Capítulo 116
— Senhorita Fan, tem certeza de que quer vender tudo agora? O preço do ouro só tem subido. Se segurarmos por mais um tempo, com certeza vamos lucrar muito mais.
O parceiro de negócios de Fan Juan tentava convencê-la a não vender o ouro que ela tinha em mãos.
— Também estou relutante, mas meu visto está prestes a vencer, e preciso voltar para minha terra natal. Então, decidi vender todo o ouro que tenho. Comparado aos outros, nós somos parceiros, então você tem prioridade. Por isso estou te avisando primeiro.
— Senhorita Fan, por que não escolhe ficar? Você tem um ótimo senso de julgamento, e nossa parceria tem sido muito agradável. Posso te ajudar a resolver isso.
Os olhos do homem estavam cheios de afeto.
— Cada um tem seus próprios objetivos. Minha família ainda está me esperando.
Fan Juan recusou o homem.
— Nesse caso, só posso lhe desejar o melhor. Se algum dia se arrepender, pode me ligar.
O homem não tentou forçar o preço para baixo. Afinal, o valor do ouro aumentava a cada dia, e havia muita gente de olho.
Fan Juan recebeu o dinheiro. Depois de fazer a remessa, soltou um suspiro de alívio. Maldito homem, fingindo desse jeito. Será que ele achava que eu não percebia as intenções sujas dele? Já tem noiva, mas ainda assim diz que vai me ajudar. Só quer que eu vire amante dele.
Em seguida, Fan Juan arrumou suas coisas e ficou esperando Qin Nian.
Ao entrarem no aeroporto e passarem pela triagem de segurança, suas bagagens foram completamente reviradas. As malas chegaram a ser danificadas, e ainda foram obrigadas a passar por revista corporal. Era claramente algo direcionado.
— Vocês, de pele amarela, não pensem que vão sair levando nossas coisas.
Qin Nian e Fan Juan tiraram os enfeites das orelhas. Ao verem o abuso daqueles seguranças — especialmente um deles tentando encostar nelas — também se ergueram com firmeza.
— Tudo bem, então não vou mais sair. Quero ver se, com o nome do meu mestre, não consigo lidar com vocês. Se eu ficar, nenhum de vocês vai ter sossego.
Qin Nian lançou um olhar gélido ao segurança.
— Eu conheço o Gerald. O número dele é ******. Pode ligar pra ele.
Fan Juan sacudiu o cabelo comprido, com os olhos igualmente frios.
— Oh, deve ter sido um mal-entendido. É uma ordem de cima, os seguranças só estão cumprindo regras. Pedimos desculpas por ofendê-las. Está tudo certo, podem passar.
Depois de um tempo, finalmente apareceu alguém para apaziguar a situação.
Só quando conseguiram embarcar no avião é que Qin Nian e Fan Juan apertaram discretamente as mãos uma da outra, se encorajando mutuamente.
O avião decolou com um rugido tão forte que machucava os ouvidos.
No conjunto habitacional da família, Yang Yufen olhava para uma fileira de crianças cobertas de lama à sua frente. Até o menorzinho, o Bebê, estava no mesmo estado, parado num canto.
— Vocês disseram que iam pegar cigarras. Agora me digam, o que foi isso?
Havia caracóis, conchas no chão, enguias, peixinhos, rãs e outros peixes desconhecidos nos baldes.
Yang Yufen sempre pensou que só crianças do interior gostavam de brincar na lama e se sujar. Agora, ao ver aqueles garotos, ela respirou fundo outra vez.
— Vovó Yang, a gente ia mesmo pegar cigarras, mas aí vimos umas enguias no campo e entramos. O Tio Wang disse que podíamos pegar, então a gente pegou um monte. Tiramos os sapatos antes de entrar, então nem nos sujamos tanto no começo. Mas o Bebê escorregou na beirada e caiu. Aí fui tentar pegar o Bebê. O Li Wu achou uma cobra, o que assustou o Wang Xing. O Wang Xing perdeu o equilíbrio e o Li Wen estava do lado dele, então acabaram caindo todos no campo e ficamos assim.
Como o mais velho do grupo, Hu Zhenghao explicou o que tinha acontecido.
Yang Yufen viu a cobra morta pendurada no pescoço de Li Wu.
— E vocês ainda desfilam por aí assim, assustando a Yaoyao e a Miaomiao até fazê-las chorar! Não sabiam guardar direito essa coisa?
Hu Zhenghao balançou a cabeça depressa.
— Não, a gente esqueceu no começo. Aí, quando o Li Wu viu a Yaoyao e a Miaomiao, lembrou na hora e correu empolgado com a cobra pra mostrar. A gente não conseguiu impedi-lo.
Na casa ao lado, Wang Shuo consolava suas duas filhas. Yaoyao, um pouco mais velha, já tinha se acalmado, mas a pequena Miaomiao ainda chorava tanto que soluçava.
— Vão se limpar. Depois eu cuido de vocês.
Yang Yufen enfiou os lanches que tinha preparado no bolso e foi às pressas para a casa ao lado.
— Miaomiao, Yaoyao, a Vovó Yang chegou. Ah, minhas queridas, não chorem mais. Depois a Vovó Yang vai bater naqueles irmãos por vocês. Olha só, a Vovó Yang confiscou os lanches dos meninos para nossa Miaomiao e nossa Yaoyao.
— Madrinha, as meninas estão bem. Não precisa se preocupar.
Vendo Yang Yufen chegando com as coisas, Wang Shuo falou depressa.
— As crianças erraram, então o castigo é só ficarem sem os lanches. Vamos, Yaoyao, ajuda sua irmã a segurar isso. Miaomiao, vem aqui. A Vovó Yang vai te pegar no colo. Vai levar você pra ver os irmãos levando bronca.
Yang Yufen enfiou os lanches nas mãos de Yaoyao e pegou Miaomiao no colo.
Se foi pelos doces ou pela promessa de ver os irmãos apanhando, o fato é que o choro de Miaomiao se acalmou bastante.
Yang Yufen voltou para casa com Miaomiao no colo. Hu Zhenghao e os outros já tinham levado os bichos para a cozinha e estavam se lavando no quintal. As roupas sujas foram todas jogadas na bacia como mandado.
— Miaomiao, olha só. Que tal a Vovó Yang usar esse bambuzinho pra bater nos irmãos?
Yang Yufen pegou uma varinha de bambu, e Miaomiao balançou a cabeça.
— Então vamos deixar a Miaomiao escolher, pode ser?
Vendo a menina que agora só fungava, sem mais lágrimas, Yang Yufen finalmente se sentiu aliviada.
Miaomiao assentiu. Depois de ser colocada no chão, escolheu o galhinho mais fino e entregou para Yang Yufen.
— Li Wu, vem aqui e estica a mão.
Yang Yufen falou com seriedade. Li Wu não se atreveu a hesitar e obedeceu prontamente, esticando a mão.
A varinha bateu na palma, deixando uma marca vermelha na hora.
— Vai continuar agindo sem pensar? Olha só como deixou sua irmã assustada.
Li Wu olhou para os olhos vermelhos e inchados de Miaomiao, depois para a varinha fina na mão da avó.
— Desculpa, irmãzinha Miaomiao. Eu não sabia que você tinha medo de cobra. Não vou te assustar mais.
Wang Shuo também se aproximou. Tinha mesmo medo de que a madrinha batesse de verdade nas crianças. Vendo que era só uma lição, não interferiu.
Era feriado para as crianças, e ele tinha acabado de voltar do sul, então estava livre. Quando ouviu que queriam pegar cigarras, levou todos ao campo experimental do instituto de pesquisa agrícola, onde havia muitas. Yaoyao quis ficar em casa ajudando a mãe a corrigir tarefas, então ele não levou nem Yaoyao nem Miaomiao. No caminho, encontrou alguns alunos com dificuldades e foi ajudá-los. Quando voltou, as crianças já estavam cobertas de lama.
Tinham feito uma boa colheita, então ele trouxe todos de volta. Nem reparou na cobra pendurada no pescoço do Li Wu. Aquele menino era realmente corajoso.
— Miaomiao, seu irmão já foi castigado e pediu desculpas. Vai perdoar ele?
Wang Shuo se agachou ao lado da filha, e Miaomiao assentiu.
— Boa menina, Miaomiao. A Vovó Yang vai cozinhar uma coisa bem gostosa pra você hoje à noite. Agora vá com seu pai e coma uns lanchinhos com sua irmã, tá bom?
Yang Yufen ficou aliviada ao ver que Miaomiao já não estava mais tão assustada.
Miaomiao assentiu e foi levada por Wang Shuo. O sorriso gentil no rosto de Yang Yufen desapareceu imediatamente, e ela trocou rapidamente a varinha de bambu por outra.
Capítulo 117
— Vocês perderam o juízo? Quando veem uma cobra, em vez de se afastarem, ainda têm a ousadia de pegá-la? E se fosse venenosa e mordesse vocês, já pensaram nas consequências? Mesmo com a cabeça cortada, uma cobra ainda pode morder. Vou contar tudo isso pra sua avó!
No fim das contas, nenhum deles — nem os pequenos, nem os maiores — escapou da surra com a vara.
— O Vovô Liao ensinou a atacar o ponto vital da cobra — e eu acertei direitinho! Mas a Vovó ainda me deu duas varadas a mais!
Li Wu levantou a mão fazendo sinal de vitória, com os dedos tão esticados que era impossível não perceber o quanto era encrenqueiro.
As crianças estavam agachadas em volta de uma bacia, lavando suas roupas sujas. Desde que haviam quebrado a máquina de lavar — mesmo já consertada — agora eram obrigadas a lavar tudo na mão quando se sujavam demais.
— Eu te disse pra jogar fora, mas você não quis me ouvir. A Vovó devia ter te castigado sozinha!
Li Wen lançou um olhar irritado para seu irmão gêmeo. Era só pra lavar roupa — por que ele tinha que ser tão teimoso? Por que fui nascer só uns minutinhos depois? Se eu fosse o mais velho...
— A Tia Yang só usou as mãos dessa vez. Esperem só pra ver a quantidade de dever extra que vamos receber.
As palavras sombrias de Wang Xing fizeram todos se calarem imediatamente.
— Ai, não... Vou ter que escrever outra redação de autocrítica...
Hu Zhenghao foi o primeiro a gemer de desespero.
Li Wu ficou paralisado.
— Irmãozinho, me ajuda! Os deveres da Vovó são difíceis demais!
— Sem chance.
Li Wen recusou. Li Wu se virou para Wang Xing, que apenas olhou para o céu.
Li Wu sentiu como se o céu estivesse desabando. Era melhor levar mais umas varadas da Vovó... pelo menos disso eu dou conta.
Professor Wen e Yang Yufen conversavam sentadas.
— Li Wu e Li Wen estão prestes a entrar no ensino fundamental. No orfanato, as crianças têm mais liberdade, mas quando começarem a escola, vão aprender disciplina. Assim você não vai precisar se preocupar tanto.
— O centro juvenil está oferecendo várias atividades agora, e seria ótimo pra eles. Vou fazer a matrícula. O Zhenghao já conhece o lugar, pode levá-los.
— As férias de verão estão chegando também. Depois do treinamento no centro, o Junzinho e os outros podem levá-los até a base militar. São todos meninos — a orientação dos pais também é importante.
— Verdade. A Niannian deve estar voltando logo, né? Não tivemos nenhuma notícia ainda, mas como ontem fez sol, aproveitei pra lavar e arejar todas as coisas no quarto dela.
Yang Yufen assentiu. O tempo havia passado rápido demais — os gêmeos já estavam quase na altura de sua cintura. Comendo bem e sempre agitados, cresciam como mato.
As crianças escutavam escondidas pela porta, sentindo como se tivessem ouvido a própria sentença de morte.
Mas Hu Zhenghao, em segredo, sentia um pouco de satisfação. Pelo menos agora ele não seria o único a sofrer no centro juvenil.
Lançou um olhar para seus irmãos mais novos. Logo até o Bebê vai se juntar a nós...
E a base militar? Ele já tinha morado lá. Heh... os irmãos logo iam descobrir o que era bom pra tosse.
— Ela deve voltar em breve. Você tem se esforçado muito nesses dois anos. A Little Zhou disse que pretende levar o Bebê ao hospital logo — ele já não é tão bebezinho assim. O Zhenghao puxou ao pai, mas a Little Zhou quer que ele estude medicina. Quanto mais cedo tiver contato, melhor.
— Medicina é um ótimo caminho! O Li Wu parece ter a personalidade do Xianjun, enquanto o Li Wen puxou à Niannian.
Yang Yufen assentiu. Sem perceber, as crianças tinham crescido tanto. Logo teria mais tempo livre.
— O Li Wen tem mesmo talento pra línguas e números. Ele e o Wang Xing se dão super bem. O Zhenghao e o Li Wu até vão bem no inglês, mas quando o assunto é aprender línguas extras, não conseguem acompanhar os dois — falta paciência.
A Professora Wen adorava Li Wen e Wang Xing, e frequentemente os levava à universidade para assistirem às aulas de idiomas estrangeiros. Com o desenvolvimento do país, a demanda por talentos multilíngues só aumentava — dominar uma só língua já não bastava.
Essas eram coisas que Yang Yufen não conhecia tão bem, mas a Professora Wen entendia perfeitamente e gostava de compartilhar. Por isso, quando se tratava da educação das crianças, Yang Yufen nunca contestava.
— Se o Velho Hu não estivesse tão ocupado ultimamente, também seria ótimo pra ensinar as crianças.
A Professora Wen pensou no marido.
— Todos eles estão fazendo um trabalho importante.
Base Militar
— Missão designada: buscar duas pessoas no aeroporto. Uma vai para o instituto de pesquisa, a outra para o Ministério das Relações Exteriores.
Hu Jun foi convocado. Após receber as ordens e revisar os documentos, sentiu o coração saltar de alegria.
— Entendido!
Chamou Shen Xianjun e Liao Yuanjie.
— Vocês dois, venham comigo numa missão.
— Sim, senhor!
Os dois se apressaram em arrumar as coisas, trocaram de roupa para trajes civis e seguiram com Hu Jun.
— Para o aeroporto.
Shen Xianjun pisou fundo no acelerador, dirigindo o grupo para fora.
— Velho Hu, precisamos mesmo de três pessoas só pra buscar alguém no aeroporto?
Liao Yuanjie, no banco do carona, virou-se para perguntar.
— Não façam perguntas. Logo vão entender.
Hu Jun não explicou. Quando chegaram, ele olhou o relógio — o horário estava perfeito.
Pelos canais internos, acompanharam a aterrissagem do avião ao longe.
— Um dia, nossos caças vão superar esses aviões comerciais. Vamos voar pra onde quisermos.
Shen Xianjun olhou para as aeronaves espalhadas pelo aeroporto imenso. Se ao menos fossem todos jatos militares...
— Esse dia vai chegar.
Liao Yuanjie concordou. Já haviam começado o treinamento com caças — se não fosse pela convocação de Hu Jun, estariam agora mesmo num simulador.
O transporte parou. Os três desceram no momento em que a porta do avião começou a se abrir lentamente.
Qin Nian e Fan Juan desceram com suas bagagens. Assim que pisaram no chão firme, a sensação de estar flutuando desapareceu, substituída por um alívio profundo.
— Estamos em casa.
Não conseguiram evitar se abraçar.
— Niannian, bem-vinda de volta.
A voz de Hu Jun soou firme. Qin Nian se virou e o viu fardado.
— Irmão!
— Niannian.
Shen Xianjun se aproximou e pegou sua bagagem.
— Olá, Camarada Fan Juan. Sou Hu Jun. Fomos enviados para escoltá-la. Primeiro iremos ao instituto de pesquisa, depois o Camarada Liao Yuanjie a levará ao Ministério das Relações Exteriores. Está tudo bem para você?
Hu Jun saudou-a com um gesto formal.
— Sem problema. Niannian, vou te visitar depois. Também quero ver a Tia Yang.
Fan Juan conhecia os laços entre Qin Nian, Hu Jun e Shen Xianjun, e sabia respeitar seu espaço.
Liao Yuanjie pegou as malas de Fan Juan — agora entendia por que fora chamado.
— Aqui, vou te dar meu contato — o número da casa do meu mestre. Pode ligar a qualquer hora, se precisar de algo.
Saíram do aeroporto sem dificuldades. Dentro do carro, Qin Nian anotou o número para Fan Juan, que o guardou com cuidado.
Quando os portões familiares do instituto de pesquisa surgiram à frente, Qin Nian respirou fundo. O carro parou em frente ao prédio do escritório, onde ela viu sua mentora.
— Mestre, estou de volta.
Qin Nian olhou para sua professora, cujas têmporas agora estavam grisalhas — em apenas dois anos, parecia que uma eternidade havia se passado.
Capítulo 118
Fan Juan também desceu do carro para cumprimentar todos.
— Olá, Diretor Hu. Eu sou Fan Juan.
— Olá, Camarada Fan Juan.
Como estava com pressa para ir ao Ministério das Relações Exteriores, Fan Juan não demorou. Qin Nian e os outros a observaram partir no carro, até que o Diretor Hu se pronunciou:
— Que bom, é ótimo que você voltou. Vou levá-la até o escritório primeiro. Vá avisar sua mãe e a tia Yang que Nian Nian voltou.
— Certo.
Hu Jun assentiu e saiu com Shen Xianjun.
— Na verdade, irmão, posso ir eu mesmo avisar minha mãe. Aproveito e trago as coisas da Nian Nian comigo também.
— Vou com você. Elas podem estar juntas no mesmo lugar.
E estavam mesmo. Hu Jun acertou — a Professora Wen e Yang Yufen estavam juntas.
— O que vocês estão fazendo aí? Aglutinados na porta, parecendo uns pestinhas.
No instante em que Hu Jun falou, as crianças se endireitaram como se levassem um choque.
— Pai? Você já voltou?
O coração de Hu Zhenghao afundou assim que terminou de falar. Ai, ai, lá vem bronca de novo...
E não era só ele que pensava isso — todos os pequenos se enrijeceram.
— Estão tão tensos assim... Então com certeza aprontaram alguma. Todos vocês, para o canto agora. Quero reflexão sobre o que fizeram.
Ao comando de Hu Jun, os pequenos foram obedientemente para o canto, cabisbaixos.
— Sogra, mãe.
— Mãe, tia Yang, a Nian Nian voltou. Ela está no instituto agora, cuidando da parte burocrática.
Hu Jun foi um pouco mais lento que Shen Xianjun no cumprimento, mas acabou sendo o primeiro a dar a notícia.
— A Nian Nian voltou?!
Yang Yufen levantou-se na hora, o rosto iluminado de alegria.
— Sim, mas provavelmente só chega aqui em casa em uma ou duas horas.
Hu Jun respondeu sorrindo.
— Dá tempo mais que suficiente! Vamos, cunhada, vamos fazer o jantar em casa hoje. Você escolhe os legumes e eu vou pegar uma galinha.
Yang Yufen ignorou completamente Shen Xianjun — ela o via todo mês, afinal — e já saiu de braço dado com a Professora Wen direto para o quintal.
Depois de pegar a galinha, Yang Yufen voltou para o pátio da frente e viu Shen Xianjun ainda parado ali, feito um perdido.
— Vai ver se consegue comprar algum peixe ou carne. Teremos muita gente para o jantar hoje. Se não achar nada, tenta no refeitório. Tá esperando o quê?
— Meu cunhado já foi. Nem tive como impedir.
Shen Xianjun só tinha colocado a bagagem no chão quando Hu Jun disparou: “Vou comprar a carne”, empurrou a bicicleta e saiu pedalando, sem dar chance a ninguém.
— Sua esposa está voltando e você parado aí que nem uma tábua? Seu cunhado teve que sair pra comprar a carne no seu lugar — que vergonha! Deixa pra lá. Vai matar a galinha. Eu vou arrumar o quarto da Nian Nian.
Yang Yufen empurrou a galinha nas mãos dele.
— Ah, e põe um pedaço de carne curada de molho também.
Ela gritou o lembrete enquanto lavava as mãos.
Quando a Professora Wen voltou com os legumes, encontrou Yang Yufen estendendo um esteira nova de bambu e pendurando um mosquiteiro no quarto de Qin Nian.
— O Xianjun não fica neste quarto quando vem pra casa?
A Professora Wen notou que não havia quase nada dele ali.
— Quando a Nian Nian não está, ele só aparece uma vez por mês. Dorme com as crianças — passa mais tempo com elas, e eu tenho um quarto a menos pra limpar.
A Professora Wen ajudou, alisando as fronhas de dois travesseiros.
— Por enquanto, só uma arrumada rápida. Vou começar o jantar.
Yang Yufen deu uma última olhada satisfeita no quarto antes de abrir a janela para arejá-lo.
— Eu te ajudo com a comida.
Assim que teve certeza de que o pai já tinha saído, Hu Zhenghao se animou de imediato.
— Li Wu, Li Wen, sua mãe — minha tia — voltou! Eu ouvi!
— Mãe?
Li Wu congelou por um segundo, mas Li Wen saiu correndo em disparada na direção de Yang Yufen como nunca antes.
— Vovó, é verdade que a mamãe tá voltando?
— É sim, sua mãe está voltando. Você não tá feliz?
Yang Yufen bagunçou o cabelo do menino com carinho.
Li Wen não respondeu. Yang Yufen não insistiu — a mãe deles estava fora havia tanto tempo. No começo, ainda havia ligações, mas depois nem isso. Li Wen era o mais sensível dos gêmeos, ao contrário de Li Wu. Precisava de tempo para processar.
Li Wen voltou pra fora. Os outros ainda estavam de castigo no canto, mas Li Wu agora interrogava Hu Zhenghao:
— Irmão, é verdade que a mamãe é bonita daquele jeito que você falou?
— Não é só bonita — ela é incrível! Tipo... muito incrível!
— Uau... Você acha que ela vai se decepcionar comigo?
Li Wu olhou para suas roupas, um pouco sujas.
— Claro que não! Aposto que ela sentiu muita saudade de vocês. Talvez até chore quando vir vocês. Ela é super carinhosa.
— A mamãe choraria?
Li Wen olhou para Hu Zhenghao, que confirmou com um aceno firme.
No escritório —
— Professora, conheci um pesquisador incrível durante o tempo fora.
Qin Nian passou os minutos seguintes relatando tudo que tinha aprendido nos últimos dois anos ao Diretor Hu.
— Professora, pretendo compilar tudo em um relatório o quanto antes, pra que possamos integrar nas experiências.
— Muito bem. Aprovo que trabalhe de casa por um tempo. Um ambiente confortável ajuda a acelerar o trabalho.
O Diretor Hu estava profundamente satisfeito. Só pelas descrições, já dava pra perceber como aqueles dados eram cruciais — exatamente o que precisavam naquele momento. Ele até queria extrair cada informação na hora, mas sabia que isso não era possível. Um pequeno erro podia desperdiçar recursos preciosos e atrasar tudo.
Em casa, Yang Yufen já havia abatido a galinha e cozinhado a carne curada, mas não parou por aí. Limpou os muçuns e enguias que as crianças trouxeram, fritou alguns e refogou outros. Hu Jun voltou com um peixão — não tinha encontrado carne — mas Yang Yufen jogou na panela para fazer um ensopado mesmo assim.
— A Nian Nian ainda não voltou... Deixa eu ver o que mais posso preparar. Ela gosta de sabores mais leves — vou ralar umas batatas pra refogar. Ah, e uns vegetais em conserva, que abrem o apetite.
Yang Yufen rodava pela cozinha, feliz demais para sentir cansaço. Curiosamente, Li Wu — normalmente o primeiro a invadir a cozinha — não se moveu. Em vez disso, cutucou o irmão.
Li Wen não parecia triste, mas também não estava exatamente alegre. Os gêmeos tinham essa conexão estranha, e pela primeira vez, Li Wu resistiu ao impulso de ir atrás da comida, agachando-se ao lado do irmão.
Logo, todos estavam agachados juntos.
Wang Xing pareceu captar o clima e se aproximou de Li Wen.
— Li Wen, sua mãe com certeza sentiu saudade de vocês. Mas adultos têm tanto trabalho... Olha pra mim — agora eu moro com vocês. Meus pais antes vinham quando dava, agora evitam vir. Faz tempo que não vejo eles.
Tão ocupados, tão ocupados... que sumiam. Cada retorno era apressado, com desculpas vagas, algum dinheiro, e às vezes nem rolava uma refeição juntos. Quando as roupas não serviam mais, era a Vovó Yang que o levava para comprar novas.
— Na real, a maioria das crianças do complexo vive assim. Nossos pais são tão ocupados que a gente acaba crescendo na creche. Metade dos meninos lá mal vê os pais também.
Eles não estavam sozinhos nisso. Li Wen absorveu tudo, sentindo-se subitamente envergonhado.
— E seu irmão disse que sua mãe é super gentil e bonita. Tô curioso pra ver como a tia Qin é linda!
O entusiasmo de Wang Xing era contagiante. Li Wen não lembrava muito da mãe, mas se recordava que ela era boa — muito boa. E a vovó sempre dizia que ela era incrível.
Capítulo 119
— Irmãozinho, a vovó fez tanta comida gostosa. Você não tá mais triste, né? A gente pode ir dar uma olhada na cozinha? Não é que eu queira comer... é só pra ver se tem algo que a gente possa levar pra mamãe.
Li Wu engoliu seco, com a boca praticamente salivando. Nem era Ano-Novo, mas a fartura parecia até maior do que em dias de festa. O ar estava carregado com aromas de dar água na boca.
Li Wen, que estava prestes a se levantar, hesitou de novo. Por que o irmão sempre pensa em comida? Quando a mamãe chegasse, ele queria ser o primeiro a vê-la. Será que ela ainda o reconheceria?
Ele e o irmão eram quase idênticos, e as pessoas viviam confundindo os dois. Mas a vovó nunca errava, nem o vovô e a vovó Liao, nem mesmo o Wang Xing e os outros — eles os viam com frequência suficiente para distinguir.
Mas a mamãe... não os via fazia dois anos.
— Talvez a gente devesse esperar no portão?
Hu Zhenghao olhou pro pai, que estava ocupado demais pra prestar atenção. Deve estar tudo bem — e se der ruim, a gente pede desculpa pra tia depois.
As crianças se levantaram justamente quando o som de uma campainha de bicicleta ecoou no portão do pátio.
— É a bicicleta do vovô!
Os olhos de Li Wu brilharam quando o Reitor Hu entrou empurrando a bicicleta, seguido por Qin Nian.
— Tia!
— Zhenghao, Dabao, Erbao — a mamãe voltou.
Os olhos de Qin Nian se encheram de lágrimas ao ver como os filhos estavam mais altos e crescidos.
O rosto de Li Wen se iluminou. A mamãe o chamou de "Erbao" olhando direto pra ele — ela lembrava! Reconheceu ele de primeira!
Li Wen correu até ela, e Qin Nian se abaixou um pouco, com os braços abertos para recebê-lo.
— Mamãe!
— Sim, sou eu. Vocês dois cresceram tanto...
Ela os abraçou, um de cada lado, mas logo percebeu que não conseguia mais levantá-los ao mesmo tempo. Tinha perdido tanto...
Ajoelhou-se, vendo que eles já estavam quase da sua altura. Então, uma mãozinha tocou seu rosto.
— Mamãe, não chora.
A voz de Li Wen era suave, os dedos molhados pelas lágrimas dela. Então o que o irmão tinha dito era verdade — mamãe tinha sentido muita falta deles.
Qin Nian sorriu, mesmo enquanto as lágrimas escorriam.
— São lágrimas de alegria, meu amor. Não de tristeza.
Ela balançou a cabeça com leveza e os puxou ainda mais para perto.
— Mamãe, a vovó fez um monte de comida gostosa.
Li Wu cheirou as roupas de Qin Nian — ela tinha um cheiro doce, quase como algo delicioso. E se aconchegou nela.
Shen Xianjun e Hu Jun observavam a cena até que Shen Xianjun levou um leve chute. Virou-se.
— Vai lá avisar a Tia Yang e as outras que a Nian Nian voltou — disse Hu Jun, como se fosse a coisa mais óbvia do mundo.
Shen Xianjun não teve escolha senão ir até a cozinha.
— Sogra, mãe, a Nian Nian chegou.
— Ela voltou? Que maravilha!
A Professora Wen largou a lenha com alegria.
— Vai lá você. Eu termino de refogar esse último prato.
Yang Yufen jogou as verduras na wok. Legumes precisavam ser cozidos na hora — passar do ponto acabava com o sabor.
— Sem pressa, sem pressa. As crianças estão todas lá fora. Esse é o último.
A Professora Wen logo adicionou mais lenha ao fogo.
Hu Jun entrou bem nessa hora.
— Mãe, tia Yang, deixem o resto com a gente. Vamos arrumar a mesa e levar os pratos pra fora.
— Ótimo, ótimo.
Yang Yufen assentiu com um sorriso. As verduras ficaram prontas rapidamente e, quando terminaram, a mesa já estava posta. Shen Xianjun assumiu a pia para lavar a wok.
— Lava direito e depois põe água pra ferver.
Yang Yufen deu a instrução antes de tirar o avental e sair com a Professora Wen.
Li Wen e Li Wu não esqueceram de apresentar Wang Xing a Qin Nian — afinal, eram irmãos de cama compartilhada!
— Tia Qin, olá! Eu sou o Wang Xing. Li Wu, Li Wen — a mãe de vocês é tão bonita e gentil!
Wang Xing se aproximou sem o menor traço de timidez.
— Olá, Xingxing.
Qin Nian já tinha ouvido falar das crianças com o Reitor Hu no caminho. Ele tinha mencionado Wang Xing especificamente — um bom menino.
— Shimu, mãe.
Qin Nian se levantou ao ver a Professora Wen e Yang Yufen se aproximarem.
— Você emagreceu, mas parece bem.
A Professora Wen falou com carinho.
— Que bom que voltou. A comida está pronta — leve as crianças pra lavar as mãos primeiro.
Yang Yufen lançou um olhar caloroso para Qin Nian e os dois meninos agarrados em suas mãos.
— Sua sogra fez todos os seus pratos preferidos.
Todos se acomodaram à mesa enquanto Hu Zhenghao e os mais novos serviam o arroz, revezando para colocar as tigelas diante dos adultos.
Qin Nian tentou ajudar, mas a Professora Wen a impediu.
— Deixe que as crianças façam isso.
Qin Nian se sentou entre a Professora Wen e Yang Yufen, enquanto o Reitor Hu, Hu Jun e Shen Xianjun ocuparam seus lugares. As crianças se organizaram por idade.
— Separei comida e sopa de frango pra Pequena Zhou, já que ela tá de plantão.
Yang Yufen comentou com Hu Jun.
— Obrigado, tia. Depois eu levo pra ela.
Assim que todos foram servidos, Yang Yufen os incentivou a comer, colocando uma coxa de frango direto na tigela de Qin Nian.
— Ué — a coxa não é pras crianças?
Qin Nian corou levemente.
— Eles já comem disso o tempo todo.
Yang Yufen nunca deixou faltar comida boa pras crianças.
Logo duas asinhas de frango se juntaram à coxa na tigela de Qin Nian, cortesia da Professora Wen e do Reitor Hu.
— Você não deve estar se alimentando bem lá fora. Coma mais.
Nenhuma criança reclamou — havia pratos deliciosos de sobra.
— Mamãe, come você! Tem tanta comida — se eu comer a coxa, nem vou ter espaço pro resto!
Li Wu olhava a mesa, dividido entre tantos sabores.
Hoje parecia mesmo um dia de festa.
— É, tia, a gente não tá com ciúmes. Eu quero é o loach frito!
Hu Zhenghao ainda estava obcecado pelos peixes que haviam capturado mais cedo.
Vendo que cada criança tinha seu prato favorito, Qin Nian finalmente pegou a coxa.
— Pode comer com a mão. O Xianjun depois traz uma toalha pra você.
Yang Yufen percebeu que Qin Nian estava tendo dificuldade com os hashis.
— Aqui em casa não precisa dessas formalidades.
A Professora Wen completou com a mesma ternura.
Qin Nian assentiu, tomou um pouco de sopa primeiro, e depois mergulhou na coxa de frango.
A comida caseira era dos deuses — o frango tinha gosto de frango de verdade, doce e salgado na medida certa, cozido como ela gostava, com um leve toque de tâmaras vermelhas.
Cada vez que ela levantava os hashis, sua tigela era reabastecida.
— Coma mais legumes.
Qin Nian assentia, devorando tudo sem deixar um grão.
Yang Yufen lhe serviu, silenciosamente, mais três tigelas de arroz. O coração apertado. Quanto será que essa menina sofreu lá fora? No fim, chegou a se preocupar que Qin Nian pudesse comer demais.
Só quando Qin Nian finalmente largou os hashis é que percebeu o quanto havia comido. Devia ter convidado a Fan Juan... Agora parece que sou uma gulosa.
Corando, levantou-se para ajudar a tirar a mesa.
— Deixa que o Xianjun cuida disso. Leva as crianças pra dar uma caminhada e ajudar a digestão. Vou fazer um chá de espinheira-santa — vai estar pronto quando vocês voltarem.
Yang Yufen a impediu imediatamente. A Professora Wen concordou, e Hu Jun e Shen Xianjun assumiram a limpeza.
Capítulo 120
— Então vou levar as crianças para dar uma caminhada, ajuda na digestão.
Qin Nian também sentia que precisava de um pouco de ar fresco, e os pequenos a seguiram felizes.
— Pobrezinha... Devíamos mesmo ter nos preparado melhor para a Nian naquela época — suspirou Yang Yufen, sem conseguir conter a culpa.
A Professora Wen também sentiu um aperto no peito.
— Sempre dizem que fora do país tudo é melhor, mas como é que ela pôde passar fome daquele jeito? A Nian comia tão pouco, era difícil fazê-la dar sequer uma mordida a mais... Ainda bem que hoje fizemos bastante comida.
— Na verdade, a comida de fora só parece bonita — comentou o Diretor Hu. — Mas não é gostosa. A carne costuma vir malpassada e tem aquele cheiro forte.
Enquanto isso, em um cenário semelhante no refeitório do Ministério das Relações Exteriores, Fan Juan tentava se controlar... mas mesmo assim acabou devorando várias tigelas de arroz. O porco ao molho sobre o arroz estava absolutamente irresistível.
— Camarada Fan Juan, nossa comida aqui no refeitório é deliciosa assim mesmo — tem certeza de que não quer ficar com a gente?
Perder uma diplomata tão talentosa para o Ministério da Economia era difícil de engolir.
— Os chefs do Ministério da Economia são tão bons quanto os de vocês! — rebateu alguém da equipe econômica, determinado a não perder uma conquista tão disputada.
— Ahem... estamos todos trabalhando por um bem comum. Ajudarei onde for necessária — respondeu Fan Juan rapidamente, disfarçando ao esfregar o estômago cheio.
Sua decisão de ir para o Ministério da Economia tinha nascido das experiências dos dois últimos anos no exterior. Um país fraco não tem voz na diplomacia — a força econômica era a base do progresso. O desenvolvimento vinha antes de tudo.
Pensando no dinheiro que já havia acumulado, Fan Juan sabia que a base financeira já estava pronta. O que lhe faltava eram projetos. E seu primeiro pensamento foi recorrer a Qin Nian.
Ciência e tecnologia eram o caminho para fortalecer o país. Se era para investir no desenvolvimento, por que não começar com o que já tinham em mãos? Pesquisa exigia dinheiro, mas investir às cegas não bastava — era preciso criar um ciclo onde o avanço científico gerasse lucro, que alimentasse novas pesquisas e permitisse integrar a tecnologia no dia a dia.
Depois de viverem fora juntas, elas tinham visto muitas inovações e compartilhavam um entendimento mútuo. Além disso, Qin Nian também tinha seus próprios fundos — era uma parceria entre iguais.
Mas uma ideia solta não bastava para convencer os superiores. Era preciso um plano concreto, executável e sustentável.
Fan Juan passou a noite acordada, rascunhando pensamentos e estratégias.
Depois de colocar as crianças na cama, Qin Nian também ficou acordada. Shen Xianjun, com um raro dia de folga, percebeu que ela procurava papel e caneta e foi ajudá-la.
— Está trabalhando em quê?
— Tive algumas ideias e preciso anotar antes que sumam. Conversei com os professores hoje — as condições para pesquisa aqui são limitadas. Quero organizar o que tenho na cabeça para melhorar o que já existe e aproveitar o conhecimento disponível.
Ela lançou um olhar de desculpas a Shen Xianjun.
— Não vou atrapalhar. A luz está boa? Tem uma luminária no quarto das crianças, vou pegar pra você.
Shen Xianjun assumiu um ar sério imediatamente. Desde que ingressara na Universidade de Defesa Nacional, ele aprendera a valorizar profundamente a importância da pesquisa científica.
— Tá bom — concordou Qin Nian com a cabeça.
Assim que ele voltou com a luminária, ela começou a escrever rapidamente. Shen Xianjun observava aqueles símbolos estranhos fluírem no papel, sem conseguir entender nada.
Fiel à sua palavra, não a interrompeu. Preocupado que o ronco pudesse atrapalhá-la, ficou ali ao lado em silêncio, abanando-a de leve para espantar os mosquitos.
Qin Nian escreveu por cinco ou seis horas seguidas, ainda adaptada ao fuso horário estrangeiro. Quando finalmente parou, o relógio marcava três da manhã — e seu estômago roncava alto.
— Vou fazer um macarrão pra você.
Shen Xianjun largou o leque e se levantou.
Qin Nian olhou para a figura alta se afastando e depois para o leque ao lado da cama. Estava tão concentrada que nem tinha percebido o cuidado dele. Só agora sentia aquele calor aconchegante que a deixava à vontade para deixar as ideias fluírem.
Com o coração aquecido, tomou um gole de água e voltou a escrever até que Shen Xianjun retornou com uma tigela — não, uma bacia — cheia de macarrão, com uma montanha de coberturas.
— Não sabia do que você gostava, então peguei um pouco de tudo que tinha na despensa. Pode comer à vontade.
— Eu não vou conseguir comer tudo isso — murmurou Qin Nian, corando com o exagero. Será que ele achou que eu como muito por causa do jantar?
— O que você não comer, eu como. A mamãe tem sono leve, e não quero fazer barulho voltando pra cozinha.
Qin Nian assentiu e pegou os hashis. Achava que só conseguiria umas poucas mordidas, mas entre uma ideia anotada e outra, e aproveitando o sabor, acabou comendo quase tudo.
— Quer mais?
Shen Xianjun, como se não percebesse nada demais, a incentivou quando ela parou.
— Tô cheia.
— Então continua aí com seu trabalho.
Ele terminou o resto e levou a bacia para fora — e deu de cara com sua mãe já acordada.
— Mãe.
— Fala baixo. A Nian ficou acordada a noite toda?
— É o fuso — explicou ele. — Lá fora, esse horário seria tarde da tarde pra ela.
Yang Yufen assentiu, compreendendo. Ao ver que o filho já havia comido, resolveu pular o preparo do café da manhã para não atrapalhar Qin Nian.
Foi até o quintal alimentar as galinhas e regar os vegetais, consultando o relógio enquanto trabalhava.
— Hora de acordar. A vovó vai levar vocês pra tomar café fora hoje — bem quietinhos, a mamãe acabou de dormir.
Qin Nian adormecera na escrivaninha, e Shen Xianjun a pegou no colo, levando-a até a cama e cobrindo-a cuidadosamente.
As três crianças colaboraram, se vestindo em silêncio e saindo na ponta dos pés.
Shen Xianjun ficou de guarda na porta, impedindo os gêmeos de entrarem — aqueles papéis são preciosos demais para serem bagunçados.
Enquanto isso, Hu Jun já havia enviado um relatório aos superiores.
— Esta questão é da mais alta prioridade. Após análise, a organização decidiu atribuir a Shen Xianjun a missão de proteger a camarada Qin Nian.
Dado o planejamento inicial e o forte endosso do Diretor Hu à importância do projeto, Shen Xianjun foi considerado o candidato ideal.
Yang Yufen levou as crianças para comer macarrão num restaurante, depois os deixou no complexo — eles sabiam o caminho até a escola. Livre por um tempo, seguiu para o mercado com a cesta no braço.
Camarões frescos? Comprados! Costelinhas macias? Compradas! Pés de porco bem carnudos? Comprados!
Lembrou que pato era bom para o calor — e como não tinha criado nenhum, comprou um também.
Carregada de sacolas, Yang Yufen voltou para casa contente da vida, sem se incomodar com o peso.
Quando Hu Jun chegou, encontrou Shen Xianjun sentado do lado de fora da porta, olhos fechados, mas alerta.
— Você não tá dormindo lá dentro?
Hu Jun se espantou. Será que o casal brigou? Mas sua irmã não era disso... Não, não pode ser isso.
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