pássaros pretos voando, não havia ninguém ali. Além disso, se ninguém interno levasse alguém até a Cidade Chiyou, um forasteiro jamais encontraria sequer um tijolo dela.
Os três estavam com medo de outros acharem alguma coisa boa antes deles, então, depois de discutirem, saíram às pressas.
A rua caiu em silêncio por um momento.
Ji Muye e He Xiao saíram com cuidado, esconderam-se no escuro e esperaram bastante tempo. Como não apareceu ninguém, chamaram o grupo de volta ao portão da estalagem.
Geralmente, o layout de cidades antigas era estruturado segundo o modelo das antigas dinastias, onde os edifícios administrativos, comerciais e religiosos ficavam ao centro, e as residências dispostas à esquerda e à direita. Porém, a Cidade Chiyou era claramente uma cidade militar de fronteira, e seu layout não podia ser analisado pelas regras comuns. Já se sabia que havia uma pagoda no canto nordeste, então o correspondente noroeste provavelmente seria uma repartição oficial ou um acampamento militar.
Não devia restar nada de valor no gabinete ou no acampamento. Os saqueadores eram espertos, provavelmente iriam direto para a pagoda.
Jiang Zheng expôs essa ideia ao grupo, e os seis decidiram fazer o oposto: ir para o noroeste.
Por segurança, voltaram ao portão oeste e seguiram pela muralha em ruínas, andando no sentido anti-horário.
Assim, evitariam se perder e também era pouco provável que dessem de cara com os saqueadores.
O portão norte estava ainda mais destruído — mal dava pra ver a entrada. Pisando no solo de loess e cruzando a muralha, finalmente chegaram a uma plataforma de terra bem preservada.
No chão, havia muitas flechas e bestas espalhadas. Os cabos de madeira já haviam virado pó fazia tempo, restando só o ferro duro, lembrando aos que vieram depois que um exército já estivera ali em pequeno número.
Todos observaram o chão com atenção. A equipe do programa realmente foi cuidadosa — dentro da mochila de Xiao Cheng havia duas pás militares: pequenas, afiadas e perfeitas para escavar.
He Xiao e Xiao Cheng começaram a revirar os montes com as pás e logo encontraram várias ferramentas de ferro enferrujadas: martelos, barras, panelas…
Jiang Zheng chamou Liang Xiaoduan e Ke Cancan para vasculharem os arredores.
Desde que pisou num crânio, Liang Xiaoduan tinha perdido a coragem. Segurava firme no braço de Jiang Zheng e observava o chão com todo o cuidado, com medo de pisar em mais alguma coisa estranha.
Ke Cancan, por sua vez, tocou algo que parecia um tecido de barro dentro de uma casa semi-desabada. Mal encostou e o “tecido” foi “ofendido” — virou vento num instante e desapareceu por completo.
#Meu Deus. Palmas pra equipe. Isso é uma transmissão AO VIVO. De onde tiraram esse tecido de milhares de anos?
#kecancan Por favor, não mexa em relíquias culturais.
#Meu maior sonho é ver o país escavar o Mausoléu de Qin Shihuang[1] antes de eu morrer.
#Ah, +1 aqui.
#Deixa de sonhar. A tecnologia arqueológica atual não dá conta. Pra entender o risco, veja o caso do Túmulo Dingling da dinastia Ming[2].
O grupo discutiu: provavelmente estavam no acampamento militar. As fileiras de casas ao fundo deviam ser os dormitórios dos soldados.
Jiang Zheng perguntou:
— Encontramos muitos ossos até agora. Por que aqui, no alojamento, não tem nenhum?
Ji Muye respondeu:
— Quando a cidade foi soterrada pela areia, será que os soldados estavam fora, em batalha?
He Xiao comentou:
— O professor Ji está sugerindo que a destruição da Cidade Chiyou foi causada por um soterramento repentino de areia?
— Essa possibilidade não pode ser descartada — disse Ji Muye, franzindo a testa. — Claro que também é possível que a cidade tenha perdido importância militar, o exército recuou, e restaram apenas civis. Depois, foram saqueados e virou uma cidade morta.
Jiang Zheng disse:
— O crânio que Xiaoduan esmagou na estalagem tinha uma rachadura profunda no esterno e nos ossos da perna. Provavelmente essa pessoa foi assassinada a golpes.
Cidade Chiyou e os ossos espalhados deixaram todos em silêncio mais uma vez.
Ji Muye deu dois passos, então virou-se de repente com um brilho nos olhos.
— Se havia tropas aqui, então devia haver bastante água potável. A nascente pode estar aqui.
Liang Xiaoduan, ao ouvir “água”, teve os olhos iluminados. Levantou-se na hora e gritou que ia procurar a nascente.
Assim, o grupo se dividiu: Jiang Zheng, Ji Muye e Liang Xiaoduan saíram à procura da nascente, enquanto He Xiao, Xiao Cheng e Ke Cancan continuaram procurando por bastões e afins para se armarem.
Depois de andar um pouco, Jiang Zheng sentiu uma estranheza difícil de descrever na Cidade Chiyou.
Apesar de lá fora haver muito vento e areia, dentro da cidade havia apenas uma fina camada de areia sobre as ruas. Era como se houvesse uma peneira gigante sobre a cidade, filtrando a areia grossa e deixando entrar apenas os grãos finos.
Jiang Zheng comentou isso com Ji Muye e Liang Xiaoduan. Nenhum dos três conseguiu entender esse fenômeno fora do comum.
Mas o mais urgente era encontrar a nascente. Subiram numa plataforma de terra e espiaram com cautela. De fato, fumaça subia de tempos em tempos na direção nordeste, e sons abafados podiam ser ouvidos. Parecia que os saqueadores estavam apressados e até usaram explosivos.
Depois de vasculhar vários pátios, finalmente encontraram o lendário poço doce num pátio próximo à muralha.
Era um poço de três buracos. Devia haver um pavilhão sobre ele, mas agora restava apenas a fundação das colunas.
Os saqueadores já tinham passado por ali. Havia buracos por todo lado. Provavelmente vasculharam os arredores e foram embora sem achar nada.
Jiang Zheng logo chamou Ji Muye. Ele carregava seis cantis.
#Tem uma nascente num lugar tão seco? E ainda é doce? Incrível.
#Ji Muye é tão obediente. Jiang Zheng faz o que quiser com ele.
#Se tem nascente, deve haver um rio subterrâneo passando por aqui. Deve ter sido um lugar com plantas aquáticas tão lindas quanto pérolas.
Liang Xiaoduan se apoiou na borda do poço e olhou para dentro. De repente, uma silhueta passou voando pela água, assustando-a tanto que caiu sentada.
— Tem alguém lá!
Jiang Zheng parou e olhou em volta. Tudo parecia vazio e silencioso.
Liang Xiaoduan, tremendo, se agarrou a Jiang Zheng:
— É sério! Eu vi!
Jiang Zheng a acalmou e pediu a Ji Muye que enchesse os cantis o mais rápido possível. Precisavam sair dali.
Os três tinham acabado de pisar sobre uma laje coberta de areia fina quando um redemoinho de vento soprou à frente. O estranho era que o vento girava em espiral, como se dançasse — bem ali, diante deles.
Jiang Zheng franziu a testa, deu um chute no redemoinho. A areia se dispersou… mas pouco depois, ela tremeu e voltou a envolvê-los, formando novamente o vórtice.
Jiang Zheng: — …
#PQP!
#Protejam seus corpos, chegou a hora!
#Essa areia de Chiyou tá possuída!
#Esse vento tá assediando a irmã Zheng!
Com o rosto pálido, Liang Xiaoduan sussurrou:
— Irmã Zheng… vamos por outro caminho?
Mas não importava para onde iam, aquele estranho redemoinho os impedia.
Ji Muye murmurou:
— …Será que ele quer que a gente vá por esse caminho?
Liang Xiaoduan escondeu-se atrás de Jiang Zheng e cochichou:
— Então vamos seguir o caminho original?
Os três voltaram pelo mesmo trajeto de antes. O vento maligno os seguiu de perto. A cada encruzilhada, o redemoinho “escolhia” uma direção.
E assim, depois de algumas voltas, chegaram a um lugar que parecia um antigo campo de treinamento. A área era bem ampla, com muitas armas enferrujadas espalhadas no chão plano.
Os três ainda tentavam entender por que o vento os havia levado até ali, quando um vendaval os cegou.
Liang Xiaoduan cuspiu areia e ia falar algo quando viu vagamente uma pessoa à sua frente.
A figura estava de costas, tinha o corpo robusto, um coque preso no alto da cabeça e uma presilha atravessada. Vestia armadura, com uma espada preciosa na cintura.
●❯────────「⊙」────────❮●
Notas de rodapé:
[1] O Mausoléu do Primeiro Imperador Qin é o túmulo de Qin Shi Huang, o primeiro imperador da dinastia Qin. Fica no distrito de Lintong, em Xi’an, província de Shaanxi, China. Embora tenha sido descoberto em 1974, a câmara subterrânea ainda não foi escavada devido às limitações tecnológicas atuais.
[2] Túmulo Dingling da Dinastia Ming é o mausoléu do Imperador Wanli e suas duas imperatrizes. Está entre os treze túmulos imperiais Ming em Changping, 45 km ao norte do centro de Pequim. A escavação não foi oficialmente aprovada e fracassou na conservação dos corpos, que se deterioraram rapidamente, especialmente durante a Revolução Cultural. Esse fracasso é frequentemente citado como motivo para não abrir outros túmulos antigos.
0 Comentários