Capítulo 136 a 138


  Capítulo 136: Conhecer Você 

Han Yan ficou em silêncio. Então disse:

— Apenas me diga: você está disposto a cooperar comigo?

Sua expressão não demonstrava nenhum traço de comoção, apenas uma indiferença fria. Zhuo Qi, de repente, sorriu:

— É claro que estou disposto a cooperar com você. — E acrescentou: — Mas tenho uma condição: se Fu Yunxi sair disso ileso, você deve ir comigo para a Região Oeste.

— Está bem — respondeu Han Yan prontamente.

Agora foi a vez de Zhuo Qi se surpreender. Olhando para a expressão de Han Yan, ele achava que ela rejeitaria sem hesitar, mas ela concordou com tanta facilidade. Zhuo Qi ficou desconfiado no início, mas também sabia que Han Yan era alguém que cumpria o que prometia; em geral, ela honrava suas palavras. Embora sentisse certa confusão, relaxou um pouco por dentro e assentiu:

— Está combinado.

Han Yan não respondeu. Zhuo Qi baseava seu julgamento no caráter anterior dela, mas não percebia que sua promessa fora apenas um comentário casual. Quem poderia dizer o que o futuro traria? Se Fu Yunxi conseguiria escapar do desastre ainda era incerto. Além disso, o veneno frio em seu corpo... Quanto às palavras de Zhuo Qi, não passavam de um paliativo. Dependendo da situação, se Zhuo Qi levasse aquilo a sério, Han Yan apenas pediria desculpas em pensamento.

— O que fazemos agora? — perguntou Zhuo Qi. Ele sabia que Han Yan já tinha um plano em mente, e tudo o que precisava era cooperar plenamente.

Han Yan disse:

— Vamos até o Palácio Xuanqing.

Embora, no geral, as coisas estivessem sob controle, ainda havia algumas dúvidas que precisavam de confirmação. Fu Yunxi não tinha sido honesto com ela; talvez fosse hora de colocar tudo às claras. Uma pontada de dor atravessou seu coração — o que faria se realmente não houvesse saída?

Zhuo Qi franziu ligeiramente a testa ao ouvir que Han Yan queria ir ao Palácio Xuanqing, e isso o desagradou bastante. No entanto, sabia que não poderia impedi-la; não podia forçá-la. Então disse, a contragosto:

— Vamos.

Han Yan pareceu não notar as mudanças emocionais de Zhuo Qi e respondeu:

— Está bem.

No Palácio Xuanqing.

Naquele dia, o Palácio Xuanqing estava estranhamente silencioso, e naquele silêncio parecia ferver uma leve inquietação — um ar palpável de tensão. A porta do estúdio estava firmemente fechada, e do lado de fora dois guardas faziam vigília. Uma bela mulher estava parada diante da porta, aparentemente praguejando em voz baixa. Essa mulher empunhava um chicote de aço, golpeando-o com força contra os dois guardas, tentando entrar à força, mas os guardas permaneciam imóveis, permitindo que o chicote os atingisse sem permitir que ninguém entrasse.

— Saiam da frente! Eu vou entrar para salvá-lo! — exclamou a bela mulher, sua frustração aumentando ao perceber que não conseguia passar.

— Sinto muito, Princesa, mas essa é a ordem do Príncipe — respondeu um dos guardas.

Ao ouvir isso, a mulher — Yi Lin Na — ficou furiosa:

— Eu sou sua Princesa, a Princesa! Como ousam desobedecer às minhas ordens?

Os guardas permaneceram firmes, indiferentes ao surto dela, enquanto algumas criadas próximas trocavam olhares cúmplices. Embora a Princesa da Região Oeste alegasse residir no Palácio Xuanqing e se considerasse esposa do Príncipe, ele raramente a recebia. Frequentemente, ela perguntava, indignada, sobre o paradeiro do Príncipe. Mas ele pouco lhe dava atenção, quase não interagindo com ela. Comparada ao modo como tratava a Quarta Senhorita da Família Zhuang, era uma diferença gritante. As criadas, que viviam no palácio há anos, entendiam bem que o desprezo do Príncipe por Yi Lin Na refletia a ausência de afeto.

Como o ser humano — especialmente os servos — tende a se adaptar às circunstâncias, logo perceberam que a Princesa da Região Oeste havia caído em desgraça. Somado ao seu temperamento notoriamente ruim — recorrendo frequentemente a abusos verbais e físicos contra os criados — passaram a guardar ressentimentos e até conspirar contra ela. Nunca se deve subestimar os servos de uma casa; embora pareçam insignificantes, sua capacidade de causar problemas é notável.

A ansiedade de Yi Lin Na só aumentava nesse ambiente. Não apenas Fu Yunxi era frio com ela, como os criados se uniam para maltratá-la. Na Região Oeste, ela era constantemente elogiada por sua nobreza e beleza — uma realidade muito distante da atual. As criadas sussurravam que ela não passava de um presente de um país derrotado. Ela se enchia de raiva, mas além de punir alguns que espalhavam rumores, o que mais podia fazer? As fofocas continuavam; ela não podia simplesmente matar todos os servos. E mesmo que quisesse, não tinha autoridade no Palácio Xuanqing. Fu Yunxi não a apoiaria.

Yi Lin Na sabia que sua presença no Palácio Xuanqing, substituindo Zhuang Han Yan, devia-se à sua capacidade de aliviar o veneno frio no corpo de Fu Yunxi — ainda que não pudesse curá-lo completamente. Mas Fu Yunxi havia rejeitado sua ajuda, deixando claro que não estava apenas recusando o tratamento, mas também a ela. Preferia morrer a ficar com ela. Pensar em Zhuang Han Yan enchia Yi Lin Na de ciúme e ressentimento; ela já havia deixado o palácio, sua reputação estava manchada por boatos de incesto com o irmão. Então por que sua sombra ainda pairava em todo lugar?

Desde que Fu Yunxi se feriu na rua, seu estado piorou bastante. Estava acamado há dias, e o médico real já o visitara várias vezes, a ponto de permanecer no Palácio Xuanqing. O tempo de Fu Yunxi parecia estar se esgotando; se continuasse recusando o tratamento, poderia morrer. Yi Lin Na queria salvá-lo, mas Fu Yunxi nem sequer permitia que ela o visse, ordenando aos guardas que a mantivessem afastada.

Ela sentia ódio, ressentimento, dor e impotência.

— Fu Yunxi, você vai se arrepender disso! — gritou antes de sair furiosa do pátio, com as criadas ao redor trocando olhares relutantes antes de a seguirem.

Dentro do Estúdio.

Cheng Lei estava sentado à escrivaninha, com expressão indecifrável — impossível saber se era de alegria ou raiva.

— Ela se foi.

— Mn — veio uma resposta suave da cama.

— Você cortou toda esperança — disse Cheng Lei, um tanto agitado.

O Doutor Wu estava separando ervas, e o estúdio estava impregnado com um forte cheiro de remédio. Somente a pessoa recostada na cama, vestida com um longo roupão branco que ressaltava sua palidez, parecia imperturbável, com as amplas mangas espalhadas pelo chão, conferindo-lhe um ar etéreo.

Diante do silêncio de Fu Yunxi, Cheng Lei prosseguiu:

— Qual o sentido disso? Você está em estado crítico, e ela não sabe de nada. Por que afastar a Princesa da Região Oeste? Mesmo que não goste dela, aceite o tratamento; depois pense em como lidar com isso. — O mais importante era curar-se, e a princesa podia ajudar. Cheng Lei acreditava que não era necessário manter os princípios intactos em todo momento.

— Ela não pode me curar — disse Fu Yunxi calmamente, sem nenhum traço de tristeza.

— Como sabe que não pode? Nem tentou! — Cheng Lei elevou a voz, incomodado com a aceitação tranquila da morte por parte de Fu Yunxi. Aquela atitude não combinava com ele; nos momentos críticos no campo de batalha, ele nunca falava assim.

— Você tem medo de se tornar dependente do veneno — interveio o Doutor Wu, normalmente calado.

Fu Yunxi hesitou levemente, mas não respondeu. Cheng Lei, curioso, perguntou:

— Que tipo de dependência?

— O veneno da Princesa da Região Oeste pode combater o veneno frio; é uma técnica de combater veneno com veneno. No entanto, esse veneno permanece no corpo e precisa ser mantido, alimentando-se do sangue e da carne do hospedeiro, enraizando-se cada vez mais. Além disso, não é inofensivo; quanto mais se usa, mais a pessoa se torna dependente, quase viciada. Se parar de usá-lo, sofrerá dores intensas por todo o corpo. Mais importante ainda, esse veneno pode afetar gradualmente a consciência da pessoa — nesse ponto, o Doutor Wu olhou para Fu Yunxi. — Você teme que, ao usá-lo, se torne dependente e perca a razão, cometendo atos que não deveria.

Fu Yunxi não confirmou nem negou, mas o silêncio foi uma aceitação implícita.

Era a primeira vez que Cheng Lei ouvia esse ponto de vista, e ficou atônito. Após alguns segundos, uma onda de frustração tomou conta dele.

— Nesse caso, o veneno não pode ser usado. Se um homem feito se torna dependente de uma coisa tão pequena, a Princesa da Região Oeste poderia usá-lo para manipulá-lo. Se você perder a razão, ela poderá controlá-lo — disse, furioso. — Como o povo da Região Oeste pode usar métodos tão torpes!

Ainda assim, por mais torpe que fosse, aquele veneno podia ao menos salvar Fu Yunxi. Agora que não era mais uma opção, restava apenas esperar a morte? Seu estado estava piorando; ele dormia cada vez mais, às vezes o dia inteiro. Cheng Lei temia que, um dia, ele dormisse e nunca mais acordasse. Mas Fu Yunxi parecia indiferente à própria situação, como se nem soubesse o quão grave era. Ainda assim, instruía Cheng Lei a cuidar bem dos assuntos pendentes, demonstrando sua natureza meticulosa. Mesmo que um dia se fosse, deixaria tudo em ordem; aqueles que precisassem ser enfrentados seriam resolvidos com antecedência.

— Você se arrepende? — perguntou Cheng Lei. — Em relação à Zhuang Han Yan? — Sem dizer nada a ela, deixou que o mal-entendido crescesse. Mesmo que houvesse circunstâncias que o impedissem de falar, aquilo era doloroso demais. Fu Yunxi não havia feito nada errado, certo?

— Estou em dívida com ela — disse Fu Yunxi.

Assim que disse isso, o quarto mergulhou em silêncio. Nesse instante, uma voz fria e familiar ecoou:

— Eu nunca soube do que você me devia. Era afeto, reputação ou... o trono?

Com um “vuuush”, a porta foi escancarada do lado de fora, e as lanternas vermelhas lançaram um brilho ensanguentado sobre as roupas de Han Yan. Ela estava diante da porta, observando Fu Yunxi em silêncio, com expressão serena e inabalável — mas havia uma emoção indescritível nos olhos, geralmente frios — talvez tristeza, ou talvez... compreensão.


Capítulo 137: Ramo de Ouro, Folha de Jade 
Todos no cômodo ficaram surpresos, claramente espantados com a chegada de Han Yan. Fu Yunxi franziu levemente a testa e lançou um olhar aos guardas junto à porta. Viu-os se ajoelharem em uníssono:
— Estamos dispostos a aceitar o castigo.
Aqueles homens eram auxiliares de confiança de Fu Yunxi. Embora não soubessem exatamente o que estava acontecendo, os anos de convivência permitiam que percebessem quando algo estava errado. A Princesa da Região Oeste nunca fora uma preocupação real para o Príncipe; quem importava era Han Yan. Se sua presença pudesse ajudá-lo, estavam dispostos a aceitar qualquer punição por negligência.
Fu Yunxi acenou com a mão:
— Podem se retirar.
Os guardas então se afastaram.
Felizmente, Yi Lin Na não estava presente; se tivesse presenciado essa cena, certamente teria um ataque de fúria. A maneira como aqueles homens tratavam Han Yan era completamente diferente da forma como tratavam a ela, mesmo sendo a suposta dona da residência real.
Todos no quarto ouviram claramente as palavras de Han Yan, e Cheng Lei perguntou, confuso:
— O trono?
Se todo o resto poderia ser entendido, a ideia de que Fu Yunxi devia a Han Yan o trono era algo que Cheng Lei não conseguia compreender. Ele olhou para Fu Yunxi:
— O que isso quer dizer?
Naturalmente, Fu Yunxi não respondeu. Apenas voltou-se para o Doutor Wu:
— E você, o que tem a dizer?
Doutor Wu pigarreou:
— Alteza, o senhor sabe que a Jovem Princesa é muito astuta. Como eu poderia competir com ela? Ela me pressionou severamente, e eu não tive como resistir...
— Você não vai responder a ele? — Han Yan olhou para Fu Yunxi. — Se não, eu posso responder por você. Seu irmão real ordenou meu assassinato porque sou filha do Príncipe Dong Hou. Mesmo sabendo que foi a Imperatriz Viúva quem exterminou toda a família do Príncipe Dong Hou para garantir o trono, ele ainda assim me mataria para eliminar futuras ameaças.
O extermínio da família do Príncipe Dong Hou não foi apenas uma história de vingança, mas um ato premeditado. O falecido Príncipe Dong Hou e o Imperador anterior haviam fundado juntos o reino, dividindo méritos igualmente. Inicialmente, estava acertado que o Príncipe Dong Hou se tornaria o Imperador, mas o antigo Imperador chegou primeiro à capital e assumiu o trono sem dificuldades. Ele passou a carregar um ressentimento oculto por ter tomado o trono do amigo e, por isso, tratou a família do Príncipe Dong Hou com extrema generosidade. Foi por isso que, mesmo com as frequentes denúncias contra ele, nada acontecia. Era a forma que o antigo Imperador encontrou de compensá-los.
Em seus últimos anos, o sentimento de culpa do Imperador em relação ao Príncipe Dong Hou aumentou. Ele chegou a redigir um decreto para passar o trono ao Príncipe Dong Hou, com a intenção de devolver-lhe o que era de direito. Mas a Imperatriz Viúva descobriu.
Ela jamais permitiria isso; se a família do Príncipe Dong Hou se tornasse a nova família imperial, ela perderia tudo. Então tomou medidas drásticas, contratando assassinos do submundo para exterminar a família inteira. Os assassinos foram cruéis e não pouparam ninguém. Após o massacre, o Imperador desconfiou que a Imperatriz Viúva estivesse envolvida, mas não tinha provas. Logo começaram a circular rumores no mercado de que o Imperador havia mandado matar o Príncipe Dong Hou por insatisfação com seu poder. Apesar de infundados, muitos acreditaram nesses boatos por um tempo. Isso era extremamente perigoso para a estabilidade do país. Assim, o Imperador emitiu um decreto proibindo qualquer menção ao caso do Príncipe Dong Hou, com severas punições para quem desobedecesse. Políticas tão brutais mostraram-se eficazes. No entanto, sempre que o Imperador pensava no destino trágico da família de seu amigo, não conseguia mais encontrar paz. Ele acabou falecendo, e o trono passou ao atual Imperador.
Foi a primeira vez que tanto o Doutor Wu quanto Cheng Lei ouviram uma declaração tão direta. Ficaram momentaneamente atônitos. Afinal, viviam no palácio, e embora não soubessem os detalhes, podiam deduzir algumas coisas. Mas, pelas palavras de Han Yan, parecia que ela era a verdadeira herdeira imperial — e não Fu Yunxi.
Fu Yunxi olhou para Han Yan:
— Como você descobriu?
Han Yan respondeu:
— Você é quem deve dizer: sim ou não.
Seu tom era firme, quase impositivo. No entanto, em contraste com essa firmeza, sua expressão era serena, como se estivessem discutindo algo trivial, como o que comer naquele dia ou onde ir — nada que merecesse ser levado a sério.
Fu Yunxi ficou em silêncio por um momento.
— Sim — disse ele.
Han Yan então se aproximou e sentou-se ao lado dele. A cama era muito macia. A expressão de Fu Yunxi permanecia fria, seu olhar para Han Yan novamente indiferente. Mas no momento seguinte, ela ergueu uma mecha do cabelo negro dele, examinando-a com atenção. Instintivamente, ele virou o rosto, mas Han Yan puxou sua roupa, aproximando-o. Naquele instante, com seus rostos tão próximos que podiam sentir a respiração um do outro, Han Yan inspirou fundo.
O outrora negro cabelo de Fu Yunxi já começava a exibir fios brancos sutis, como uma fina camada de geada sobre a escuridão, destoando de forma gritante. O cabelo dele já estava sendo afetado pelo veneno frio a esse ponto? Mesmo estando tão perto, não emanava nenhum calor. Aquele abraço que antes transmitia um traço de calor agora desaparecera. Han Yan sentou-se ao lado dele com a estranha sensação de estar ao lado de uma estátua esculpida em gelo e neve.
— Cunhada — disse Cheng Lei —, você tem alguma maneira de lidar com isso?
Na mente de Cheng Lei, Han Yan era capaz de qualquer coisa. Muitas pessoas na capital já conheciam seus feitos e, como amigo de Fu Yunxi, ele ouvira bastante sobre ela enquanto estava na residência do Príncipe Xuanqing. Sabia que Han Yan era astuta, sempre encontrando maneiras de virar o jogo a seu favor. Desde que Fu Yunxi permitira que Yi Lin Na permanecesse na residência, Cheng Lei não tivera mais notícias de Han Yan. Mas agora, com seu retorno repentino e com tanto conhecimento dos fatos, será que ela havia encontrado outra saída?
Han Yan balançou a cabeça, querendo dizer algo, mas acabou em silêncio.
— Inteligente — disse subitamente Fu Yunxi, ao notar o olhar dela. Um leve sorriso curvou seus lábios. Ele parecia tão calmo quanto sempre fora, como se não houvesse urgência alguma. Han Yan sentiu um aperto no peito; apertou com mais força a manga de sua túnica, abriu a boca, mas conseguiu dizer apenas uma única palavra:
— Você...
Fu Yunxi permanecia sentado ao lado dela, em silêncio, surpreso com a rapidez com que ela havia entendido tudo. Desde o início, ele estivera atento à possibilidade de seu irmão mais velho perseguir Han Yan, mas não imaginava que ele agiria tão depressa. Seu irmão estivera no poder por tanto tempo que não podia permitir a existência de qualquer ameaça. Assim que soube que Han Yan era filha do Príncipe Dong Hou — que fora nomeado pelo antigo Imperador como seu sucessor —, decidiu matá-la imediatamente. Ainda que Han Yan fosse apenas uma mulher e jamais pudesse subir ao trono, se sua identidade viesse à tona, todos saberiam que a posição do atual Imperador era ilegítima e poderiam se rebelar. Isso era algo que seu irmão jamais toleraria. Assim, mesmo sabendo que Han Yan era uma pessoa digna de compaixão, mesmo suspeitando que ela fosse de fato a princesa legítima, ele ainda assim a mataria. Do ponto de vista de um governante, isso era perfeitamente justificável.
No entanto, Fu Yunxi não conseguia simplesmente assistir de braços cruzados. O Imperador e a Imperatriz Viúva haviam chegado a um acordo tácito: nenhum dos dois queria que Han Yan continuasse viva. Inicialmente, quando a Consorte do Príncipe Dong Hou, Tang Xiao Qiao, teve sua criada fugindo com Han Yan da residência do Príncipe e entregando-a à família Wang, Han Yan passou a viver sob a identidade de Zhuang Han Yan — e isso não era segredo. A Imperatriz Viúva tinha influência suficiente para descobrir seu paradeiro facilmente. Porém, ao perceber que Han Yan era um elo solto da casa do Príncipe Dong Hou, não a eliminou imediatamente, pois o decreto imperial ainda não havia sido localizado.
O decreto do falecido Imperador, nomeando o Príncipe Dong Hou como seu sucessor, ainda não fora descoberto. A Imperatriz Viúva sabia que o Imperador o havia confiado a alguém, mas essa pessoa ainda não se revelara. Por isso, ela queria manter Han Yan viva, para atrair essa pessoa. Enquanto Han Yan estivesse viva, aquele indivíduo a reconheceria como filha do Príncipe Dong Hou e acabaria entregando o decreto a ela. No entanto, essa pessoa nunca apareceu, mesmo após todos esses anos.
A Imperatriz Viúva considerou simplesmente matar Han Yan, mas isso eliminaria a isca que poderia atrair o portador do decreto. Então arranjou seu casamento com Wei Ru Feng — o Príncipe Wei —, um aliado de confiança da Imperatriz Viúva, mantendo Han Yan sob constante vigilância. Se ela fizesse qualquer movimento suspeito, a Imperatriz saberia de imediato.
Inicialmente, Lady Zhou havia sido enviada à residência Zhuang para investigar o paradeiro do decreto imperial, pois a Imperatriz Viúva não confiava completamente em Zhuang Shiyang, temendo que ele escondesse o decreto para si. Por isso enviou o Tutor Imperial Zhang para investigar. Ele mandou Lady Zhou infiltrar-se na casa dos Zhuang, sob o pretexto de visitar a irmã recém-abortada, para que pudesse permanecer mais tempo e procurar o decreto. Contudo, o que ninguém esperava era que Lady Zhou não apenas fracassaria em sua missão, como acabaria se envolvendo com Zhuang Shiyang, tornando-se motivo de escárnio em toda a capital.
Todos esses acontecimentos se desencadearam por causa de algo que ocorrera muitos anos antes: o trono do Imperador, na verdade, pertencia ao Príncipe Dong Hou, e Han Yan era a verdadeira nobre. Agora, as intenções da Imperatriz Viúva de eliminá-la tornavam-se cada vez mais evidentes. Contudo, Fu Yunxi estava envenenado com o veneno frio, algo que talvez jamais pudesse ser curado.
As sobrancelhas de Han Yan se franziram de frustração. A situação era tão complexa que ela se sentia completamente perdida. Fu Yunxi não havia feito nada de errado. Nem ela. E, ainda assim, parecia estranho demais afirmar que não havia nada de errado entre eles.
— Você já sabe — disse Fu Yunxi. — O que pretende fazer?
Han Yan virou-se para encará-lo. O que poderia fazer? Não havia como simplesmente invadir o palácio e tomar o trono. Ela não queria isso. Se fosse possível, preferia que tudo continuasse como estava. Ainda era apenas uma mulher comum. E ele, um poderoso Príncipe da família imperial.


 Capítulo 138: Jamais Desesperar 
O Doutor Wu e Cheng Lei trocaram um olhar e discretamente saíram do quarto, deixando espaço para os dois. Han Yan e Fu Yunxi certamente tinham muito o que conversar.
— Fu Yunxi — perguntou Han Yan —, como está o veneno frio?
No instante em que pronunciou “Fu Yunxi”, ela hesitou levemente. Ele também sentiu isso. Em interações anteriores, sempre que Han Yan ficava muito emocionada, chamava-o pelo nome, abandonando o frio “Sua Alteza” e a polidez formal, revelando uma leve intimidade. Ouvir seu nome saindo da boca dela, depois de tanto tempo, causava a Fu Yunxi uma sensação de distanciamento — como se eles pertencessem a mundos diferentes agora.
— Por enquanto — ele respondeu —, ainda não estou morto.
Han Yan se virou para olhá-lo. Aquele jovem belo, mesmo acamado pela doença, ainda exalava um charme inegável, sem demonstrar o menor sinal de desespero. Parecia que nada no mundo poderia derrubá-lo, e ainda assim, ele não conseguia controlar o próprio destino. Sem saber o que dizer, ela sentia que talvez nada precisasse ser dito — agora que conhecia a verdade, qualquer explicação soava desnecessária.
Ela segurava firmemente a manga da túnica de Fu Yunxi, como se temesse que ele escapasse, ou talvez para acalmar sua própria inquietação. Fu Yunxi notou o gesto e pousou suavemente a mão sobre a dela. Apesar do frio de seus dedos, Han Yan sentiu um traço de calor, que serenou seu coração agitado.
— Pode me contar sobre o veneno frio?
Após uma longa pausa, Han Yan finalmente perguntou.
Fu Yunxi hesitou por um instante e esboçou um leve sorriso.
— Posso — disse ele, e começou a relatar lentamente uma história que guardava no coração havia muitos anos — uma história que jamais contara a ninguém.
A mãe de Fu Yunxi, a Consorte Jing, era de uma beleza deslumbrante — fato evidente na aparência dos dois irmãos, ele e o Imperador. Ambos haviam herdado o rosto extraordinário da mãe. A Consorte Jing era gentil e bondosa, como uma flor de lótus no palácio. Alguém assim não parecia ter nascido para os jogos da corte, e ainda assim, ela era uma exceção. O Imperador a favorecia enormemente. No entanto, só o amor dele não bastava; ele não podia gerir diretamente os assuntos do harém.
Felizmente, a Imperatriz Viúva da época também adorava a Consorte Jing, e seu poder dentro do palácio era incontestável — ninguém ousava prejudicar a Consorte. Sua doçura e a ausência de ambição só tornavam o afeto do Imperador ainda mais profundo. Porém, esse amor não vinha sem conflitos. As outras mulheres do harém começaram a sentir inveja, especialmente a Imperatriz.
Como chefe dos Seis Palácios, a Imperatriz precisava manter uma imagem de virtude e tolerância — mas isso não significava que ela suportasse ver outra mulher monopolizando o afeto do Imperador. O favoritismo pela Consorte Jing criava nela uma sensação constante de ameaça, fazendo com que sentisse sua própria posição em risco. Depois que a Consorte Jing deu ao Imperador dois filhos e estava prestes a dar à luz o terceiro, a Imperatriz não pôde mais ficar parada.
A Imperatriz não tinha filhos. No palácio, a posição de uma mulher era frequentemente determinada pelos filhos. Com a preferência crescente do Imperador pela Consorte Jing, a posição desta se tornava ainda mais sólida — e em privado, talvez até superior à da Imperatriz. Se o Imperador decidisse nomear o filho da Consorte como Príncipe Herdeiro, a posição da Imperatriz desmoronaria. Seria possível que todos os anos em que ela fingira ser bondosa e virtuosa acabassem servindo apenas para beneficiar outra mulher?
Então, na época do parto da Consorte Jing, a Imperatriz subornou a criada pessoal que a acompanhava e mandou acender um tipo de incenso no quarto. Esse incenso continha almíscar, substância que podia causar aborto espontâneo e infertilidade. A Consorte Jing gostava muito de aromas, e ao misturar várias especiarias, o cheiro se tornava imperceptível. Quanto ao suborno, a Imperatriz usou uma combinação de ameaças e promessas. As pessoas ao redor da Consorte, assim como ela própria, eram inocentes e pouco astutas, o que facilitou a manipulação.
Dois meses antes do parto, a Imperatriz partiu para o Monte Wutai, alegando que iria rezar pela criança. Assim, na noite do incidente, ela sequer estava presente — o que serviu como álibi.
Todos os anos, inúmeras mulheres morriam no palácio. Mesmo sendo a favorita do Imperador, a Consorte Jing foi lamentada apenas por um curto período antes de ele seguir em frente. Embora ele soubesse que o ocorrido tinha alguma relação com a Imperatriz, sentia-se impotente. A Imperatriz não era apenas uma mulher — ela representava um poder que ele precisava manter. Foi exatamente essa influência que lhe deu ousadia para cometer tamanha atrocidade.
A Consorte Jing e o pequeno Príncipe prestes a nascer morreram. Restaram apenas Fu Yunxi e o Príncipe mais velho. A Imperatriz então passou a cuidar deles como filhos. Aos olhos de todos, ela era verdadeiramente digna do título de virtuosa e tolerante. Até mesmo a Consorte Jing era próxima a ela. Naquela época, Fu Yunxi e o irmão mais velho também gostavam muito dela.
O Imperador não viu razão para impedir que os dois fossem criados sob o nome da Imperatriz — isso legitimaria qualquer reivindicação futura ao trono. No entanto, ele temia que a Imperatriz tivesse outras intenções, e discretamente sugeriu que os dois irmãos mantivessem certa distância. Mas crianças são inocentes por natureza — não percebem os perigos do mundo, nem os desejos ocultos por trás de sorrisos falsos.
Após a morte do Imperador anterior, a Imperatriz tornou-se Imperatriz Viúva, e o Príncipe mais velho subiu ao trono. Logo, a Imperatriz Viúva conquistou completamente a confiança e o respeito dos dois irmãos.
Todos os dias, a Imperatriz Viúva ordenava que a cozinha imperial preparasse pratos medicinais para os dois irmãos. Naquele dia, o lótus-de-neve vindo das montanhas era valioso demais, e o Imperador, preocupado com a saúde frágil do irmão mais novo, simplesmente cedeu sua própria refeição medicinal para Fu Yunxi — sem saber que, com isso, o parente mais próximo acabava ingerindo o dobro do veneno, permitindo que o veneno frio se instalasse em seu corpo.
Quando estava na adolescência, numa tarde, Fu Yunxi foi até a Imperatriz Viúva para falar com ela e, sem querer, escutou uma conversa entre a Imperatriz e sua tia, revelando a verdade sobre a morte da Consorte Jing. Sentiu-se tomado pela raiva e pelo choque. Durante todos aqueles anos, ele havia considerado como família justamente a pessoa que havia causado a morte de sua mãe biológica. Seu impulso imediato foi entrar ali mesmo e matar aquela mulher hipócrita. No entanto, sabia que não podia fazer isso. Seu irmão mais velho havia acabado de ascender ao trono, e seu poder ainda era instável. Muitos cortesãos estavam aliados à Imperatriz Viúva — revelar a verdade só traria problemas para o irmão.
Só lhe restava engolir a dor e esconder a verdade. Nem mesmo contou ao irmão, pois sabia que o temperamento dele era mais impulsivo e que ele poderia confrontar diretamente a Imperatriz Viúva. Ele queria vingança — mas também queria garantir o trono para seu irmão. A única maneira de fazer isso era suportar, crescer em poder, e, quando estivesse suficientemente forte, expor os crimes da Imperatriz Viúva e vingar sua mãe.
O caminho mais rápido para ganhar poder era assumir o comando militar. Mas possuir autoridade militar não era o bastante — ele também precisava estabelecer prestígio entre os soldados. Contra a vontade do irmão, ingressou na campanha contra os bárbaros do Oeste, em parte para se afastar do palácio e refletir sobre estratégias, e em parte para reunir forças para o dia em que pudesse enfrentar a Imperatriz Viúva.
Quanto à permanência do Príncipe mais velho no trono por tantos anos, aquilo fora, a princípio, um acidente. A intenção da Imperatriz Viúva era usar o veneno frio para controlar os dois irmãos, esperando que morressem para então colocar um fantoche no trono. Quem poderia imaginar que Fu Yunxi acabaria consumindo a poção venenosa, enquanto o Imperador saía ileso? Os planos da Imperatriz Viúva ruíram. Ela observava os feitos do Imperador crescerem, e cada vez mais membros da corte se alinhavam a ele, deixando-a ansiosa. Jamais esperava que o jovem Fu Yunxi retornasse um ano depois com grandes méritos militares, consagrando seu nome entre os oficiais do exército — não mais alguém que se pudesse subestimar.
Esses dois já haviam escapado de seu controle, e a situação lhe escapava das mãos. Enquanto o poder da Imperatriz Viúva enfraquecia, o de Fu Yunxi crescia — uma oportunidade perfeita.
Mas, nesse momento crucial, o veneno frio de Fu Yunxi se agravou.
Não se sabia ao certo se aquilo era sorte ou infortúnio; a dose dupla do veneno o fizera adoecer cedo demais, e foi por acaso que o Doutor Wu o descobriu. Embora não pudesse curá-lo, seus conhecimentos médicos avançados conseguiram ao menos suprimir parte dos efeitos do veneno.
Finalmente, Fu Yunxi adquiriu força suficiente para circular pela corte sem que ninguém ousasse menosprezá-lo. Seu irmão mais velho havia se tornado um governante sábio, o país prosperava, mas o inimigo ainda não fora punido — e sua própria vida estava por um fio.
Seu tom era extremamente calmo, como se estivesse contando a história de outra pessoa. Mas Han Yan podia ouvir a mágoa escondida em sua voz constante — aquele jovem que aprendeu a andar com cuidado por um palácio sem sangue, protegendo a si mesmo e ao irmão, havia se transformado num homem maduro e frio, de beleza impenetrável.
— Naquela época... você chegou a se sentir desesperado? — Han Yan perguntou.
Na verdade, a vida de Fu Yunxi era quase idêntica à da Han Yan de sua vida passada. Sua mãe também morrera cedo, e ele enfrentou sozinho as intrigas ao redor, descobrindo que seu inimigo era alguém da própria família. A única diferença é que Fu Yunxi descobriu a verdadeira natureza da Imperatriz Viúva muito antes. Han Yan, por sua vez, só se deu conta, no momento da morte, de que sua vida inteira fora uma mentira. Num ambiente assim, sem ninguém por perto, a experiência era verdadeiramente angustiante. Então, será que Fu Yunxi também se sentiu impotente, como o antigo Han Yan?
— Não — Fu Yunxi abaixou o olhar. — O desespero não traz vingança.
Desespero era algo inútil.
Fu Yunxi era alguém que sempre agia com propósito. Um dos motivos pelos quais a Imperatriz Viúva não previu que a situação evoluiria até aquele ponto foi sua subestimação da resistência daquele jovem. Ele suportava mais do que qualquer um, sem nunca poupar a si mesmo. Tinha o tipo de coração que sobrevive num palácio — duro demais, sagaz demais. Ele não se permitia desesperar, porque o desespero não ajudava em nada em sua busca por justiça. O que ele precisava era viver com ambição.
E ele conseguiu.
Naquele momento, detinha poder e status que não podiam ser abalados facilmente. Mesmo acamado, ainda era capaz de orquestrar tudo com calma — inclusive, confrontar a Imperatriz Viúva.
— Então você também não está desesperado agora? — Han Yan perguntou.

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