Capítulo 121 a 125


 Capítulo 121 – Perseverança

Quando Tang Shishi acordou, assim que abriu os olhos viu a familiar cortina vermelha acima de si, e o edredom de brocado sob seu corpo também exalava o cheiro conhecido. Seu rosto tenso se suavizou aos poucos — estava aliviada por ter voltado para casa.

A cortina da cama pendia baixa, e havia vozes falando suavemente do lado de fora. Tang Shishi moveu os dedos. Quando as pessoas do lado de fora ouviram o movimento, as vozes cessaram imediatamente.

Logo, a cortina foi erguida. Zhao Chengjun sentou-se ao lado da cama e estendeu a mão até a testa de Tang Shishi.

— Como você está se sentindo? Ainda está desconfortável?

Havia certo incômodo no abdômen inferior, mas muito melhor do que quando estava na casa da família Wang. Tang Shishi balançou a cabeça suavemente. Zhao Chengjun ficou aliviado ao ver que, embora seu rosto estivesse pálido, ela parecia estar bem-disposta.

Tang Shishi acabara de acordar, e sua voz estava rouca.

— Que horas são?

Zhao Chengjun fez um gesto para que a criada trouxesse água. Ajudou Tang Shishi a se sentar, testou a temperatura da xícara com as próprias mãos e a alimentou com cuidado:

— É hora shen (entre 15h e 17h).

Tang Shishi achava que havia dormido por muito tempo, mas tinha passado apenas uma hora. Ela sorveu a água em pequenos goles e, depois de beber metade da xícara, não quis mais.

Zhao Chengjun colocou a xícara na bandeja da criada. Após repousar os objetos, de repente ficou sério e disse:

— Shishi, preciso te contar uma coisa.

Tang Shishi se assustou ao vê-lo tão sério. Seus dedos se apertaram inconscientemente.

— Sim?

— Você precisa se acalmar e não se exaltar. — Zhao Chengjun preparou o terreno com tom grave. — Você está grávida, com quase um mês.

Tang Shishi piscou lentamente, arqueando as sobrancelhas com tranquilidade:

— E o que mais?

— Como você passou um grande susto na casa da família Wang, e o bebê ainda não está muito firme, será necessário repousar por um tempo para preservar a gestação.

Tang Shishi apenas murmurou um “hm” e respondeu com leveza:

— Entendi.

Zhao Chengjun havia ensaiado muitas vezes, com medo de assustá-la com palavras duras. Preparou-se psicologicamente, mas não esperava que Tang Shishi estivesse tão calma. Ele perguntou, surpreso:

— Você não ficou surpresa?

— Não há motivo para espanto. — Tang Shishi respondeu em tom completamente indiferente. — Não é como se eu nunca tivesse engravidado antes. Embora dessa vez esteja no começo, eu já desconfiava.

Zhao Chengjun ficou atônito por um momento. Depois de tanto preocupar-se, quem acabou se alarmando por nada foi ele mesmo?

Ainda assim, o fato de Tang Shishi aceitar a situação com tanta naturalidade era uma boa coisa. Zhao Chengjun sentiu-se aliviado e disse:

— Que bom que você aceitou bem. Obrigado por se esforçar nesses próximos meses.

Ele segurou a mão de Tang Shishi, sentindo-se profundamente culpado. Em outras famílias, gravidez era motivo de alegria, mas para Tang Shishi, parecia sempre vir acompanhada de desastres. Quando ela esperava Zhao Zigao, quase tomaram remédio para abortar. Agora, na segunda gravidez, por pouco não a forçaram a um aborto por perseguição.

Zhao Chengjun sentia-se inexplicavelmente angustiado. Da outra vez, ele não estava presente — era compreensível. Mas agora, mesmo dentro da própria mansão, quase foi enganado pelos outros. Apertando suavemente a mão dela, consolou:

— Não se preocupe. Já consultei os médicos imperiais. Disseram que embora o bebê esteja um pouco instável, como você foi bem cuidada após o parto, se repousar bastante, conservar sua energia e não se irritar ou se emocionar demais, tudo correrá bem. Se o repouso for eficaz, em cerca de um mês poderá andar normalmente.

Tang Shishi assentiu com tranquilidade, como se soubesse que tudo ficaria bem. Talvez fosse por ter voltado ao ambiente familiar, ou por sentir segurança... mas, mais do que tudo, era porque Zhao Chengjun estava ali.

Parecia que, enquanto ele estivesse por perto, nem o céu nem a terra poderiam tirar seu filho.

Tang Shishi se lembrou de algo e perguntou:

— Onde estão Xique e Dujuan?

Zhao Chengjun respondeu:

— Também voltaram. Como foram drogadas, ainda estão se recuperando em seus quartos. Amanhã já poderão te servir normalmente.

Tang Shishi soltou um longo suspiro de alívio. O alvo da emboscada era ela. Após doparem Dujuan e Xique, partiram imediatamente para persegui-la. Mais tarde, Zhao Chengjun chegou a tempo e a resgatou. Ele a levou nos braços, e os guardas que ficaram para resolver o restante encontraram as duas criadas e as trouxeram de volta à mansão.

Ambas sofreram pequenas pancadas na cabeça e membros ao desmaiar, mas felizmente não tiveram ferimentos mais graves. Diante da tragédia iminente, foi uma sorte em meio ao infortúnio.

Tang Shishi hesitou por um instante antes de perguntar em voz baixa:

— E a família Wang?

A expressão de Zhao Chengjun mudou imediatamente ao ouvir a menção da família Wang. Mas, vendo Tang Shishi ali, disfarçou e respondeu com gentileza:

— Saí cedo de lá e não vi o que aconteceu depois. No entanto, ouvi dizer que o filho mais novo do Taifu, o favorito dele, ficou bêbado. Ninguém sabe como ele foi parar no jardim e acabou dormindo no pavilhão fresco. Quanto às pessoas que te perseguiram, disseram que a família Wang as pegou emprestadas de fora e que não pertenciam à casa deles. Quando foram capturadas, todas cometeram suicídio.

Tang Shishi revirou os olhos. Tantas coincidências. Ela foi atraída até o jardim, e por acaso o filho mais novo do Taifu também estava lá, dormindo? Se eu não tivesse escapado a tempo, para onde eu teria sido levada?

Ela já sabia que a Imperatriz Viúva Yao não era uma boa pessoa, mas ainda assim subestimou sua crueldade. Tang Shishi sabia que era odiada por ela — poderia ter sido assassinada ou envenenada. Mas não... a imperatriz viúva queria manchar sua reputação.

Ela era a jovem Wangfei, mãe de uma criança de um ano. Se fosse acusada de adultério, não apenas perderia a própria vida — Zhao Zigao e toda a família Tang seriam arrastados junto. O mais assustador era imaginar a velocidade com que se espalharia a notícia de um escândalo entre a Wangfei e o filho do Taifu em Jinling. As línguas ferinas das ruas fariam questão de repetir e exagerar os detalhes infinitamente, e não se saberia mais até onde a difamação poderia ir.

A mansão do Príncipe Jing e a família Wang seriam completamente humilhadas, e a relação entre Zhao Chengjun e o Taifu inevitavelmente se romperia.

A tática da Imperatriz Viúva Yao era suja — mas brilhante. Podia-se dizer que ela tentou acertar três alvos com uma só flecha.

Contudo, tudo dependia do sucesso. E, talvez, ela não tivesse contado com o fracasso.

Nem Zhao Chengjun nem o Taifu eram tolos. Como poderiam não perceber quem estava por trás de tudo aquilo e o que pretendia? Era de se imaginar que, nesse momento, a família Wang também estivesse em alvoroço. O velho Taifu, sábio por toda a vida, ser ludibriado na velhice — certamente estava furioso.

A imperatriz viúva, tão digna e respeitada, governando por trás do trono, agora recorria a truques tão vis contra um velho oficial honrado. Quantos outros ministros e anciãos não teriam se desiludido com isso?

Tang Shishi antes temia que a família Wang se recusasse a apoiar Zhao Chengjun. Mas, num piscar de olhos, a Imperatriz Viúva Yao, por ironia, enviou uma valiosa ajuda sem querer. Foi como um presente vindo de mil léguas — ainda que simples, o gesto teve profundo significado.

Ela piscou, se aproximou de Zhao Chengjun em silêncio e perguntou suavemente:

— Hoje é o aniversário do Taifu… mas acabei causando um escândalo no jardim. O que ele disse? Está bravo comigo?

Tang Shishi perguntava com cuidado sobre o desenrolar na família Wang. O Taifu era uma figura de grande prestígio, com discípulos espalhados pela corte e pelo povo. Se Zhao Chengjun conseguisse o apoio dele, o auxílio seria inestimável. Afinal, mesmo com poder militar em mãos, conquistar e governar o mundo exigia mais do que força armada.

Poder militar, apoio popular e respaldo dos oficiais da corte eram indispensáveis.

Zhao Chengjun não respondeu. Apenas segurou os ombros de Tang Shishi, deitou-a com cuidado sobre o travesseiro macio e disse:

— Você deve cuidar da gravidez com tranquilidade e não se preocupar com essas coisas. Fique tranquila, eu cuidarei de tudo. Você só precisa se concentrar em si mesma. Já é o bastante engordar o quanto antes.

Tang Shishi soltou uma risadinha. Lançou um olhar para Zhao Chengjun e respondeu, indignada:

— Quem disse que vai engordar?

Zhao Chengjun riu, puxou o edredom para cobri-la e disse com voz suave:

— Descanse bem. Voltarei em breve.

Tang Shishi não pensou muito a respeito. Zhao Chengjun sempre esteve ocupado e, muitas vezes, precisava sair no meio do caminho. Achou que seria como de costume e não deu importância. Apenas assentiu alegremente:

— En.

Zhao Chengjun tocou carinhosamente a cabeça de Tang Shishi e saiu do quarto sorrindo. No entanto, à medida que deixava o pátio principal, sua expressão foi se tornando cada vez mais fria.

Liu Ji o acompanhava ao lado e relatou:

— Wangye, a pessoa foi detida. O que deseja que façamos?

— Tragam para o pátio da frente. — respondeu Zhao Chengjun com frieza, os olhos afiados. — Não quero sujar os ouvidos da Wangfei.

— Sim.

No pátio da frente, Zhou Shunhua foi forçada a se ajoelhar no chão. Zhao Zixun estava não muito longe, com expressão ansiosa e angustiada.

— Pai, talvez tenha havido algum mal-entendido…

— Mal-entendido. — Zhao Chengjun sentou-se ereto no salão principal e respondeu com calma. — Ela se encontrou secretamente com uma espiã da Imperatriz Viúva Yao. Depois, essa espiã enganou a Wangfei dizendo que a Cefei Zhou havia perdido o bebê. Ela fingiu estar com dores abdominais. Que tipo de mal-entendido poderia haver?

Zhou Shunhua estava ajoelhada sobre o chão duro e gelado. Era final do primeiro mês lunar e o frio se infiltrava por suas roupas, penetrando lentamente até os ossos. Sentia um leve desconforto no abdômen. Ainda assim, forçou-se a manter a calma e disse a Zhao Chengjun com firmeza moderada:

— Wangye é um homem sábio e perspicaz. Comi algo gelado ao meio-dia e tive uma cólica súbita. Achei que havia acontecido algo com o bebê e entrei em pânico. Mas juro que não fiz nada de propósito. Quanto àquela espiã que armou contra a vida da Wangfei, eu não a conhecia. Ela veio me entregar algo pela manhã, e achei que tinha sido enviada pela mansão, então troquei algumas palavras. Não sei de mais nada.

Zhao Zixun sabia que Zhou Shunhua estava grávida de pouco mais de dois meses — uma fase delicada. O chão era extremamente frio e, se ela continuasse ajoelhada por muito tempo, poderia haver complicações. Apressado, intercedeu:

— Sim, pai. Hoje foi um dia muito estranho. Aqueles que invadiram claramente vieram preparados. Talvez até os eventos dentro da mansão tenham sido uma distração proposital. Pai, talvez seja melhor investigar por mais alguns dias, para não sermos enganados.

Zhao Chengjun sorriu levemente e respondeu com frieza:

— Acha que eu não fiz isso? Zhou Shunhua, já que você diz que foi injustiçada, me diga: no dia do Festival das Lanternas, para onde você foi depois que se separou do grupo da mansão?

Zhou Shunhua hesitou por um instante, mas se forçou a parecer tranquila.

— Havia muita gente naquele dia. Me perdi na multidão e acabei me desencontrando do Shizi.

Zhao Chengjun a encarou em silêncio. Até agora, ainda tenta mentir. Perdeu a paciência e declarou:

— Alguém viu você voltar silenciosamente ao Pavilhão da Lua.

Zhou Shunhua ficou atônita, e o rosto de Zhao Zixun empalideceu.

— O quê?

A voz de Zhao Chengjun soava completamente sem emoção ao perguntar:

— O que você disse à Imperatriz Viúva?

Zhou Shunhua abaixou os olhos, tentando desesperadamente pensar em uma justificativa, mas sua mente parecia envolta em névoa, completamente em branco. Zhao Zixun entendeu o que significava aquela expressão. Naquele dia, Zhou Shunhua não se perdeu. Ela voltou para relatar tudo à Imperatriz Viúva Yao.

Na verdade, Zhao Zixun já havia estranhado o tempo que ela demorou para percorrer uma curta distância. Zhou Shunhua explicara que, ao perceber que se perdera, ficou parada esperando por ele, sem se arriscar a andar sozinha. Embora ele achasse estranho, preferiu não investigar. Agora via que tudo era verdade — justamente o que ele mais temia.

Zhou Shunhua traiu a mansão do Príncipe e se aliou à Imperatriz Viúva Yao.

A mente de Zhou Shunhua estava vazia. Assistia, impotente, ao momento em que perdia sua melhor chance de defesa. Cerrou os olhos com amargura. Acabou. Nem Zhao Zixun acreditará em mim agora.

Na verdade, nada do que fizera naquele dia foi por vontade própria. Zhou Shunhua não era tola. Fingir ter dores abdominais justamente no dia em que a Imperatriz Viúva agia? Era óbvio que isso levantaria suspeitas do Príncipe Jing.

Mas Zhou Shunhua simplesmente não tinha escolha. Quase ao meio-dia, uma criada viera lhe trazer comida e discretamente mostrara o símbolo da Imperatriz Viúva costurado na manga. O que ela poderia fazer? Só restava obedecer. Seguindo as instruções, fingiu sentir dor no estômago, dando à criada uma desculpa legítima para sair da mansão.

A criada ainda a tranquilizara, dizendo que Tang Shishi não teria chance de voltar naquele dia. Ninguém saberia o que ela diria à Wangfei. Quando fosse interrogada, Zhou Shunhua diria que teve uma indisposição alimentar, e a criada se alarmou achando que era algo com o bebê. Mesmo se Tang Shishi a confrontasse no futuro, ela poderia dizer que a criada entendeu errado.

Claro... isso tudo se Tang Shishi estivesse viva para questioná-la.

Zhou Shunhua aguardava o desfecho, cheia de angústia. Mas, em vez das boas notícias da espiã, ouviu que o Príncipe Jing havia voltado carregando Tang Shishi nos braços. Sentiu um mau pressentimento na hora. Antes que pudesse reagir, já estava sob custódia dos homens do Príncipe Jing.

Ficou sob vigilância constante, sem chance de mandar qualquer recado a Zhao Zixun. Assim, ele não sabia da verdade. Mesmo querendo defendê-la, não teria como.

Mas, de qualquer modo, Zhou Shunhua era sua mulher. Zhao Zixun reuniu coragem e disse:

— Pai, talvez Shunhua tenha sido forçada por traidores e não teve escolha. Peço ao senhor que leve em consideração que ela está grávida…

Teria sido melhor se Zhao Zixun não tivesse mencionado isso. Ao ouvi-lo, Zhao Chengjun se lembrou de outra questão. Seu olhar percorreu Zhou Shunhua com frieza:

— Já estamos no final do primeiro mês lunar. O bebê na barriga de Zhou Shunhua deveria estar com seis meses. Antes, disseram que ainda era cedo demais para se notar. Mas agora, seis meses e ainda nada? Tenho receio de que nem sequer haja gravidez alguma. Conspirar com inimigos, tentar contra a vida da Wangfei e ainda mentir descaradamente... sem nenhum sinal de arrependimento. Qualquer um desses crimes bastaria para condená-la à morte. Em consideração à Wangfei, que não deve ver sangue nesse estado, vou poupá-la.

Zhao Chengjun virou-se para Liu Ji e ordenou com frieza:

— Liu Ji, mande dar trinta bastonadas na Cefei Zhou. Castigo leve, lição severa. Execute imediatamente.

Capítulo 122 – Retribuição

Zhou Shunhua e Zhao Zixun ergueram os olhos, chocados. Zhao Zixun exclamou:

— Pai, não pode!

A paciência de Zhao Chengjun já havia chegado ao limite. Ele os encarou com frieza:

— Por que não?

Zhao Zixun cerrou os dentes e respondeu com sinceridade, arriscando tudo:

— Pai, é verdade que Shunhua mentiu sobre a gravidez antes, mas durante a viagem para a capital, ela realmente engravidou. Já faz dois meses. Eu sei que ela cometeu muitos erros imperdoáveis, mas... ela está grávida. Espero que, pelo bem do bebê, o senhor possa conceder mais tempo. Ao menos espere até ela dar à luz antes de aplicar a punição com os bastões.

Zhao Zixun não ousava pedir o perdão do castigo, então só lhe restava tentar adiá-lo. Afinal, não se podia bater em uma mulher grávida, tampouco durante o resguardo. Após esse período, ela teria que cuidar da criança — e também não poderia ser punida. Arrastando assim indefinidamente, o castigo acabaria por se dissipar sem resultado.

Zhao Chengjun estava furioso. Zhao Zixun, sem coragem de interceder diretamente, tentava salvar alguém por vias indiretas. Mas Zhao Chengjun não acreditava nem por um instante. Olhou para Zhao Zixun, que suplicava com aparente sinceridade, e achou tudo aquilo ridículo.

— Chegamos a esse ponto e ainda querem enganar os outros, cheios de mentiras e nenhuma verdade. Este é o Shizi e sua concubina, Cefei da mansão do príncipe. Já dei uma chance antes — desta vez, não cometerei o mesmo erro.

Depois de dizer isso, o rosto de Zhao Chengjun escureceu. Sua voz soou dura:

— Levem-na.

Liu Ji não hesitou mais. Avançou com os guardas e puxou o braço de Zhou Shunhua. Ela entrou em pânico e lutou com todas as forças:

— Príncipe Jing, eu não estou mentindo! Eu estou mesmo grávida! Se não acredita, pode chamar um médico imperial para me examinar!

Esse truque já havia sido usado antes. Zhao Chengjun sabia que Zhou Shunhua tomava pílulas de perfume quente. Mesmo que chamasse o médico, ele não encontraria nada. Já sem paciência, Zhao Chengjun apenas franziu o cenho, impaciente.

Liu Ji, percebendo que seu senhor detestava escândalos, tampou rapidamente a boca de Zhou Shunhua. Ela parecia uma louca, soluçando e se debatendo. O rosto de Zhao Zixun também mudou. Em desespero, disse:

— Pai, desta vez ela está mesmo grávida! Eu juro pela minha vida que não é mentira!

Zhao Chengjun continuou impassível. Zhao Zixun se angustiava ainda mais. Ao ver Zhou Shunhua sendo arrastada para fora, não conseguiu mais suportar e estendeu o braço para impedir Liu Ji.

Zhao Chengjun arqueou uma sobrancelha, sentado em seu assento de honra. Com um olhar, sinalizou aos guardas ao redor para conter Zhao Zixun.

Os guardas da mansão do Príncipe Jing eram todos de confiança de Zhao Chengjun. Com a ordem silenciosa, detiveram Zhao Zixun sem dizer uma palavra. Como um jovem qualquer poderia se comparar aos soldados de elite? Foi rapidamente contido, sem chance de resistência.

Zhao Chengjun, furioso e achando tudo aquilo risível, disse com desdém:

— Ótimo. Realmente excelente. Já te dei muitas oportunidades, apenas por haverem estranhos por perto. No fim, além de mentir e enganar, ainda ousa atacar os meus homens?

Zhao Zixun sabia que havia cometido um grande tabu, mas era homem — como poderia assistir, impotente, à mulher e ao filho sendo arrastados para a punição? Mesmo com o braço preso e doendo intensamente com qualquer movimento, ele já não ligava para a dor. Reuniu todas as forças para erguer a cabeça e gritar:

— Pai, o senhor também é um homem, tem esposa e filho. Como pode suportar usar um método tão cruel com uma mulher grávida? Shunhua está esperando um bebê — ela não vai aguentar os bastões!

Ainda assim, se recusavam a admitir seus erros. Zhao Chengjun riu com frieza e respondeu, indiferente:

— Mesmo que ela esteja realmente grávida, se sabe amar seu filho, será que quando tentou armar contra Tang Shishi não considerou que ela também poderia estar esperando um bebê? Levem-na. A execução deve ser imediata.

Ao ouvir isso, Liu Ji entendeu que não havia mais volta. Curvou-se diante de Zhao Chengjun e rapidamente arrastou Zhou Shunhua para fora.

Os olhos de Zhao Zixun se arregalaram, quase sangrando.

— Não! Parem! Todos vocês!

Obviamente, o jovem Shizi não tinha autoridade alguma dentro da mansão. Não importava quanto gritasse, logo se ouviu o som dos bastões do lado de fora. Tum! Tum! Tum! Após o terceiro golpe, houve uma breve pausa.

Zhao Zixun fechou os olhos, tomado pelo desespero. Ele sabia... seu filho havia se perdido.

As sobrancelhas de Zhao Chengjun se moveram levemente. Seus olhos revelaram surpresa. Liu Ji se aproximou rapidamente e sussurrou ao ouvido de Zhao Chengjun:

— Wangye, houve sangramento. Parece que ela estava realmente grávida.

Depois que Zhao Chengjun saiu, Tang Shishi permaneceu deitada, tranquila, repousando para cuidar da gravidez. Quando Zhao Zigao acordou, balbuciou querendo encontrá-la. Como Tang Shishi não podia sair da cama, mandou que a ama trouxesse Zhao Zigao até o leito para que pudessem brincar juntos.

Zhao Zigao já conseguia dar alguns passos. Assim que chegou perto da cama, correu na direção de Tang Shishi e fez manha para que ela o carregasse. As criadas se assustaram e o pegaram rapidamente.

— Pequeno Junwang, não pode!

Tang Shishi também se assustou e cobriu o abdômen instintivamente. Por sorte, foi só um susto. Aliviada, disse:

— Está tudo bem. Deixem ele vir.

Zhao Zigao foi colocado na cama. Rastejou com agilidade até o lado de Tang Shishi e puxou suas roupas, pedindo para ser carregado. Tang Shishi também queria pegá-lo, mas não podia forçar o abdômen, então não ousou.

Suspirou e disse:

— Você já está mais pesado e cresceu bastante. Precisa aprender a andar sozinho.

Zhao Zigao pareceu entender, e as criadas riram.

— Pequeno Junwang, tem um bebê na barriga da Wangfei. Daqui a alguns meses, você terá um irmãozinho ou irmãzinha. Gosta da ideia?

Zhao Zigao não sabia o que era um irmão. Mas, ao ver as criadas rindo, ele também riu e bateu palmas. As criadas se alegraram ainda mais:

— Wangfei, viu só? O pequeno Junwang também gostou.

Tang Shishi não resistiu ao sorriso.

— O que ele entende disso? Mas que não seja outro menino desta vez. Não tenho forças para criar outro Zhao Zigao.

— Com o pequeno Junwang como irmão mais velho, seja um Junwang ou uma princesinha, será bem protegido pelo irmão.

Depois que disse isso, uma das criadas provocou Zhao Zigao:

— Pequeno Junwang, não é verdade?

Zhao Zigao mostrou os dentinhos da frente, riu e balbuciou. As criadas se divertiram:

— Olha só, Wangfei! Ele concordou! Pequeno Junwang, você é o irmão mais velho agora. Uma promessa é uma promessa — nada de maltratar os irmãos no futuro!

A criada havia mencionado “irmão mais velho” sem pensar. Percebeu o erro e, assustada, olhou para Tang Shishi. No entanto, ela apenas abaixou a cabeça e continuou brincando com Zhao Zigao, como se não tivesse ouvido.

A criada suspirou aliviada, mas suava frio.

Como se Tang Shishi realmente não tivesse ouvido? Ela apenas não se importava mais em fingir. Antes, até se dava ao trabalho de dizer palavras hipócritas. Agora... nem isso.

Qual a maneira mais rápida de fazer um cafajeste mudar de ideia? Obviamente, era desmanchar o harém, cortar sua sorte, e dar-lhe um irmão mais novo para disputar o trono. Assim, ele dependeria totalmente de Tang Shishi para sobreviver. Não mudaria rapidinho?

Tang Shishi recostou-se no travesseiro, brincando com Zhao Zigao enquanto refletia sobre a trama do livro. Nesse momento, uma criada entrou apressada. Parou do lado de fora da divisória, parecendo hesitar.

Tang Shishi notou e perguntou:

— O que foi?

— Wangfei, o médico imperial está aqui.

— Hã? — Tang Shishi ficou intrigada. — Ele acabou de sair. Por que voltou?

A criada passou pela divisória e respondeu em voz baixa:

— Ouvi dizer que a Cefei Zhou teve um aborto espontâneo. O médico voltou às pressas para tentar salvá-la.

Tang Shishi arqueou lentamente as sobrancelhas. Por um momento, não encontrou palavras para descrever seu estado de espírito.

Zhou Shunhua realmente perdeu o bebê? Impossível. Desde quando Zhou Shunhua estava grávida?

Tang Shishi lançou um olhar significativo para as criadas em silêncio. Elas entenderam na hora, pegaram Zhao Zigao no colo e saíram do quarto. Quando todos já haviam se retirado, Tang Shishi perguntou à criada que trouxera a notícia:

— Ela estava perfeitamente bem. Por que teve um aborto?

A criada abaixou a cabeça ao ouvir isso e respondeu em voz baixa:

— O Wangye descobriu que a Cefei Zhou estava em conluio com um espião e ordenou que ela fosse punida com trinta bastonadas. Ninguém esperava que ela estivesse grávida. Depois de apenas três golpes, ela começou a sangrar.

Ao ouvir isso, Tang Shishi ficou sem palavras. Entendeu por que a criada tivera aquela expressão estranha ao entrar no quarto — no fim, foi o próprio Zhao Chengjun quem deu a ordem.

Naquele dia do Festival das Lanternas, tudo estava bem quando Tang Shishi saiu. Mas, ao voltar, a Imperatriz Viúva Yao havia mudado de atitude drasticamente. A mudança foi tão repentina que só podia ter sido provocada por alguém que a delatou — e não era difícil adivinhar quem.

Combinando com os acontecimentos daquele dia, Tang Shishi não teve dúvidas de que a delatora foi Zhou Shunhua. Se eu consigo perceber isso, Zhao Chengjun, então, com certeza já sabe.

Ela pensava que Zhao Chengjun estava saindo para tratar de assuntos oficiais, mas não esperava que ele estivesse indo punir Zhou Shunhua.

Zhou Shunhua armou tramas por meio ano. Quando finalmente engravidou de verdade, ninguém acreditou nela. E por causa disso, o filho que ela tanto esperava foi perdido.

Tang Shishi suspirou. Esse foi o segundo filho de Zhao Zixun que foi perdido. E ainda era filho da mulher que ele mais amava. Infelizmente, essa criança também morreu prematuramente.

Só esse fato já seria o bastante para criar um ressentimento entre pai e filho biológicos — quanto mais entre um pai adotivo e um filho adotivo. Tang Shishi, que antes estava preocupada em como afastá-los discretamente, agora percebia que talvez não fosse mais necessário fazer nada.

Era só uma questão de tempo até que Zhao Chengjun e Zhao Zixun se afastassem completamente.

Mesmo que Zhao Chengjun tivesse chamado o médico imperial imediatamente, não adiantaria. A criança não pôde ser salva. Ouviu-se dizer que Zhou Shunhua quase desmaiou de tanto chorar. Ela levou três bastonadas e ainda perdeu o bebê — o choque foi tão grande que não conseguia nem sair da cama.

Naquela noite, Tang Shishi ficou acordada de propósito. Quando ouviu o som da porta sendo aberta, despertou sobressaltada e chamou:

— Wangye?

Os passos do lado de fora pararam por um instante. Depois, Zhao Chengjun entrou no quarto e suspirou baixinho:

— Ainda não dormiu?

— O Wangye ainda não tinha voltado. Como eu poderia dormir? — Tang Shishi respondeu, e então olhou para Zhao Chengjun de relance. — Wangye, sobre a Cefei Zhou...

— Já está resolvido. O médico imperial receitou um remédio para restaurar o corpo dela. Quanto a tomar ou não, é problema dela.

Tang Shishi soltou um “hm” suave. Ao ver a expressão neutra de Zhao Chengjun, achou que ele estivesse de mau humor. Por isso, segurou a mão dele de propósito e disse:

— Wangye, não se culpe. Não foi culpa sua. O senhor não sabia que ela estava grávida. Eles mentiram por tanto tempo que não dá pra culpar os outros por não acreditarem.

Ninguém acredita na história do lobo depois de ouvi-la muitas vezes — e com Zhou Shunhua foi o mesmo. Ela causou o aborto de Lu Yufei e agora sofria um aborto espontâneo. Talvez isso fosse apenas o ciclo do carma — retribuição.

Zhao Chengjun suspirou. O erro já havia sido cometido, e não fazia sentido procurar culpados agora. Ele puxou o cobertor e disse a Tang Shishi:

— Eu sei que mesmo que algo dê errado, você nunca me confortaria à toa. Você também está em uma situação delicada, então não precisa se preocupar com os outros. Apenas cuide bem de si mesma.

Ao ver que Zhao Chengjun não insistiria no assunto, Tang Shishi relaxou e sorriu:

— É claro que sei. Não posso visitar Zhou Shunhua agora, então mandarei alguns remédios para ela recuperar o corpo. Pelo menos servirá como um gesto da mãe legítima da casa.

Zhao Chengjun sorriu e assentiu.

— Muito bom.

Mas ele sabia, no fundo, que nem Zhao Zixun nem Zhou Shunhua tocariam no que fosse enviado. Aqueles tônicos preciosos acabariam desperdiçados.

Ao pensar em Zhao Zixun, Zhao Chengjun também se sentia confuso. Pelo olhar de Zhao Zixun naquele dia, estava claro que o rapaz já havia se afastado dele. No entanto, Zhao Chengjun não podia se preocupar com isso agora. Teria que lidar com os assuntos externos primeiro e depois resolver o nó com Zhao Zixun.

Ele sabia muito bem que toda mágoa tem um culpado, e toda dívida tem um devedor. Zhou Shunhua, no máximo, era apenas a lâmina. A verdadeira culpada era a Imperatriz Viúva Yao.

O ódio sangrento pela morte de sua mãe, a Concubina Imperial, e de seus irmãos ainda não havia sido vingado. E agora, a Imperatriz Viúva Yao ainda ousava estender a mão contra Tang Shishi.

Zhao Chengjun suportara tudo por treze anos. Agora era a sua vez de revidar.

A Imperatriz Viúva Yao já havia sido arrogante por tempo demais. Esquecera que, ao fazer mal aos outros, mais cedo ou mais tarde, a retribuição viria. Não é falta de educação retribuir na mesma moeda.

Nesse caso... Zhao Chengjun não teria mais nenhum escrúpulo.

Capítulo 123 – Revidar

Por mais de meia quinzena, Tang Shishi permaneceu em seu quarto, repousando e cuidando da gravidez com tranquilidade. O médico imperial veio duas vezes e disse que seu pulso estava estável, e ela não precisava mais ficar deitada o tempo todo. Desde que não fizesse nenhum esforço excessivo, não havia problema em andar um pouco.

Tang Shishi respirou aliviada por finalmente poder se movimentar. No entanto, as criadas ainda não a deixavam se mexer demais. Basicamente, ela dava apenas alguns passos antes de ser parada pelas serviçais e guiada para se sentar novamente no divã.

Enquanto Tang Shishi se mantinha reclusa, cuidando da gravidez, Zhou Shunhua se recuperava do outro lado — embora em um estado completamente diferente.

No dia do aborto de Zhou Shunhua, Tang Shishi não foi vê-la pessoalmente, mas enviou um presente como demonstração de consideração. Naturalmente, os itens enviados não poderiam ser recolhidos de volta, mas Tang Shishi sabia que todos os ingredientes medicinais que mandara haviam sido jogados fora sem sequer serem abertos.

Pelo visto, Zhou Shunhua e Zhao Zixun a odiavam profundamente. Tang Shishi fingia não saber e continuava comendo e bebendo bem como sempre, desfrutando do conforto ao cuidar da própria gravidez. Dujuan e Xique também haviam retornado. Ambas estavam assustadas e cobertas de hematomas no dia do ocorrido. Elas deveriam ter voltado a servir no dia seguinte, mas Tang Shishi as dispensou por mais cinco dias para que descansassem devidamente antes de retomarem o serviço.

Já havia começado o segundo mês. A primavera em Jinling chegava mais cedo do que no Noroeste. Após algumas garoas, o tempo ficava mais quente a cada dia. Choveu na noite anterior e, hoje, o sol brilhava forte. Tang Shishi se recostou no divã perto da janela sul, ouvindo as criadas conversarem sobre os acontecimentos da mansão.

— Wangfei, a família Tang enviou alguém. O mordomo trouxe os brocados recém-chegados à mansão e gostaria de transmitir votos de saúde para a senhora e para o pequeno Junwang. Deseja recebê-los?

Tang Shishi suspirou. Não existe mesmo segredo que dure na capital. Não sabia de onde a família Tang obtivera a informação, mas claramente estavam tentando sondar sua situação. Tang Shishi disse:

— Diga a eles que tanto eu quanto Gao’er estamos bem. Peça que mantenham a cautela, pois a harmonia traz prosperidade. E que evitem conflitos com os outros. Tenho estado ocupada cuidando da Cefei nos últimos dias e não posso recebê-los por ora.

Dujuan assentiu e mandou uma criada transmitir a mensagem para a família Tang. Tang Shishi não tinha ânimo para lidar com eles no momento. Ainda se recuperava e não podia sobrecarregar o corpo ou a mente. Melhor esperar mais um mês e, quando o bebê estiver totalmente estável, envio uma carta para minha mãe e o restante da família.

Assim, usou Zhou Shunhua como desculpa para se livrar da visita. No entanto, ao mencioná-la, acabou se lembrando dela também.

— Como está a Cefei Zhou ultimamente? — perguntou.

Dujuan torceu os lábios e respondeu em voz baixa:

— Quem sabe? Vive se fazendo de coitada. Da última vez que entreguei os itens da Wangfei, ela nem apareceu. Mas, segundo as criadas do outro pátio, ela emagreceu bastante e o rosto está abatido.

Deve estar arrasada por ter perdido o filho tão esperado. Tang Shishi suspirou e disse:

— Aborto debilita muito o corpo. A Cefei Zhou precisa se fortalecer adequadamente. Ela comeu aqueles ninhos de andorinha e o ginseng que enviei?

Dujuan fez uma expressão de desdém e balançou a cabeça devagar. Tang Shishi não se surpreendeu com a resposta. Continuou com seu papel de esposa atenciosa:

— Talvez esteja sem apetite. Mas com os suplementos do Shizi, acredito que nada lhe falte. Dujuan, diga ao almoxarifado que, se a Cefei Zhou quiser algo nos próximos dias, não precisa me avisar. Pode entregar diretamente.

Dujuan ficou contrariada. Zhou Shunhua tramou contra a Wangfei com gente de fora... Por que ainda estão tratando-a tão bem? Mas Tang Shishi insistiu, levantando levemente o queixo para ela.

— Vá logo.

Dujuan saiu a contragosto. Assim que se foi, Xique suspirou:

— A Wangfei é realmente bondosa. Apesar das mágoas do passado, ainda tem um coração generoso. Não é à toa que o Wangye gosta tanto da senhora.

Tang Shishi riu e observou Zhao Zigao engatinhando ao seu lado. Acariciou a barriga com a mão direita e murmurou:

— Só estou acumulando méritos para os filhos.

A questão da cumplicidade de Zhou Shunhua com o espião ainda não havia sido oficialmente resolvida. Primeiro, porque Zhao Chengjun acabara interrompendo a gravidez dela ao puni-la, então não podia acusá-la formalmente. Segundo, por medo da Imperatriz Viúva Yao.

Todos sabiam que aquele episódio tinha dedo da Imperatriz Viúva, mas como ela não admitia, ninguém ousava mencionar. Todos temiam a Imperatriz Viúva em segredo e só podiam engolir a revolta. Apesar da falta de punições formais, a reputação de Zhou Shunhua estava arruinada — principalmente entre os criados mais antigos do palácio do Jing Wang, que passaram a detestá-la.

A raposa seduziu o mestre, come dentro e serve aos de fora. Merece morrer!

Por causa disso, até Zhao Zixun passou a ser criticado. No dia do castigo, ele não hesitou em atacar seus próprios homens para proteger Zhou Shunhua e ainda afrontou Zhao Chengjun. Quando os conselheiros e generais do pátio externo souberam disso, ficaram extremamente incomodados.

Tudo isso só podia ser descrito como o céu ajudando Tang Shishi. Antes, ela era uma estranha, e Zhao Zixun era o legítimo herdeiro. Para os criados e oficiais, ele era o jovem mestre a quem juraram lealdade, enquanto Tang Shishi era apenas uma beleza enviada pela corte para semear discórdia entre pai e filho. Assim que ganhou fama de ser um desastre, tudo o que fazia era errado.

Mas agora, em apenas um ano, a situação se inverteu completamente.

Tang Shishi era a Wangfei “gentil e sincera”, mãe biológica do pequeno Junwang. Enquanto isso, o Shizi ousava enfrentar o Wangye por causa de uma mulher. A postura de Liu Ji sempre foi clara: dedicava-se inteiramente a Zhao Zigao e só mantinha as aparências com Zhao Zixun. Cada vez mais pessoas passavam a olhar para Zhao Zigao com atenção. Afinal, ele era sangue do Wangye.

Tang Shishi não precisava mover um dedo — eles mesmos estavam se dividindo.

Ela se sentia ótima com a boa sorte. E quando estava feliz, gostava de dar um toque de infelicidade nos outros. Com ares de uma mãe zelosa, comentou com as criadas:

— Não sei o que há, mas ultimamente têm ocorrido muitos infortúnios na mansão. O Shizi perdeu dois filhos… Como Wangfei, fui negligente ao não cuidar bem dos assuntos internos, permitindo que os descendentes da mansão morressem com tanta frequência. Isso é culpa minha.

As criadas a consolaram:

— Wangfei, não se culpe. Isso não tem nada a ver com a senhora. Talvez o destino dos filhos do Shizi ainda não tenha chegado.

Tang Shishi suspirou:

— O Shizi já não é tão jovem. Embora tenha se casado mais tarde, por alguma razão, nunca consegue manter um filho. Na minha opinião, nesse momento não importa se a criança é legítima ou de concubina, homem ou mulher. Desde que nasça saudável, já é ótimo. Infelizmente, parece que nenhuma das crianças do Shizi tem destino com a mansão do Jing Wang…

A ama de leite — contratada de fora e não acostumada com os costumes da nobreza — deixou escapar:

— O Shizi não tem filho, mas o Wangye ainda está em pleno vigor. Se o pátio do Shizi não lhe agrada, então que a Wangfei e o Wangye tenham logo mais alguns filhos.

As criadas e matronas ficaram em silêncio. Tang Shishi apenas abaixou os olhos para Zhao Zigao, sem dizer nada. A ama percebeu, tarde demais, que falara demais e começou a suar frio.

Tang Shishi limpou a boca de Zhao Zigao e disse suavemente:

— Deixe pra lá. Como a Shizifei não está por perto, tenho que cuidar dessas coisas. A Cefei Zhou acabou de perder o filho, está de luto, e um aborto debilita muito o corpo. Ela precisa de tempo para se recuperar. Em breve, escolham duas criadas bonitas, de boa índole e educadas, e mandem servir o Shizi.

Hoje em dia, tudo na mansão acontecia conforme as palavras de Tang Shishi. Além disso, era perfeitamente aceitável que a mãe legítima escolhesse criadas para o filho. A matrona curvou-se e disse:

— Sim. A Wangfei pensou em tudo.

Tang Shishi suspirou:

— O pátio do Shizi anda uma bagunça. Se eu não cuidar, quem mais vai? Xique, vá chamar o médico imperial para verificar o pulso da beleza Zhou e preparar alguns remédios para sua recuperação. Se ela não confia nos tônicos que enviei, que ao menos confie nas receitas do médico imperial, não é?

A ama de leite ficou comovida:

— Wangfei, a senhora tem um coração tão bondoso. As sogras no nosso vilarejo tratam as noras como gado. Já a senhora... Mesmo sendo contrariada por sua nora, ainda manda um médico por preocupação. Essa moça teve sorte por três vidas seguidas pra conseguir ser sua nora.

Tang Shishi apertou os lábios e sorriu. Ouviu, satisfeita, os elogios das outras pessoas enquanto mantinha uma postura modesta. Sua atuação estava perfeita, e ela sinalizou discretamente para Xique:

— Leve minha placa de nome ao Hospital Imperial e convide um médico imperial. O Médico Imperial Xu é especializado em ginecologia. Se ele não tiver saído para consulta, tente pedir que venha.

— Sim.

Depois de dar as instruções, Tang Shishi não se preocupou mais com o restante. A parte da encenação que lhe cabia já havia terminado. Se o médico imperial viria ou não, ou o que diria depois, já não era problema seu.

Ela se recostou sobre a almofada macia, espreguiçando-se sob o sol e observando, com preguiça satisfeita, seu adorável filho engatinhar pelo chão. Ao redor, as criadas se apressavam para servi-la com comida e bebida, temendo que ela se cansasse. A tarde estava confortável, com uma tranquilidade que não sentia havia anos. Após algum tempo sob o sol, Tang Shishi começou a sentir sono.

Apoiou a testa com a mão e bocejou, indecisa sobre tirar uma soneca. Foi então que alguém abriu a porta do lado de fora. Tang Shishi virou-se e viu Xique retornando.

Surpresa, perguntou:

— Por que voltou tão rápido? Onde está o médico imperial?

Embora Xique fosse uma criada, sempre havia um servo para acompanhá-la nas saídas. Se a carruagem não fosse conveniente, usava-se uma liteira pequena. Ir buscar um médico imperial costumava levar bastante tempo só pelo trajeto de ida e volta.

Xique fez uma reverência e respondeu:

— O Hospital Imperial está muito ocupado e hoje não estão fazendo consultas externas.

Não estão saindo para consultas? Tang Shishi imediatamente sentiu que algo estava errado.

— O que houve?

Xique olhou em volta e sussurrou:

— Ouvi dizer que Sua Majestade caiu acidentalmente no lago enquanto brincava no lago dos fundos. Depois de ser resgatado, teve febre. Agora, os médicos imperiais estão todos no Palácio Qianqing cuidando de Sua Majestade.

Então o Imperador caiu na água... Tang Shishi ficou sem palavras. O Imperador era mesmo impulsivo e inconsequente. Naquele Festival das Lanternas, já havia extrapolado os limites e continuava correndo para fora. Agora, conseguiu se superar: foi passear de barco e caiu na água.

Como o Imperador estava com febre, não havia como competir com as prioridades do palácio. Tang Shishi disse:

— Já que Sua Majestade está doente, não devemos incomodar o Hospital Imperial. Huangli, traga meu rosário de contas budistas. Já que não posso ir ao palácio, rezarei por Sua Majestade aqui na mansão.

— Sim.

Naquela tarde, Tang Shishi passou o tempo manipulando seu rosário budista. Sabia que os acontecimentos dentro da mansão não se espalhariam para fora, mas, para não dar margem a suspeitas, era melhor manter as aparências — já que o jovem Imperador estava enfermo.

Ela fez seu papel direitinho. Para pessoas comuns, uma febre não era algo trivial, e qualquer descuido podia ser fatal. Mas o Imperador não era uma pessoa comum. Estava cercado pelos melhores recursos médicos do império. Tinha apenas caído na água, e em alguns dias estaria completamente recuperado.

Essa era a opinião da Imperatriz Viúva Yao, do Hospital Imperial e de muitos ministros. No entanto, ninguém esperava que a doença do Imperador não só não melhorasse, como piorasse.

A Imperatriz Viúva Yao lançou o rosário budista no chão com raiva. O cordão se rompeu, e as contas de sândalo rolaram de um lado para o outro sobre os tijolos dourados.

Todos os servos, dentro e fora do salão, abaixaram a cabeça em silêncio. Dava para ouvir até uma agulha cair no imenso Palácio Qianqing. A raiva da Imperatriz Viúva não diminuiu nem um pouco após atirar o rosário. Ela se levantou e começou a caminhar de um lado para o outro, apontando para os médicos imperiais e gritando:

— Charlatões! Todos vocês são um bando de charlatões! Zhun’er só caiu na água e foi resgatado pouco tempo depois. Como é possível que um frio estranho tenha penetrado seu corpo, e que agora não haja forma de curá-lo? Ele só tem catorze anos! Como pode não resistir nem por meia quinzena?

Os médicos imperiais se curvaram profundamente e mantiveram-se assim por muito tempo:

— Esta humilde serva é incompetente...

A Imperatriz Viúva Yao andava de um lado para o outro, como em transe, murmurando:

— Eu sabia... Sabia que todos vocês deviam ter envenenado meu neto para matá-lo. Digam! Foi Zhao Chengjun que mandou vocês fazerem isso? Quanto ele pagou a cada um?

Os médicos abaixaram os olhos. Ninguém respondeu. O Primeiro-Assistente Yang permanecia ao lado, calmo, como se não tivesse escutado as palavras perigosas da Imperatriz Viúva. Ao perceber que ela começava a se acalmar, ele deu um passo à frente, juntou as mãos e disse com reverência:

— Imperatriz Viúva, naturalmente todos esperamos que Sua Majestade recupere a saúde e volte ao seu estado anterior. No entanto, a condição atual de Sua Majestade não parece boa. Para evitar o caos, é prudente que Vossa Alteza comece a se preparar para os próximos acontecimentos.

Capítulo 124 — Mudança Súbita

Após o Primeiro-Assistente Yang terminar de falar, o Palácio Qianqing mergulhou em completo silêncio. A Imperatriz Viúva Yao perguntou com a voz rouca:

— O que você quer que eu prepare?

O Primeiro-Assistente Yang baixou os olhos e encarou fixamente as rachaduras nos tijolos dourados. Os tijolos do Palácio Qianqing não eram feitos de ouro, mas sim de um tipo especial de argila vinda da olaria imperial. De cada dez tijolos moldados, apenas um era aprovado. Dessa forma, o custo de cada tijolo era equivalente ao de uma peça de ouro do mesmo tamanho, motivo pelo qual era chamado de "tijolo dourado" — um nome que fazia jus ao seu valor. Diziam que esses tijolos eram extremamente duros. Mesmo que alguém escavasse túneis por baixo e os golpeasse com as adagas mais afiadas, ainda assim não conseguiria rachá-los.

A família imperial vivia com medo de que invasores entrassem no palácio para assassiná-los, mas se esqueciam de que os assassinos muitas vezes vinham de dentro. Para que serviam tijolos tão resistentes se o inimigo era alguém do próprio círculo?

Foi realmente uma coincidência o Imperador ter caído na água, mas foi ele mesmo quem sugeriu sair para passear. No momento da queda, estava cercado por seus próprios servos. Depois de resgatado, ficou cada vez mais doente sob os olhos atentos do Hospital Imperial e dos altos funcionários. Durante todo esse tempo, os remédios e alimentos foram supervisionados pela Imperatriz Viúva Yao. Para todos os efeitos, parecia apenas uma tragédia comum: uma queda acidental na água, um resfriado que se agravou e, por fim, uma doença fatal. Tragédias assim aconteciam todos os dias. O único detalhe fora do comum era que o tio do Imperador, o Príncipe Jing, encontrava-se justamente na capital naquele momento.

Coincidência? Coincidência demais. Mas... qual era a prova?

A Imperatriz Viúva Yao suspeitava de envenenamento. Por isso, trocou uma leva após a outra de médicos imperiais e até trouxe médicos populares em segredo para examiná-lo. No entanto, todos, sem exceção, afirmaram que o frio invadira os pulmões do Imperador e agravara uma antiga enfermidade. Se sobreviveria ou não, só o céu poderia dizer.

Morrer por conta de um resfriado era mais comum do que se imaginava. A Imperatriz Viúva Yao só não esperava que isso acontecesse com ela.

Ela já havia preparado o funeral de seu filho — e agora, era a vez do neto?

Duas vezes, uma pessoa de cabelos brancos enterrando alguém de cabelos pretos.

A Imperatriz Viúva Yao segurou a testa com força. Cuidara muito bem de si mesma ao longo dos anos. Sempre elegante, serena, jamais perdia a compostura. Agora, porém, parecia que seu espírito havia desabado de uma vez, e rugas profundas surgiram em seu rosto. Só então o Primeiro-Assistente Yang percebeu como ela estava velha.

Homem experiente, ele sabia a hora de se retirar. Deu dois passos para trás; a barra de sua túnica oficial balançou levemente. Sabia que o que dissera era desagradável, mas alguém precisava romper o silêncio. Se ele não falasse, ninguém mais poderia fazê-lo.

Baixando as pálpebras, murmurou com suavidade:

— Imperatriz Viúva, não se aflija demais. O país não pode ficar sem imperador nem por um dia. Vossa Alteza deve considerar o futuro.

A morte do Imperador em si pouco importava. O mais crucial agora era quem assumiria o trono.

O Imperador era jovem e imaturo, e não deixou herdeiros. O falecido Imperador Xiaozong também não tinha outros filhos. Seguindo a etiqueta, nessa situação, deveria-se escolher alguém da geração do Imperador Shizong.

Entre os muitos filhos de Shizong, o primogênito Xiaozong, o segundo filho Príncipe Xiang e o terceiro Príncipe Teng já estavam mortos. Pela ordem de sucessão, o próximo seria o Príncipe Jing.

E coincidentemente, o Príncipe Jing encontrava-se em Jinling naquele momento.

O Primeiro-Assistente Yang havia deixado sua intenção bem clara. Depois disso, não importava se a Imperatriz Viúva havia escutado ou não — ele se retirou em silêncio.

No início, Tang Shishi achava que sua vida se resumia a cuidar do bebê em paz, brincar com o filho e fingir-se de preocupada com a saúde do Imperador, manipulando um rosário. Mas a partir daquele dia, tudo mudou de forma repentina, sem que ela sequer percebesse.

A atmosfera na capital tornou-se estranhamente tensa. Zhao Chengjun estava cada vez mais ocupado. As pessoas na mansão caminhavam em ritmo apressado. Soldados começaram a ser posicionados até mesmo ao redor do pátio onde ela e seu filho residiam. Tang Shishi não havia saído da mansão nos últimos dias e não fazia ideia do que se passava do lado de fora — mas sentia no íntimo que algo muito grande estava para acontecer.

Foi então que, assustada, percebeu que há dias não ouvia nenhuma notícia sobre a recuperação do Imperador.

Seu coração acelerou. Ao pensar nas implicações daquilo, sentiu o sangue gelar. Pela primeira vez, mesmo correndo o risco de ser descoberta, ela revirou o fundo do baú, retirou o livro original e abriu diretamente no capítulo mais recente.

Infelizmente, o livro tinha pouca utilidade naquele momento. De acordo com a linha do tempo narrada, eles ainda estavam na província de Xiping. Zhou Shunhua acabara de vencer a disputa com Lu Yufei e sido diagnosticada com gravidez. Foi graças à criança que conseguiu ser promovida a Cefei.

Além disso, no livro, Tang Shishi sequer havia aparecido, e a questão das pílulas aromáticas nem tinha sido descoberta. Zhou Shunhua não precisou mentir sobre a gravidez para se proteger. Quando anunciou sua gestação, era de fato verdadeira.

Mas na realidade, Zhao Chengjun havia exposto a questão das pílulas. Naquele momento, Zhou Shunhua só podia dizer que estava grávida para salvar a própria pele. E uma mentira exige inúmeras outras para sustentá-la. Fingir-se grávida com um abdômen completamente plano acabou se tornando motivo de piada. Quando de fato engravidou, não havia mais como explicar.

Depois de manchar sua reputação com uma mentira, era impossível revertê-la. Até mesmo Zhao Zixun foi prejudicado. De fato, um movimento errado arrastou todos os outros.

Além disso, o momento e o local em que recebeu o título de Cefei também estavam diferentes. Na realidade, Tang Shishi e Zhao Chengjun haviam sido convocados repentinamente a Jinling. Para provocar conflitos internos em Zhou Shunhua, Tang Shishi lhe concedeu o título antes da hora. Embora o título fosse o mesmo, um foi conquistado com esperteza usando uma criança, o outro foi aceito de forma passiva. O significado era completamente distinto.

Tang Shishi calculou as datas e viu que o tempo de gravidez de Zhou Shunhua no livro coincidia com a realidade, e ela de fato se tornava Cefei. Havia apenas uma pequena diferença nos detalhes, mas o desfecho era o mesmo. A única mudança foi que, na realidade, Zhou Shunhua ofendeu Zhao Chengjun e perdeu o bebê após a punição com tábuas.

Tudo podia ser rastreado, mas ainda assim era imprevisível.

Tang Shishi folheou o índice e percebeu que estava repleto de disputas entre esposas e concubinas. Passou os olhos por cima. Era sempre a mesma coisa: uma criada querendo subir na cama hoje, outra beleza tentando envenenar Zhou Shunhua amanhã. Intrigas banais, sem qualquer relação com a situação atual.

Observando o progresso da gravidez de Zhou Shunhua, via-se que a família ainda vivia no Noroeste até o filho completar dois anos. Portanto, segundo o livro, Zhao Chengjun só começaria sua rebelião dali a pelo menos três anos.

Agora, tudo estava adiantado, e o rumo da história havia mudado por completo. Se o Imperador no livro morresse de doença, então, segundo a etiqueta, Zhao Chengjun seria o próximo sucessor, e não precisaria rebelar-se. Logo, a rebelião do livro provavelmente só ocorreu porque o Imperador havia deixado um herdeiro.

Tang Shishi ficou completamente atônita. Encostou-se à tampa do baú e demorou a se recompor. Do lado de fora, uma criada, assustada por não ouvir nenhum som, chamou:

— Wangfei, está aí dentro?

— Estou. — Tang Shishi fechou o livro, escondeu-o debaixo das roupas e disse: — Quero ficar sozinha por um tempo. Não precisam me servir.

Ao verem que ela estava bem, as criadas se acalmaram e responderam:

— Sim, senhora.

Tang Shishi ajeitou tudo como antes. Andou de um lado para o outro, sem conseguir se acalmar. Por fim, sentou-se diante do espelho e começou a pentear os cabelos. Encarou seu reflexo no espelho de bronze, e o brilho de seus olhos oscilava de tempos em tempos.

Na história original, o Imperador não caía na água, tampouco morria de doença. Então, por que agora ele estava com uma febre que ameaçava sua vida?

Tang Shishi não ousava pensar a respeito. Quando recebeu o livro pela primeira vez, estava cheia de ambições e sonhava em se tornar Imperatriz Viúva. Era uma ignorante destemida justamente por não compreender o verdadeiro peso das palavras Imperatriz e Imperatriz Viúva — por isso falava sem medo. Mas à medida que se aproximava do centro do poder imperial, Tang Shishi também começava a compreender cada vez mais que o sucesso de um grande general vinha à custa de milhares de vidas sacrificadas, e que sob o trono onde se sentava o imperador jaziam incontáveis ossos. Essa era a realidade por trás daquela glória suprema.

Tang Shishi pegou o pente. Queria apenas alinhar os cabelos, mas, por mais que tentasse, os dentes do pente se prendiam aos fios. Seus dedos tremiam sem parar — ela sequer conseguia pentear os próprios cabelos.

Tang Shishi sempre comeu bem, dormiu bem, e nunca sofrera de insônia. Mas, desde aquele dia, não conseguia mais dormir direito. Frequentemente adormecia e despertava assustada. Abria os olhos e percebia que tudo não passava de um sonho. Aliviava-se por um instante, mas, ao se levantar, sentia o frio do lençol ao lado.

Aos poucos, Zhao Chengjun começou a ocultar seus passos e enganava Tang Shishi dizendo que tudo seguia como de costume. No vigésimo primeiro dia desde que o Imperador caíra na água, Zhao Chengjun passou o dia inteiro fora da mansão e, mesmo após os portões serem trancados à noite, ele não voltou.

O coração de Tang Shishi apertou. As criadas também sentiam que algo não ia bem na capital. Vendo que o semblante dela não estava bom, tentaram confortá-la:

— Wangfei, o Wangye deve estar num banquete e não conseguiu voltar a tempo. Não se preocupe. Ele voltará amanhã.

Essas palavras eram ditas para consolar Tang Shishi, mas pareciam mais um autoengano. Tang Shishi sabia muito bem que o Imperador estava gravemente doente. Qual família em Jinling teria ânimo — ou coragem — para sediar um banquete?

Zhao Chengjun jamais desapareceria sem aviso… a menos que fosse tarde demais.

As mãos de Tang Shishi estavam frias como gelo, mas ela ainda forçou um sorriso e assentiu:

— É verdade. Mande alguém vigiar bem o portão. Se o Wangye voltar, venha me avisar imediatamente. E diga à cozinha para preparar sopa contra ressaca e pratos quentes. Caso ele volte, terá algo para aquecer o estômago.

— Sim, senhora.

Depois de dar as instruções, Tang Shishi olhou para o céu nublado do entardecer e sentiu que, pela primeira vez, não tinha nada a fazer. Quando Zhao Chengjun estava por perto, ela jamais achava difícil suportar as noites. Cuidava de Zhao Zigao, conversava sobre os assuntos da casa, organizava o cardápio do dia seguinte… sempre parecia que o tempo voava.

Agora, sem nada a fazer, só lhe restava ver seu filho. Brincou com Zhao Zigao por um tempo, mas logo o menino bocejou e não conseguia mais manter os olhos abertos. Diante disso, Tang Shishi deixou que a ama o levasse para dormir.

Ela andou de um lado para o outro no quarto diversas vezes, mas ainda assim não conseguiu se acalmar. Vendo o desânimo da senhora, as criadas sugeriram:

— Wangfei, a senhora esteve ocupada o dia todo. Por que não toma um banho e descansa mais cedo esta noite?

Era o que podia fazer naquele momento. Tang Shishi suspirou:

— Preparem a água.

Após o banho, uma das criadas trouxe a toalha e a ajudou a secar os cabelos. Tang Shishi sentou-se no divã, com a mente vagando.

Normalmente, era Zhao Chengjun quem secava seus cabelos. Depois do anoitecer, não havia tantas criadas no aposento principal.

Então era essa a sensação de quando o marido não volta para dormir em casa...

Tang Shishi não conteve um suspiro. A criada, ao ouvi-la, pensou ter puxado o cabelo da senhora e ajoelhou-se apressada:

— Wangfei, por favor, me perdoe!

— Está tudo bem — respondeu Tang Shishi, acenando com a mão. — Deixem que eu mesma faço. Podem ir descansar.

As criadas se entreolharam, hesitantes:

— Wangfei...

Mas Tang Shishi estava decidida. Fez um gesto e repetiu:

— Podem ir.

— Sim, senhora.

Elas responderam, deixaram os itens para secar os cabelos sobre a mesinha de sândalo e recuaram em silêncio. Tang Shishi pegou o lenço limpo e tentou secar o cabelo sozinha, mas logo se cansou. Por que meu cabelo é tão comprido? Como Zhao Chengjun conseguia fazer isso sem parecer cansado?

Ela ergueu os fios ainda úmidos e os observou por um tempo. Não queria chamar as criadas de volta, tampouco tinha forças para continuar. Acabou por simplesmente deixar o cabelo como estava e decidiu dormir daquele jeito mesmo. Afinal, as janelas estavam bem fechadas e ela não pegaria um resfriado.

Tang Shishi deitou-se com os longos cabelos soltos sobre os ombros. Quando se acomodou, percebeu o quanto a cama parecia grande. Sem querer, bateu o cotovelo, e ninguém veio consolá-la. Não sabia por que, mas sentiu-se profundamente injustiçada. Virou-se de um lado para o outro até finalmente adormecer.

Por algum motivo, aquela noite parecia especialmente fria. No meio da madrugada, ela acordou subitamente. Ao abrir os olhos, viu tudo escuro e sombras dançavam ao redor. Ficou deitada sem entender onde estava, até que percebeu: estava na mansão, e Zhao Chengjun não havia voltado.

Tang Shishi esfregou os braços. Então era por isso que estava com frio… seus braços haviam ficado descobertos. Todas as outras vezes em que não acordava no frio era porque Zhao Chengjun cobria a coberta para ela.

Ela não sabia por que não conseguia dormir. Sentou-se devagar e ficou encarando a cortina no escuro, perdida em pensamentos. A criada que estava de vigia do lado de fora escutou o barulho e bateu suavemente na porta:

— Wangfei, está acordada?

— Sou eu — respondeu Tang Shishi. — Está tudo bem. Só acordei para tomar um pouco de água. Pode voltar a descansar.

Ao ouvir isso, a criada pegou uma pequena lamparina, vestiu um manto e entrou para servir água. Entregou a xícara a Tang Shishi, e ao soltar a mão, tocou os dedos da senhora. Surpresa, exclamou:

— Wangfei, suas mãos estão tão frias!

— Porque acabei de acordar. Logo vou melhorar. — Tang Shishi não deu muita importância e perguntou: — Onde está o Gao’er?

— O pequeno Junwang está dormindo bem. — A criada se levantou e disse: — Wangfei, espere um pouco, vou buscar uma bolsa de água quente.

Tang Shishi estava prestes a dizer que não era necessário, quando de repente ouviu o choro estridente de uma criança vindo do salão dos fundos. O choro era agudo e penetrante, e a assustou. Imediatamente, ela levantou o edredom e saiu da cama às pressas:

— Gao’er está chorando? O que houve? Por que começou a chorar de repente?

Por questão de praticidade, Zhao Zigao dormia no salão lateral, atrás do pátio principal onde ficava o quarto de Tang Shishi e Zhao Chengjun. Tang Shishi vestiu o manto e correu em direção ao salão dos fundos. A ama de leite segurava Zhao Zigao no colo e tentava acalmá-lo, quando percebeu que a luz do pátio da frente havia sido acesa. Ao ver a Wangfei se aproximando com suas criadas, apressou-se:

— Saudações à Wangfei. Wangfei, fiz barulho demais e atrapalhei seu sono? Mereço morrer. Mas o pequeno Junwang estava bem até agora. Não sei por que começou a chorar tão alto de repente esta noite.

Tang Shishi tomou Zhao Zigao nos braços e o acalentou com voz suave:

— Mamãe está aqui. Gao’er, não chore.

Ela andou em círculos duas vezes com Zhao Zigao no colo. Aos poucos, o choro cessou, embora ele ainda fungasse baixinho. Ao ver isso, a ama e a criada se aproximaram depressa:

— Wangfei, a senhora ainda carrega outro bebê. Passe o pequeno Junwang para mim rapidamente.

Tang Shishi ainda estava grávida e não podia fazer esforço. Sem insistir, aproveitou a chance e passou Zhao Zigao de volta à ama de leite. Observando o rostinho vermelho do filho, perguntou:

— O que houve? Ele nunca chora à noite. Será que pegou um resfriado?

— Impossível. — As criadas estavam confusas. — Já verifiquei portas e janelas várias vezes, não deixei nada aberto. Está tudo como sempre foi.

A ama, que era do povo, abaixou a voz e murmurou em tom estranho:

— Talvez o pequeno Junwang tenha se assustado com alguma coisa…

Ela disse aquilo com naturalidade, mas quem ouviu entendeu de outra forma. O coração de Tang Shishi apertou. Antes que ela pudesse responder, uma das criadas a repreendeu com o rosto fechado:

— Que ousadia! Está insinuando que há forças estranhas sob os pés de Sua Majestade? Se continuar falando essas tolices diante da Wangfei, pense bem na sua pele!

A ama tinha falado sem pensar e não esperava tocar num tabu da família imperial. Imediatamente baixou a cabeça, sem ousar dizer mais uma palavra.

Tang Shishi lançou um olhar à criada e disse:

— Está bem. Não fale assim no meio da noite. Já que Gao’er voltou a dormir, vamos embora. Cuidem bem dele e não deixem nada atrapalhar o sono.

— Sim, senhora.

Vendo que não havia nada de anormal no quarto, Tang Shishi saiu acompanhada da criada. Ajustou melhor o manto em torno do corpo e, assim que cruzou a soleira, ouviu o som estrondoso de um sino vindo do nordeste.

O som prolongado carregava umidade e frio, espalhando-se camada por camada como ondas na água. Tang Shishi ficou paralisada ao ouvir a primeira badalada. Logo veio a segunda.

O sino soava no meio da noite, vindo da direção do Palácio Imperial.

O Imperador havia morrido.

Capítulo 125 – A Morte do Imperador

O imperador morreu. Tang Shishi ficou completamente atordoada e não conseguia mais ouvir nada do que diziam atrás dela. As criadas estavam apavoradas e perguntaram:

— Wangfei, o que devemos fazer agora?

O que devemos fazer agora? Tang Shishi também queria saber. Ela mesma não fazia ideia. Mas sabia que agora era a Wangfei, o pilar de toda a mansão do príncipe, e de forma alguma podia demonstrar pânico. Respirou fundo e disse com firmeza:

— Acordem todos e reúnam-nos no salão. Não deixem ninguém perambulando do lado de fora. Guardem bem os portões. Se notarem qualquer sinal de anormalidade, venham me avisar imediatamente. Além disso, retirem as lanternas vermelhas, os recortes de papel vermelho e tudo do tipo. Troquem as roupas por cores sóbrias. Ainda não precisam vestir luto, por enquanto.

A morte do imperador era um funeral nacional, e o país inteiro vestiria roupas de luto. Como membros da família imperial, seu luto só seria mais rigoroso. Em teoria, a troca de roupas só ocorreria após o Palácio Imperial anunciar oficialmente a morte. Mas agora, com o sino fúnebre já soando, esses preparativos podiam ser adiantados.

O tom de Tang Shishi era calmo e suas ordens, metódicas. As criadas, contagiadas por sua serenidade, começaram a se acalmar também:

— Sim, senhora.

As criadas saíram para executar as ordens. Tang Shishi voltou ao salão dos fundos para ver Zhao Zigao. A ama de leite era uma mulher do povo e não fazia ideia do significado daquele sino vindo do Palácio Imperial, mas pelo semblante das pessoas na mansão, percebeu que algo grave havia ocorrido.

Algo muito sério, ao que tudo indicava.

Principalmente quando Tang Shishi voltou após ter saído — a ama ficou ainda mais nervosa. Segurando Zhao Zigao no colo, perguntou, trêmula:

— Wangfei, por que as luzes foram acesas? Aconteceu alguma coisa?

Tang Shishi desviou da pergunta. Abaixou o olhar para ver Zhao Zigao. O menino chorava alto no silêncio, mas adormeceu profundamente quando o sino começou a tocar. Ao perceber que ele não havia acordado com o barulho, Tang Shishi se sentiu aliviada e disse:

— Dê ele pra mim. Ele vai dormir comigo no quarto da frente esta noite.

Tang Shishi estendeu os braços para pegá-lo, mas as criadas não ousaram deixá-la carregar o menino sozinha e correram para tomar a frente. Ela não discutiu. Depois que uma delas segurou Zhao Zigao com firmeza, Tang Shishi apenas disse:

— Vamos. Tragam também o edredom de brocado. Está úmido aqui fora. Não deixem o ar frio acordá-lo.

— Sim, senhora.

A criada envolveu Zhao Zigao com cuidado e o levou para o quarto principal. Parecia que o choro intenso de antes havia consumido todas as forças do menino, e agora ele não acordava nem com toda essa movimentação. Ao chegarem, as criadas se ocuparam acendendo as luzes, arrumando a cama, aquecendo uma bolsa de água quente e trocando as roupas do pequeno Junwang por trajes sóbrios.

Depois de se trocar, Tang Shishi sentou-se no divã e ficou observando em silêncio o rosto adormecido do filho. Com receio de que a luz o acordasse, pediu que retirassem a luminária da mesa e deixassem apenas uma lanterna suspensa acesa. Tang Shishi não sabia qual era a situação lá fora, nem qual seria o próximo passo de Zhao Chengjun, tampouco como funcionava uma transição formal de poder. Tudo que sabia era que seu filho dormia, e ela esperava por ele.

Não importava se fosse vida ou morte, glória ou humilhação, sucesso ou fracasso... nossa família estará unida.

Tang Shishi sentiu uma paz sem precedentes naquele momento. Olhou para o céu profundo da noite. Era meia-noite — talvez muitas pessoas também estivessem sem dormir naquela hora. O que estaria acontecendo na Corte Imperial agora?

No Palácio Cining, a Imperatriz Viúva Yao havia dormido há pouco tempo quando foi repentinamente acordada por passos apressados.

— Imperatriz Viúva Niangniang, acorde depressa! Sua Majestade... parece que não vai resistir!

O quê? Em estado de meio sono e meio vigília, ela se levantou com os cabelos soltos caindo pelos ombros. O rosto estava abatido pela falta de descanso.

— O que você disse?

O eunuco imperial ajoelhou-se sobre o chão frio do Palácio Cining e começou a chorar desesperadamente:

— Sua Majestade... não vai resistir.

Ao ouvir isso, a Imperatriz Viúva Yao ficou profundamente abalada. Suas mãos tremiam e ela quase caiu ao chão. As amas se apressaram para ampará-la:

— Imperatriz Viúva...

Naquele instante, a Imperatriz Viúva Yao sentiu que sua vida havia chegado ao fim. Por um momento, ficou completamente desorientada. Depois, recuperou a consciência e reuniu toda a força de vontade para demonstrar a autoridade da “avó imperatriz que governa por trás da cortina”. Disse com voz firme:

— Ajudem-me a levantar. Vamos ao Palácio Qianqing.

Os criados do palácio correram para ajudá-la a trocar de roupa. O tempo era curto, e não havia como pentear o cabelo adequadamente. Mas, naquele momento, ela não se importava com a dignidade da posição de Imperatriz Viúva. Vestiu-se na maior pressa que já havia feito na vida. Ainda assim... foi tarde demais.

Mal havia terminado de se vestir — sequer colocara as capas protetoras das unhas — quando ouviu sons de passos correndo do lado de fora. O Palácio Cining parecia estar cercado. À distância, um eunuco batia o gongo e gritava com voz esticada:

— Neste momento crítico, é proibido sair! Cada palácio deve permanecer onde está!

O rosto da Imperatriz Viúva Yao ficou pálido. Com expressão severa, perguntou:

— O que está acontecendo lá fora?

Os criados se entreolharam, desconcertados. Passado um momento, o eunuco responsável por buscar informações voltou com o rosto carregado de preocupação:

— Imperatriz Viúva, o Palácio Cining está cercado. Ninguém pode entrar ou sair.

O semblante da Imperatriz Viúva escureceu e ela gritou, furiosa:

— Atrevimento! Sou a Imperatriz Viúva! Quem ousa agir com tanta insolência diante de mim?

— Disseram que foi por ordem do Príncipe Jing. Jing Wang afirmou que o estado de saúde de Sua Majestade piorou repentinamente, e que, neste momento crítico, ninguém deve se mover dentro do palácio. Quem desobedecer será executado no local.

O rosto da Imperatriz Viúva voltou a escurecer. O Palácio Qianqing já está sob o controle de Zhao Chengjun?

Ela nem sequer havia colocado as capas das unhas e, com expressão gelada, saiu apressada:

— Sua Majestade é meu neto. Agora que sua vida está por um fio, como posso não ir protegê-lo? Quero ver quem ousa me impedir!

— Imperatriz Viúva Niangniang, pense bem! — Os criados tentaram detê-la, desesperados. — A situação lá fora ainda é incerta. A senhora não pode se arriscar dessa forma!

A Imperatriz Viúva empurrou com raiva a mão de Feng Momo e gritou:

— Insolência! Sou a Imperatriz Viúva de duas dinastias e mãe legítima de Zhao Chengjun. Ele ainda ousa me impedir? Saíam da minha frente! Eu vou sair!

Feng Momo, pega de surpresa, caiu ao chão com um baque. A queda foi dolorosa, mas ela não ousou se atrasar. Levantou-se rapidamente e voltou a impedir a Imperatriz Viúva:

— Niangniang, esta situação é diferente das anteriores. Por favor, acalme-se. A senhora é o esteio de todos nós. Só com sua segurança é que poderemos nos reerguer!

A Imperatriz Viúva Yao foi se acalmando aos poucos. Passado o acesso de raiva, ela pareceu perder as forças de repente. Sua visão ficou turva e ela desmaiou para trás. Os criados correram para segurá-la e ajudá-la a sentar-se. Ela segurou a cabeça por um tempo e perguntou:

— Como está o portão do palácio?

O eunuco saiu para investigar. Após um tempo, voltou com a resposta:

— O portão do palácio está guardado pelos soldados imperiais, sob o comando de Lorde Xiang.

Xiang Ying não era o Comandante da Guarda Imperial — esse era Hong Fei. Hong Fei era muito leal à Imperatriz Viúva e fizera muitos favores a ela ao longo dos anos. Mas Xiang Ying havia sido promovido recentemente, e a Imperatriz Viúva mal o conhecia. Estava claro: Hong Fei fora traído, e seus subordinados escolheram apoiar alguém de posição superior.

Mas não havia traições entre os guardas imperiais? Os membros da Divisão Zhen Fu do Norte estavam cada vez mais obscuros. Todos ali não passavam de tiranos de métodos desprezíveis, dispostos a se substituir mutuamente por poder.

A Imperatriz Viúva Yao perguntou:

— E os portões da cidade?

— Estão guardados pelos soldados do Palácio Imperial. Não conseguimos obter nenhuma informação por meios discretos.

A Imperatriz Viúva Yao suspirou. Ao ouvir aquilo, soube que tudo havia terminado. Assim que o destino do Imperador ficou por um fio, Zhao Chengjun tomou o controle do Palácio Qianqing, do Portão da Cidade Imperial e do Portão do Palácio. Embora ainda não se soubesse sobre a situação fora da cidade, era de se presumir que o portão de Jinling também estivesse sob seu controle.

O Imperador e o poder estavam em suas mãos. O que restava agora era o posicionamento do governo central. No entanto, aqueles velhos raposas do gabinete sabiam bem reconhecer a maré: Zhao Chengjun tinha um poder imensurável nas mãos e um motivo perfeitamente legítimo para herdar o trono. Portanto, ninguém colocaria obstáculos em seu caminho.

Ficou treze anos afastado da capital. Ainda assim, conseguia controlar os eunucos, a Guarda Imperial, as Vinte e Seis Guardas e a Mansão do Comandante do Quinto Exército, tudo ao mesmo tempo. A derrota da Imperatriz Viúva Yao dessa vez... não parecia nem injusta.

Ela recostou-se na cadeira, sentindo-se cansada pela primeira vez. No passado, por mais duras que fossem suas lutas com a dinastia anterior ou dentro do harém, por mais árdua que fosse sua análise dos registros e contas, nunca havia sentido esse peso da velhice.

Um longo sino soou ao longe. A Imperatriz Viúva Yao fechou os olhos e soltou uma risada amarga.

Achou que havia vencido após vinte e sete anos de luta, mas no fim... ainda perdeu para eles.

Guo Qinyue, que bom filho você teve.

Na mansão do Príncipe Jing, Tang Shishi segurava o filho nos braços, trêmula de medo. Zhao Zigao dormia profundamente, estalando a boquinha, como se saboreasse alguma comida gostosa em seus sonhos.

Tang Shishi olhou para o filho e, enfim, entendeu o que Zhao Chengjun quis dizer quando a chamou de insensível, tempos atrás. Suspirou e voltou o olhar para a janela. Era sigeng (entre 1h e 3h da manhã), e logo o dia nasceria.

Estava distraída quando uma voz repentina veio de fora. Tang Shishi se sobressaltou. Uma criada correu para anunciar:

— Wangfei, o Shizi chegou.

O coração de Tang Shishi, que havia se agitado por um momento, afundou de novo. Ela murmurou um "Ah" e disse, com voz indiferente:

— O que ele veio fazer aqui?

A criada não respondeu, e a voz de Zhao Zixun ressoou do lado de fora da porta:

— Wangfei, houve uma mudança esta noite na cidade de Jinling. Cheguei tarde e assustei Wangfei.

Tang Shishi respondeu sem emoção:

— Em plena madrugada, o Shizi não está confortando suas duas belas concubinas no quarto? O que veio fazer aqui?

Zhao Zixun achava que mulheres eram naturalmente medrosas. Mesmo que Tang Shishi se mostrasse altiva, no fim das contas, ainda era uma mulher. Aquela noite foi perigosa, e provavelmente ela já estava morrendo de medo por ficar sozinha no quarto.

Embora ele próprio estivesse apavorado, ao pensar que Tang Shishi poderia estar ainda mais assustada e mesmo assim mantinha a compostura, Zhao Zixun não conseguiu evitar um sentimento de ternura e desistiu de repreendê-la. Disse:

— Wangfei, não precisa se preocupar. Comigo aqui, protegerei a mansão com firmeza.

Tang Shishi revirou os olhos em silêncio. E o que ele pode fazer? Pode mudar o resultado da rebelião? Pode sair correndo e matar os inimigos?

Zhao Chengjun levara consigo seus homens de confiança para uma ocasião tão importante, e deixara os guardas de elite para Tang Shishi. Mas não levara Zhao Zixun.

Isso deixava claro que, no coração de Zhao Chengjun, Zhao Zixun era inútil. Mesmo pensando assim, Tang Shishi sabia que precisava manter as aparências:

— O Shizi tem um bom coração. Mas aqui já há pessoas suficientes. Shizi deveria voltar para confortar a Cefei Zhou. Ela acabou de sofrer um aborto e ainda não se recuperou bem. Está precisando muito de companhia.

Era uma frase corriqueira, mas, nos ouvidos de Zhao Zixun, soou com um tom inexplicável. As palavras de Tang Shishi estavam carregadas de acidez, como se estivesse com ciúmes.

O coração de Zhao Zixun disparou. Ele olhou para a silhueta de Tang Shishi projetada na janela de papel, dançando à luz da vela — graciosa e serena. Ficou em silêncio. Permaneceu diante da porta, sem entrar e sem ir embora.

Tang Shishi não sabia que loucura Zhao Zixun tinha na cabeça. Já que ele queria ficar ali e ela não conseguia mandá-lo embora, decidiu deixá-lo. Após algum tempo sentada, começou a sentir sono. Cobriu os lábios e bocejou. A criada, ao ver isso, tentou persuadi-la:

— Wangfei, a senhora já ficou acordada metade da noite. Por que não descansa um pouco?

Zhao Zixun também percebeu e reforçou:

— É verdade. Wangfei, durma tranquila. Eu cuido das coisas lá fora.

Mal ele terminou de falar, ouviram-se movimentos do lado de fora. Zhao Zixun se virou e Tang Shishi se levantou de imediato, perguntando:

— Quem está aí?

Uma fileira de lanternas se aproximava à distância. Quando chegaram perto, um homem de branco fez uma reverência diante do salão:

— Saúdo a Wangfei Jing.

Tang Shishi reconheceu que era um eunuco. Abriu a porta apressada e saiu para perguntar:

Gonggong, o que houve?

O eunuco de branco sorriu ao vê-la e anunciou:

— Vim relatar a morte por ordem de Sua Excelência dos Registros. O falecido Imperador partiu, e todo o país deve lamentar sua perda.

Tang Shishi não entendeu bem as intenções do eunuco, mas em ocasiões como essa, era adequado chorar. As pessoas no pátio choraram por um tempo. Tang Shishi conteve as lágrimas e disse:

— Não sei como expressar minha dor. Gonggong, por favor, perdoe minha falta.

— Wangfei, contenha sua tristeza. — Disse ele. Em seguida, continuou: — Ainda preciso ir à mansão da Princesa Mais Velha Nanyang. Vou me retirar. Wangfei, cuide-se e não se aflija demais.

Tang Shishi assentiu e acompanhou o eunuco até o portão do pátio. Notou que, ao mencionar Nanyang, ele usou o termo “Princesa Mais Velha”.

A hierarquia familiar foi mencionada… isso tem peso. Tang Shishi ficou alerta. Ao chegarem ao portão, o eunuco parou de repente e disse:

— O mestre no palácio pediu para eu deixar um recado à Wangfei. Ele disse para dormir bem esta noite e não se preocupar. Amanhã, tudo ficará claro.

Tang Shishi ficou surpresa e perguntou com cautela:

— Agradeço. Mas posso saber quem é esse mestre…?

O eunuco de branco manteve uma atitude ambígua. Sorriu, mas não respondeu. Virou-se para ir embora. Tang Shishi correu dois passos atrás dele, colocou um saquinho de pano em sua mão e disse:

— Obrigada, Gonggong, por aliviar minhas preocupações. Wangye não voltou esta noite… Posso saber se ele está no palácio?

O eunuco devolveu o saquinho com calma, ainda sorrindo:

— Como eu poderia saber dos assuntos do mestre? Mas Wangfei pode ficar tranquila: no palácio está tudo bem com ele. Wangfei só precisa descansar em paz.

Depois de dizer isso, juntou as mãos numa saudação e disse com ênfase:

— Wangfei, a senhora é uma pessoa abençoada. Descanse bem esta noite. Amanhã, ao entrar no palácio, haverá muitos assuntos a tratar.

Tang Shishi ficou parada, observando o eunuco se afastar. Mesmo depois que Zhao Zixun e ele sumiram da vista, ela ainda não havia recobrado os sentidos.

Dujuan, que a seguia de perto, tremia ligeiramente — não se sabia se era de frio ou nervosismo.

— Wangfei… o que aquele gonggong quis dizer?

Tang Shishi finalmente voltou a si e murmurou:

— Eu… não sei.

Ela realmente não sabia. Mas no fundo, sentia — Zhao Chengjun havia vencido.

O eunuco evitara mencionar o nome de Zhao Chengjun, sequer o chamara de Príncipe Jing. Muito provavelmente, a situação já estava decidida, mas ainda não havia sido divulgada. Por isso, evitava dizer qualquer coisa que pudesse ser considerada tabu.

Caso contrário… por que Tang Shishi, como Wangfei, teria que entrar no palácio no dia seguinte?

Tang Shishi se acalmou e ordenou às criadas:

— Retirem todas as coisas chamativas da mansão e avisem a todos que troquem de roupa para o luto.


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