131
Depois que a família Ban foi saqueada, alguns playboys que tinham boas relações com Ban Heng chegaram a tentar, em segredo, lhe entregar um pouco de ouro e prata. Mas, ao saberem que Rong Xia não rompeu com ninguém por causa da queda da família Ban — pelo contrário, acolheu todos os seus membros — desistiram da ideia.
Mais tarde, quando o imperador Fengning colocou os três membros da família Ban em prisão domiciliar, esses mesmos dândis ficaram se mexendo daqui e dali, tentando encontrar uma solução. No entanto, não puderam fazer isso por muito tempo, pois logo as próprias casas deles também foram saqueadas. Eram nobres hereditários, sem cargos reais na corte. Fengning não gostava deles, e se quisesse copiar os bens deles, não havia o que impedisse.
Quando o exército de Rong Xia entrou na capital, esses playboys se deliciaram com o espetáculo. Embora não tivessem recuperado seus títulos, seus bens confiscados foram devolvidos pela corte — o que já era uma grata surpresa.
Especialmente aqueles poucos que ajudaram Rong Xia nos bastidores — agora, todos receberam alguns títulos moderados de nobreza.
Esses dândis também eram bastante espertos: sabiam que seria vergonhoso ir ao palácio agradecer, então se limitaram a se ajoelhar diante do eunuco Xuanzhi, proferiram várias palavras bajuladoras em direção ao palácio e, com um presente generoso, seguiram para a mansão Jingting.
O novo imperador havia acabado de se estabelecer. Os anciãos da família ainda não ousavam formar facções, então os que foram fazer visitas e levar presentes eram todos da geração mais jovem. Arranjaram uma desculpa qualquer de reunião antes de pisar na casa dos Ban.
Por causa desse golpe de estado, os jovens dândis haviam se tornado mais comedidos do que antes. Enquanto comiam e bebiam, criticavam os velhos eruditos ranzinzas que fingiam nobreza e defendiam a dinastia anterior.
— Por que se recusam a aceitar o convite da corte? — disse Ban Heng, direto. — O que Sua Majestade deseja são pessoas capazes, talentosas e preocupadas com o povo. Não é dividir status com nobres esnobes. Se tivessem a chance de subir ao poder, ficariam com vergonha de si mesmos.
Os outros não esperavam ouvir isso e perguntaram, curiosos:
— Isso é verdade?
— É claro que é — afirmou Ban Heng, balançando a cabeça. — Sua Majestade valoriza gente com competência e integridade. Ouvi de minha irmã que, se houver mesmo um ministro capaz de governar o mundo, mas que se recusa a servir à corte, Sua Majestade pessoalmente irá convidá-lo. Esses aí de quem vocês falam... quando é que a corte os procurou?
— Então são todos recalcados, mas ainda fingem ser superiores? — zombou um dos dândis. — Esse tipo me dá nojo. À noite, devem sonhar com a corte chamando por eles. De manhã, levantam e fingem desdém, escrevem poemas e cantigas para parecer elevados. Que tal ser honesto?
— Gente assim é fácil de lidar — disse outro. — Já que se importam tanto com a própria imagem, vamos expô-los.
— Tive uma ideia ótima — disse Ban Heng, batendo na mesa. — Vamos contratar atores para fazer uma apresentação no centro da cidade. Que seja engraçada e os deixe morrendo de vergonha.
— Isso! Eles são sem vergonha, e a gente também não precisa dar cara de santo.
Quando esses literatos autoproclamados estavam se achando os mártires da cultura, e acreditando mesmo que tinham recusado uma convocação imperial, os dândis — que não tinham nada melhor para fazer — começaram a organizar sessões gratuitas de teatro e narração de histórias.
E o que diziam as peças?
Falavam de alguns eruditos sem talento, que se achavam superiores e desprezavam o povo. Invejavam colegas que haviam entrado para o governo, choravam escondidos à noite, mas saíam de cara limpa no dia seguinte para fingir nobreza.
Alguns acadêmicos realmente tinham essa postura arrogante, e ao verem o povo sendo representado de forma tão bem-humorada, a plateia caía na gargalhada. Os palhaços que representavam esses "eruditos" até começaram a receber gorjetas.
Em pouco tempo, essas peças ficaram famosas na capital.
Eruditos e dândis, juntos, formavam uma mistura explosiva. Se os eruditos reclamavam dizendo que aquilo era ofensa, os dândis retrucavam:
— Ora, estamos só matando o tédio e entretendo o povo da capital.
Você, erudito, é tão correto assim? Não finge nobreza? Então por que ficou ofendido? Vai manchar sua reputação por defender quem é desprezível?
O que restava a esses estudiosos dizer?
Assumir que foi atingido em cheio?
Fingir magnanimidade e engolir a seco?
Depois de tantas provocações dos dândis como Ban Heng, esses velhos talentos sumiram. Pararam de escrever poemas e canções e se esconderam dentro de casa, com medo de serem apontados nas ruas como exemplo.
Mas suas atitudes anteriores já haviam ofendido os literatos que continuavam servindo na corte. Se eles não têm cargos, são nobres. Mas e nós, que trabalhamos para o governo? O que somos?
Muitos calaram-se antes para não sujar a reputação. Agora que o momento era favorável, aproveitaram para pisar com força.
Era uma forma de aliviar suas frustrações — e também de agradar ao novo imperador.
Quando Rong Xia soube do que Ban Heng e os outros estavam fazendo, comentou com Ban Hua:
— O método do irmão Heng é mais eficaz.
— Esse cérebro dele só funciona nessas horas — resmungou Ban Hua, irritada. — No futuro, sua reputação de talento romântico vai por água abaixo.
— Talento romântico? — Rong Xia não hesitou. — Ele é mais bonito que eu? Tem mais talento que eu?
— Um está no céu, o outro no chão. Vai comparar o quê? — Banhua apertou a bochecha dele, descascou um longan e enfiou na boca dele. — E eu nem estou te comparando com a senhorita Shi, a senhorita Lin, ou qualquer outra princesa.
Rong Xia cuspiu o caroço na mão dela e riu:
— Essas aí, nem lembro o rosto. Se me perguntarem qual é mais bonita, não sei responder.
— Você tem uma lábia que derruba até os pardais do céu.
— Coaxar pardal não tem graça. Já estou feliz por ter conseguido convencer você, minha fênix.
O casal conversou à noite à luz de velas — e foi mais uma noite de aconchego. Quando Ban Hua despertou da cama, Rong Xia já havia ido à corte.
Ao ouvir o relatório do eunuco da Província de Dianzhong, foi informada de que a Imperatriz Viúva Fuping deixaria o palácio naquele dia para viver em outro palácio nos arredores de Pequim. Ele perguntou se ela tinha alguma ordem a emitir.
A Imperatriz Viúva Fuping era mãe biológica do príncipe e de Jiang Luo. Embora a dinastia anterior tivesse chegado ao fim, Rong Xia ainda lhe concedia deferência, mantendo seu título de imperatriz viúva, assim como os títulos da família materna. Isso já era suficiente para preservar as aparências e o prestígio da imperatriz viúva.
— Vai partir hoje? — Ban Hua ficou um instante surpresa, levantou-se e disse: — Vou vê-la.
— Sua Majestade... — Ruyi olhou para Ban Hua com certa apreensão. Da última vez, a Imperatriz Viúva Fuping pedira que ela intercedesse em favor do tirano. Depois de recusar, as duas nunca mais se encontraram. Agora que tudo havia passado, temia que a imperatriz viúva pudesse guardar rancor.
Ban Hua respondeu com calma:
— Vamos.
A senhora Fuping observava sem expressão enquanto os eunucos e criadas retiravam as caixas que já haviam sido arrumadas. Virou-se para a ama-de-leite que espiava ao redor e disse:
— O que está olhando?
Ao ser pega em flagrante, a ama ficou visivelmente constrangida, sem saber o que responder. Imaginava que a imperatriz poderia mandar alguém se despedir, e assim, ao chegar no outro palácio, sua vida seria um pouco mais fácil.
Ela é a imperatriz viúva de um império que caiu. Ainda que mantenha o título, quem levaria isso a sério? Mas se a atual imperatriz demonstrasse cortesia, os servos do novo palácio não ousariam tratá-la mal. Como serva do palácio, ela conhecia muito bem os pensamentos dos que estavam abaixo. Mas como dizer isso diretamente à imperatriz viúva?
Na verdade, a própria Imperatriz Viúva Fuping sabia o que se passava na mente dela, mas só podia fingir que não sabia. Já pensara em morrer, mas se morresse... o que aconteceria com seu filho mais velho e com sua filha? Não eduquei bem meu segundo filho... ainda vou usar o suicídio para irritar o novo imperador e acabar prejudicando os outros dois?
Além disso, ainda sentia alguma gratidão por Rong Xia. Enquanto eu estiver viva, Rong Xia tratará meu filho e minha filha com um pouco mais de bondade.
Então ela só podia viver. Viver com honestidade e resignação.
Estava prestes a subir na carruagem quando ouviu a voz surpresa da ama:
— Sua Majestade, é a imperatriz!
Fuping virou-se. De fato, era Ban Hua que se aproximava. Ela hesitou por um instante e virou-se para encará-la.
— Sua Majestade — Ban Hua entregou uma caixa de madeira à ama ao lado da rainha-mãe —, cuide-se bem no outro palácio. Se houver algo de que não goste, mande alguém me avisar. Quando eu tiver um tempo livre, irei visitá-la.
Os lábios da Imperatriz Viúva Fuping tremeram levemente. Após alguns instantes, respondeu:
— Você não deveria ter vindo.
Ela era a rainha-mãe da dinastia anterior. Ban Hua, uma princesa daquela mesma dinastia, ainda carregava o sangue da família Jiang. Aproximar-se demais delas não era prudente.
— Vossa Majestade não precisa se preocupar, eu compreendo — disse Ban Hua, ajudando pessoalmente a imperatriz viúva a entrar na carruagem. Do lado de fora, sussurrou: — Ao chegar no outro palácio, fique tranquila. Sua Majestade é um homem generoso. Tratará bem o Príncipe He e a Princesa Anle.
Lágrimas brilharam nos olhos da Imperatriz Viúva Fuping. Ela fez uma reverência e baixou a cortina da carruagem.
— Ruyi — disse Ban Hua, voltando-se —, acompanhe a imperatriz viúva para fora do palácio.
— Sim, senhora.
Quando Ban Hua retornou ao Palácio da Lua, Rong Xia ainda não havia voltado da corte. A ama Chang, que havia entrado no palácio com ela, aproximou-se com uma tigela de sopa nutritiva que ela mesma preparara:
— Senhora, o que aconteceu? Está com o semblante preocupado?
— Não — respondeu Ban Hua, tomando a sopa em silêncio. Depois de enxaguar a boca e limpar os lábios, completou: — Só fui me despedir da imperatriz viúva.
A ama Chang sorriu com doçura:
— Foi o certo a se fazer.
— Uma parte é por afeição pessoal — disse Ban Hua —, e outra é para demonstrar a dignidade da mãe do país.
A ama Chang, que servira por muitos anos à Princesa Herdeira de Dening, era sua confidente e ouvira muitas verdades escondidas. Sabia bem que, exceto pelas dificuldades nos primeiros anos de casamento com o imperador Yunqing, a imperatriz viúva vivera com fartura e tranquilidade. O marido a respeitava, e as concubinas mal ousavam olhá-la nos olhos. Isso era mais sossegado do que qualquer imperatriz do império Daye.
Quanto mais pacífica a vida, mais pura a natureza. O lado sombrio era quase nulo — como era o caso da própria imperatriz viúva.
— Que tipo de tolerância? — Ban Hua abaixou os olhos com um leve sorriso. — Ama, não precisa me elogiar tanto.
A ama Chang balançou a cabeça com um sorriso gentil:
— Vossa Majestade é muito boa. Igualzinha à alteza.
— Não sou tão boa quanto minha avó.
A ama acariciou sua mão com ternura:
— Vossa Majestade, não pense mais nisso. Que tal dar uma olhada nas roupas e joias para a cerimônia de selagem como imperatriz? Se algo não agradar, ainda dá tempo de pedir que os bordadores façam alterações.
Ban Hua assentiu:
— Está bem. Mande trazer para eu ver.
— Vossa Majestade, isso não é apropriado! — exclamou o oficial do Ministério dos Ritos, ajoelhado diante de Rong Xia. — A cerimônia de entronização da Imperatriz Chunming seguiu regras que datam de oitocentos anos atrás. Desde então, nenhuma rainha teve uma cerimônia tão grandiosa. Não devemos estabelecer esse precedente!
— Regras antigas não podem ser vistas como precedentes — respondeu Rong Xia, ignorando os oficiais ajoelhados. — A imperatriz teve papel fundamental na conquista do mundo. Realizar a cerimônia conforme esse padrão não é nenhum exagero.
Os oficiais do Ministério dos Ritos não esperavam ouvir tal coisa. Sabiam que os méritos da rainha eram incontestáveis, mas ainda assim era uma mulher — e exaltá-la em excesso não era apropriado. E se uma galinha começasse a cantar antes do amanhecer...
— Eu sei o que vocês estão temendo, mas a imperatriz não é esse tipo de pessoa. Eu... — Rong Xia largou o pincel e olhou fixamente para os ministros presentes — confio nela.
Ao verem que Rong Xia já havia falado com tanta clareza, os ministros entenderam que, se continuassem a insistir, acabariam desagradando o imperador. Por isso, apenas assentiram em silêncio.
— Já que todos os senhores não têm objeções, sigamos as regras — Rong Xia assentiu lentamente, finalmente demonstrando alguma satisfação no rosto.
— Lorde Zhou, Lorde Yao — o oficial do Ministério dos Ritos chamou os dois que não haviam se oposto desde o início —, os senhores não acham que há algo errado com essa cerimônia da imperatriz?
— Algo errado? — Zhou Bing’an ergueu as sobrancelhas, com expressão de confusão — Sua Majestade não está satisfeito?
— Embora Sua Majestade esteja satisfeito, essa cerimônia é grandiosa demais...
— Lorde Wang — Yao Peiji deu um tapinha no ombro do oficial —, as regras, enquanto tiverem respaldo, não são transgressões. Na minha opinião, a imperatriz é corajosa, habilidosa na guerra e compartilhou alegrias e sofrimentos com Sua Majestade. Seguir esse padrão não é exagero.
Diante das palavras de Yao Peiji, o oficial do Ministério dos Ritos deixou-se ser tocado no ombro, atônito, e de repente teve a sensação de que talvez estivesse realmente fazendo tempestade em copo d’água.
Como os ministros de maior importância não demonstraram qualquer objeção à cerimônia da imperatriz, os demais também não ousaram se pronunciar. No momento, Sua Majestade não só demonstrava aptidão para governar, como também detinha o controle militar na corte. Os oficiais, portanto, mostravam-se extremamente obedientes.
Afinal de contas, quem Sua Majestade estava homenageando era a esposa legítima, não uma concubina. E, além disso, havia precedentes históricos.
Os oficiais do Ministério dos Ritos passaram a se empenhar intensamente nos preparativos para a cerimônia de selamento da imperatriz. Ao mesmo tempo, os estados e condados que haviam sido afetados pela guerra começaram, gradualmente, a retomar a normalidade. O relatório da residência imperial sobre a ascensão de Rong Xia ao trono só agora estava sendo enviado para as demais regiões e países vizinhos.
Ao saberem que o novo imperador era tão justo e benevolente, o povo de todos os estados e condados celebrou com alegria.
Quanto aos pequenos países ao redor, que durante a guerra civil não ousaram se mover, agora que o novo imperador havia ascendido ao trono, a única reação possível era enviar emissários para parabenizá-lo sem parar — com a esperança de descobrir se ele tinha alguma intenção hostil em relação aos vizinhos.
Se o novo imperador for do tipo que gosta de invadir os outros sem motivo... nossa vida vai virar um inferno.
— Vossa Majestade, cuidado onde pisa.
Jiang Luo, preso na masmorra imperial, ouviu vozes do lado de fora e correu para a porta da cela, empolgado. Há dias não ouvia uma alma, estava quase enlouquecendo. Agora, ao escutar vozes humanas, sentiu-se vivo novamente.
Mesmo sendo Rong Xia quem entrava, isso não diminuía sua excitação.
— Rong Xia, me solta! Me tira daqui!
— O Rei Li, aceite o decreto.
O edito listava em detalhes os crimes de Jiang Luo e, ao final, concedia-lhe o título de Rei Li, condenando-o à prisão perpétua.
— Você não pode fazer isso comigo! Eu sou o imperador! — Jiang Luo gritou, puxando com força as grades — Você não pode me tratar assim!
Rong Xia observava calmamente o desespero de Jiang Luo. Sentou-se na cadeira e só falou quando ele já estava exausto:
— Rei Li, você não tem consciência. Estou poupando sua vida por consideração à Imperatriz Viúva Fuping. Do contrário, já teria arrancado sua cabeça para consolar o espírito do imperador anterior.
Jiang Luo se apoiou na porta da cela, olhando para Rong Xia com desespero:
— Rong Xia, seu hipócrita!
Wang De empurrou a porta da cela, avançou e estapeou Jiang Luo no rosto. Depois, limpou as mãos com um lenço e disse com um sorriso:
— Vossa Alteza, o Rei Li, não deve faltar com o respeito a Sua Majestade. Mesmo que este servo tenha perdido três dedos, ainda tem força de sobra para bater.
— Que tipo de cão é você para latir diante de mim, hein?! — Jiang Luo cuspiu sangue — Todo mundo diz que fui eu quem envenenou meu pai, mas você nem pegou aquele frasco naquele dia! Ridículo. Todos elogiam a benevolência de Rong Xia, mas não sabem que a vida do meu pai foi tirada pelas suas mãos.
Rong Xia continuou em silêncio, ouvindo seu surto.
Wang De deu-lhe outro tapa. Após o golpe, inclinou-se respeitosamente diante de Jiang Luo, agora caído no chão, e disse:
— Vossa Alteza, já avisei: não deve desrespeitar Sua Majestade. Embora eu não tenha aceitado o frasco, os outros eunucos aceitaram. E os crimes que o senhor cometeu, Sua Majestade não precisa carregar em seu lugar.
— Heh... — Jiang Luo estava estirado no chão, em frangalhos, sem conseguir se levantar — Vocês dois, Rong Xia e você, conspiraram para enganar o mundo. E ainda fingem decência na minha frente?
— Vossa Alteza está enganado mais uma vez — disse Wang De, com um sorriso falso —. Sua Majestade guarda respeito pelo falecido imperador e também aprecia a lealdade deste servo. Por isso, permitiu que eu permanecesse ao seu lado.
— Hahahaha! — Jiang Luo gargalhou alto — Que piada! Vocês assassinaram o imperador e se rebelaram por ganância, e agora dizem isso como se fosse algo nobre? O povo é cego e surdo pra ainda elogiar vocês como se fossem cavalheiros virtuosos?
Wang De chutou Jiang Luo novamente, indignado.
— Basta — interrompeu Rong Xia —. Se você não tivesse feito coisas que me desagradaram, poderia estar vivendo bem hoje.
— Bah! — Jiang Luo cuspiu em sua direção.
— Du Jiu — disse Rong Xia, em tom calmo, como quem serve chá —, quebre um dos braços dele.
Du Jiu, que estava em silêncio atrás de Rong Xia, avançou e fez uma reverência:
— Vossa Majestade, qual braço?
Rong Xia pensou por um instante antes de responder, com firmeza:
— O esquerdo.
Du Jiu entrou na cela, pisou no braço esquerdo de Jiang Luo e, com um estalo seco, o osso se partiu.
— Ah!
O rosto de Jiang Luo empalideceu de dor, lembrando um sapo de barriga inchada — uma visão ao mesmo tempo ridícula e aterradora.
Rong Xia contemplou sua expressão sofrida por um tempo, depois se levantou e disse:
— Não o deixem morrer. Vamos.
— Louco... lunático — disse o Rei Changqing, que havia sido trazido ali sem que se soubesse quando, com o rosto lívido —. Rong Xia, você disse que Jiang Luo era tirânico... mas em quê você é melhor que ele?
Xie Qilin, que também estava sendo escoltado, parecia um pouco pálido, mas ao olhar para Jiang Luo, que chorava de dor, permaneceu em silêncio.
Rong Xia lançou-lhe um olhar frio e indiferente.
O Rei Changqing sentiu um calafrio ao receber aquele olhar. Ainda assim, arriscou-se a dizer:
— Você tortura tanto as pessoas, por que não lhes dá uma morte rápida?
— Não os trouxe aqui para assistirem a um espetáculo — Rong Xia riu de repente —. Se não falassem nada, eu até teria esquecido de vocês.
Seu sorriso desapareceu.
— Amarrem-no.
Logo, o Rei Changqing foi amarrado à parede com os braços abertos em forma de cruz. Rong Xia caminhou até a parede, retirou um arco pendurado, tocou a corda e, de repente, puxou uma flecha, encaixou-a e disparou.
A flecha passou raspando pelo braço do Rei Changqing, deixando uma ferida nem tão profunda, nem tão superficial.
Outra flecha foi lançada, raspando o outro braço e abrindo um segundo ferimento.
Há pouco, o Rei Changqing ainda era ousado e falava com arrogância. Agora, seu rosto estava pálido e azulado, o corpo tremendo como uma folha.
— Tragam Gao Wangsheng. — Rong Xia atirou o arco e a flecha no chão.
Os guardas logo trouxeram Gao Wangsheng, e Rong Xia apontou para o Rei Changqing, amarrado na parede:
— Dou-lhe duas opções: ou passa o resto da vida na prisão, ou acerta dez flechas nele sem matá-lo.
Ao ver o Rei Changqing amordaçado e preso à parede, Gao Wangsheng ficou tão apavorado que caiu de joelhos diante de Rong Xia.
Ele era apenas um arqueiro talentoso, elogiado por supostamente carregar o legado do Marechal Ban, mas sabia bem que não era digno nem de carregar os sapatos do marechal, muito menos de herdar qualquer legado.
Embora a Dinastia Daye já não existisse, ele não tinha coragem de ferir um membro da antiga família imperial. Ficou ajoelhado por muito tempo, mas Rong Xia não demonstrou emoção alguma — e ele entendeu.
Na verdade, ele não tinha escolha alguma.
Com as mãos trêmulas, disparou a primeira flecha. Ela saiu um pouco torta e atingiu a coxa da vítima. Depois disso, sentiu-se um pouco menos nervoso, e logo as outras nove flechas foram disparadas.
Quando finalmente olhou para o Rei Changqing, agora transformado em um homem coberto de sangue, percebeu que estava encharcado de suor frio.
Rong Xia virou-se e olhou demoradamente para Xie Qilin. Em seguida, disse a Qin Wei:
— Liberte esses dois.
Xie Qilin encarou Rong Xia com incredulidade. Ele vai me libertar?
Após a saída de Rong Xia, um guarda veio com a chave e destrancou suas algemas e correntes.
— Senhor Xie, por favor.
Xie Qilin olhou para o moribundo Rei Changqing e para Jiang Luo, que gemia baixinho, então virou-se e saiu apressado daquele lugar sombrio e sangrento.
O Rei Changqing, pendurado na parede, observou a silhueta apressada de Xie Qilin e começou a rir:
— Louco... louco... Rong Xia é um lunático...
Ao ouvir essa frase, Xie Qilin apressou o passo até começar a correr, saindo pelos portões e mergulhando na multidão.
O sol quente brilhou sobre ele, e só então ousou respirar fundo.
— Mãe, o que aquele homem faz? Ele está tão sujo...
— Shhh, não aponte o dedo.
Ao ouvir os sussurros ao redor, percebeu o estado em que se encontrava. Suas roupas estavam sujas e manchadas de sangue — ainda vestia o manto que usara quando entrou na cidade com Rong Xia.
Dirigiu-se à mansão do tio Zhongping, mas ao chegar ao portão, viu um selo oficial — aquela já não era mais sua residência.
— Qilin?
Um velho com uma bengala o chamou à distância.
— É você, Qilin?
Ele virou-se para o idoso.
— Pai?!
Por que seu pai parecia tão envelhecido e desgastado?
— Que bom que voltou, que bom... — Xie Jinke caminhou até ele com passos trêmulos, enxugando as lágrimas —. Vamos, venha com o pai.
Xie Qilin segurou o braço do pai e assentiu em silêncio.
— A princesa?
Shi afastou a cortina da carruagem e perguntou sem expressão:
— Onde está morando agora a família Xie?
— Parece que vivem numa casa na Viela Bajiao.
Shi Shi soltou uma risada fria:
— Se Xie Qilin tivesse se casado com Ban Hua naquela época, nada disso teria acontecido.
Sem Ban Hua, Rong Xia jamais teria obtido o Talismã do Tigre das Três Tropas, muito menos o apoio dos generais. Todos os erros começaram quando Xie Qilin e Ban Hua romperam o noivado.
Mas, naquela época, foi nossa própria família Shi quem rompeu o casamento entre eles.
Se soubesse que o desfecho seria este, deveria ter impedido sua irmã de tomar aquela decisão.
Se eu soubesse... se eu soubesse...
Ela olhou para a movimentada capital diante de si.
Passaram-se apenas alguns dias, e essas pessoas já esqueceram a Dinastia Daye e continuam vivendo suas vidas agitadas como se nada tivesse acontecido?
132
Depois que Rong Xia subiu ao trono, embora sua postura fosse firme, ele sabia quando demonstrar humanidade, sem jamais parecer excessivamente autoritário. Em menos de meio mês, os oficiais da corte já haviam se acostumado com seu estilo de governar.
Sabendo da importância que o imperador atribuía à cerimônia de coroação da imperatriz, ninguém no palácio da frente ousava relaxar, especialmente os servos do palácio que serviam a rainha de perto. A data de nascimento de todos foi verificada, e qualquer pessoa com data desconhecida foi descartada. Os que não tinham boa conduta não foram aceitos, e quem já havia se envolvido em escândalos também foi vetado.
— A cerimônia de coroação de Sua Majestade não foi tão rigorosa assim — comentou um eunuco que esfregava o chão para seu colega —. A Imperatriz realmente tem o coração do imperador.
— Tsc — o companheiro olhou ao redor para se certificar de que ninguém os observava e depois cochichou, com ar de quem sabia das coisas —. Você está pensando de forma muito simples. Não é apenas porque Sua Majestade valoriza a rainha. Esqueceu o sobrenome ancestral da imperatriz?
O eunuco balançou a cabeça, confuso:
— Sua Majestade trata a imperatriz tão bem. Por que não a valorizaria?
— A imperatriz é muito respeitada no exército. Sua Majestade acabou de conquistar o império. Como não mostraria que a valoriza? — respondeu o colega, com um tom enigmático —. Não se esqueça, a imperatriz tem sangue real. O trono que Sua Majestade ocupa agora foi passado por abdicação de um príncipe da dinastia anterior, entendeu?
O eunuco pareceu ainda mais perdido. Se fosse apenas por isso, Sua Majestade não precisaria chegar a esse ponto. Ele não tem medo de que a imperatriz acabe assumindo o controle do governo?
Ban Hua estava do lado de fora do salão e ouviu a conversa dos dois. Ao se virar, viu as damas e eunucos pálidos e trêmulos atrás de si. Então, sorriu e disse:
— Vamos.
Eram apenas palavras ignorantes de dois criados rudes. Não há por que me importar.
Depois que Ban Hua partiu, o eunuco encarregado do salão principal apareceu e deu um chute nos dois eunucos que ainda não haviam entendido o que estava acontecendo:
— Vocês dois estão cansados de viver? Estão achando que são quem para comentar os assuntos do imperador e da imperatriz?! Alguém! Levem esses dois e arrastem para fora...
O eunuco estava furioso, quando uma jovem bem vestida, com um coque adornado com lingotes, se aproximou:
— Você é o encarregado deste salão?
O eunuco olhou para a moça. Ela tinha traços belos, estava bem vestida e usava um distintivo de cintura do Grande Palácio da Lua. Imediatamente se curvou com reverência:
— Minha senhora, deseja algo?
— Não ousamos desobedecer. Nossa senhora disse que essas duas criaturinhas cometeram um erro sem intenção, e que ela não se importou com o que disseram — declarou a oficial com semblante sério —. Mas dentro do palácio, é proibido falar demais. Que não se repita. Caso contrário, será tratado conforme o regulamento.
— Sim, sim — o mordomo deu outro chute nos eunucos ajoelhados —. Vocês dois, agradeçam à dama!
— Basta — disse Yuzhu, franzindo o cenho —. Como encarregado, você deve administrar bem os seus subordinados. Se eles cometem erros, a culpa também é sua.
O mordomo tremeu dos joelhos para baixo, e só se endireitou depois que Yuzhu se afastou.
— Vovô... — tentou puxar conversa um eunuco jovem, querendo agradá-lo, mas foi empurrado com força.
A nova imperatriz é gentil, mas tem autoridade. Sua conduta é completamente diferente da Imperatriz Viúva Fuping. Os criados como ele precisavam agir com ainda mais cautela. Lembrando-se do estilo da princesa de quando ela ainda era apenas uma princesa, sentiu um calafrio pelas costas — quase se deixou cair no chão de susto.
— Vossa Majestade — Ruyi seguiu Ban Hua com cuidado e falou com receio —. Aqueles são apenas eunucos ignorantes, suas palavras não são confiáveis. Por favor, não leve para o coração.
— Boba, Ruyi. Desde criança, que tipo de palavras eu nunca ouvi? — Ban Hua sorriu, indiferente —. Quando eu era princesa, já diziam esse tipo de coisa. Agora que sou imperatriz, você acha que as fofocas serão menos ou mais?
— Então... — Ruyi estava preocupada que aquilo criasse um atrito entre o imperador e a imperatriz. Se isso acontecesse, só sua senhora sofreria.
— Então não há nada a dizer. Não me importo com o que dizem — Ban Hua já esperava esse tipo de comentário. Vão dizer que sou virtuosa demais, depois vão dizer que esbanjo demais, ou que meus parentes são tirânicos...
Essas pessoas fingem preocupar-se com o imperador, mas se o imperador se voltasse contra ela, logo mudariam de opinião.
— Todo mundo quer conquistar o favor do imperador. Quem estiver em posição de destaque se torna alvo — ela tocou os lábios com os dedos —. De todo modo, já estou acostumada a ser o espinho nos olhos dos outros, uma pedra no sapato. Se for pra fazer o trabalho pesado, então que venha pra mim. Se não sou eu a ir para o inferno, quem irá?
Ruyi: ...
No fim das contas, acho que me preocupei à toa.
A situação chegou logo aos ouvidos de Rong Xia. Ele ouviu o relatório de Du Jiu com o rosto carregado. Após um longo silêncio, perguntou:
— Qual foi a reação da imperatriz?
— Vossa Majestade, ela... — Du Jiu ficou com uma expressão um tanto sutil —. Sua Majestade disse que, se ela não for ao inferno, quem irá?
Rong Xia ficou em silêncio por um momento... e então riu suavemente.
— Vossa Majestade? — Du Jiu percebeu que o humor do imperador melhorara instantaneamente.
Rong Xia largou o pincel que segurava, levantou-se e disse:
— Quando o príncipe vier na próxima semana, diga que tenho um compromisso e que ele pode voltar antes.
Vendo-o caminhar em direção ao fundo do palácio, Du Jiu tocou o próprio nariz com um ar de resignação.
Atualmente, ele comandava os Guardas Imperiais e, em particular, assumira a equipe de espiões que antes estava sob controle direto de Rong Xia. Por isso, sabia de muitas coisas que aconteciam no palácio. Por exemplo, que a imperatriz gostava de sair quando não havia nada para fazer — ou que a Imperatriz Viúva Fuping já havia intercedido junto à imperatriz para que falasse bem do Rei Li ao imperador.
O que a Imperatriz Viúva Fuping dissera, e o que a Imperatriz dissera, ele relatou a Sua Majestade em detalhes. Após esse episódio, Sua Majestade deu uma ordem repentina: que ninguém mais se aproximasse da imperatriz, nem mesmo para vigiá-la.
O que aconteceu dessa vez... se os espiões não estivessem acompanhando a cerimônia do Selo da Imperatriz para evitar que alguém mexesse em algo, ninguém teria ficado sabendo.
Assim que Rong Xia chegou ao salão dos fundos, viu Ban Hua em trajes de equitação, pronta para sair.
— Huahua, vai sair do palácio?
— Sim — Ban Hua assentiu. — Da última vez, eu disse que, quando voltasse à capital, iria lidar com certa organização de assassinos. Não posso quebrar minha palavra.
Rong Xia ficou atônito por um momento, depois se lembrou do que ela estava falando e não pôde deixar de rir:
— Essas pessoas já fugiram. Como vai encontrá-las?
— Não é tão fácil escapar assim. Já mandei gente vigiar — ela o empurrou para dentro do salão —. Vá se trocar rápido. Vou te levar para ver a cena.
Depois de Rong Xia trocar de roupa, vendo o brilho de animação nos olhos dela, perguntou:
— O que está planejando?
— Antes de mais nada, é preciso ter bastante gente — disse Ban Hua no tom de quem já viveu aquilo —. Três anos atrás, teve uma casa de apostas que tentou enganar o Heng-ge para fazê-lo apostar. Eu fui lá com um grupo de pessoas e destruí tudo.
Na época, havia muitos capangas na casa de apostas, mas eles não eram páreo para os guardas que ela levara. Foram espancados até chorarem, e nem mesmo os mandantes ousaram procurá-la depois.
Depois que saíram do palácio, ao ver a multidão agitada, Rong Xia ficou um pouco atordoado. Desde que se mudara para o palácio, não tivera mais a oportunidade de observar com calma a capital.
Os rostos das pessoas estavam cheios de alegria, raiva, tristeza e felicidade. Iam e vinham apressadas, como se já tivessem esquecido da guerra que ocorrera há tão pouco tempo.
— Aquilo que você disse, você realizou — Ban Hua, montada no cavalo, olhou para o homem belo ao seu lado e sorriu. — Você preservou a prosperidade da capital.
Rong Xia ficou em silêncio ao ouvir aquelas palavras. Um nó subiu à sua garganta.
— Huahua...
— O que foi? — Ban Hua olhou para ele com um sorriso. — Já esqueceu a promessa que me fez?
Rong Xia balançou a cabeça:
— Não esqueci. E não vou esquecer.
Naquela época, ele ainda mantinha algum sentimento pela dinastia Jiang. Só depois que Huahua foi envenenada e sofreu uma tentativa de assassinato, quando sua alma quase partiu, e mesmo assim o imperador Yunqing continuou a proteger cegamente o culpado... ele não suportou mais.
Ninguém da família Jiang era digno de ser imperador. Ele não precisava mais suportar.
Originalmente, achava que levaria pelo menos três ou quatro anos para romper até a capital. Mas o Talismã do Tigre das Três Tropas, dado pela Princesa De Ning, e a habilidade de Huahua em comandar generais e tropas, tornaram-no ainda mais poderoso. O que levaria anos — e talvez acabasse em fracasso — foi realizado em apenas um ano.
Dois ou três anos podem parecer pouco, mas, para o povo, cada instante de guerra significa mais sofrimento, mais mortes.
Ban Hua viu que ele estava imerso em pensamentos. Sem saber o que passava pela cabeça dele, suspirou levemente. Homens inteligentes são bons, mas pensam demais... será que envelhecem mais rápido?
— Chegamos.
As palavras de Ban Hua trouxeram Rong Xia de volta à realidade. Ele percebeu que o local estava tranquilo, com poucas pessoas. Os pavilhões e edifícios eram refinadamente construídos, e muitas portas estavam decoradas com belas lanternas vermelhas. Diante deles, um prédio de madeira exibia uma placa com os dizeres “Pavilhão Huanhua”. O nome era elegante, mas a caligrafia soava um pouco leviana.
Ele franziu o cenho:
— Que lugar é esse?
— Esta é a sede do prédio de assassinos. Provavelmente, ainda não sabem que foram descobertos — Ban Hua saltou do cavalo, apoiando uma mão na cintura, e ordenou aos guardas: — Quebrem tudo. Quanto mais forte, melhor.
— Sim!
Os guardas pessoais de Ban Hua tiraram de suas bolsas de pano martelos, machados, porretes e outras ferramentas, e começaram a arrebentar o portão do Pavilhão Huanhua. Em questão de segundos, o portão entalhado se partiu em pedaços. Um guarda pequeno deu um chute voador na metade restante da porta, fazendo-a voar até atingir o biombo e se despedaçar.
Du Jiu e os guardas pessoais do imperador ficaram boquiabertos com a cena. Era a primeira vez que testemunhavam o verdadeiro espírito de uma dondoca aristocrata.
— Esse movimento se chama ataque preventivo — disse Ban Hua, erguendo o queixo com orgulho. — Foi assim que nossa família destruiu a mansão do Conde de Zhongping.
Du Jiu abriu a boca e a fechou de novo. O método da família Ban era realmente simples e direto, mas... estranhamente satisfatório.
Ban Hua fez tanto barulho que os ocupantes do Pavilhão Huanhua logo foram alertados. Alguns homens de meia-idade saíram com bastões nas mãos, mas, antes que pudessem dizer uma só palavra, já estavam apanhando dos guardas dela. Ban Hua havia trazido muitos soldados. O tal “Mestre Gui” — ou o assassino que se passava por ele — foi incapaz de reagir diante do ataque caótico.
— Ai ai, nobre senhora, que grosseria é essa? — saiu uma mulher vestida de roxo. Embora agora estivesse mais velha, seus traços revelavam que fora uma jovem extremamente bela. — Não sei o que esse pequeno pavilhão fez para ofender Vossa Graça a ponto de provocar tanta fúria...
— Eu simplesmente não gosto da cara do seu prédio. E ele precisa ser destruído para que eu me sinta melhor — disse Ban Hua, erguendo a mão. — Continuem. Não parem.
O sorriso da mulher de roxo quase desapareceu do rosto:
— Minha senhora, o que quer dizer com isso?
— Literalmente — respondeu Ban Hua, empurrando-a. — Não me atrapalhe. Saia da frente.
A mulher de roxo, tomada de raiva pela atitude arrogante de Ban Hua, disse entre dentes cerrados:
— Embora Vossa Graça tenha posição elevada, não deveria abusar dos outros assim. Se continuar com essa bagunça, vou ter que denunciar às autoridades!
— Pode denunciar — retrucou Ban Hua, altiva. — Quero ver quem é que ousa me parar. Você sabe quem é meu pai? Sabe quem é meu marido? Até o prefeito de Jingzhao teria que se ajoelhar diante de mim!
A mulher, que já vira todo tipo de gente no Distrito da Luz Vermelha, nunca tinha visto alguém como aquela — que falava “meu pai”, “meu irmão”, “meu tio” a cada frase. Na maioria das vezes, quem dizia essas coisas não era valorizado pela família. Pessoas realmente poderosas eram discretas. Como poderiam agir como essa mulher, como se temessem que os outros não soubessem de quem eram parentes?
Depois de pensar nisso, o rosto da mulher de roxo ficou ainda mais feio.
— Como mulher, você está causando confusão num lugar romântico como o nosso. Seu marido é um homem decente. Se souber que você veio aqui incomodar gente humilde como nós, temo que nem a cara dele ficará bem vista.
— Sinto muito, meu marido me obedece muito — disse Ban Hua, com um brilho nos olhos típico de quem adorava ser mandona e extravagante. — Não apenas destruí seu prédio, se eu quiser atear fogo, ele ainda me ajuda a carregar a lenha.
Ela se entregou completamente à sensação de poder agir como bem entendesse. Depois de trocar provocações com a cafetina, seus subordinados começaram a destruir o prédio com ainda mais vigor.
Rong Xia, que estava parado do lado de fora, virou-se para Du Jiu:
— Isso é...
— Rua dos Salgueiros Floridos... — respondeu Du Jiu, um tanto constrangido.
De tempos em tempos, ouvia-se o barulho de pancadas e objetos quebrando dentro do prédio, além de gritos femininos. O ambiente era, no mínimo, animado.
Ao ouvirem a confusão, os prostíbulos vizinhos esticaram o pescoço para espiar. Ao verem a multidão em volta do Pavilhão Huanhua, encolheram-se de volta. Deve ser algum homem que não controlou os impulsos e foi pego pela esposa furiosa. Agora veio aqui com seus guardas causar confusão. Quebrem tudo mesmo. Se quebrarem bem, perdem um prédio e, com sorte, um concorrente.
A mulher de roxo, vendo Ban Hua circular por um canto isolado do prédio, não conseguiu mais se segurar. Enfurecida, gritou:
— Minha senhora, isso é demais! Não me culpe por perder a educação!
Mal terminou de falar, mais de uma dúzia de homens fortes armados com facas saltaram do interior do prédio. Tinham olhares assassinos — claramente não eram pessoas comuns.
— Um prostíbulo qualquer ousa portar armas ilegalmente? — Ban Hua riu com desdém. — Finalmente mostraram o rabo de raposa. Guardas, cerquem o prédio! Ninguém sai!
— Sim!
A mulher de roxo notou que o velho que varria o chão, a mulher que cozinhava na cozinha, o criado grosseiro que cuidava das flores... todos se levantaram. Aqueles que antes pareciam humildes e simples, agora estavam ferozes e prontos para lutar.
Eles vieram preparados!, gritou ela em pensamento. Essas pessoas foram contratadas há seis meses... aquela mulher foi inserida aqui há seis meses. Quem é ela, afinal?
A essa altura, a mulher de roxo já sabia que não havia mais volta. Só restava lutar até o fim.
Quando o som de armas colidindo ecoou do interior, o semblante de Rong Xia escureceu. Ele desmontou do cavalo e ordenou:
— Entrem todos e protejam a imperatriz.
— Sim!
Du Jiu, no entanto, achava que não havia com o que se preocupar. Os guardas pessoais da imperatriz estavam entre os melhores. Aqueles assassinos não chegariam nem perto dela.
E ele estava certo. Quando invadiram o prédio, encontraram os guardas da imperatriz já sobre os assassinos, dominando-os com facilidade. Eram mestres de alto nível. Mesmo em menor número, lutavam dois ou três contra um, e os assassinos sequer conseguiam reagir.
Du Jiu olhou para o imperador e fez um sinal para que seus homens avançassem, deixando metade para proteger Sua Majestade.
Em menos de um quarto de hora, todos os assassinos foram presos. Até as cortesãs foram retiradas e enfileiradas conforme altura, peso e aparência.
— Uma organização de assassinos tão famosa escondida bem aqui na Rua dos Salgueiros Floridos... — Ban Hua caminhava entre os assassinos amarrados, dando leves tapas com uma raquete nas cabeças deles —. Fazem qualquer negócio, matam qualquer um. O apoio que vocês tinham caiu, e ainda querem continuar na capital? Acharam que todo mundo aqui era idiota?
Os assassinos, que se gabavam de serem frios e impiedosos, agora pareciam cães acuados. Apanhavam, levavam tapinhas na cabeça e não podiam nem reagir. O quão humilhante era aquilo... nem sabiam como descrever.
Ban Hua sentou-se em uma cadeira.
— Vamos falar: quando o Rei Li se aliou ao Rei Changqing, quem foi que mandou matar o Marquês Cheng An?
Ao ouvir esse nome, os olhos da mulher de roxo brilharam, mas ela permaneceu em silêncio.
— Fale — Ban Hua apontou para ela. — Sei que você não é uma cafetina qualquer, mas a líder do prédio dos assassinos. Qual a sua relação com o Rei Changqing?
Ela cerrou os dentes:
— Não sei do que a senhora está falando.
— Não tem problema se não sabe. O Rei Changqing está preso na masmorra. Quando eu estiver entediada, vou lá brincar com ele um pouco. O que acha?
A mulher tremeu levemente as pálpebras, mas manteve a expressão firme:
— Não conheço esse homem. A senhora pode fazer o que quiser, não tenho nada a ver com isso.
— Já te disseram que suas sobrancelhas e olhos se parecem com os do Rei Changqing?
— Sou apenas uma criada insignificante. Como poderia me comparar com Sua Alteza?
— Claro que pode se comparar. No momento, ele também não passa de um insignificante — Ban Hua brincava com as unhas perfeitamente feitas. — Ele tentou matar Sua Majestade. Mas, quem sabe, se você colaborar, talvez eu fique de bom humor e peça a Sua Majestade que poupe a vida dele. Basta rebaixá-lo à posição de servente de harem.
Havia apenas um tipo de homem servente no harém: os eunucos.
A mulher de roxo finalmente perdeu o controle. Encarou Ban Hua com ódio:
— Quem é você?!
— Eu? — Ban Hua arqueou uma sobrancelha e sorriu. — Seu filho me chama de...
— Quem está causando confusão aqui?! — Zhao Dongan entrou correndo no Pavilhão Huanhua com seus subordinados e viu uma cena caótica: um grupo de pessoas ajoelhadas ou em pé no saguão, cercado por soldados desconhecidos. Estava pronto para repreender, mas engoliu as palavras.
Como tenente de oitavo grau na capital, ele sabia muito bem de uma coisa: a capital está cheia de gente poderosa. E ele não podia se dar ao luxo de ofender ninguém.
— Você é...? — Du Jiu lançou um olhar ao uniforme de Zhao Dong'an. — Tenente distrital?
— Este oficial é Zhao Dong'an, tenente do distrito de Jingcheng. Posso saber quem são vocês e por que estão causando distúrbios aqui? — Zhao Dong'an fez uma reverência com o punho cerrado diante do peito. — Se houver alguma queixa, podem reportar ao oficial. Farei o possível para mediar o conflito. Peço que não usem armas sem autorização. De acordo com os regulamentos da capital, é proibido portar espadas em público. Se for algo leve, a punição é uma multa de um tael de prata.
Du Jiu notou que os ombros do tenente ainda tremiam enquanto falava, mas mesmo assim ele ousava seguir os procedimentos, e respondeu:
— Não se preocupe, Senhor Zhao. Estamos agindo sob ordens e, com certeza, não violaremos os regulamentos da capital.
O “não violar os regulamentos” deixava claro que eles tinham uma posição oficial e estavam autorizados a portar armas. Zhao Dongsheng deu uma olhada no homem e na mulher sentados ali. O homem era de uma beleza impressionante, e a mulher, com trajes de montaria elegantes, era tão deslumbrante que ninguém ousava encará-la diretamente. Essa mulher... parece familiar. Onde já a vi antes...?
Zhao Dongsheng se lembrou de ter conhecido Ban Heng. Dois anos atrás, Ban Heng teve alguém que desmaiou na frente do cavalo dele, e a pessoa foi levada por desconhecidos. Depois disso, ele foi pessoalmente até Zhao Dongsheng para registrar o caso.
— Você é o tenente distrital da capital? — Ban Hua se virou para Zhao Dongsheng e assentiu para ele. — Dois anos atrás, meu irmão mais novo foi até você relatar um crime. Quando voltou, disse que você era um homem íntegro. Parece que era verdade.
Zhao Dongsheng baixou a cabeça, sem ousar encará-la:
— Posso saber quem é o seu irmão?
— O filho mais velho da Mansão Jingting.
Ah, então é o filho mimado da Mansão Jingting...
Espera. O Senhor da Mansão Jingting só tem um filho e uma filha. Se essa mulher disse que o irmão mais novo é o filho mais velho... então ela só pode ser...
Com um baque, Zhao Dongsheng caiu de joelhos diante de Ban Hua.
— Está vendo? — Ban Hua olhou para a mulher de roxo com um sorriso encantador e cheio de malícia. — Eu disse antes que meu pai e meu marido são muito influentes. Acredita em mim agora?
Rong Xia: ...
Du Jiu: ...
Zhao Dongsheng: ...
— É você... então era você — a mulher de roxo finalmente se lembrou de algo. Seu rosto empalideceu de pavor. Tinha medo de que Ban Hua revelasse certos segredos, e mais ainda que o Rei Changqing viesse a saber de certas coisas do passado.
Ao ver o pânico dela, Ban Hua achou a mulher ao mesmo tempo desprezível e digna de pena. Balançou a cabeça e disse:
— Não se preocupe. Se você explicar tudo direitinho, eu não contarei aquilo que você teme que seja contado.
A mulher de roxo ficou em silêncio por um momento, depois contou como fundou o prédio de assassinos, como treinava os matadores, para quem havia feito serviços e como resolvia disputas entre clientes.
Para garantir que Ban Hua não revelasse seus segredos, ela chegou a entregar o registro completo dos nomes.
Ban Hua ordenou que seus guardas pessoais prendessem todos os assassinos e os enviassem à prisão. Quanto às cortesãs que nada sabiam, disse apenas que, se quisessem seguir uma vida honesta, tudo bem. E, se preferissem voltar à profissão antiga, ela também não se importava.
Muitas das cortesãs pensaram que, não importava como seriam suas vidas dali em diante, o simples fato de terem vivido no mesmo prédio onde funcionava uma organização secreta de assassinos — e, acima de tudo, de terem conhecido a imperatriz pessoalmente — já era motivo suficiente para se gabarem pelo resto da vida.
Depois de deixarem o Pavilhão Huanhua, Rong Xia e Ban Hua montaram seus cavalos. Ban Hua olhou para Zhao Dongsheng, que os seguia, e disse:
— Pode seguir o seu caminho.
Ao ver a intimidade entre Ban Hua e o homem bonito ao lado dela, Zhao Dongsheng já tinha adivinhado a identidade do rapaz. Mas, diante de tanta gente, não ousou revelar que se tratava de Sua Majestade. Só pôde conter a excitação em silêncio.
— Huahua — disse Rong Xia, já de volta ao palácio —, aquela líder dos assassinos... ela é a mãe biológica do Rei Changqing?
Ban Hua assentiu em silêncio. Depois de um momento, murmurou:
— O Palácio Changqing é um ninho de confusão, mas eles escondem bem. Por isso, ninguém de fora sabe de nada.
Nem mesmo ela deveria ter sabido.
Até aquele dia, quando sua avó faleceu. Ela foi à Mansão da Princesa Dachang pela última vez, e encontrou uma caixa escondida na árvore oca onde, quando criança, costumava brincar com o avô, guardando ali seus “tesouros”. Dentro, encontrou segredos do clã imperial.
Esses segredos haviam sido deixados especialmente para ela pela avó.
Porque a avó sabia que, um dia, ela com certeza voltaria àquele lugar cheio de lembranças felizes.
133
Rong Xia não esperava que existissem tais segredos no palácio — nem mesmo ele os conhecia.
A Princesa Herdeira de Dening era uma mulher extraordinária e incomparável. Não era de se admirar que tantos jovens e moças da capital se apaixonassem por ela naquela época, chamando-a de a maior beleza de toda a era. Rong Xia pensava que a princesa de Dening fazia jus a essa reputação.
— Huahua — Rong Xia segurou suavemente a mão de Ban Hua —, quero conceder à sua avó o título póstumo de nobre dama imperial.
Ban Hua ficou surpresa por um instante, depois assentiu com um sorriso:
— Está bem.
A avó não se importaria com um título depois de morta, mas ela sim. Ela esperava que o povo, mesmo cem mil anos depois, soubesse que, nos anos finais da dinastia Daye, houve uma princesa realmente notável.
Os livros de história também favorecem os bem-sucedidos e renomados.
— Obrigada. — Ela se aninhou nos braços de Rong Xia, ouvindo os batimentos do coração dele, e lentamente fechou os olhos.
Rong Xia acariciava suavemente o ombro de Ban Hua, com gestos tão delicados como se estivesse tocando um tesouro inigualável do mundo. Ban Hua se aconchegava nos braços dele sem dizer nada. Havia muitas palavras em seu coração, mas, quando estava prestes a dizê-las, sentia que todas eram fracas demais.
Talvez... ele a compreendesse mesmo assim.
Dois dias depois, na cerimônia de pós-entronização, Ban Hua despertou antes do amanhecer.
Lavou o rosto, passou maquiagem.
Cada joia usada era um tesouro difícil de encontrar no mundo. Cada fio de seda que compunha suas vestes havia sido cuidadosamente selecionado. Quando o manto vermelho bordado com dragões e fênix de cauda longa foi colocado sobre o corpo de Ban Hua, todos os servos do palácio presentes ficaram deslumbrados.
Eram todos servidores de alto escalão, acostumados a ver a Imperatriz Viúva Fuping com vestes de fênix, mas jamais haviam presenciado tamanha opulência e beleza. Um traje tão luxuoso, em outra mulher, poderia parecer espalhafatoso e vulgar. Mas, no corpo da imperatriz, era como se tivesse sido feito sob medida.
Não era de se estranhar que o imperador tivesse ordenado pessoalmente que as bordadeiras confeccionassem a roupa com base nas descrições dos livros antigos. Só Sua Majestade compreendia plenamente a beleza da imperatriz.
O manto de fênix já estava posto, mas a coroa de fênix ainda não havia sido usada. Acompanhada por suas damas de honra, Ban Hua subiu na carruagem imperial de fênix em direção ao Salão Zhaoyang. No salão principal, os oficiais e suas esposas estavam organizados por hierarquia, aguardando a chegada da imperatriz.
— A imperatriz chegou!
Doze cânticos foram entoados, ecoando um após o outro dentro do salão. Assim que Ban Hua adentrou o recinto, todos os ministros ordenaram que suas esposas se ajoelhassem para saudar.
— Vida longa à imperatriz, mil anos de vida!
O chão era coberto por oito camadas de brocado vermelho, e os pés de Ban Hua caminhavam sobre ele como se pisasse nas nuvens.
Rong Xia estava no ponto mais alto do salão. Ban Hua percorreu o tapete vermelho, parou diante dos degraus dourados e declarou:
— Saudações, Vossa Majestade.
Rong Xia desceu os degraus, estendeu a mão para ampará-la e disse, diante de todos os ministros e esposas:
— A imperatriz é minha mão, meu pé, metade de mim. Não precisa mais de tanta formalidade.
Um burburinho se espalhou pelo salão. Era exagero demais para um imperador elogiar tanto sua imperatriz em público.
Mas Rong Xia não se importava com a opinião dos ministros. Ele havia se esforçado tanto para chegar ao trono, não para agradar a eles. Virou-se, pegou do tabuleiro sustentado pelo mestre de cerimônias a coroa de fênix, e a colocou pessoalmente na cabeça de Ban Hua.
A coroa de fênix, assim como a coroa imperial, era símbolo de status. Tradicionalmente, em cerimônias de entronização, a coroa da imperatriz era colocada por uma esposa de alta honra, e o selo real também era entregue dessa forma. Nunca antes se registrou um imperador fazendo isso pessoalmente.
Antigos mestres diziam que “o homem é o céu, e a mulher, a terra; o céu é mais alto que a terra”. Como poderia o imperador coroar a própria imperatriz com as próprias mãos? Isso era totalmente inadequado.
Os oficiais encarregados da cerimônia limpavam o suor em segredo. Não haviam previsto esse gesto de Sua Majestade. Voltando-se para a Senhora Zhou, que haviam convidado para a cerimônia, o oficial principal forçou um sorriso:
— Senhora Zhou, o que... acha disso?
— Está ótimo — respondeu ela com um sorriso sereno —. A harmonia entre o imperador e a imperatriz, a prosperidade do dragão e da fênix, é uma bênção para todos nós.
— A senhora tem razão. A prosperidade do dragão e da fênix é sinal de grande auspício.
Nesse momento, se não disserem que é bom presságio, vão dizer o quê?
O selo de fênix e o livro de tesouro foram entregues a Ban Hua pelas mãos do próprio Rong Xia. Com o livro dourado em mãos, Ban Hua olhou para o homem gentil à sua frente e sorriu suavemente.
— Venha. — Rong Xia estendeu a mão diante dela.
Ban Hua piscou e colocou a própria mão na dele.
Rong Xia a conduziu ao ponto mais alto do salão, onde estavam posicionados os tronos de dragão e fênix, e o casal se sentou de mãos dadas.
— Ajoelhem-se!
Os ministros civis e militares ordenaram que as esposas e demais familiares se ajoelhassem e realizassem três prostrações e nove reverências.
Na cerimônia tradicional da dinastia Daye, a entronização da imperatriz era feita separadamente. Os ministros realizavam uma reverência e três prostrações, enquanto as esposas realizavam três reverências e nove prostrações. A norma de que homens e mulheres deveriam reverenciar a imperatriz ao mesmo tempo não existia na Daye. O registro mais recente de algo semelhante era da Imperatriz Chunming, há quase mil anos.
A Imperatriz Chunming, que compartilhou alegrias e adversidades com o Imperador Kaiyuan, estabeleceu as bases para a geração seguinte. Foi amada pelo imperador e respeitada pelos ministros — uma heroína rara nos livros de história.
Contudo, havia outra versão nas histórias não oficiais: a relação entre ela e o Imperador Kaiyuan, nos últimos anos, não era tão boa. Ele chegou a desconfiar dela e até cogitou depor o príncipe que ela havia gerado. Foi graças à oposição dos ministros que abandonou a ideia.
A Imperatriz Chunming serviu como regente de três imperadores. Quando faleceu, seu neto chorou por dias sem parar. Mesmo após vinte e oito dias do luto oficial, ao mencioná-la, ainda se comovia profundamente.
Os cortesãos da corte eram todos versados em história, por isso, ao verem que o imperador insistia em seguir os antigos ritos da Cerimônia de Consagração da Imperatriz Chunming para realizar a entronização da imperatriz, entenderam claramente qual era o lugar que a imperatriz ocupava no coração de Sua Majestade.
Essa imperatriz podia ser considerada uma lenda de sua geração. Nascida em uma família nobre, fora repudiada três vezes seguidas. Quando todos pensavam que sua reputação estava arruinada e que dificilmente conseguiria um bom casamento, ela conheceu Sua Majestade — o homem mais bonito da capital — e ficaram noivos.
Mais tarde, quando Sua Majestade foi punido pelo Imperador Yunqing e rejeitado pelo segundo príncipe que governava interinamente, enquanto todos hesitavam entre o medo e o cálculo, a dama Ban levou um médico pessoalmente à residência do Marquês de Cheng'an.
Aquilo foi empatia, mas também um ato perigosíssimo.
A família Ban não tinha posição real na corte e, se o Imperador Yunqing implicasse com eles, sua vida se tornaria muito difícil. Mas os Ban pareciam teimosos: trataram Sua Majestade — ainda apenas Lorde Hou — com o mesmo respeito de sempre.
É fácil oferecer flores quando tudo vai bem, difícil é dar carvão no meio da neve. Agora entendiam por que Sua Majestade tratava tão bem a família Ban depois de subir ao trono. Se tivessem um sogro que os tratasse da mesma forma, em tempos de glória ou desgraça, também seriam gratos por essa bondade.
Falando nisso, a sorte dessa família era mesmo inexplicavelmente boa. Escapavam de atentados, e mesmo sendo uma família de jovens despreocupados, continuavam vivendo com fartura e prosperidade.
Isso era destino — vontade dos céus. Mesmo que outros invejassem, jamais conseguiriam.
A senhora Zhou voltou discretamente à formação das damas da corte, e a senhora Yin, que estava na mesma fileira, assentiu e lhe sorriu ao vê-la chegar.
Como sogra do imperador, a senhora Yin possuía altíssimo prestígio entre as famílias femininas da corte. Até a senhora Zhou lhe devia alguma deferência. Ao ver o sorriso dela, senhora Zhou retribuiu, inclinando-se levemente, e sussurrou ao seu lado:
— Meus parabéns, madame. Sua filha encontrou mesmo um bom genro.
Ela ainda se lembrava que, três anos atrás, havia sugerido o casamento de Ban Hua com o segundo filho da família Yan. Na época, todos viam esse segundo filho como um tolo, e a família Ban, ainda mais chamativa. Nem mesmo o talentoso e belo segundo filho do primeiro-ministro parecia ser bom o suficiente. Quem diria que o destino brincaria tanto? A família Yan já estava em ruínas, e a família Ban continuava como uma que ninguém ousava provocar.
Se a família Ban tivesse sido um pouco mais cruel na época, ignorando os desejos da filha e a fazendo se casar com o tal Yan Erlang, hoje não teriam sequer um lugar na corte.
Genro que vale ouro... A família Ban havia encontrado mesmo um genro de ouro. Toda casa com filhas invejaria esse discernimento.
— Azar demais não dura para sempre. Três desventuras seguidas... talvez fosse só para guardar a sorte para o final — comentou Yin, sabendo que senhora Zhou queria bajulá-la. Ela sorriu e ergueu os olhos para a filha que, no salão, estava lado a lado com o imperador. O sorriso em seu rosto, porém, era levemente frio. — Não peço muito. Só desejo que ela viva sem preocupações e envelheça ao lado de Sua Majestade.
As sobrancelhas de senhora Zhou se moveram ligeiramente. Abriu a boca, mas preferiu ficar em silêncio.
Uma mulher que se casa com um imperador pode, de fato, viver sem preocupações por toda a vida?
Se Sua Majestade jamais esquecesse o antigo amor, seria o melhor desfecho — com a imperatriz sempre protegida por ele.
Ela sabia disso. A senhora Jingting também devia saber. Mas não podia dizê-lo. E talvez... a senhora Jingting não quisesse mesmo aceitar.
Quando a cerimônia de consagração terminou, começou o grande banquete. Ban Hua trocou a pesada coroa de fênix por um penteado com coque nuvem e vestiu uma saia palaciana Fengxiang dos Nove Céus.
Imperador e imperatriz compartilhavam a mesma mesa. Após beberem três taças junto dos ministros, todos puderam circular com mais liberdade.
Ban Hua massageava discretamente o pescoço, com um pequeno sorriso no rosto, e sussurrou:
— Meu pescoço está torto?
— Ainda está reto, e muito bonito — respondeu Rong Xia, beliscando de leve seu ombro. Ela encolheu a cabeça, sentindo cócegas.
— Não faz isso, tá coçando...
Rong Xia sussurrou em seu ouvido:
— Quando voltarmos, eu te dou uma massagem.
— Só massagem? — Ban Hua o encarou com desconfiança.
Rong Xia lhe devolveu um sorriso muito gentil.
— Animal — murmurou Ban Hua, em voz baixa.
— Só com você que sou um animal — respondeu Rong Xia, fingindo ser sério. — Agora você tem que se responsabilizar por mim.
Wang De, que estava ereto atrás da imperatriz, mantinha o semblante solene, mas por dentro estava em puro tumulto. Quem imaginaria que o imperador e a imperatriz falariam coisas tão... tão descaradas?!
— Pai — Ban Heng, sentado mais abaixo, cochichou com Ban Huai —, ouviu isso?
— O quê? — Ban Huai largou os hashis e tomou um gole de vinho.
— Alguns ministros já estão planejando sugerir a Sua Majestade que aceite um harém.
— Eu acho que esses ministros têm más intenções — rosnou Ban Huai. — Sua Majestade acabou de subir ao trono, mal esquentou o assento do dragão, e já querem que aceite concubinas? O povo vai pensar o quê? Que ele é um tarado apressado?
Ban Heng assentiu:
— Pai tem toda razão!
Vendo a intimidade entre o imperador e a imperatriz, todas as mulheres da corte não escondiam a inveja em seus corações. Casar com o homem mais belo da capital já seria uma sorte... Mas quem imaginaria que esse homem belo se tornaria imperador, e ela, rainha num piscar de olhos?
Quando eram jovens, já não conseguiam competir com Ban Hua. E agora, mesmo após uma troca de dinastia, ainda não conseguiam. Era realmente de fazer inveja.
— Será que as mulheres da família Yang não estão se remoendo de arrependimento? — uma delas comentou em voz baixa, lançando um olhar enviesado para uma jovem sentada ao fundo. — Aquela ali... é da família Yang, né? Nunca imaginei que teria coragem de aparecer num evento desses. Não tem medo de ser vista por Sua Majestade e azedar o humor dele?
— O que ainda há pra se dizer sobre uma mulher dessas? — outra respondeu com um riso sarcástico. — O irmão mais velho de Sua Majestade ainda estava vivo e ela já corria para se casar de novo. Naquela época, muita gente dizia que ela e o tal Chu já estavam juntos antes... só estavam esperando Rong Dalang morrer.
— Isso... não pode ser. Não diziam que a senhora Yang estava grávida na época?
— Naquela época, com Rong Dalang tão doente, dizer se a criança era mesmo dele já era outra história. — a risada da mulher se tornou ainda mais fria. — E vai saber por que ela acabou perdendo essa criança. De qualquer forma, se eu fosse Sua Majestade, jamais esqueceria uma humilhação dessas.
As outras damas da corte se calaram. Afinal, aquilo dizia respeito à vida pessoal da família de Sua Majestade. Falar demais poderia acabar sendo ruim para elas mesmas, caso tais palavras chegassem aos ouvidos do imperador.
Yang não fazia ideia de que estava sendo alvo de cochichos. Sentada no final do salão, ela nem sequer ousava levantar a cabeça. Nunca lhe passara pela cabeça que aquele menino da família Rong, que mal tinha passado dos dez anos, teria coragem de se rebelar e tornar-se o novo imperador.
Seus atuais sogros achavam que ela tinha alguma ligação antiga com Sua Majestade, então insistiram para que ela participasse do banquete no palácio. Mas tudo o que ela sentia era um frio nas mãos e nos pés, sem sequer conseguir encarar a imperatriz.
Ao final do banquete, Yang mal havia tocado na comida. Levantou-se, atordoada, e seguiu o fluxo de pessoas para fora do salão. Só recobrou os sentidos quando ouviu gargalhadas agudas vindo atrás dela.
— Sua Majestade é mesmo muito bondoso com a imperatriz.
— A imperatriz estava lindíssima com aquela veste de fênix, majestosa e deslumbrante.
— Pois é. Com ela ali, nós parecemos uns bolinhos cinzentos.
Yang virou a cabeça. Viu várias damas reunidas, elogiando de todas as formas a imperatriz. Conhecia aquelas mulheres. Quando a família Ban foi investigada por ordem do Rei Li, essas mesmas estavam se deleitando com a queda. Mas agora... todas mudaram de atitude.
Nesse instante, uma mulher passou por ela. Yang não conseguiu se conter e a chamou:
— Senhora Zhao.
Era a esposa de Zhao Zhong. Ouviu dizer que ela tinha bom relacionamento com a imperatriz. Se pudesse encontrar Ban Hua através da recomendação dela, seria maravilhoso.
O que aconteceu no passado... foi sim culpa sua. Mas a morte dos três membros da família Rong era, no mínimo, estranha. Embora não soubesse quem estava por trás, tinha certeza de que não morreram de forma natural.
Ela era apegada à vida, temia a morte, tinha o coração endurecido e sangue frio. Se Sua Majestade quisesse se vingar dela, que fosse. Mas que não ferisse sua família, nem seus dois filhos.
— Quem é a senhora? — perguntou a senhora Zhao, surpresa. Não passava muito tempo na capital e não conhecia bem a família Yang. Viu apenas uma mulher tímida a chamando.
— Sou da família Yang, esposa do neto de Wang Zijue.
A senhora Zhao refletiu por um instante e logo reconheceu:
— Ah... então é a senhora Wang.
Yang se sentiu um pouco constrangida. Inclinou-se para cumprimentar:
— Saudações, senhora Zhao.
— Senhora Wang, não precisa de tanta formalidade — respondeu ela, mantendo uma expressão neutra. — O que deseja?
— Tenho um pedido, e peço humildemente que a senhora aceite.
A senhora Zhao entendeu imediatamente o que ela queria. Sem esperar que Yang abrisse a boca, respondeu direto:
— Acho que entendi suas intenções. Mencionarei o assunto à imperatriz. Agora, se ela vai querer vê-la ou não... isso, infelizmente, não posso garantir.
A senhora Zhao ao menos estava disposta a ajudar, e isso já era mais do que Yang esperava. Agradeceu repetidas vezes, mas Zhao não disse mais nada e logo se afastou, caminhando com Yin e outras damas nobres.
Vendo como eram cercadas por elogios das outras mulheres, Yang não conseguiu evitar de pensar: Se eu não tivesse me apressado para me casar de novo, e tivesse esperado Rong Xia passar pelo pior, será que hoje eu estaria entre elas?
— Irmã Zhao, a senhora Yang queria falar com você agora há pouco? — perguntou a senhora Zhou, olhando para trás, para Yang parada sozinha, e sussurrou: — Ela... é melhor manter distância.
— Obrigada pela preocupação, irmã. Farei isso — respondeu Zhao, com um leve sorriso.
Yin disse:
— Você nunca se mete nesse tipo de situação. Foi a imperatriz quem pediu?
A senhora Zhao ficou surpresa com a precisão da senhora Jingting. Baixou a voz:
— Sua Majestade de fato mencionou isso há alguns dias. Queria saber que tipo de pessoa era a senhora Yang.
Yin balançou a cabeça devagar, sem conseguir conter o suspiro.
— Essa menina ainda é impulsiva demais. Essa tal Yang certamente não é alguém que Sua Majestade deseje ver. Por que insistir em encontrar alguém que já não é bem-vindo?
No Palácio da Grande Lua, Ban Hua estava jogada na cama do dragão, deitada sobre Rong Xia, completamente mole, sem forças... mas com as mãos muito ocupadas, acariciando-o de um lado para o outro.
— Huahua — Rong Xia segurou a mão travessa dela —, ainda está sentindo dor?
Ban Hua piscou, sorrindo:
— Adivinha?
— Eu descubro rapidinho — disse Rong Xia, virando-a debaixo dele, mordiscando-lhe o lóbulo da orelha enquanto murmurava com voz arrastada —, vou massagear pra você, e vai parar de doer.
Essa "massagem" durou mais de meia hora.
Enrolada no edredom, Ban Hua observava Rong Xia se vestir, prender o cabelo e passar a madrugada revisando os relatórios oficiais. Havia algo de divertido naquilo, e ela não conseguiu conter um leve prazer malicioso. Esticou os braços suaves para fora do cobertor e acenou:
— Sua Majestade, bom trabalho!
— Acho que está zombando de mim — disse Rong Xia, ajustando as vestes. Aproximou-se da cama, abaixou-se e beijou-a nos lábios. — Você não disse que ia praticar caligrafia esses dias? Pode vir comigo para o escritório.
— Desde quando se pode confiar nas palavras de uma mulher na cama? — Ban Hua cobriu o rosto com o edredom e se escondeu por completo. — Vai logo, me deixa dormir.
Rong Xia deu um tapinha de leve no traseiro dela por cima das cobertas:
— Sem coração. Suas promessas não valem nada.
Pof.
Um pingente de jade foi arremessado de dentro do edredom — era o que Rong Xia havia deixado cair minutos antes.
— Ei, esse é o meu presente pra você, garota. Vale mil taéis de ouro. Fique com ele.
Rong Xia pegou o pingente de jade que estava no edredom e o amarrou na cintura dela:
— Garota, então esta noite eu volto pra você.
Ao dizer isso, viu o montinho de cobertor se mexer e saiu do quarto sorrindo.
Os empregados do palácio, já acostumados com essas demonstrações de afeto entre o imperador e a imperatriz, diziam que o relacionamento dos dois era estável e completamente natural.
No segundo dia após a Cerimônia da Imperatriz, outro decreto imperial foi emitido. Nele, celebrava-se a oficialização da imperatriz e proclamava-se uma festividade para todo o império. Como comemoração, os impostos nacionais daquele ano seriam reduzidos em 30%.
Por causa dos distúrbios causados pelo Rei Li, o povo havia sofrido bastante. Assim, essa redução de impostos trouxe grande alegria.
Num instante, toda a capital estava elogiando Sua Majestade e a Imperatriz. Uns desejavam vida longa ao casal, outros rezavam para que tivessem filhos e netos piedosos. Em poucos dias, espalhou-se o boato de que a imperatriz era uma fênix dourada enviada ao mundo dos mortais, especialmente para auxiliar Sua Majestade a ascender ao trono. Diziam que, sempre que ele estivesse ao lado da imperatriz, a vitória estaria garantida.
Esse tipo de boato mítico era muito popular entre o povo comum. Já os cortesãos não levavam isso a sério. Afinal, ainda havia quem jurasse que Sua Majestade era um dragão verdadeiro encarnado, e que essa história de dragão e fênix juntos era um velho clichê das lendas.
Histórias tão batidas já nem vendiam mais nas livrarias.
Não demorou muito para que alguns oficiais sugerissem que Sua Majestade, estando em plena juventude e com o harém vazio, deveria recrutar mulheres para servirem como funcionárias do palácio ou concubinas.
De fato, havia pouquíssimas pessoas no harém atualmente. As mais velhas tinham sido dispensadas por Rong Xia, e nenhuma nova havia sido admitida. Com isso, o palácio parecia até meio deserto. Se no futuro o imperador aceitasse concubinas e delas nascessem príncipes e princesas, provavelmente faltaria pessoal para servir.
Os cortesãos não sabiam ao certo o quanto o imperador era apegado à imperatriz, então não ousaram insistir muito. Apresentaram a sugestão de recrutamento tanto de funcionárias quanto de concubinas, deixando margem para negociação.
— O mundo está em paz, e não posso desperdiçar a riqueza do povo — disse Rong Xia com frieza. — Como Filho do Céu, como posso me deixar levar pelos desejos carnais? O povo deve ser sempre o mais importante.
— Sua Majestade é benevolente!
— Sua Majestade é assim... isso é a fortuna de todo o povo!
Os ministros ficaram tão tocados que se ajoelharam para louvar a virtude de Rong Xia. Por ora, ninguém mais teve coragem de mencionar o assunto das concubinas.
Quanto a estar obcecado por mulheres...
O imperador só gostava de ficar colado na imperatriz. Como isso poderia ser considerado obsessão? Era óbvio que se tratava de harmonia conjugal, um sinal de que o imperador amava e respeitava sua consorte. A grande dinastia Da Sheng só tinha a prosperar.
Se Sua Majestade não quis aceitar concubinas agora, que fosse. Sempre haveria uma nova chance no ano seguinte.
Ban Hua estava no aviário do palácio, distraída brincando com um pássaro, quando soube que alguns cortesãos haviam sugerido a Rong Xia que aceitasse uma concubina. Após ouvir o relato da criada, ficou em silêncio por um momento.
— Entendi.
— Sua Majestade — disse Ruyi com cautela —, Sua Majestade jamais faria algo que lhe causasse tristeza.
A imperatriz acariciava a cabeça de um papagaio, que se deixava mimar obedientemente. Ela riu:
— O imperador não aceitou a sugestão, então por que vocês estão com expressões piores que a minha?
Ruyi forçou um sorriso:
— As servas se preocuparam à toa.
Pelo temperamento da imperatriz, era impossível que ela aceitasse dividir o marido com outra mulher. Se agora Sua Majestade não aceita concubinas, será que no futuro também recusará? Quando esse momento chegasse, era certo que surgiriam conflitos difíceis de contornar entre o casal.
— Ruyi, você está comigo há tantos anos... como ainda não me entende? — Ban Hua parou de brincar com o papagaio e pegou um lenço da criada para limpar as mãos. — Eu nunca me preocupo com o que ainda não aconteceu. Pra quê se atormentar antes da hora?
Enquanto Rong Xia a tratasse com sinceridade, ela se permitiria aproveitar em paz. Se algum dia ele mudasse...
Ban Hua olhou pela janela. Um homem vestindo negro acabava de entrar pela porta. Sua presença era imponente, completamente diferente do olhar gentil de quando se conheceram.
O homem ergueu o rosto, e ela, recostada na janela, acenou para ele.
Aquele homem, tão imponente, sorriu com uma beleza impressionante. Certamente, era ainda mais encantador quando o conheceu pela primeira vez.
Se aquele dia realmente chegar, pensou, os sentimentos desses anos não podem ser negados.
Se ele fosse cruel, ela soltaria a mão. Ainda havia muitas belezas no mundo. Se ele tomasse uma concubina, ela arranjaria um amante. Ninguém ficaria devendo nada a ninguém.
— No que está pensando? — Rong Xia aproximou-se da janela e beijou a testa dela.
— Estava pensando... em como fazer as coisas de forma justa.
— Justa? — Rong Xia não entendeu o raciocínio e, como um jovem travesso, se jogou pela janela para dentro. — Comigo aqui, Huahua não precisa falar em justiça com mais ninguém.
Esse gesto foi tão inesperado que assustou os criados. Alguns quase pularam pela janela para se jogarem no chão sob os pés do imperador.
Ao ver Rong Xia daquele jeito, Ban Hua caiu na gargalhada.
— Bom.
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— Um imperador majestoso ainda se comportando como um jovem que sobe pelas janelas... — Ban Hua apertou a cintura de Rong Xia com uma mão — Não sente vergonha?
— Sorriso para conquistar a beleza. — respondeu Rong Xia com naturalidade. — Se não quiser que eu suba pela janela, é só me deixar subir pela parede.
Ele olhou ao redor do aposento, onde havia muitas gaiolas penduradas — a maioria vazia. Durante um tempo, o palácio teve o costume de criar pássaros bonitos e inteligentes, porque sabiam que Ban Hua gostava. Mas depois que o Imperador Yunqing adoeceu e Jiang Luo assumiu o poder, esse costume foi abandonado. Jiang Luo não gostava de aves, e os criados passaram a negligenciá-las. Muitos morreram de fome e doença. Quando Rong Xia e Ban Hua entraram no palácio, restaram apenas alguns.
— Se você quiser, posso mandar procurar alguns interessantes para lhe trazer — disse Rong Xia, observando os pássaros que, mesmo com a gaiola aberta, não sabiam mais voar. Estavam estupidificados pelo confinamento.
— Não precisa — Ban Hua balançou a cabeça, acariciando um papagaio verde de aparência boba. — O que vem de cima deve passar por quem está embaixo. Não vou incomodá-los com isso. Além disso, essas criaturinhas já servem bem para divertir um pouco. Não é preciso levar tão a sério.
Rong Xia se lembrou subitamente dos tubérculos assados que comeram em Zhongzhou.
— Hua Hua, lembra dos inhames que comemos em Zhongzhou?
Ban Hua assentiu:
— Lembro. Por quê?
— Quero que tentem cultivá-los nas terras imperiais. Se a produção for alta, pode trazer enormes benefícios ao povo do nosso Grande Vencedor — ele se aproximou da gaiola ao lado e, imitando o tom que Ban Hua usava, disse a um passarinho — Quando a primavera chegar, vou enviar embaixadores para explorar outros países. Se encontrarem culturas diferentes e puderem trazê-las de volta, será algo que beneficiará gerações futuras.
— Embora eu não entenda muito disso — disse Ban Hua com os olhos brilhando —, sempre ouvi meus antepassados dizerem que o mundo é imenso, e que há muitas coisas que nunca vimos. É uma ideia excelente, Sua Majestade.
Rong Xia pensava que apenas Ban Hua o apoiaria numa ideia tão audaciosa. Os cortesãos e o povo de Daye acreditavam que seu país era o mais forte e poderoso de todos, e desprezavam os pequenos reinos vizinhos. Talvez porque eles fossem realmente pobres e atrasados, o que só aumentava a arrogância dos de Daye.
A mente do povo era simples. Não tinham visto o suficiente do mundo, então essa arrogância não era surpresa. Mas se os ministros também partilhassem dessa presunção... aí seria um problema.
Um imperador não pode ser arrogante.
Um dos dois pensava em como beneficiar o povo. A outra estava animada com o desconhecido. Propósitos diferentes, mas uma conversa agradável.
Eles pegaram um mapa e começaram a especular, com base nos climas das diversas regiões de Daye, como seriam os climas além das fronteiras, que povos e países poderiam existir além-mar.
No fim da conversa, os dois concluíram que, para navegar pelos mares, precisariam de navios fortes e armamento de defesa contra ilhas hostis — para, assim, fortalecer o prestígio nacional de Daye.
— Tudo custa dinheiro — disse Ban Hua, deitada sobre a mesa — Parece que teremos de avançar passo a passo.
— Você tem razão — Rong Xia olhou para um ponto invisível do mapa astronômico — Sem pressa. Vamos passo a passo.
— Sua Majestade — Wang De entrou no estúdio imperial, vendo o casal concentrado diante do mapa. Curvou-se e anunciou: — O salão principal foi completamente redecorado.
Rong Xia ergueu uma sobrancelha e disse:
— Que o pessoal do Observatório Imperial aproveite bem. Depois disso, eu volto a me mudar para lá.
— Sim.
Wang De hesitou um instante e depois disse:
— Há algo que ainda não relatei a Vossa Majestade.
— Diga — Rong Xia ergueu o olhar. Percebeu que Wang De lançava olhares discretos a Ban Hua. Bateu os dedos sobre a mesa. — Se tem algo a dizer, fale logo.
— Quando o Imperador Yunqing estava gravemente doente, ele mencionou uma coisa a este servo. Disse que, caso morresse, deixava uma ordem imperial a ser entregue.
— Que ordem?
— Uma ordem para conceder à Imperatriz o título de princesa.
— O que disse? — Ban Hua olhou para Wang De, incrédula. — Princesa?
— Sim — Wang De engoliu em seco — O Imperador Yunqing disse que Vossa Majestade possui tanto talento quanto virtude, além de uma aparência extraordinária. Disse que haveria muitas mulheres apaixonadas por Vossa Majestade, e... se o senhor mudasse de ideia algum dia, ele desejava ao menos garantir à senhora uma posição de prestígio.
Ban Hua ficou paralisada por um momento antes de recobrar os sentidos:
— Onde está esse decreto?
— Por favor, aguarde um momento. Este servo irá buscá-lo agora.
Logo, Wang De voltou trazendo uma caixa dourada. Ban Hua pegou a caixa e retirou de dentro o edito imperial. A caligrafia estava trêmula — afinal, fora escrita por um imperador gravemente enfermo.
O documento enumerava detalhadamente as qualidades de Ban Hua e concedia-lhe o título de Princesa Changle.
Seus sentimentos por Yunqing eram confusos. Na infância, o via como um primo próximo. Depois, à medida que crescia, começou a suspeitar de certas verdades. Quando agia, havia uma mistura de sinceridade e encenação.
Após ler o edito por um longo tempo, Ban Hua o devolveu à caixa e fechou a tampa com um clique.
As mágoas e ressentimentos do passado, junto da partida daqueles que se foram, finalmente se dissipavam com o tempo.
Ela entregou a caixa de volta a Wang De:
— Quando será o sepultamento?
Embora o Imperador Yunqing fosse o soberano de Daye, diante do povo, ele havia tratado Rong Xia e Ban Hua com equidade. Por isso, mesmo com o fim da dinastia Jiang, Rong Xia ordenara que o sepultamento seguisse todos os rituais de um imperador.
O mausoléu fora iniciado assim que Yunqing subira ao trono e já estava pronto há anos. Agora só faltava escolher a data adequada para o enterro.
— Vossa Majestade — respondeu Wang De —, será no oitavo dia do próximo mês.
— Huahua? — vendo que Ban Hua estava com a expressão pesada, Rong Xia se aproximou para abraçá-la com carinho, acariciando-lhe as costas, tentando acalmar sua tristeza.
— Estou bem — Ban Hua balançou a cabeça, envolvendo a cintura de Rong Xia com os braços. — Só não esperava por isso...
Não esperava que o afeto do Imperador Yunqing por mim fosse maior do que eu imaginava.
No oitavo dia do décimo primeiro mês, no primeiro ano de Cheng’an, o Imperador Yunqing — o penúltimo imperador da Dinastia Daye — foi sepultado. Embora tivesse criado um imperador deposto e um príncipe deposto, o novo imperador fundador de Daying não rebaixou os ritos fúnebres, chegando até a comparecer pessoalmente ao enterro, o que provocou novamente os elogios de inúmeros súditos.
O príncipe deposto, agora Príncipe He, caminhava à frente da procissão fúnebre com semblante abatido, vestindo luto.
O glorioso Imperador Yunqing encerrou sua vida esplendorosa no instante em que os portões do mausoléu se fecharam. A procissão partiu levando o carro cerimonial de jade, deixando apenas o lamento e o príncipe solitário diante da entrada.
Seus filhos concubinos, temendo ofender o novo imperador, não ousaram permanecer nem por mais um instante. O segundo filho ainda estava preso, e apenas o primogênito teve coragem de ficar ali diante do túmulo.
O frio já era intenso na capital em novembro. Diante das palavras gélidas gravadas na lápide, o Príncipe He ajoelhou-se e prostrou-se três vezes diante do túmulo.
— Primo. — Ban Hua hesitou por um momento ao ver que o Príncipe He ainda não havia se levantado. Aproximou-se para verificar e encontrou os olhos dele vermelhos, com lágrimas correndo pelo rosto.
Após ajudá-lo a enxugar o rosto, o príncipe se levantou e a saudou com respeito:
— Saudações à Imperatriz.
Com o vento frio soprando, Ban Hua lhe estendeu um manto:
— O vento de outono está gelado. Cuide-se, primo.
Ele hesitou por um instante, segurou o manto, mas não o vestiu. Ban Hua entendeu suas preocupações, então desviou o olhar com um sorriso:
— Está se adaptando bem à nova residência?
— Se for para responder à Sua Alteza, está tudo bem.
Ban Hua assentiu devagar e suspirou:
— Que bom.
Ela ajeitou a tira do próprio manto, olhou ao redor e viu que, além dos guardas à distância, não havia mais ninguém.
— O vento está forte, Alteza. Deveria voltar ao palácio mais cedo — disse o Príncipe He, lembrando que todo o poder da corte estava nas mãos de Rong Xia. Os parentes da dinastia anterior não poderiam ajudar Ban Hua, apenas trazer desconfiança de Rong Xia sobre ela.
— Não se preocupe, avisei Sua Majestade antes de ficar — Ban Hua sorriu, com um toque de alívio no olhar. — Pensei que meu primo fosse me culpar.
O príncipe herdeiro a tratara com gentileza, e ela ajudara Rong Xia a rebelar-se. Se fosse o contrário, ela também guardaria rancor.
— Antes de minha mãe partir para outro palácio, contou-me tudo — disse o Príncipe He, com uma expressão que misturava culpa e alívio. — O Marechal Ban...
O vento levantou a saia branca de Ban Hua, suas pálpebras tremularam como uma borboleta assustada.
— Isso não tem nada a ver com você, primo. Não precisa se sentir culpado.
— Então o que a decisão de Sua Majestade tem a ver com a Imperatriz? — O Príncipe He sorriu com gentileza, como o jovem amável de outrora. — Eu não fui feito para ser imperador. Os fardos deste mundo são pesados demais, e eu sou indeciso. Se subisse ao trono, não conseguiria dar paz ao povo. Sua Majestade é diferente. Sempre foi mais capaz do que eu, com visão mais clara. Nenhuma dinastia dura mil anos, a troca de poderes é a lei do céu. Aconteceu de ser minha vez.
Dizendo isso, sua expressão tornou-se estranhamente calma. Sorriu para Ban Hua:
— Alteza, não leve isso a mal. O que o povo precisa é de Sua Majestade, não de alguém como eu.
Ban Hua sorriu, mas os olhos se tornaram úmidos. Virou o rosto:
— Primo... volte.
— Está na hora de voltar. — O Príncipe He tocou a lápide gelada. — Alteza, vá na frente. Quero ficar aqui mais um pouco.
— Está bem — Ban Hua assentiu. — Como não trouxe guardas, deixarei alguns para acompanhá-lo. Cuidado no caminho.
O Príncipe He sorriu, curvou-se e disse:
— Despeço-me da Imperatriz.
Ban Hua parou, virou-se e disse:
— Primo, somos da mesma família. Quando estivermos em particular, não precisa tanta formalidade comigo.
O sorriso no rosto do Príncipe He se abriu um pouco mais, mas ele balançou a cabeça com firmeza:
— As formalidades não podem ser esquecidas. Alteza, o palácio é um lugar complicado, onde poder e desejo se entrelaçam. Precisa tomar cuidado. No harém, não pode ser benevolente demais. Os velhos da corte anterior... é melhor esquecê-los de vez.
Ban Hua piscou, sufocando a amargura no coração, e sorriu com arrogância:
— Eu sou quem eu sou. Seja na corte ou no harém, jamais viverei suportando injustiças. Se tiver que contrariar minha vontade em todos os cantos, prefiro morrer. A bondade do primo, Huahua entende, mas esquecer ou não, lembrar ou não, isso só cabe a mim decidir!
— Adeus.
Vendo aquela mulher bonita de pele escura montar o cavalo e partir com imponência, o Príncipe He permaneceu ali ao lado do túmulo. Só depois de um longo tempo, riu alto.
Essa é Huahua. Essa é a minha Huahua.
Ele sacudiu o manto em suas mãos e o vestiu. Não era grosso, mas parecia proteger até o coração mais gelado.
Durante o sepultamento do Imperador Yunqing, o povo foi proibido de consumir álcool e carne por vinte e sete dias. Ban Hua cavalgava pelas ruas, observando o povo ainda rindo e conversando. Retirou o manto e o chapéu, e disse ao guarda que a seguia:
— Esse povo... se contenta com pouco.
O guarda sorriu:
— Senhora, não se demore. Sua Majestade ainda a espera para o jantar.
Ban Hua sorriu e, ao virar-se, viu uma criança de dois ou três anos que havia caído não muito longe do cavalo. O pequeno era rechonchudo e redondinho. Ela desmontou com um salto.
No instante em que tocou o chão, uma flecha passou voando por sua cabeça. Ela não se feriu, mas uma mecha de seu cabelo foi cortada.
Se não tivesse descido do cavalo naquele momento, a flecha teria atravessado seu peito. Nem um deus a salvaria.
— Há assassinos!
— Fechem os portões da cidade!
Ban Hua abaixou-se, olhando para os fios de cabelo no chão. Seu rosto escureceu como tinta.
Esse é o meu cabelo... cuidado como cetim desde a infância!
Naquele dia, mesmo com o funeral do Imperador Yunqing, a rua foi liberada depois que Rong Xia voltou ao palácio. O povo, trancado por tanto tempo, mal podia esperar para sair e trocar as novidades com os vizinhos. Numa multidão dessas, se alguém quisesse atacar... ninguém notaria.
No entanto, os métodos daquele assassino não eram muito sofisticados — ou então ele estava decidido a morrer —, pois, quando os guardas o encontraram, ele permaneceu na casa, sem sequer tentar se esconder.
O guarda trouxe o assassino até Ban Hua. Ao ver que o homem tinha uma aparência refinada e era da mesma idade que o príncipe, Ban Hua arqueou as sobrancelhas e disse ao guarda:
— Vá imediatamente montar guarda no portão do palácio. Se vir Sua Majestade sair, tem que detê-lo a todo custo.
— Sim! — respondeu o príncipe, apressando-se.
Ban Hua lançou um olhar em volta e disse com frieza:
— Investigação. Essa pessoa certamente tem cúmplices.
Se o assassino errasse o alvo e, mesmo assim, esperasse calmamente ser encontrado pelos guardas, provavelmente queria que ela o interrogasse ali mesmo. Pois, diante da raiva e do medo, as pessoas tendem a agir impulsivamente, sem se importar com o momento ou o lugar.
Dado o quanto Rong Xia a valorizava, ao ouvir que ela sofrera um atentado, ele certamente sairia correndo do palácio — e os assassinos escondidos dos dois lados da estrada aproveitariam esse momento para atacá-lo.
Com isso em mente, Ban Hua nem sequer olhou para o homem ajoelhado no chão. Montou o cavalo, ergueu o chicote e disse aos guardas:
— Todos, venham comigo!
Foi nesse momento que a habilidade dos guardas que cresceram ao lado de Ban Hua se revelou. Eles sabiam exatamente do que a senhora precisava e como agir para acompanhá-la. Em comparação, os guardas imperiais estavam sempre meio passo atrás.
— Sua Majestade! — Um guarda entrou apressado no Palácio da Grande Lua. — Sua Majestade, tentaram assassinar a imperatriz!
Rong Xia, que acabara de trocar as roupas por vestes simples, ergueu-se com o rosto pálido:
— Como ela está?
— Sua Majestade está bem!
— Preparem meu cavalo!
— Por favor, pense duas vezes — Wang De se adiantou ao ver Rong Xia prestes a cavalgar para fora do palácio. — Vossa Majestade não pode se arriscar assim!
— Saia da frente — Rong Xia empurrou Wang De sem sequer olhar para trás e saiu do Palácio da Lua.
Du Jiu, que guardava a entrada, imediatamente o seguiu ao perceber sua intenção.
Apesar de ser um erudito, Rong Xia era excelente em equitação e arco. Os criados do palácio, no entanto, estavam apavorados: o que havia acontecido para que Sua Majestade saísse cavalgando daquele jeito?
Ninguém ousou perguntar. Apenas se tornaram mais atentos em suas tarefas.
Os guardas enviados por Ban Hua estavam de prontidão no Portão de Suzaku e, ao ouvirem o som de cascos, gritaram:
— Sua Majestade! Há um aviso urgente!
Mas dezenas de cavaleiros passaram sem parar.
O guarda pessoal de Ban Hua ficou atônito. Ao perceber que Sua Majestade estava prestes a sair com os guardas imperiais, rapidamente montou e saiu em perseguição, gritando:
— Sua Majestade! Sou o guarda pessoal da imperatriz! Tenho uma mensagem urgente!
Diferente de Rong Xia, que estava tomado pela ansiedade, Du Jiu prestava mais atenção ao redor. Ao ouvir o grito, olhou para trás e pensou:
Aquele ali... não é um dos homens da imperatriz?
— Sua Majestade, espere! São os guardas da imperatriz!
Rong Xia puxou as rédeas. O cavalo relinchou alto, erguendo as patas dianteiras com força, e parou.
Ao ver que Sua Majestade finalmente parara, o guarda pessoal quase chorou de alívio. Sua Majestade é famoso por seu talento, mas por que cavalga tão bem? Eu cresci entre cavalos e quase não consegui alcançá-lo...
— Sua Majestade! — disse o guarda, ofegante, curvando-se diante de Rong Xia. — A imperatriz ordenou que Vossa Majestade não saísse do palácio. É uma armadilha para Vossa Majestade!
O rosto de Rong Xia estava gelado como gelo:
— Como está a imperatriz?
— Não está ferida, mas... está de muito mau humor.
Rong Xia olhou para o portão do palácio atrás de si, depois para o caminho que levava para fora, e apertou as rédeas com força:
— De mau humor?
— Porque... seu cabelo foi cortado — respondeu o guarda, um pouco constrangido. — Vossa Majestade, talvez a imperatriz não fique de bom humor nos próximos dias. Por favor, seja paciente.
Rong Xia sabia o quanto Huahua se importava com sua aparência, especialmente com o cabelo, que sempre cuidara com tanto zelo. Se realmente tivesse sido cortado...
Ele pigarreou:
— O pessoal do Yamen e da Divisão de Infantaria já foi mobilizado?
— Vossa Majestade pode ficar tranquilo. A rua inteira está cercada como um barril de ferro. Nenhuma pessoa suspeita escapará.
— O cabelo da imperatriz... caiu muito?
O guarda pessoal: ...
Ban Hua vinha cavalgando com os cabelos soltos, a expressão sombria e o ritmo acelerado. Aquilo tudo emanava uma frieza arrebatadora.
Ela não disse uma palavra no caminho inteiro. Só quando viu Rong Xia esperando obedientemente diante do portão do palácio, com os guardas ao seu redor, sua expressão aliviou um pouco.
Mas mesmo assim, Rong Xia e seus guardas não puderam evitar de recuar um passo ao ver Ban Hua se aproximando a galope.
— Sua Majestade, Sua Majestade — disse Du Jiu, num sussurro quase tremido —, parece mesmo que a imperatriz está muito... muito irritada.
Rong Xia lançou-lhe um olhar:
— Você acha que eu não sei?
Du Jiu pensou: Ah, desde que saiba...
Antes mesmo que o cavalo parasse por completo, Ban Hua pulou da sela. Seus cabelos longos esvoaçavam como uma cascata ao vento.
Toque, toque, toque.
Ela caminhou rapidamente até Rong Xia. Ele segurou sua mão antes que ela pudesse se curvar.
— Huahua, você está bem?
— Nem tanto — respondeu Ban Hua, com a expressão fechada. — O assassino maldito teve a audácia de cortar o meu cabelo!
— Onde? Deixe-me ver — Rong Xia estendeu a mão e tocou o topo da cabeça dela, depois a rodeou devagar. — Está lindíssima, não vejo nada de errado.
Bem, havia sim uma mecha atrás que parecia mais curta do que o resto...
Mas ele não disse isso.
— Sério? — Ban Hua se acalmou um pouco e passou a mão pelo cabelo atrás da cabeça, desconfiada. — Não dá pra notar?
— Não dá! — Rong Xia assentiu com firmeza. — Além do mais, Huahua é tão linda que, mesmo sem cabelo, ainda seria cem vezes mais bonita do que qualquer outra mulher.
— Que absurdo. Sem cabelo, como é que eu vou usar aqueles acessórios maravilhosos? — Ban Hua revirou os olhos para ele, mas sua expressão já estava bem melhor. Virando-se para Du Jiu, ordenou:
— General Du, você cuidará pessoalmente disso. Leve seus homens e também os que serviram comigo e com Sua Majestade no passado.
Ela não podia confiar em outros por enquanto.
— O último general obedece.
— Volte comigo primeiro — disse Ban Hua a Rong Xia. — Aqui não é lugar pra conversar.
— Não está mais brava? — Rong Xia segurou sua mão enquanto os dois entravam pelo Portão de Suzaku. — Me diga o que aconteceu.
Ban Hua contou tudo que havia ocorrido, incluindo suas suposições. Mesmo que o barco esteja podre, ainda restam três quilos de pregos. Jiang Luo estava preso, mas se alguém tentasse matar Rong Xia para colocá-lo de volta no trono, não seria impossível.
Rong Xia assentiu:
— Você acertou.
Mas os suspeitos não se resumiam apenas a Jiang Luo... havia também o príncipe deposto.
De volta ao Palácio da Grande Lua, Ban Hua arrumava os cabelos diante do espelho. Rong Xia se aproximou, esfregou suavemente o topo da cabeça dela:
— Por quê? Não acredita no que eu disse?
— É justamente porque você acha que tudo em mim é bom que eu não consigo acreditar no que você diz — resmungou Ban Hua, vendo Rong Xia se afastar novamente, e virou o rosto, ignorando-o.
Clac.
Ela ouviu um som de algo sendo cortado atrás de si e, ao se virar, viu Rong Xia segurando uma tesoura e uma mecha de cabelo. Todos os criados no salão se ajoelharam de susto.
— O que está fazendo?! — Ban Hua arrancou a tesoura da mão dele. — Por que está cortando o cabelo do nada?
— Não combinamos que dividiríamos alegrias e dores? — Rong Xia colocou a mecha de cabelo nas mãos dela e sorriu. — Está se sentindo menos desconfortável agora?
Ban Hua apertou com força a mecha entre os dedos, levou a mão até a cabeça dele e tocou o local onde faltava o cabelo, com o coração apertado:
— Não... agora me sinto ainda pior.
Ele não ligava de perder sua beleza assim, mas ela se importava.
Rong Xia a puxou para os braços e riu baixinho:
— Tola da minha Huahua...
Wang De fez um sinal com os olhos para os demais criados, e todos deixaram o salão silenciosamente.
— O que aconteceu hoje — disse Wang De com frieza, voltando-se para o grupo — não pode ser comentado. Se vazar qualquer informação... não precisam mais viver.
— Sim! — responderam todos, assustados. Para servir junto à imperatriz, a discrição era o mínimo exigido.
Ban Hua se aninhou no peito de Rong Xia, olhando a mecha de cabelo em sua palma. Apesar da dor no coração, um leve sorriso brotou em seus lábios.
Ainda bem que ele é o imperador que liderou a rebelião com sucesso... mas quando se trata de consolar uma mulher, seu jeito ainda é completamente idiota.
Du Jiu vasculhou a capital e, por fim, localizou todos os assassinos escondidos. A identidade deles surpreendeu até Du Jiu: alguns eram arqueiros de elite que já haviam servido sob ordens do Imperador Yunqing; outros, antigos mestres do Palácio do Leste.
Será que... foram enviados pelo Príncipe He?
Embora todos os capturados insistissem que eram remanescentes de Jiang Luo, Du Jiu não acreditou nem por um instante. Se tivessem falhado na missão e logo entregassem o mandante, isso contrariaria completamente o comportamento típico de um assassino.
Se assassinos do mundo todo fossem tão falantes assim, o termo "confissão sob tortura" nem existiria.
Du Jiu levou os depoimentos a Rong Xia, que os folheou rapidamente e depois os jogou de lado.
— Escolha alguns e leve-os ao palácio junto com o príncipe.
— Sua Majestade... — Du Jiu hesitou ao olhar para Rong Xia. — Deveríamos informar a imperatriz sobre isso?
O silêncio caiu sobre o Estudo Imperial.
Depois de um longo tempo, Rong Xia suspirou:
— Se a imperatriz perguntar, pode responder tudo. Se não perguntar... então não precisa contar.
Ele sabia que Huahua ainda tinha algum carinho pelo príncipe deposto. Se ela soubesse que ele enviou alguém para matá-la e usá-la para atraí-lo ao perigo... isso a deixaria profundamente triste.
— O subordinado compreende.
Du Jiu retirou-se em silêncio.
Rong Xia olhou para a mesa abarrotada de memoriais e soltou um longo suspiro. Ele havia decidido poupar a vida do príncipe. Mas se o outro fosse tão insensato assim... então não haveria como culpá-lo.
135
— Princesa, o príncipe está aqui.
Shi cobriu a boca e tossiu algumas vezes:
— Eu ouvi.
Ele entrou no aposento junto com o príncipe e, ao ver que o rosto de Shi estava pálido, parou por um instante, prestes a se virar para ir embora. Perguntou:
— Você chamou o médico imperial?
Era tarde da noite. Ele hesitou por um tempo, mas decidiu ir vê-la. Embora não concordasse com muitas das ações de Shi atualmente, afinal, os dois haviam compartilhado o mesmo leito por muitos anos. Ele não podia simplesmente tratá-la como se não fosse nada.
— O corpo da concubina está bem... o que me preocupa é... o príncipe. — Shi lançou um olhar para a capa que ele usava, uma que ela jamais tinha visto antes.
— Se está tudo bem, melhor assim.
O aposento caiu em silêncio. Entre o príncipe e Shi já não havia mais o que dizer. O Príncipe He sabia que não era a ele que Shi queria se casar, mas sim ao príncipe, ao futuro imperador. Agora, ele era apenas o último príncipe remanescente, sobrevivendo sob a administração da nova dinastia — não era mais o homem que ela desejava.
Ao ver a atitude indiferente do príncipe, Shi sentiu uma leve mágoa no coração. Desde que se casara com ele, ninguém mais a elogiava por ser digna e virtuosa. E agora, separados, ela se via tentando calcular cada passo… mas para quê, afinal?
Marido e mulher por um dia, cem dias de afeição. Estavam casados há tantos anos... será que nem essa afeição restava?
Contudo, a personalidade de Shi sempre foi firme. Por mais insatisfeita que estivesse por dentro, não diria nada diante dos criados.
— Princesa! — Um criado entrou correndo com expressão alarmada, nem ao menos notando a presença do príncipe no canto do aposento. — Princesa, não conseguimos comprar o que a senhora pediu!
— O que você disse?! — Shi se levantou de súbito e foi até o servo. — Você não tinha dito que era seguro?
— O dono da loja foi astuto demais. Não esperávamos isso... e agora? O que vamos fazer?! — Os criados ajoelharam no chão, as expressões mais apavoradas do que a de Shi. Se aquilo fosse descoberto, a morte deles seria certa.
Shi ficou paralisada por um momento, depois se lembrou de que o Príncipe He ainda estava no canto da sala. Abriu a boca, querendo dizer algo, mas aquele assunto era sério demais para ser dito em voz alta.
O príncipe percebeu pelo semblante dela que algo grave havia ocorrido — algo que ele desconhecia. Ao pensar que Shi talvez tivesse feito algo imprudente pelas suas costas, ele inspirou fundo e perguntou:
— O que aconteceu?
— Príncipe, eu... — Os ombros de Shi tremiam levemente. Ela baixou os olhos, sem ousar encarar o olhar dele.
— Sua Majestade ordenou que o Príncipe Xuanhe entre no palácio.
Ao ouvir esse anúncio, Shi sentiu as forças desaparecerem do corpo e caiu sentada no chão, completamente pálida.
— Diga! O que você fez?! — O príncipe agarrou seus ombros, olhando-a com severidade, como se quisesse arrancar a resposta à força.
Shi balançou a cabeça, apavorada, até desabar em lágrimas.
— Príncipe He — Wang De entrou no aposento, ignorando Shi que chorava no chão, e declarou com o rosto inexpressivo: — Sua Majestade ordena que o Príncipe Xuanhe vá imediatamente ao palácio.
Príncipe He soltou os ombros de Shi, levantou-se e endireitou as vestes:
— Este ministro recebe o decreto.
No Palácio da Grande Lua, Ban Hua mandava a criada pentear seus cabelos novamente. Após se certificar de que os fios quebrados estavam bem escondidos, seu humor nublado enfim clareou.
— Vossa Majestade, esse coque de fada voadora ficou realmente lindo — disse Ruyi, segurando o espelho para que Ban Hua visse o penteado. — Parece uma daquelas deusas das pinturas nos murais.
— Sua língua continua doce como sempre. — Ban Hua se levantou, olhou para o céu avermelhado refletido pelo pôr do sol e saiu do salão interior para passear pelo jardim imperial.
Assim que cruzou os portões do palácio, viu Wang De conduzindo o príncipe na direção do Estudo Imperial. Franziu o cenho, virou-se e disse às criadas atrás de si:
— Esperem aqui. Vou dar uma olhada.
— Vossa Majestade — chamou Ruyi —, não vai visitar o Jardim Imperial?
Ban Hua sorriu:
— Vou morar neste palácio por décadas. Quando quiser ver, é só ir. Além disso, está escurecendo, e não há muito o que se ver agora.
Sem argumentos, as criadas curvaram-se e se retiraram.
O Príncipe He seguiu Wang De até o salão interior e viu Rong Xia sentado diante da escrivaninha imperial. Curvou-se respeitosamente.
Normalmente, Rong Xia já teria dispensado as formalidades. Mas hoje, ele permaneceu em silêncio, apenas observando o outro como se o avaliasse — ou pesasse algo em sua mente.
O silêncio durou um bom tempo até que Rong Xia finalmente disse:
— Sente-se.
A disposição do Estudo Imperial não havia mudado muito, mas cada objeto lá dentro era novo. Para o Príncipe He, aquele era um lugar familiar e ao mesmo tempo estranho. Ele juntou as mãos em saudação e perguntou:
— Não sei por que Sua Majestade me convocou?
Rong Xia pousou o livro que segurava e sorriu levemente:
— O príncipe entendeu os preceitos da retidão e foi capaz de me ceder o trono. Sou muito grato por isso. Desde que subi ao trono, nunca ousei tratá-lo com desconsideração. Se houver qualquer falha minha, por favor, aponte.
O Príncipe He sentiu que havia algo de estranho nas palavras de Rong Xia. Levantou-se e curvou-se novamente:
— Sua Majestade tem me tratado muito bem. Não tenho nenhuma queixa.
— Se o príncipe não tem queixas, por que então enviou alguém para assassinar minha imperatriz? Por que usou a imperatriz como isca para me atrair?! — Rong Xia lançou a xícara de chá contra o chão com violência. Era a primeira vez que ele se mostrava sem reservas, perdendo completamente a compostura diante de outros. — Mesmo que eu tenha tomado seu trono, mesmo que esteja ressentido, ainda assim... jamais deveria ter tocado em Huahua!
O Príncipe He olhou para ele, atônito.
Huahua foi assassinada?!
— Hua... a imperatriz foi atacada?! — exclamou, alarmado. — Como ela está agora?
Rong Xia o encarou com desprezo e riu friamente:
— É agora que o senhor se lembra da amizade entre Huahua e seu irmão? Este mundo já está em minhas mãos. Se não fosse por consideração a Huahua, acha mesmo que eu teria poupado sua vida? Que lhe daria títulos? E vocês todos... o que pensam que Huahua é, afinal?
Desde que ascendeu ao trono, embora Rong Xia não reutilizasse muitos dos antigos oficiais, também não lhes tirava a vida. No entanto, ele não esperava que sua momentânea benevolência os levasse a se tornarem gananciosos, fazendo com que voltassem a se aliar ao príncipe, pretendendo assassiná-lo para retomar o trono.
— Sua Majestade, eu jamais tive tal intenção — o Príncipe He se levantou apressado. — A grande causa já é coisa do passado, e eu também conheço minhas próprias limitações. Por que iria querer tomar o trono? Peço que me diga como está Huahua, Vossa Majestade.
Dessa vez, ele não chamou Ban Hua de imperatriz, mas pelo apelido de infância: Huahua.
Desesperado, já não se importava com etiqueta ou com a falta de cortesia. O Príncipe He não entendia — estava tudo bem antes, como algo tão grave pôde acontecer em tão poucas horas?
— A imperatriz está bem — Rong Xia não deixou escapar nenhuma das emoções no rosto do príncipe. — O príncipe diz que nada tem a ver com isso, mas muitos dos assassinos capturados eram antigos soldados seus. Eles permaneceram leais até hoje e insistem que ainda são subordinados do Rei Li. Se o príncipe não estiver ocupado, venha comigo até a prisão.
— Este ministro está disposto a ir.
A porta do Estudo Imperial se abriu, e a expressão de Rong Xia mudou ligeiramente.
— Huahua?
Ao ver que Ban Hua estava corada e sem sinais de ferimento, o Príncipe He finalmente relaxou. Curvou-se diante dela:
— Saudações à imperatriz.
— Príncipe, não precisa de tanta formalidade — Ban Hua lhe sorriu.
Vendo o sorriso natural dela, Rong Xia achou que ela não havia ouvido a conversa no estudo e estava prestes a suspirar aliviado, quando Ban Hua falou:
— Eu também quero ir à prisão. Me levem com vocês.
Rong Xia: ...
Ele virou o rosto e olhou para Du Jiu, que estava parado à porta. Du Jiu encolheu o pescoço para dentro. A imperatriz havia lhe proibido de dizer qualquer coisa, então como ele ousaria abrir a boca? Vossa Majestade, o senhor tem que se esforçar para agradar a imperatriz. Nós, guardas desgraçados, o que mais podemos fazer?
— Eu não posso ir? — Ban Hua ergueu uma sobrancelha, encarando Rong Xia.
— Está bem, vamos juntos.
Ao ver a forma como os dois interagiam, o Príncipe He relaxou um pouco o maxilar tenso.
A Prisão Celestial era guardada conjuntamente pelo Templo Dali e pelo Ministério da Justiça Criminal, e ali eram mantidos todos os prisioneiros importantes. O lugar era altamente vigiado; salvo ordem direta de Sua Majestade, parentes e amigos dos detentos não tinham permissão de visita.
Ban Hua notou que os guardas ali mantinham expressões severas, com traços duros no rosto — quase se podia ver as palavras “Proibida a entrada de ociosos” estampadas neles.
Mesmo com a chegada da imperatriz, limitaram-se a uma saudação formal, sem correrem para bajular. Após entrar, Ban Hua virou-se para observar os guardas com seus ombros largos e pernas longas.
Rong Xia percebeu os pequenos movimentos dela e apertou sua mão, evitando que ela continuasse a fitar os outros homens.
Será que ela achou esses homens mais bonitos que eu...?
Ban Hua piscou para ele com inocência, como quem perguntasse por que você está me beliscando?
Rong Xia sentiu uma coceira irresistível no coração com aquele olhar e apertou mais algumas vezes a mão dela, tentando reprimir o que sentia.
Ao descer os degraus, Rong Xia olhou para a saia elaborada atrás de Ban Hua, curvou-se, levantou a barra e só a soltou quando terminaram de descer. O gesto foi tão natural que os guardas e o príncipe presentes ficaram completamente atônitos.
— Saudações a Sua Majestade, à Imperatriz e ao Príncipe — Liu Banshan veio ao encontro, também notando o gesto de Rong Xia ao ajudar a imperatriz com a saia, mas escondeu bem sua expressão, sem deixar transparecer nada.
— Sem formalidades — disse Rong Xia direto. — Onde estão os assassinos?
Liu Banshan lançou um olhar ao Príncipe He, curvou-se e respondeu:
— Peço que Vossa Majestade me acompanhe.
O fato de Sua Majestade ter trazido o Príncipe He mostrava que ainda havia alguma margem de consideração por ele. Se aquilo realmente não tivesse a ver com o príncipe, por consideração à imperatriz, talvez Rong Xia não tornasse as coisas tão difíceis para ele.
Naquele momento, os assassinos presos na masmorra já estavam conformados com a morte. Mas quando viram o Príncipe He sendo trazido pelo imperador, suas expressões mudaram. Liu Banshan notou a reação e sentiu o coração apertar — parecia que o príncipe realmente estava envolvido.
— Vocês... — o Príncipe He ficou chocado ao ver os assassinos. — Eu não lhes disse para deixarem a capital, levarem uma vida decente e nunca mais voltarem?!
— Príncipe He, nunca ouviu que se morre por dinheiro? — disse um dos assassinos. — O que podíamos fazer com as poucas pratas que o senhor nos deu? O Rei Li pode ser cruel, mas é generoso. Dinheiro, casas, mulheres... com ele temos tudo. Por que deveríamos ouvir você e ir viver como mendigos em terras pobres e distantes?
— Agora que virou príncipe da nova dinastia, não se preocupe conosco. Não queremos seguir um mestre covarde como você.
O Príncipe He fitou aqueles assassinos com o rosto pálido. Eram todos soldados leais que o acompanhavam desde pequeno. O que falara fora ferido nas costas por uma flecha, e levou mais de um ano para se recuperar. Outro quebrou três dedos e um braço. Todos eram devotados a ele, dispostos a dar a vida por gratidão. Como podiam fazer aquilo por Jiang Luo?
O Príncipe He então se lembrou da reação de Shi Shi antes de entrar no palácio. Encarou os homens à sua frente e, com voz rouca, perguntou após um tempo:
— Foi a Shi Shi quem mandou vocês fazerem isso?
As expressões dos assassinos mudaram. Mas aquele que falara antes riu:
— É mesmo interessante estar com o príncipe... Acha que só porque a princesa envelheceu e perdeu a beleza pode descartá-la como lixo? Agora vai colocar toda a culpa nela? Afinal, marido e mulher por uma noite, afeição por cem. Está sendo cruel demais.
As palavras do assassino eram um ataque direto ao Príncipe He, mas, ao mesmo tempo, cada uma delas parecia refletir a realidade.
Mesmo Ban Hua, que não tinha o menor interesse em intrigas ou esquemas, já havia entendido tudo. Nove entre dez daqueles assassinos haviam sido chamados por Shi em nome do primo dela. Agora que a tentativa de assassinato foi revelada, por lealdade ao primo, se recusavam a envolvê-lo e diziam ser todos subordinados de Jiang Luo.
Afinal, Jiang Luo já tinha feito tantas maldades que não faria diferença se levasse mais essa culpa.
Rong Xia também imaginava tudo que Ban Hua havia deduzido. Sem vontade de assistir mais aquela cena de “amor profundo entre mestre e servo”, declarou:
— Príncipe, venha comigo encontrar o Rei Li.
O assassino pensou que Rong Xia queria confrontar os dois irmãos Jiang, e por isso ficou aliviado.
Parecia que o Imperador Cheng’an realmente tinha algumas suspeitas sobre o Rei Li — e, com isso, também se sentiam aliviados.
Para chegar ao local onde o Rei Li estava preso, era necessário atravessar outras celas. Ao passarem pela cela número 7, chamada Tianzi, Ban Hua parou ao ver a mulher de meia-idade encarcerada ali dentro.
Essa mulher era a antiga cafetina do Pavilhão Huanhua e também a proprietária do Edifício dos Assassinos. Depois de retirar as roupas luxuosas e os pentes de ouro, sua aparência envelhecida se tornava evidente.
A velha cafetina também viu Ban Hua. Virou o rosto com expressão indiferente, sem se importar com vida ou morte.
Ban Hua soltou uma risadinha e seguiu adiante. Do outro lado, ao ouvir aquele riso, a cafetina virou repentinamente a cabeça e olhou, mas só viu as costas de Ban Hua se afastando, rodeada por seus acompanhantes.
Ela pensou no Rei Changqing, que estava encarcerado ali dentro, e não conseguiu mais se acalmar.
Não importa o quão bonito um homem seja — se não toma banho ou troca de roupa por muito tempo, não é diferente de um vagabundo sujo na rua. O Rei Changqing antes tinha feições atraentes, mas o que Ban Hua via agora era apenas um homem com os cabelos emaranhados e o corpo sujo.
Que tipo de postura, que tipo de elegância... tudo se desfez como fumaça ao vento.
— Rei Changqing. — Ela parou do lado de fora da cela, olhou para o homem de mãos negras e falou com calma: — Tenho uma dúvida no coração. Será que pode me ajudar a respondê-la?
Rong Xia e o Príncipe He pararam os passos. Rong Xia lançou um olhar para Ban Hua, mas não disse nada.
Talvez por estar preso há tempo demais, o Rei Changqing se tornara apático e já não tinha o charme refinado de antes. Ele lançou um olhar para Ban Hua e respondeu com indiferença:
— Pergunte.
— O estorninho que naquela época só dizia “Viva o imperador”... foi alguém tentando incriminá-lo ou foi uma encenação sua?
— Não esperava que minha boa sobrinha ainda se lembrasse dessa pequena coisa, eu mesmo quase havia esquecido — disse o Rei Changqing, soltando uma gargalhada orgulhosa. — Nascido na família imperial, não há necessidade de se apegar ao que é verdadeiro ou falso. Meu primo ainda é um pouco infantil. Isso é uma bênção.
Seus olhos escurecidos pousaram sobre Rong Xia:
— Só espero que a longa vida no harém não sufoque sua essência, e que você não se torne pálido e sem vida como aquelas outras mulheres.
Rong Xia franziu o cenho, mas permaneceu em silêncio.
— O coração humano... o mais raro é também o mais insignificante — riu o Rei Changqing. — Espero que minha boa sobrinha nunca se arrependa nesta vida, e envelheça com um sorriso.
— Agradeço pelas palavras auspiciosas — respondeu Ban Hua com um sorriso. — O primo deve viver bem. Esta masmorra é espaçosa e arejada. Depois de alguns anos, vai se acostumar.
O sorriso do Rei Changqing congelou no rosto. Ele arregalou os olhos, encarando Ban Hua como se ela fosse um monstro terrível.
— Acho que já sei a resposta para minha pergunta. O primo não precisa mais respondê-la — disse Ban Hua, com um sorriso brilhante. Os cantos de seus olhos e sobrancelhas exalavam cor e vivacidade. — É muito bom conspirar e tramar, não é mesmo?
Liu Banshan: Não, ele definitivamente não vai se sentir bem com isso.
Príncipe He: A boca da minha prima continua a mesma... cheia de personalidade.
Rong Xia segurou a mão de Ban Hua. Não deu desculpas nem fez promessas. Ignorando todos os olhares ao redor, segurou a mão dela com firmeza, apertando-a contra a palma.
Liu Banshan coçou o nariz. Aqui é a Prisão Celestial, onde estão os criminosos mais perigosos. Como a imperatriz pode agir dessa maneira diante dos condenados?
Segurar as mãos assim, com tanto carinho... pareciam dois amantes passeando ao ar livre.
Sua Majestade mudou, pensou Liu Banshan. Já não é mais aquele soberano calmo e majestoso de antes. Por um momento, ele não sabia se isso era bom ou ruim. Quando começou a seguir Rong Xia, este ainda vivia seus anos mais frágeis, mas mesmo assim já possuía uma forma de agir inigualável, conquistando a admiração de todos.
Quando era pequeno, Liu Banshan ouvira sua mãe dizer que não existe pessoa perfeita neste mundo; e, se existir, essa pessoa provavelmente não será feliz. Na época, ele não entendeu. Mas depois que passou a acompanhar Sua Majestade, observando-o planejar calmamente um grande evento atrás do outro, ele compreendeu o que a mãe quis dizer. Aos olhos de Rong Xia, as pessoas e as coisas se dividiam apenas em dois tipos: úteis ou inúteis.
A única exceção foi a Mansão Jingting.
Naquele tempo, a imperatriz ainda era apenas uma nobre do campo. Mesmo assim, ela ousou açoitar o Tanhua escolhido a dedo pelo Imperador Yunqing e causou um grande alvoroço na corte. A língua dos eruditos é afiada — e, depois de ofendê-los, quem teria algo de bom a esperar?
Mas naquela ocasião, Sua Majestade interveio. Não era uma guerra contra os letrados — era uma defesa em favor da imperatriz.
Naquele tempo, Liu Banshan pensava que Rong Xia só queria se aproximar da família Ban, ou que, sabendo do carinho do Imperador Yunqing por Ban Hua, queria ajudá-la em nome dele.
Mas olhando agora... talvez Rong Xia já nutrisse um afeto por ela desde então.
Mais tarde, Du Jiu descobriu que a família Ban mantinha contatos particulares com os generais do exército, e até mesmo Zhao Weishen, Ministro do Ministério da Guerra, frequentemente enviava notícias para a família Ban. Sua Majestade, que na época era o capitão da rede de espiões do Imperador Yunqing, não entregou essas informações — em vez disso, ele as suprimiu.
Se Sua Majestade tivesse repassado essa notícia, mesmo que a Princesa Dachang conseguisse limpar as suspeitas do Imperador Yunqing sobre a família Ban, eles jamais teriam sido promovidos de conde para duque, e a Rainha Ban jamais teria passado de uma lorde de vilarejo a uma princesa.
Ele só ajudou a família Ban porque Sua Majestade tinha a intenção de conquistá-los e se beneficiar do prestígio da família entre os generais. Os fatos provaram que ele pensou demais. Sua Majestade não apenas deixou de usar as conexões da família Ban, como ainda os ajudou a limpar tudo. Até mesmo o desconfiado Imperador Yunqing não conseguiu perceber nada.
Uma vez que alguém impiedoso se apaixona, é como uma árvore seca florescendo na primavera, ou uma casa velha incendiada. Se ele não destrói até as raízes, mas está disposto a arriscar tudo por um único jogo... então, não se trata mais de tentação.
Aquele que sempre calcula tudo... a única pessoa que Sua Majestade não calculou em toda a sua vida provavelmente foi os sentimentos da Rainha Ban.
Ao observar o casal de mãos dadas à sua frente, Liu Banshan virou a cabeça para olhar o Príncipe He e viu que sua expressão estava mais tranquila que a sua.
Realmente digno de quem já foi um príncipe — essa capacidade de adaptação supera a minha.
A cela mais interna da prisão era trancada com uma pesada porta de ferro. Havia apenas uma abertura de ventilação do tamanho de uma palma. Vendo de fora, só se via um buraco escuro. O coração do Príncipe He apertou. Será que o segundo irmão está mesmo preso aqui...?
A pesada porta se abriu. Após piscar algumas vezes, ele finalmente conseguiu enxergar uma jaula de ferro no fundo da cela escura, e uma pessoa sentada dentro dela.
Depois de algum tempo, Liu acendeu duas velas, e a luz do cômodo se tornou mais clara.
— Segundo irmão — disse o Príncipe He, ao ver claramente quem estava na jaula. Deu alguns passos adiante, mas parou de repente, lançou um olhar para Rong Xia e então se escondeu atrás dele.
Mas seu pequeno gesto foi percebido por Jiang Luo, que estava na cela. Ele agarrou as grades da jaula e olhou para o Príncipe He com expressão de êxtase:
— Irmão! Irmão mais velho! Me leve daqui, por favor, me leve embora!
— Eu realmente não aguento mais ficar aqui nem por um momento. Me tira daqui! Eu não vou mais competir com você, não vou mais disputar nada. Por favor, me ajuda...
O Príncipe He notou que ele estava com roupas limpas, o rosto e as mãos lavadas, e parecia bem melhor do que o Rei Changqing, que estava trancado do lado de fora. Os cantos dos lábios do príncipe tremeram, mas ele não suplicou por Jiang Luo.
Ao ver que o Príncipe He não dizia nada, Jiang Luo esticou desesperadamente os braços para fora da jaula. Aquele homem, já com mais de vinte anos, chorava de maneira humilhante:
— Irmão! Você não pode me deixar aqui sozinho! Quer que eu morra nesse lugar?
— Alteza, quando fui incumbido de cuidar de Vossa Alteza, jamais o maltratei. Se essas palavras forem mal interpretadas por Vossa Alteza, quer que eu me desculpe com a morte? — Liu Banshan se aproximou com uma lamparina nas mãos, olhando para Jiang Luo com um meio sorriso. — Peço que não diga bobagens, Vossa Alteza.
Ao ver Liu Banshan, Jiang Luo tremeu de medo. Foi esse desgraçado que me trancou num quarto escuro o dia todo, sem permitir que ninguém falasse comigo ou sequer aparecesse diante de mim. Exceto pelas três refeições e trocas de roupa, ninguém aparecia — e mesmo quando apareciam, agiam como se eu não existisse, sem dizer uma só palavra.
Esse tipo de castigo, sem agressões físicas ou xingamentos, parece suportável por um ou dois dias, mas com o tempo... percebe-se que é a tortura mais cruel. Às vezes, Jiang Luo até duvidava se era mesmo o imperador, se ainda estava vivo, o que estava acontecendo do lado de fora, e por que o mundo estava tão silencioso — tão silencioso que dava vontade de enlouquecer.
Liu Banshan, que antes era apenas um oficial medíocre em quem ele jamais prestara atenção... não esperava que esse sujeito aparentemente gentil tivesse métodos tão cruéis.
Por isso, ao ver o Príncipe He, toda a tensão de Jiang Luo desmoronou. Aquela era sua única esperança.
Ele nem sequer teve coragem de olhar para Ban Hua e Rong Xia, porque sabia que seu irmão mais velho sempre o tolerou, sempre o suportou. Mesmo quando errava, bastava implorar, chorar, e o irmão amolecia o coração.
Mas ele esqueceu que o irmão mais velho já não era mais príncipe — e que o sobrenome deste mundo já não era mais Jiang. Mesmo que o Príncipe He quisesse salvá-lo, agora... não havia o que fazer.
O segundo irmão, diante do Príncipe, parecia até um pouco perturbado. Seus lábios tremeram por muito tempo, mas não conseguiu dizer uma única palavra de súplica.
Quanto àqueles que morreram pelas mãos do segundo irmão... esses não tiveram chance de dizer nada.
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