Capítulo 106 a 108


 


Capítulo 106

Qi Yanzhou encontrou o olhar sincero de Ye Chutang e soltou uma leve risada.

— Porque o povo é inocente.

Além disso, ele não tinha ambição de reivindicar o trono.

Ye Chutang discordava daquela visão estreita.

— Mas às vezes a destruição é necessária para o renascimento. O povo pode sofrer por um tempo, mas é melhor do que suportar dificuldades por uma vida inteira.

Qi Yanzhou compreendia seu raciocínio, mas aquilo não se aplicava ao estado atual do Reino Beichen.

— Senhorita Ye, se uma guerra civil estourar em Beichen, inimigos estrangeiros aproveitarão a oportunidade. O povo só enfrentará a ruína de sua nação e de seus lares.

Ao ouvir isso, Ye Chutang finalmente entendeu a razão por trás da chamada “lealdade cega” dele.

— Uma represa de mil li pode ruir por causa de um formigueiro. Vossa alteza poderia agir em segredo — um dia, talvez derrubasse o império sem derramar uma única gota de sangue.

Qi Yanzhou abaixou as pálpebras, ocultando o brilho sombrio nos olhos.

— Isso se eu viver tempo suficiente.

Com isso mencionado, Ye Chutang perguntou:

— Por que o veneno de fogo de Vossa Alteza atacou tão de repente?

Ela tinha total confiança no elixir que havia preparado.

Se ela dizia que protegeria Qi Yanzhou por um mês, então duraria um mês sem falhar.

Desde que entrara na propriedade do Príncipe An, Qi Yanzhou havia sido extremamente cauteloso — evitando qualquer alimento e minimizando o contato com outras pessoas.

A única pessoa com quem tivera proximidade fora o próprio Príncipe An.

— Depois que a senhorita Ye foi para os aposentos de hóspedes, o Príncipe An me convidou propositalmente para beber com ele. Havia uma fragrância estranha nele.

O cheiro era fraco, e ele se esforçou ao máximo para prender a respiração.

Mas o Príncipe An demorou demais, e inevitavelmente ele inalou parte daquilo.

A expressão de Ye Chutang escureceu.

— Deve ter sido o catalisador para desencadear o veneno de fogo.

Então seu tom se tornou ainda mais grave.

— Vossa Alteza, com esse último ataque, o tempo restante para a chegada do Feiticeiro de Miaojiang diminuiu. Agora, no máximo, você tem cinco meses.

Cada vez que o veneno de fogo irrompia, seu corpo se enfraquecia ainda mais.

Se acontecesse de novo, o tempo restante diminuiria ainda mais.

Embora Qi Yanzhou já tivesse aceitado a possibilidade da morte, ainda desejava viver.

— Entendi.

Tendo dito tudo o que precisava, Ye Chutang se levantou para partir.

— Vossa Alteza, na noite do casamento de Ye Anling, eu retornarei para administrar o antídoto.

— Muito bem. Aguardarei sua chegada, senhorita Ye.

Qi Yanzhou lançou um olhar para o céu escurecendo além da janela.

— Nan Xiao, acompanhe a senhorita Ye.

Nan Xiao surgiu prontamente por trás do biombo.

— Vossa Alteza, a Concubina Chen convidou a senhorita Ye para ficar para o jantar.

Um traço de constrangimento passou pelo rosto de Qi Yanzhou, e ele rapidamente corrigiu suas palavras.

— Então acompanhe a senhorita Ye até o salão principal.

Mal ele terminara de falar quando a voz da Concubina Chen chegou do lado de fora.

— Vamos, depressa. Já está tarde, e a senhorita Ye deve estar faminta.

Uma fileira de criadas entrou no salão principal carregando bandejas, cobrindo rapidamente a mesa redonda com uma variedade de pratos perfumados e visualmente deslumbrantes.

A Concubina Chen entrou no quarto.

Ao ver seu filho acordado, ela ficou radiante.

— Eu disse que as habilidades médicas da senhorita Ye eram excepcionais — ela conseguiu despertá-lo.

Em seguida, perguntou a Qi Yanzhou:

— Você consegue se levantar? Se sim, jante com a senhorita Ye.

Embora seus ferimentos internos fossem sérios, não atrapalhavam suas atividades diárias.

— Consigo.

Ele afastou as cobertas, vestiu o manto externo e fez um gesto educado.

— Senhorita Ye, por favor.

Ye Chutang ia recusar, mas a Concubina Chen, sempre acolhedora, segurou sua mão e a guiou até a mesa.

— É só uma refeição simples — espero que não se incomode.

— Parece farta e deliciosa.

A Concubina Chen sabia que ela estava sendo apenas educada, mas sorriu calorosamente.

— Se gostar, venha mais vezes. Não precisa de cerimônia.

Com isso, ela se retirou com suas criadas, deixando-os à vontade para comer.

Para não deixar Ye Chutang desconfortável, Qi Yanzhou sentou-se duas cadeiras afastado.

— Por favor, sirva-se.

Tendo aceitado o convite, Ye Chutang não viu motivo para recato.

— Então vamos comer juntos.

Ela comeu com apetite, experimentando o que queria até se sentir satisfeita.

Qi Yanzhou, ainda debilitado, não tinha muito apetite, mas ao vê-la apreciando a refeição, também terminou uma tigela de arroz.

Ye Chutang se levantou.

— Agradeço pela hospitalidade, Vossa Alteza. Vou me retirar agora — não precisa me acompanhar.

Mesmo assim, Qi Yanzhou a acompanhou até o portão do pátio.

— Senhorita Ye, desde que o ‘Ladrão Fantasma’ nos salvou, o Imperador certamente ficará desconfiado. Mas não se preocupe — eu cuidarei disso.

Ye Chutang voltou-se com um sorriso.

— Não estou preocupada. Na verdade, pretendo apresentar uma queixa imperial contra a mansão do Príncipe An.

Então, rapidamente alinhou seu depoimento ao de Qi Yanzhou.

— Vamos garantir que nossas versões batam.

— Tenha certeza. Viaje em segurança, senhorita Ye.

Ao deixar a Mansão do Príncipe Chen, Ye Chutang comprou alguns doces antes de seguir para a Mansão do Grande Tutor.

Ela já havia tratado o Grande Tutor Qin antes, então o porteiro a reconheceu.

— Senhorita Ye, por favor, entre!

Uma vez lá dentro, ela disse:

— Vim ver o Jovem Mestre Qin.

O porteiro a conduziu ao salão principal, instruindo uma criada a servir o melhor chá.

— Por favor, aguarde um momento, senhorita Ye. Vou avisá-lo imediatamente.

Logo, Qin Zheng chegou pessoalmente.

Ele apressou-se até ela e fez uma reverência profunda.

— Senhorita Ye, a senhorita salvou meu pai antes e hoje salvou meu filho. Por favor, aceite minha gratidão.

Ye Chutang desviou do gesto.

— Não foi nada. Não mereço tamanha cortesia, Prime-Ministro Qin.

Qin Zheng a observou com admiração, lamentando que seu filho não tivesse conquistado seu favor.

— Senhorita Ye, por aqui, por favor.

— Obrigada, Primeiro-Ministro.

Quando Qin Muyun soube que Ye Chutang viera vê-lo, forçou-se a ficar ereto apesar dos ferimentos.

Contorcendo-se de dor, ainda perguntou ao atendente:

— Como eu estou? Devo me arrumar?

— Jovem Mestre, o senhor está perfeitamente pálido e miserável. A senhorita Ye certamente sentirá pena.

Qin Muyun: “...”

Ridículo!

Ela só pensaria que ele era fraco!

Quando estava prestes a pedir ao atendente que ajeitasse sua aparência, Qin Zheng voltou com Ye Chutang.

— Senhorita Ye, converse com Muyun. Vou esperar no salão principal — há algo que gostaria de discutir com você mais tarde.

Sem saber ao certo o que ele queria dizer, Ye Chutang assentiu.

— Muito bem. Até mais.

Qin Zheng lançou um olhar ao filho, pálido.

— Muyun, expresse sua gratidão como deve.

— Pai, eu vou.

Ao sair, Qin Zheng levou o atendente consigo.

Ye Chutang ficou confusa.

Os antigos não eram rígidos quanto à decência, evitando encontros a sós entre homens e mulheres?

Ela já havia rejeitado Qin Muyun — o que o Primeiro-Ministro estava pensando?

Percebendo seu desconforto, Qin Muyun chamou o atendente de volta.

— Guanyan, sirva um chá à senhorita Ye.

O atendente, entendendo a intenção de seu mestre, permaneceu.

— Imediatamente, Jovem Mestre.

Ye Chutang colocou os doces sobre a mesinha ao lado da cama.

— Como você está se sentindo?

Em vez de responder, Qin Muyun perguntou:

— Você se machucou? Sinto muito — eu queria ajudar, mas acabei sendo um fardo.

Ele pretendia ser o salvador, mas acabou sendo o salvo.

— Estou bem.

Depois de verificar seu pulso e confirmar que não havia ferimentos fatais, ela perguntou:

— Seu atendente é confiável?

Ao ouvir isso, Guanyan saiu discretamente.

Não porque Qin Muyun duvidasse dele, mas para evitar bisbilhoteiros.

Qin Muyun a tranquilizou:

— Guanyan é leal. Pode falar livremente, senhorita Ye.

Ye Chutang repetiu o mesmo relato que havia dado a Qi Yanzhou, garantindo que seus depoimentos coincidissem.

— Se os interrogadores da corte vierem, diga apenas isto.

Vendo que ela evitava mencionar o “Ladrão Fantasma”, Qin Muyun não insistiu.

— Não se preocupe, senhorita Ye. Repetirei palavra por palavra.

— Mestre Qin, você deve descansar. Já vou me retirar.

— Espere um momento.

Qin Muyun chamou o servo de volta.

— Guanyan, traga todas as notas bancárias do cofre e entregue à senhorita Ye.

Assim que Guanyan ia obedecer, Ye Chutang recusou.

— Não há necessidade de tanta cortesia. Sei que você foi ao pátio dos hóspedes porque estava preocupado comigo. Ser derrotado em artes marciais não é culpa sua.

Qin Muyun pareceu envergonhado.

— Mas ainda assim você me salvou. Por favor, aceite.

Vendo sua insistência, Ye Chutang não recusou mais.

— Muito bem. As vítimas das enchentes em Jiangnan certamente apreciarão a generosidade do Mestre Qin.

Ela só gostava de pegar dinheiro de vilões. Quanto à prata de pessoas boas, era melhor usá-la em caridade — acumular mérito nunca era ruim.

Capítulo 107

Qin Muyun tornou-se um libertino pelo bem de sua família. Seus familiares sentiam pena dele. Não só lhe davam dinheiro para gastar, como também lhe presentearam com várias lojas e terras férteis.

Ao longo dos anos, ele havia acumulado uma quantidade considerável de notas de prata — quase duzentos mil taéis, um maço espesso.

Depois que Ye Chutang as recebeu, ela foi até o salão principal.

Qin Muyun observou, da porta, a silhueta dela desaparecendo, e seu olhar escureceu.

— Se existe alguém neste mundo capaz de combiná-la, só pode ser Ziqian.

A habilidade e a amplitude de visão dela faziam com que ele se sentisse envergonhado!

Guanyan, vendo o jovem mestre abatido, tentou consolá-lo:

— Meu senhor também é muito bom. Com certeza encontrará a pessoa certa no futuro.

— Depois que você encontra a melhor pessoa, não é mais atraído por ninguém.

Ye Chutang, que já havia ido embora, não sabia que um coração se partia por causa dela.

Quando chegou ao salão principal, ela perguntou diretamente:

— O que o Primeiro-Ministro Qin deseja discutir comigo?

Qin Zheng entregou a Ye Chutang uma pequena caixa de madeira.

— Por favor, aceite isto como um presente, senhorita Ye.

— Se for prata, Lorde Qin, é melhor doar diretamente como auxílio às áreas atingidas por desastre ao sul do rio Yangtzé.

Qin Zheng abriu a tampa da caixa.

— Não é prata. É um complemento de dote.

Ye Chutang viu as joias finas dentro da caixa e a expressão em seu rosto se tornou confusa.

— O que isso significa, Primeiro-Ministro Qin?

Sem falar que ela nem estava noiva. E mesmo que estivesse para se casar, não havia motivo para a família Qin lhe oferecer um complemento de dote, certo?

— Minha esposa foi uma vez devedora a sua mãe. Isto é apenas um pequeno gesto de gratidão dela.

— Sério? Eu não aceito recompensas sem mérito.

Qin Zheng falou com seriedade:

— Eu, Qin, nunca conto mentiras. Na época, minha esposa estava gravemente doente e precisava urgentemente de uma erva medicinal raríssima e preciosa. Foi sua mãe quem ajudou a encontrá-la.

Depois de dizer isso, colocou diretamente a caixinha nas mãos de Ye Chutang.

— Minha esposa queria visitar sua mãe para expressar sua gratidão após se recuperar, mas, infelizmente, sua mãe faleceu antes que pudesse fazê-lo.

Ye Chutang colocou a caixa sobre a mesa e disse friamente:

— Minha mãe não morreu de doença. Ela foi envenenada até a morte por Kong Ru, e Ye Jingchuan consentiu com isso.

Vendo os olhos arregalados de Qin Zheng, ela continuou:

— Se o Primeiro-Ministro Qin quer retribuir a bondade da minha mãe, então vá com tudo contra Ye Jingchuan.

Depois de falar, ela deixou rapidamente a Mansão do Grande Tutor.

Qin Zheng voltou a si e disse ao pátio vazio:

— Senhorita Ye, fique tranquila. A velha senhora não deixará Ye Jingchuan escapar impune!

Essas palavras alcançaram vagamente os ouvidos de Ye Chutang.

Ela retornou à Mansão do Ministro de bom humor.

Após aplicar acupuntura em Jun’er, tomou banho e foi descansar.

Deitada na cama, Ye Chutang finalmente teve tempo de entrar no espaço e organizar os espólios do dia.

Embora o dinheiro da Mansão do Príncipe An não fosse de grande valor, havia muitas coisas.

Por causa do limite de tempo, ela foi expulsa do espaço duas vezes antes de finalmente terminar de organizar tudo.

Olhando para as montanhas de roupas e roupas de cama, ela escapou da cidade pelo subsolo e as distribuiu aos mendigos que viviam nos templos dilapidados e favelas.


No dia seguinte.

Ye Chutang levantou-se antes do amanhecer.

Ela acordou cedo não para praticar artes marciais, mas para ir ao tribunal com Ye Jingchuan.

Dan’er vinha acordando cedo recentemente para treinar suas habilidades básicas.

Ao ouvir o movimento, levantou-se imediatamente.

— Senhorita, por que está acordando tão cedo hoje?

Era meia hora antes do habitual.

Só então percebeu que Ye Chutang não estava usando sua roupa de prática, mas um fino vestido de gaze.

— Senhorita, vai sair tão cedo?

Ye Chutang assentiu.

— Sim, vou ao tribunal imperial com meu pai. Vocês podem tomar café sozinhas. Não me esperem.

Antes que Dan’er pudesse reagir, Ye Chutang saiu rapidamente do Pátio Ningchu.

Ye Jingchuan já havia vestido seu robe oficial e estava na entrada da Mansão do Ministro. Ele subiu na carruagem.

— Ande...

Ele tinha acabado de dizer uma palavra quando a cortina foi erguida e Ye Chutang entrou.

As sobrancelhas de Ye Jingchuan tremeram e um mau pressentimento surgiu em seu coração.

— Chuer, o que você está fazendo aqui?

— Não disse ontem que vou ao Salão Dourado apresentar uma queixa ao imperador?

— Bobagem! Você acha que pode simplesmente ir ao Salão Dourado quando quiser?

Ye Chutang encostou-se à parede da carruagem e bocejou sonolenta.

— Claro que não. Mas tenho certeza de que você ficará feliz em me ajudar. Caso contrário, terei que bater o Tambor de Apelo.

Assim que o tambor fosse batido, o caso da tentativa de assassinato contra ela e Qi Yanzhou na Mansão do Príncipe An teria de ser investigado publicamente — e até o imperador, que comandou tudo por trás, poderia ser exposto!

Ye Jingchuan ficou tão irritado que suas têmporas latejaram.

— Chuer, não é tão fácil bater o Tambor de Apelo. Ao longo da história, poucos suportaram as cem chicotadas do tribunal.

— Eu tenho a pele grossa. Certamente ficarei bem. Já que o Príncipe An ousou tentar me matar, precisa arcar com as consequências!

— A Suprema Corte nem emitiu uma sentença ainda. Que bobagens você está falando!

— O Príncipe An é o irmão mais novo do imperador. Acha que a Suprema Corte ousaria condená-lo? De qualquer forma, vou apresentar minha queixa ao imperador.

Vendo que Ye Chutang não se movia, Ye Jingchuan bufou:

— Se não tem medo da morte, então vá e bata o Tambor de Apelo!

Depois disso, ordenou ao cocheiro que levasse a carruagem para o palácio.

Ye Chutang sabia que Ye Jingchuan só estava fingindo dureza e que não a deixaria realmente bater o tambor.

A carruagem balançou levemente e logo chegou ao portão do palácio.

O Tambor de Apelo ficava instalado ali, guardado pelos soldados imperiais, para que qualquer súdito pudesse levar suas queixas diretamente ao imperador.

Antes que a carruagem parasse completamente, Ye Chutang saltou e caminhou rapidamente em direção ao tambor.

Vendo que ela levava a sério, Ye Jingchuan avançou imediatamente e a segurou.

— Chuer, embora eu não possa levá-la ao Salão Dourado, posso mencionar este assunto ao imperador. Espere na carruagem pelas notícias.

— Está bem.

Ye Chutang esperou quase duas horas.

O motivo da demora era que, para expiar seus crimes, o Príncipe An fez parecer que o imperador havia doado anonimamente fundos de socorro.

O imperador ficou naturalmente satisfeito com esse tipo de coisa, que lhe rendia fama e apoio popular sem gastar um centavo.

Ele sugeriu, de forma clara e implícita, que os oficiais doassem mais — e registrou as doações na hora.

Parecia que quem doasse pouco teria problemas com ele.

Ye Jingchuan, bajulador do imperador, foi o primeiro a doar generosamente vinte mil taéis de prata.

O imperador ficou muito satisfeito e deu um assento a ele.

Aproveitando a oportunidade, Ye Jingchuan mencionou que Ye Chutang queria apresentar uma queixa ao imperador e bater o Tambor de Apelo.

O imperador ficou furioso.

— Tragam-na!

Chapter 108

O imperador presumira que seu plano de arranjar um casamento forçado seria simples, e que coagir Ye Chutang à obediência por meio de veneno também não seria difícil.

Ainda assim, acabou perdendo quatro guardas das sombras sem conseguir absolutamente nada.

No fim, quem acabou envenenado foi aquele tolo do Ye Jingchuan!

Quando concordara em receber Ye Chutang, não era apenas para repreendê-la — ele também pretendia envenená-la.

Como ela ousava ameaçar o Filho do Céu dizendo que bateria no tambor imperial? Que audácia!

— Eunuco De, prepare chá e alguns quitutes para recompensar a senhorita Ye mais tarde.

O eunuco De compreendeu a mensagem oculta do imperador.

— Este servo obedece.

Ye Jingchuan já esperava que o imperador tomasse alguma atitude contra Ye Chutang. Ao ouvir isso, uma expressão satisfeita surgiu em seu rosto.

Um título nobre estava ao alcance de suas mãos!

Ele fingiu falar em defesa de Ye Chutang.

— Vossa Majestade, por favor, acalme sua ira. Minha filha teve um desentendimento com a consorte da princesa. Ontem, quando foi atacada na residência do Príncipe An, ela assumiu, por engano, que fora obra do Príncipe An. É tudo um mal-entendido — peço que não leve isso a sério.

O Príncipe An sabia que, se o assunto se agravasse, sua situação só pioraria.

Ele acrescentou:

— De fato, foi negligência minha ao recebê-la que levou a senhorita Ye a interpretar mal. Suplico que Vossa Majestade não a culpe.

O imperador, naturalmente, não puniria uma simples peça — afinal, ela ainda tinha grande utilidade.

Mas era necessário dar uma lição.

Se deixasse esse precedente passar, todos começariam a apresentar queixas e a bater no tambor imperial.

Nesse momento, uma voz aguda ecoou do lado de fora do Salão Dourado do Pavilhão da Fênix.

— A senhorita Ye da família Ye solicita uma audiência!

O imperador lançou um olhar ao eunuco De.

— Os assuntos de Estado ainda estão em discussão. Faça a senhorita Ye esperar do lado de fora do salão.

O eunuco De se curvou e saiu.

— Senhorita Ye, Sua Majestade ainda está lidando com os assuntos da corte. Por favor, aguarde um momento.

Já era fim da manhã, e o sol escaldante brilhava intensamente no alto.

Ye Chutang percorrera todo o caminho desde os portões do palácio, suas roupas úmidas de suor.

Ela sabia que o imperador estava deliberadamente querendo humilhá-la, forçando-a a ficar de pé sob o sol ardente.

— Esta humilde súdita aguarda o chamado de Sua Majestade a qualquer momento.

Dito isso, dirigiu-se ao corredor sombreado diante do Salão Dourado e sentou-se.

Ao ver o olhar atônito do eunuco De, ela arqueou a sobrancelha.

— Sua Majestade não ordenou explicitamente que eu ficasse sob o sol como punição, não é?

Como a vítima, mesmo que o maldito imperador tivesse tais intenções, ele não diria isso abertamente.

O eunuco De observou a postura pouco refinada de Ye Chutang, relembrando seus hábitos notórios — pular banhos, recusar trocar de roupa, até cutucar os próprios dedos dos pés. Enojado, desviou o olhar.

— Sua Majestade é benevolente. A senhorita Ye está interpretando demais.

Com isso, retornou ao salão e informou discretamente o imperador sobre como Ye Chutang havia escapado do calor com esperteza.

O imperador não esperava tal astúcia dela e murmurou entre dentes:

— Tão ardilosa quanto a mãe!

No passado, a beleza de Tang Wanning fora incomparável na capital. A família Tang, a mais rica de Jiangnan, garantia que ela tivesse inúmeros pretendentes.

Não apenas o Príncipe An considerara tomá-la como concubina, como o próprio imperador cogitara torná-la sua consorte.

Quem não desejaria um belo e inestimável vaso decorativo?

Mas o coração dela pertencia unicamente a Ye Jingchuan. Ela rejeitou todas as investidas — diretas ou sutis — e até usou a boa vontade do povo, adquirida por meio de suas obras de caridade, para se proteger de uma posse forçada.

O imperador sentia que Ye Chutang trilhava o mesmo caminho.

Exceto pelo fato de ela ser ainda mais capaz que Tang Wanning.

Em menos de um mês, ela tornara impossível para ele, o imperador, agir contra ela livremente!

Já que sua tática de intimidação falhara, não havia motivo para perder mais tempo.

O imperador acenou com a mão.

— Chamem-na.

O eunuco De balançou seu espanador de cauda de cavalo, branquíssimo.

— Ye Chutang é convocada para uma audiência!

Ao ouvir isso, Ye Chutang se levantou, ajeitou as roupas e entrou a passos firmes no Salão Dourado do Pavilhão da Fênix.

Ela era a primeira dama nobre a entrar ali desde o início do reinado do imperador.

— Esta súdita saúda Vossa Majestade. Que o Imperador viva dez mil anos!

Em vez de se ajoelhar, ela uniu as mãos e fez uma reverência profunda — a saudação de um erudito.

O imperador a observou do alto de seu trono dracônico.

— Levante-se. Olhe para mim.

Ye Chutang se endireitou e encontrou seu olhar.

Por um instante, o imperador ficou atordoado com sua beleza estonteante, seu olhar escurecendo.

Uma mulher deslumbrante que sabia ler, era habilidosa em artes marciais e versada em medicina… Ele relutava em deixá-la morrer.

— O ministro Ye mencionou que você deseja apresentar uma queixa?

— Sim, Vossa Majestade!

Ye Chutang percebeu a fome nos olhos do imperador e sentiu uma onda de repulsa.

Ela relatou os acontecimentos estranhos desde sua visita à residência do Príncipe An até a subsequente tentativa de assassinato.

— Vossa Majestade, não é que eu seja excessivamente desconfiada, mas desde o momento em que entrei na propriedade do Príncipe An, tudo começou a dar errado — especialmente a enorme gaiola de ferro nos aposentos de hóspedes e a dúzia de assassinos de elite. Como o Príncipe An explica isso?

Sem dar ao Príncipe An chance de se defender, ela acrescentou:

— Posso desenhar os rostos daqueles assassinos. Com seus retratos, não será difícil rastrear a identidade deles.

Isso era dirigido ao imperador.

Embora aqueles quatro guardas das sombras raramente aparecessem em público, alguém deve ter os visto.

Assim que os retratos circulassem, o imperador seria implicado na trama de assassinato.

Um homem que prezava sua reputação jamais permitiria tamanho escândalo.

Portanto, a culpa do maldito imperador recairia inteiramente sobre o Príncipe An!

O coração do imperador se contraiu, mas ele ignorou a provocação, recordando-se do relato do Príncipe An no dia anterior.

— Ye Chutang, você afirma que o Príncipe An tentou matá-la. Então me diga — como escapou de tantos assassinos habilidosos?

Ye Chutang sabia que o imperador suspeitava que ela tivesse ligação com o “Ladrão Fantasma”.

Ela sustentou seu olhar opressor com tranquilidade.

— Eu não sei. Naquele momento, o Príncipe Chen, o Jovem Mestre Qin e eu estávamos à beira da morte quando o chão começou a tremer, como se fosse um terremoto. Então perdi a consciência e acordei em meus próprios aposentos.

— Mais tarde, soube pelos investigadores que o “Ladrão Fantasma” havia esvaziado toda a propriedade do Príncipe An e incendiado tudo.

A aura imperial do imperador pesou sobre ela.

— Então você foi salva pelo “Ladrão Fantasma”. Por que ele a salvaria? Estão em conluio?

Imperturbável, Ye Chutang respondeu:

— Nunca encontrei o “Ladrão Fantasma”, nem sei por que ele me salvou. Meu palpite? Ele provavelmente viu o Príncipe An e o Mestre Celestial Zhang como dois do mesmo tipo, então resgatou a vítima que pretendiam sacrificar e saqueou a propriedade.

Ye Jingchuan, relutante em permitir qualquer associação entre a família Ye e o Ladrão Fantasma — temendo desagradar o imperador — apressou-se em intervir:

— Vossa Majestade, o Ladrão Fantasma atacou primeiro o Pavilhão Ningchu, da minha filha. Ela jamais poderia ser cúmplice dele. O resgate foi pura coincidência.

De repente, uma voz interrompeu:

— Ou talvez seja um caso do ladrão gritando “peguem o ladrão”, apenas para desviar as suspeitas.

Ye Chutang identificou o orador imediatamente.

— Então este oficial está insinuando que o Ladrão Fantasma está aliado ao eunuco De, a Vossa Majestade e ao Príncipe An?

O oficial empalideceu e caiu de joelhos.

— Vossa Majestade, não foi isso que eu quis dizer!

Ye Chutang sorriu docemente.

— Então está mirando em mim?

— A senhorita Ye entendeu errado. Este oficial apenas apresentou uma hipótese.

— Ah, é? Então eu também tenho uma — talvez o Ladrão Fantasma trabalhe para o senhor, já que sua propriedade foi poupada.

O oficial gaguejou:

— Muitos oficiais não foram roubados!

Ye Chutang sorriu de canto.

— Justamente isso prova meu ponto. Portanto, estimado oficial, não saia por aí dizendo bobagens sem fundamento.

Hoje à noite garantimos outra remessa — que emoção!

O oficial ficou sem palavras, incapaz de rebater uma única frase.

— A senhorita Ye está certa. Este oficial agiu precipitadamente — admitiu ele.

O imperador observou Ye Chutang, afiada como uma lâmina e firme como aço, e convenceu-se de que ela não tinha ligação alguma com o “Ladrão Fantasma”.

O Ladrão Fantasma só aparecera depois que Qi Yanzhou voltou à capital — certamente era obra dele!

Assim que essa conclusão o atingiu, a determinação do imperador de erradicar a família Qi ficou ainda mais feroz.

Retraindo sua aura imponente, ele voltou-se para o Príncipe An.

— Príncipe An, desde que a senhorita Ye entrou em sua propriedade, os incidentes só aumentaram. Como você explica isso?


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