Capítulo 34 a 36


 Capítulo 34 – A Academia

A Academia Imperial ficava dentro da Cidade Imperial. Ao norte, situava-se o Palácio Imperial; ao sul, o Portão Shunxi; a leste, o Tribunal da Direita. Pode-se dizer que estava cercada pelas instituições mais poderosas do país. Somente o Portão Anfu, a oeste, servia como entrada e saída para os alunos.

Como a mais alta instituição educacional da Dinastia Grande Xuan, a abertura da Academia Imperial era naturalmente um evento extraordinário. Assim que a segunda sequência de tambores matinais se extinguiu, e os portões dos vários distritos de Chang’an mal haviam sido abertos, carruagens começaram a sair uma após a outra, finalmente se reunindo diante do Portão Anfu.

A Academia Imperial admitia apenas 300 alunos por ano, e esses estudantes eram, sem exceção, ricos ou nobres. A academia era dividida em seis escolas: Escola dos Filhos do Estado, Universidade Imperial, Escola dos Quatro Portões, Escola de Escrita, Escola de Matemática e Escola de Direito. Entre elas, as Escolas de Escrita, Matemática e Direito formavam especialistas em suas respectivas áreas, enquanto as três primeiras cultivavam talentos versáteis.

A Escola dos Filhos do Estado, a Universidade Imperial e a Escola dos Quatro Portões concentravam-se principalmente nos clássicos confucionistas, sendo a Escola dos Filhos do Estado a mais prestigiada. Ela admitia 72 alunos, todos filhos de oficiais de terceiro escalão ou superiores. A Universidade Imperial admitia 140 alunos, filhos de oficiais de quinto escalão ou superiores. A Escola dos Quatro Portões admitia 130 alunos, filhos de oficiais de sétimo escalão ou superiores. Ocasionalmente, funcionários locais podiam recomendar estudantes extremamente talentosos de origens humildes para a Escola dos Quatro Portões, mas tais casos eram extremamente raros.

Xiao Jingduo ingressou na Escola dos Filhos do Estado. Na Dinastia Xuan, o terceiro escalão era, essencialmente, o posto mais alto entre os oficiais em exercício. Os títulos de primeiro e segundo escalão geralmente eram honorários, concedidos a oficiais veteranos ou falecidos. Aqueles que realmente detinham poder no tribunal eram quase todos de terceiro escalão. O fato de a Escola dos Filhos do Estado aceitar apenas filhos de oficiais desse nível já demonstra o quão rigorosos eram os critérios. Embora o posto oficial de Xiao Ying ainda não tivesse atingido o terceiro escalão, ele possuía um título nobre de segundo grau, o que qualificava Xiao Jingduo para a admissão.

A carruagem do Marquês de Dingyong parou ao deixar Xiao Jingduo diante do Portão Anfu. Não apenas a deles — todas as carruagens de outras famílias também estacionaram ali. A partir daquele ponto, tratava-se de um território governamental onde até mesmo oficiais do tribunal precisavam andar a pé; carruagens de famílias de oficiais, então, certamente não podiam seguir adiante. Diferente dos outros estudantes que se despediam com relutância de seus familiares, Xiao Jingduo despediu-se sem hesitar do pessoal da mansão do Marquês e caminhou em direção ao Portão Anfu com seu pajem de livros.

Depois de recusar a proposta da velha madame de fornecer um pajem naquele dia, Xiao Jingduo foi ao Mercado Oeste e comprou um por conta própria. Quando perguntou o nome do menino, este apenas balançou a cabeça. Mais tarde, Xiao Jingduo deu-lhe o sobrenome Xiao e o nomeou de Lin. Xiao Lin era de poucas palavras, quase sempre em silêncio, mas trabalhava com eficiência notável. Xiao Jingduo ficou secretamente satisfeito e decidiu comprá-lo do mercador de escravos.

Inicialmente, Xiao Jingduo pretendia carregar seus próprios livros, mas Xiao Lin os tomou à força. Xiao Jingduo não insistiu e ficou feliz por estar livre do peso.

Assim que passaram pelo Portão Anfu, a Academia Imperial surgiu à vista. Naquele momento, o local estava efervescente, repleto de jovens vibrantes com seus cabelos presos em estilo erudito. Só de observar aquela cena, o espírito se enchia de esperança. O humor de Xiao Jingduo melhorou sem que percebesse, e ele avançou sorrindo em direção à Academia.

Como era seu primeiro ano na Academia Imperial, os procedimentos de matrícula foram mais complexos que os dos veteranos, que resolviam tudo com leveza. Normalmente, essas formalidades eram tratadas pelos familiares, ou por criados, no caso das famílias influentes. Mas Xiao Jingduo era uma exceção — cuidava de tudo sozinho.

Depois de concluir a papelada, era hora de ir ao dormitório. Xiao Lin o seguia silenciosamente. Xiao Jingduo lançou-lhe um olhar casual, sem dar muita atenção.

Na verdade, naquele dia no Mercado Oeste, Xiao Lin não era a melhor escolha — sequer era qualificado, pensou Xiao Jingduo. Afinal, um pajem de livros precisava ser esperto, hábil com as palavras e atento. A Academia Imperial era um ambiente complexo, e um pajem sagaz era fundamental. Outras famílias escolhiam os mais inteligentes entre seus criados, ou ao menos alguém sociável. Mas o meu... parece um balde de madeira de tão quieto.

Xiao Lin era claramente inapropriado para o papel de pajem, mas isso não incomodava Xiao Jingduo. Ele preferia alguém que falasse pouco, mas fosse eficiente no trabalho.

Logo chegaram ao dormitório. Seguindo o número do quarto, Xiao Jingduo empurrou a porta.

O cômodo ficava numa área um pouco isolada, mas tinha boa orientação solar, excelente iluminação e era tranquilo e limpo. Talvez por estar mais afastado, parecia mais espaçoso do que os demais dormitórios. Havia duas camas, uma no lado leste e outra no oeste, e duas escrivaninhas dispostas sob a janela, com esteiras de junco dobradas sob elas. Fora isso, não havia mais nada.

Para um aluno da Escola dos Filhos do Estado, aquela acomodação podia parecer simples demais, mas Xiao Jingduo achou adequada. Comparado ao Templo Qingyuan, aquele dormitório já era um luxo. Se consegui viver confortavelmente num templo budista, é claro que posso me adaptar aqui.

Xiao Jingduo já sabia que o dormitório seria dividido com outro aluno. Ao que parecia, seu colega de quarto ainda não havia chegado. Influenciado pelo tempo no templo, Xiao Jingduo era muito apegado à limpeza e estava prestes a começar a arrumação, quando Xiao Lin se adiantou. Pegou a bacia de água, foi buscá-la do lado de fora e começou a limpar o quarto.

Só então Xiao Jingduo percebeu que agora tinha um pajem. Apertou a ponte do nariz, tentando se acostumar com a mudança. Como Xiao Lin havia assumido a tarefa, não restou muito o que fazer, então Xiao Jingduo sentou-se à escrivaninha e começou a ler.

Passado um tempo, a porta foi subitamente empurrada com força, e uma voz estrondosa ecoou:

— Por todos os deuses, por que meu quarto designado fica tão longe? Estou morrendo!

Xiao Jingduo ergueu os olhos. Quando a pessoa do lado de fora cruzou o batente e o viu, não conseguiu conter a exclamação:

— Uau!

Xiao Jingduo imediatamente franziu a testa, visivelmente irritado.

O recém-chegado percebeu que havia exagerado. Sorriu e disse:

— Perdão, mil perdões. Mas não dá pra me culpar — olha só pra você! Eu nunca imaginei que um homem pudesse ter esse tipo de aparência.

Xiao Jingduo ficou ainda mais contrariado. Vendo o desagrado crescer no rosto do colega, o rapaz finalmente se calou, constrangido.

Durante os três anos em que cultivou-se no Monte Zhongnan, o ar puro da montanha refinou Xiao Jingduo, tornando sua aparência etérea. Seus traços eram bem delineados, sua pele extremamente clara, os olhos intensamente negros, criando um contraste marcante e belo. Contudo, seus traços eram firmemente masculinos, sem traço algum de feminilidade. À primeira vista, parecia apenas um jovem limpo e bonito — o que assustou Bai Jiayi.

Xiao Jingduo já estava acostumado com olhares alheios. Ao longo dos anos, tornara-se cada vez mais popular entre as mulheres, mas seu temperamento frio o fazia ignorar esse tipo de atenção, evitando complicações. No entanto, ver um homem reagir daquela forma… era demais.

Bai Jiayi, alheio ao desprezo de Xiao Jingduo, continuava admirando o rosto do colega. Será que meu futuro companheiro de quarto é mesmo tão bonito assim? De repente, Bai Jiayi se empolgou com a vida monótona de estudante que o aguardava.

Após mais alguns segundos de contemplação, Bai Jiayi pareceu lembrar de algo e exclamou apressado:

— Esqueci de me apresentar! Sou Bai Jiayi, de uma família comum.

Xiao Jingduo não acreditou nem um pouco nessa de "família comum" e expôs sem piedade:

— Para entrar na Escola dos Filhos do Estado, é preciso ser descendente de, no mínimo, um oficial de terceiro escalão. Como isso pode ser chamado de família comum?

Bai Jiayi coçou a cabeça:

— Ah, é mesmo? Bom, meus ancestrais incluíam altos funcionários. Ouvi dizer que meu avô chegou ao terceiro escalão na dinastia anterior, mas depois nossa família entrou em decadência. Durante os tempos caóticos, a linhagem masculina foi dizimada várias vezes, restando apenas as mulheres. Agora, só sobrou eu.

De fato... isso sim é decadência, pensou Xiao Jingduo, caindo em silêncio por um instante.

Sem saber da crítica mental de Xiao Jingduo, Bai Jiayi continuou suspirando:

— Minha avó é terrível, insistiu que eu viesse estudar aqui. Eu realmente não queria passar por isso de novo.

Sendo o único homem restante da família Bai, Bai Jiayi era como uma folha verde solitária em meio a um mar de flores — mimado até o limite. Ele até gostava dessa vida confortável, mas, infelizmente, seus dias tranquilos foram interrompidos quando foi forçado a estudar. Para isso, sua avó chegou a pedir favores a velhos conhecidos, tudo para garantir que ele estudasse bem e restaurasse a glória da família Bai o quanto antes.

Por dentro, Bai Jiayi não queria nada disso. Achava um desperdício de favores preciosos. Mas o destino já estava traçado e ele não teve escolha a não ser vir para a Academia Imperial, sentindo-se completamente miserável.

Bai Jiayi soltou um longo suspiro, seus olhos amendoados perderam o brilho. Era bonito e de pele clara, com olhos ligeiramente puxados que pareciam sorrir naturalmente, dando-lhe uma aparência encantadora. Mesmo agora, abatido, ainda conseguia evocar simpatia nas mulheres.

Essa foi a primeira impressão que Xiao Jingduo teve de seu colega de quarto — um jovem mimado e leviano.

Após se acomodarem, as aulas formais começariam no dia seguinte. Essa nova leva de estudantes da Academia Imperial primeiro prestou homenagens a Confúcio, depois sentou-se formalmente no salão principal para ouvir as palavras de encorajamento do Chanceler.

— Sua admissão na Academia Imperial é uma bênção para toda a vida. Os sábios depositam grandes esperanças em vocês, e a corte concedeu muitos privilégios. Devem usar isso como motivação, dedicar-se aos estudos e passar nos exames imperiais o quanto antes, para servir ao Império. Os estudantes da Academia Imperial não precisam realizar os exames distritais nem provinciais. Ao se formarem, já podem se registrar para os exames imperiais no mesmo ano, diretamente com o Ministério dos Ritos. Mas não pensem que podem relaxar só porque já entraram na Academia. As avaliações aqui são extremamente rigorosas, divididas em provas a cada dez dias, provas anuais e o exame de graduação. As provas de dez dias são feitas a cada dez dias; as anuais, uma vez por ano; e o exame de graduação é obrigatório. Aqueles que não passarem não só perdem a qualificação para os exames imperiais, como também deixam de ser reconhecidos como estudantes da Academia. O Imperador reabriu os exames imperiais e revitalizou a educação para incentivar os estudiosos de todo o país. Como elite, vocês não devem decepcionar as expectativas do Imperador.

Bai Jiayi já estava cochilando enquanto ouvia. Forçou as pálpebras a se manterem abertas e viu Xiao Jingduo sentado ereto, atento do início ao fim. Achou aquilo inacreditável e cochichou:

— Você não tá cansado?

Xiao Jingduo apenas lançou-lhe um olhar de canto de olho e permaneceu em silêncio.

Sem desistir, Bai Jiayi tentou de novo:

— Dá pra falar baixinho, o Chanceler não vai ouvir.

— O Chanceler está falando. Preste atenção e não fale — respondeu Xiao Jingduo.

A boca de Bai Jiayi se abriu em espanto. Céus, fazia tempo que não via uma figura dessas. Xiao Jingduo não só estava prestando atenção de verdade naquele discurso velho de abertura, como ainda estava mandando ele calar a boca!

Bai Jiayi balançou a cabeça, sentindo que ele e Xiao Jingduo vinham de mundos completamente diferentes. Restou-lhe recostar-se e continuar lutando contra o sono.

O discurso do Chanceler ainda se arrastava quando, de repente, houve um alvoroço do lado de fora. Um homem com aparência de eunuco entrou, sorrindo e fazendo uma reverência ao Chanceler:

— Saudações ao Chanceler, e a todos os professores e instrutores.

O Chanceler desceu rapidamente e retribuiu a reverência, junto aos demais oficiais da Academia:

— Ora, se não é o Alto Eunuco Gao. O que o traz hoje à Academia Imperial?

— Sua Alteza, o Príncipe Herdeiro, lembrou-se de que hoje é o dia de abertura da Academia. Queria vir pessoalmente oferecer seus cumprimentos, mas, por conta de assuntos urgentes do Estado, não encontrou tempo. Por isso, enviou este humilde servo para trazer presentes e desejar ao Chanceler sucesso em formar grandes talentos.

— Sua Alteza é mesmo atenciosa — disse o Chanceler com o rosto iluminado, visivelmente satisfeito com o gesto do Príncipe Herdeiro. Enquanto ele e o Alto Eunuco Gao trocavam cortesias, Bai Jiayi cutucou Xiao Jingduo e cochichou:

— Esse Príncipe Herdeiro sabe mesmo como conquistar as pessoas.

Xiao Jingduo ergueu uma sobrancelha e lançou um olhar severo a Bai Jiayi:

— Não seja desrespeitoso.

— Hã? — Bai Jiayi ficou confuso. Como alguém pode ser tão rígido a ponto de nem aceitar um comentário casual sobre o Príncipe Herdeiro? Sentindo-se repreendido, murmurou:

— Foi só um comentário bobo. Não é como se você fosse parente do Príncipe. Pra que tanto rigor?

Xiao Jingduo apenas olhou de relance para ele e não respondeu.

Quando todos os rituais longos e complexos chegaram ao fim, Xiao Jingduo e os outros novos alunos foram receber seus livros. Mal tiveram tempo de fazer qualquer outra coisa antes que a noite caísse.

Os pajens (meninos de livro) dormiam separados, nos alojamentos dos servos, longe de seus mestres. Os estudantes, exaustos pelo longo dia, retornaram aos dormitórios, e o barulho começou imediatamente.

Felizmente, o quarto de Xiao Jingduo e Bai Jiayi ficava em uma área remota, então os ruídos mal chegavam até eles, não atrapalhando a leitura.

Xiao Jingduo virou mais uma página. Bai Jiayi, entediado até a alma, não resistiu:

— Ei, você não tá cansado? De onde você é? Tem quantas irmãs? São bonitas? Que idade têm? Já casaram? …Tá bom, eu só queria conversar.

Xiao Jingduo lançou-lhe um olhar gélido de advertência e voltou à leitura. Mas o gelo não intimidou Bai Jiayi, que continuou tagarelando:

— Por que você veio pra Escola dos Filhos do Estado? Eu vim por causa da minha avó. Ela teve que pedir favor pra meio mundo. Sinceramente, acho um desperdício. Esses favores dariam pra arranjar um casamento pra mim, não acha? Enfim, você não respondeu: por que veio pra Academia Imperial?

Xiao Jingduo até ficou tentado a dizer que fora recomendado pelo Príncipe Herdeiro, mas, sendo naturalmente discreto, acabou não dizendo nada.

— A gente tem aula amanhã. Você devia pelo menos dar uma folheada no livro — disse Xiao Jingduo, por fim.

Bai Jiayi arregalou os olhos, chocado. Xiao Jingduo estava até adiantando matéria? Mas que tipo de monstro eu fui arrumar como colega de quarto?

Capítulo 35 – Intimidação

No segundo dia, as aulas começaram oficialmente na Academia Imperial.

Antes que as aulas tivessem início, o professor do Colégio Imperial não pôde deixar de advertir aqueles filhos da nobreza:

— Vocês conseguiram entrar na Academia Imperial, então imagino que todos venham de boas famílias. No entanto, o ingresso é rigoroso, e a graduação não é nada fácil. Como o Chanceler disse ontem, o exame de graduação é essencial para que possam prestar os exames imperiais. Além disso, a Academia também realiza provas a cada dez dias e provas anuais. Os exames decenais ocorrem a cada dez dias, cobrindo o conteúdo estudado nesse período — como recitação dos clássicos, explicações, interpretação de frases e testes escritos. Quem for reprovado será punido. Já o exame anual avalia o conteúdo de todo o ano, com um formato semelhante, mas com consequências muito mais severas. O professor responsável fará dez perguntas orais sobre os clássicos: acertar oito é excelente, seis é mediano, cinco é fraco. Quem tirar uma nota fraca repetirá o ano. Se falhar novamente no segundo ano, precisará estudar por mais nove anos. Se ainda assim for reprovado, será expulso.

Os estudantes imediatamente soltaram um lamento coletivo. Ninguém esperava que os exames da Academia Imperial fossem tão rígidos. Deixar de lado os testes a cada dez dias já era difícil, mas ser retido um ano inteiro por falhar no exame anual... além de atrasar a formatura, isso traria uma vergonha insuportável. E ser expulso? Todos eles eram descendentes de oficiais de terceiro escalão ou superior, rodeados de prestígio. Se fossem reprovados ou expulsos, como encarariam a sociedade de Chang’an?

Ao ver os alunos assustados e cochichando entre si, o professor esboçou um sorriso satisfeito. Em seguida, ergueu a voz:

— Silêncio!

A sala finalmente se acalmou, e ele continuou:

— O caminho do conhecimento é longo e árduo. Devem se esforçar sem cessar para corresponder às expectativas que a Corte deposita em vocês. Durante o tempo na Academia, todas as suas despesas serão custeadas pelo governo — inclusive alimentação e vestimenta. Se forem mal nas provas decenais, receberão um aviso na primeira vez. Na segunda, suas refeições serão suspensas. Aqueles que se destacarem em caráter e estudos receberão recompensas adicionais. Além da parte acadêmica, seu comportamento também deve ser digno e exemplar. Faltas não autorizadas, atrasos após feriados ou sair para se divertir escondido resultarão em expulsão. Espero que todos saibam se comportar.

Os alunos já estavam abalados com tantas advertências. Responderam num coro desanimado, como se dissessem “entendido”.

O professor, satisfeito com a autoridade que exercera naquele momento, pigarreou e declarou com imponência:

— Muito bem. Agora que falamos sobre os exames, podemos iniciar oficialmente a aula. Abram seus exemplares dos Analectos. Hoje, estudaremos o capítulo “Xue Er” — Aprender.

Assim que a aula terminou, Xiao Jingduo arrumou seus livros e se preparou para sair. Mas mal tinha dado dois passos, Bai Jiayi o alcançou por trás:

— Irmão Xiao, espera! Vamos juntos ao refeitório!

Xiao Jingduo parou, sem muita vontade.

Ao alcançá-lo, Bai Jiayi tentou, de forma afetuosa, colocar o braço sobre os ombros de Xiao Jingduo — mas este se esquivou com agilidade. Bai Jiayi arregalou os olhos:

— Qual é o seu problema? Nem posso colocar o braço no seu ombro?

Subitamente, Bai Jiayi lembrou de uma daquelas histórias famosas de romance escolar. Observou Xiao Jingduo de cima a baixo, intrigado: Não parece ser uma garota disfarçada...

Acostumado a ser tratado como um jovem mestre — bajulado e cercado de atenção —, Bai Jiayi nunca havia sido rejeitado daquele jeito. Mas desde que chegara à Academia Imperial, já tinha levado várias patadas de Xiao Jingduo. Ainda assim, quem está sob o teto de outro, deve abaixar a cabeça. Como precisava da ajuda de Xiao, engoliu o orgulho e tentou mais uma vez, num tom gentil:

— Irmão Xiao, quais clássicos você pretende estudar? Dois? Três?

— Pretendo estudar cinco — respondeu Xiao Jingduo, como se dissesse algo banal, quando na verdade deixava todos ao redor boquiabertos.

Os “clássicos” a que Bai Jiayi se referia eram os clássicos confucionistas, divididos por grau de dificuldade e importância: superiores, médios e menores. Os superiores eram o Livro dos Ritos e os Anais da Primavera e Outono com Comentário de Zuo. Os médios incluíam o Livro dos Cânticos, o Zhouli (Ritos de Zhou), e o Yili (Etiqueta e Cerimonial). Os menores abrangiam o Livro das Mutações, o Livro dos Documentos, os Anais da Primavera e Outono com Comentário de Gongyang e os com Comentário de Guliang.

Apesar de a Academia ser rigorosa, os alunos podiam escolher quais clássicos estudar, além dos obrigatórios — os Analectos e o Clássico da Piedade Filial. Os níveis eram: dois clássicos (um superior e um menor, ou dois médios), três clássicos (um de cada tipo), e cinco clássicos — o mais difícil e também o mais prestigiado — com todos os superiores, mais um médio e um menor.

Xiao Jingduo tinha escolhido o mais exigente de todos: os cinco clássicos.

Bai Jiayi ficou em silêncio por um instante, depois forçou um sorriso:

— Cinco clássicos? Isso não é difícil demais?

Xiao Jingduo percebeu logo as intenções por trás da pergunta e respondeu, com calma:

— Já pensei bem antes de escolher os cinco. Você não precisa me seguir. Faça de acordo com o seu ritmo.

Bai Jiayi suspirou. Por não estar familiarizado com o ambiente, queria frequentar as mesmas aulas de alguém que pudesse ajudá-lo nos estudos e nas provas — de preferência, seu colega de quarto. Mas nunca imaginou que o tal colega optaria logo pelo percurso mais desafiador.

Entre conforto e orgulho, Bai Jiayi cerrou os dentes e anunciou com bravura:

— Tudo bem! Também vou estudar os cinco clássicos com você. Quem disse que tenho medo?

Como Bai Jiayi já havia decidido, Xiao Jingduo não disse mais nada. Apenas assentiu e seguiu em direção ao refeitório. Quando se aproximaram, um alvoroço do lado de fora os fez parar.

— O que está acontecendo?

Aparentemente, havia uma briga entre estudantes da Academia Imperial e da Escola dos Quatro Portões. Naquele ano, alguns jovens de origem humilde haviam sido recomendados por oficiais locais para estudar na Escola dos Quatro Portões da Academia. Era uma prova de suas habilidades excepcionais, e por isso valorizavam muito a oportunidade, dedicando-se aos estudos com afinco. Contudo, na Academia, dominada por filhos da elite, esses alunos de origem modesta eram como estranhos em terra hostil.

Agora, um desentendimento havia estourado entre os nobres e os pobres estudantes da outra escola. De onde estavam, Xiao Jingduo não conseguia enxergar direito — apenas ouvir fragmentos da discussão.

Bai Jiayi também esticou o pescoço para ver melhor e comentou com uma mistura de nostalgia e indignação:

— Isso aqui devia ser um ambiente de aprendizado e crescimento... e essas coisas continuam acontecendo.

Outro aluno, que também observava a cena, ouviu Bai Jiayi e se meteu na conversa:

— Acontece o tempo todo na Academia. Tá vendo aquele garoto de azul? É Liang Zhihong, de Zezhou. Lutou muito pra chegar até a capital e estuda como ninguém. Mas viver em Chang’an é caro, e mesmo com alojamento e alimentação garantidos, a família dele não tem como bancar as outras despesas. Ele teve que aceitar trabalhos de cópia para se sustentar. Uma pena... mesmo com tanto talento, acabou ofendendo gente poderosa. Vai saber o que esses jovens mestres vão fazer com ele agora.

Como também fazia parte da elite, Xiao Jingduo franziu a testa, visivelmente incomodado com o que via:

— Quem esse sujeito pensa que é, pra intimidar um colega assim, em plena luz do dia? Não teme punição do Chanceler?

— Ele? O nome dele é Qi Xuan. Tem muitos contatos influentes. É filho legítimo de um marquês. Os avôs e tios trabalham na corte, e a família materna também é poderosa. Dizem que o tio dele é um alto funcionário da Corte de Revisão Judicial, e supervisiona uma prisão local. Quem é que vai mexer com ele?

A expressão de Bai Jiayi demonstrava compreensão. Então ele tinha conexões com o Tribunal de Revisão Judicial — agora tudo fazia sentido. Pessoas assim eram abusivas em qualquer lugar que fossem.

Xiao Jingduo desaprovava fortemente esse comportamento e estava prestes a intervir quando viu alguém emergir da multidão. Era um jovem de pele clara e expressão gentil. Ele uniu as mãos em saudação para Qi Xuan e Liang Zhihong, dizendo:

— Antes, éramos todos estranhos uns para os outros, mas o destino nos reuniu aqui para estudar na Academia Imperial. Os ensinamentos sinceros do Chanceler têm como objetivo fomentar a amizade, o respeito e a diligência entre nós, para que possamos servir à corte em breve. Somos colegas que estudarão juntos por anos e talvez até sirvam juntos no governo no futuro. Não seria bom para ninguém se esse clima se tornasse hostil. Que tal me fazerem esse favor e deixarem isso para lá?

Se eles recuarem só porque alguém veio intermediar, isso ainda pode ser chamado de intimidação? Por que ele realmente recuou? — murmurou Bai Jiayi, desconfiado.

Após a fala do mediador, Qi Xuan pareceu acatar o conselho e deixou de incomodar Liang Zhihong, indo embora com seus seguidores. Não só Bai Jiayi, mas também Xiao Jingduo acharam aquilo estranho.

— Quem é esse mediador? — perguntou Xiao Jingduo.

— O nome dele é Li Qingfeng. Lembro que ele não é da capital, nem tem um histórico familiar poderoso. Estranho... — comentou o estudante ao lado, também confuso com a influência de Li Qingfeng, mesmo após explicar o pouco que sabia.

Enquanto Bai Jiayi ainda se esticava curioso para ver melhor a situação, Xiao Jingduo desviou o olhar e disse:

— Já temos aula à tarde. Vamos logo.

Antes de entrar no refeitório, Xiao Jingduo olhou por acaso para trás e viu Li Qingfeng conversando com Liang Zhihong do lado de fora. Parecia que, após o incidente, os dois haviam se aproximado rapidamente.

Após as aulas da tarde, Bai Jiayi gemeu de cansaço. Espalhado na cama, viu Xiao Jingduo se preparando para sair. Sentou-se de repente, animado, e perguntou:

— Irmão Xiao, onde você vai? Eu quero ir também!

Xiao Jingduo lançou-lhe um olhar indiferente:

— Está imaginando coisas. Só vou praticar artes marciais.

Bai Jiayi pensava que Xiao Jingduo ia sair para se divertir, mas sua resposta o desapontou profundamente.

— O sol já está quase se pondo. Onde você vai praticar artes marciais a essa hora?

— A Academia Imperial tem instrutores de artes marciais. Há cursos completos de equitação, arco e flecha e muito mais. Basta avisar ao responsável para se inscrever. — Por cortesia, Xiao Jingduo perguntou: — Quer ir também?

Naquele momento, Bai Jiayi ficou tão chocado que sua boca nem se fechava:

— Quer dizer que, além de estudar os cinco clássicos, você também vai treinar artes marciais?

— Claro. — Xiao Jingduo respondeu com naturalidade. Embora tivesse aprendido caça no Templo Qingyuan e com caçadores, tudo era de forma informal. Nunca havia estudado artes marciais de maneira sistemática. Como a Academia Imperial oferecia instrutores profissionais e excelentes, ele queria aproveitar a oportunidade para aprimorar suas habilidades.

— Mas somos oficiais civis, para que serve praticar artes marciais? — Bai Jiayi perguntou, confuso.

Por um momento, Xiao Jingduo não entendeu o raciocínio. Parou e olhou para Bai Jiayi com a mesma confusão:

— Os exames imperiais são apenas um método de seleção de oficiais com base no mérito literário. Que conflito isso tem com a prática das artes marciais?

— Ah... Os oficiais civis não deveriam ir para a corte em liteiras, sendo responsáveis apenas por falar, enquanto os militares cuidam de batalhas? Os civis não desprezam os militares, a ponto de nem arranjarem casamentos entre suas famílias? — Sob o olhar de Xiao Jingduo, a voz de Bai Jiayi foi diminuindo aos poucos. — Não é assim?

— Você não é velho nem doente, por que precisaria de uma liteira para ir à corte? Até muitas damas montam a cavalo quando saem. Como pode um oficial se apresentar tão fraco ao entrar na corte? E não pense que os primeiros-ministros de hoje são todos estudiosos. Há poucos anos, quando o país ainda não era pacífico, muitos desses ministros atuaram nos campos de batalha, sendo excelentes em equitação e arco. Mesmo hoje, a maioria dos oficiais da corte tem alguma experiência militar.

Quanto mais ouvia, mais confuso Bai Jiayi ficava. Parecia que, na Dinastia Xuan, não havia uma distinção clara entre oficiais civis e militares. Até os civis precisavam ser capazes de liderar tropas. Ele soltou um longo suspiro:

— Ah, então é mesmo um ambiente bem feroz...

As suspeitas de Xiao Jingduo sobre Bai Jiayi cresceram ainda mais. Seu colega de quarto era mesmo estranho. No entanto, ele não demonstrou isso, preferindo aconselhá-lo com sinceridade:

— Isso não vai dar certo. As artes marciais são fundamentais. Não pode negligenciá-las só porque está estudando. Caso contrário, será motivo de chacota entre seus colegas quando virar oficial.

Bai Jiayi se sentiu ferido pelo olhar de Xiao Jingduo, como se o vissem como um efeminado. Fez bico, ressentido. Mas eu me exercito, sim! Só fui mal influenciado por ideias erradas...

Xiao Jingduo vestiu rapidamente uma roupa preta, justa ao corpo, que o deixava ainda mais alto e com aparência refinada. Bai Jiayi o observou em silêncio, até que perguntou, repentinamente curioso:

— Sempre quis te perguntar: de que tipo de família você vem? Você só tem treze anos, mas é tão disciplinado e rigoroso. Sabe, esta é a capital, Chang’an. Todos os alunos saem para se divertir depois das aulas, mas você, depois de um dia inteiro de estudos, ainda vai praticar artes marciais e se exercitar.

Xiao Jingduo, que ajustava as mangas, parou com a pergunta e sorriu levemente:

— Você me lisonjeia. Sou da família Xiao, do Marquês de Dingyong, filho mais velho.

Bai Jiayi ergueu uma sobrancelha:

— Filho mais velho de um marquês? Então tem o mesmo status daquele valentão, o Qi Xuan, que vimos hoje... ou até maior. Com uma origem tão boa, por que ainda se esforça tanto?

Xiao Jingduo apenas balançou a cabeça e sorriu:

— É tudo ilusão.

Toda família tem seus próprios problemas, pensou Bai Jiayi, decidindo não perguntar mais. Em silêncio, admirou seu colega de quarto. Durante todos aqueles dias, Xiao Jingduo havia sido discreto, parecendo igual aos demais. Mas, na verdade, sua origem era impressionante.

Ao se deparar com um colega tão excelente e disciplinado, Bai Jiayi abandonou a atitude despreocupada e começou a levar a vida na Academia Imperial mais a sério. Não posso perder para um garoto de treze anos.

Com o passar do tempo, os estudantes foram se adaptando ao novo ambiente, e a vida na Academia Imperial entrou em rotina. Xiao Jingduo frequentava as aulas durante o dia, praticava artes marciais à noite e fazia os exames decenais a cada dez dias. Seus dias eram completamente preenchidos.

Logo após o segundo exame decenal, um grande incidente ocorreu na Academia Imperial.

Liang Zhihong — o aluno pobre que havia sido intimidado por Qi Xuan naquele dia — morreu.


Capítulo 36 – Nuvens de Suspeita

Um assassinato repentino ocorreu na Academia Imperial, um local sagrado de aprendizado, o que imediatamente causou um grande alvoroço.

Liang Zhihong foi encontrado morto em seu dormitório. Seus colegas de quarto estavam de licença nos últimos dias, então Liang Zhihong estava sozinho. Quando os colegas retornaram e abriram a porta, depararam-se com uma cena sangrenta.

As consequências eram previsíveis. Em pouco tempo, uma multidão se reuniu do lado de fora do dormitório de Liang Zhihong.

— Ouvi dizer que ele foi assassinado. O corte foi no pescoço, um golpe só. Quem fez isso, tem experiência. Tsc, me pergunto como um estudante tão honesto e decente conseguiu ofender criminosos assim — disse um estudante que espalhava boatos, abaixando a voz enquanto olhava ao redor. — Se quer saber, só tem uma pessoa com quem ele se desentendeu nos últimos dias.

Era Qi Xuan, com quem Liang Zhihong teve um confronto dias atrás.

Qi Xuan era filho legítimo de uma família marquesal e tinha um tio que ocupava um cargo importante no Tribunal de Revisão Judicial. Se fosse ele o culpado, faria sentido.

Um burburinho percorreu a multidão. Cada estudante tinha sua própria opinião, comentando de tudo, mas no geral, quase todos concordavam em uma coisa: a morte de Liang Zhihong devia estar relacionada a Qi Xuan.

Bai Jiayi balançou a cabeça e estalou a língua:

— Inacreditável, verdadeiramente inacreditável. Imaginar que um estudante da Academia Imperial poderia fazer algo assim.

— Não fale sem provas — respondeu Xiao Jingduo. Ele não temia esse tipo de situação. Observou o interior do quarto mais uma vez, ainda sentindo algo estranhamente errado.

Li Qingfeng se aproximou e, ao ver tanta gente reunida, perguntou com curiosidade:

— O que está acontecendo? Por que estão todos aqui?

Alguém na multidão o reconheceu como aquele que havia ajudado Liang Zhihong dias antes. Um estudante suspirou e disse:

— Irmão Li, meus pêsames... Liang Zhihong, ele...

Os olhos de Li Qingfeng se arregalaram:

— Como isso é possível...

Ele logo se espremeu entre os estudantes até alcançar a frente. Ao olhar pela porta, viu imediatamente o corpo estirado em meio a uma poça de sangue.

Seu rosto demonstrava choque e pesar. Ele gritou, angustiado:

— Como isso pôde acontecer? Ontem mesmo voltei com ele para o dormitório, e ele estava bem! Foi só uma noite... como pôde ter um fim tão cruel?

Os que estavam por perto sabiam que Li Qingfeng e Liang Zhihong haviam se aproximado muito após o incidente em que Li o ajudou. Tornaram-se grandes amigos rapidamente. Agora, com seu novo amigo brutalmente assassinado, era compreensível que Li Qingfeng estivesse tão abalado. Um estudante suspirou e tentou consolá-lo:

— Irmão Li, os mortos não podem voltar. Tente se recompor.

Li Qingfeng ainda parecia não aceitar a realidade. Xiao Jingduo, parado ao lado, de repente perguntou:

— Irmão Li, você disse que voltou ao dormitório com Liang Zhihong ontem?

— Sim. Estávamos conversando na sala de estudos, e quando vimos, já era noite. Eu o acompanhei até o quarto antes de seguir para o meu. — Li Qingfeng olhou para Xiao Jingduo, confuso. — O que houve? Há algo errado?

Sem demonstrar expressão, Xiao Jingduo sorriu levemente e balançou a cabeça:

— Nada. Só queria saber se notou algo estranho ao levá-lo de volta ontem.

— Algo estranho? — Li Qingfeng pensou por um momento e depois balançou a cabeça. — Não.

Mas então pareceu se lembrar de algo. Seu semblante hesitou.

— Irmão Li, se se lembrou de algo, por favor, sinta-se à vontade para compartilhar — disse Xiao Jingduo.

Li Qingfeng, então, falou hesitante:

— Ontem voltamos bem tarde. Depois que o deixei no dormitório, voltei para o meu. Já era tarde, e começou a nevar. Quando cheguei no quarto, estava encharcado. Numa noite assim, ninguém deveria sair, mas quando fui buscar água, vi vagamente uma silhueta escura. Estava nevando forte e ventava muito, e eu estava longe, então não consegui ver claramente quem era, mas pela silhueta... parecia com o Zhihong...

— Oh? — Xiao Jingduo ergueu as sobrancelhas. — Então Liang Zhihong saiu novamente, na neve, depois de voltar ao quarto?

— Estava escuro demais. Posso ter me enganado... — Li Qingfeng hesitou e, por fim, negou com a cabeça.

Bai Jiayi, ao lado de Xiao Jingduo, também achou estranhas as palavras de Li Qingfeng:

— Com tanta neve ontem, pra onde ele teria ido?

Antes que conseguissem entender, o Diretor de Estudos e pessoas do Tribunal de Revisão Judicial chegaram. Os oficiais dispersaram imediatamente a multidão e isolaram o corpo e o dormitório. O Diretor ordenou que todos os alunos voltassem às aulas.

— Voltem aos estudos. Nada de comentar assuntos irrelevantes — disse o Diretor. Embora não tenha especificado, era evidente que se referia ao caso de Liang Zhihong. Seu tom beirava uma ameaça, como uma ordem de silêncio. Em seguida, ele foi com os oficiais examinar a cena.

Os estudantes que observavam tiveram que se retirar com relutância. Xiao Jingduo e os outros seguiram com a multidão, caminhando devagar.

A curiosidade de Bai Jiayi ainda não tinha sido satisfeita. Aproximou-se de Xiao Jingduo e perguntou em voz baixa:

— Xiao Jingduo, o que você acha disso tudo? Pra onde acha que o Liang Zhihong foi ontem à noite?

O olhar de Xiao Jingduo era calmo, como se ponderasse algo. Após um instante, balançou a cabeça e disse, com naturalidade:

— Ele mentiu.

— Hã? — Bai Jiayi ficou chocado. — Quer dizer o Li Qingfeng? Você acha que o Liang Zhihong não saiu e ele inventou isso?

Xiao Jingduo lançou um olhar leve para Bai Jiayi. Seu colega de quarto, apesar da aparência despreocupada e brincalhona, se mostrava surpreendentemente perspicaz em assuntos importantes. Com uma simples observação, Bai Jiayi também ficou desconfiado.

Xiao Jingduo não respondeu diretamente. Li Qingfeng, de fato, mentiu — mas não sobre isso. Era bem provável que Liang Zhihong realmente tivesse saído na neve naquela noite.

Por que um estudante comum sairia no meio da neve? E por que isso resultaria em sua morte? E Li Qingfeng... por que mentiu?

Naquela noite, o vento era cortante, a lua pálida e poucas estrelas brilhavam.

Uma figura empurrou uma porta e saiu. Olhou para os lados e, ao perceber que não havia ninguém, pulou agilmente o muro da Academia Imperial, correndo rápido em direção à rua principal.

Mas ele não percebeu que, pouco depois, outra figura surgiu atrás de um canto. Naquele momento, a lua saiu das nuvens, projetando a sombra alta da pessoa contra o muro.

Xiao Jingduo, vestido de preto, observava silenciosamente a figura que se afastava no vento gelado.

Li Qingfeng correu rapidamente até a frente de uma casa. Olhou para trás uma vez mais, sorriu de forma inexplicável e empurrou o portão.

Xiao Jingduo o seguiu até o portão. De longe, memorizou o local e os pontos de referência. Estava prestes a ir embora. Não seria tolo de entrar sozinho numa armadilha.

Mas, no instante em que se moveu, ouviu um som vindo da escuridão. Seus sentidos se aguçaram e ele desviou imediatamente.

Ao ver que o primeiro ataque falhou, o agressor oculto não se desesperou e lançou mais três golpes, todos evitados por Xiao Jingduo.

O atacante, vestido de preto, começou a suspeitar. Decidiu que não poderia mais seguir a ordem do mestre de capturar com vida — teria que ferir aquele perseguidor primeiro, desde que não o matasse.

Ele balançou o braço, prestes a desferir um golpe feroz, quando de repente uma faísca brilhou na escuridão, seguida por uma chama.

Xiao Jingduo acendera uma vareta de fogo e observava o adversário com cautela:

— Quem é você, que ousa espreitar na cidade imperial e tentar ferir os outros?

Nesse momento, o portão atrás de Xiao Jingduo rangeu ao se abrir. Ainda atento ao agressor com faca, ele olhou por sobre o ombro. À fraca luz do fogo, reconheceu facilmente a figura por trás de tudo.

A pessoa pareceu surpresa por um instante. Antes que Xiao Jingduo dissesse algo, ela se adiantou:

— É você?

Li Qingfeng estava ao lado, apontando para Xiao Jingduo:

— Princesa, foi ele quem me seguiu até aqui. Ah, e também tentou arrancar informações de mim durante o dia.

Rong Ke e Xiao Jingduo se encararam em silêncio por um longo momento. Por fim, Xiao Jingduo baixou a guarda e fez uma reverência:

— Xiao Jingduo saúda a Princesa.

— Hm? — Li Qingfeng estava confuso. — Vocês se conhecem?

Rong Ke pressionou a testa, como se contivesse a raiva:

— Você me mandou uma mensagem dizendo que havia assuntos urgentes para discutir esta noite, e agora me diz que conseguiu atrair a cobra para fora do buraco. É essa a pessoa que você trouxe?

— Não é ele o que estávamos procurando? — Li Qingfeng também estava surpreso. Gritou para Xiao Jingduo: — Se não é um espião, por que estava me seguindo? Você quase me matou de susto no caminho, sabia?

— Chega. Há olhos demais lá fora. Vamos conversar dentro — disse Rong Ke, sinalizando para que seus subordinados baixassem as armas e entrando no pátio.

O pátio não era grande, parecia simples e comum, mas o interior da casa era impressionante, contrastando com a simplicidade do exterior.

Diversas donzelas e eunucos estavam lá dentro. Assim que Rong Ke entrou, todos se curvaram em uníssono:

— Princesa.

Rong Ke se sentou casualmente na posição principal, sendo imediatamente cercada por criadas que vieram servi-la. Após a retirada dos criados, Rong Ke olhou para Xiao Jingduo e os outros, dizendo:

— Agora vocês podem falar. Como nos seguiram até aqui?

Xiao Jingduo também estava intrigado:

— Vi Li Qingfeng agindo de forma suspeita, então resolvi seguir para investigar. Mas, Princesa, está tão tarde… por que ainda está fora do palácio?

— O incidente na Academia Imperial foi orquestrado por mim. Agora que a situação mudou, a quem mais ele poderia reportar, senão a mim? — disse Rong Ke com indiferença. — Além disso, este lugar não fica longe do Palácio Leste, voltar ao palácio não é problema.

O Palácio Leste funcionava de forma semelhante à corte imperial, apenas em menor escala. Se Rong Ke realmente quisesse entrar e sair do Palácio Leste à noite, o toque de recolher não a impediria. Xiao Jingduo, mais uma vez, se surpreendeu com o grau de audácia daquela ancestral.

Mas desta vez, Rong Ke não havia saído do palácio por capricho. Ela olhou para Xiao Jingduo e finalmente foi direto ao ponto:

— Diga-me, o que exatamente está acontecendo?

Em apenas um quarto de hora, as emoções de Xiao Jingduo haviam passado por uma montanha-russa. Ele havia seguido Li Qingfeng por desconfiança, mas agora descobria que o mentor por trás de Li Qingfeng era, na verdade, Rong Ke.

Xiao Jingduo não conseguia acreditar que a filha do Príncipe Herdeiro machucaria um estudante sem motivo. Assim, reprimiu suas dúvidas e explicou em detalhes por que estava ali.

— Hoje, um colega da Academia Imperial, Liang Zhihong, foi encontrado morto. O comportamento de Li Qingfeng na cena foi extremamente suspeito. Suspeitei que ele tivesse ligação com o assassino, então resolvi vigiá-lo esta noite. Inesperadamente, ele realmente saiu furtivamente no meio da noite. Eu o segui até aqui, e o restante, Princesa, já sabe.

Li Qingfeng nunca imaginou que seria descrito como “saindo furtivamente”. Seus sentimentos se misturaram, e ele não sabia nem por onde começar. No fim, desistiu e perguntou com curiosidade:

— Como meu comportamento na cena podia ser suspeito? Eu até ensaiei várias vezes...

Xiao Jingduo olhou para Li Qingfeng com desprezo. Aquela pessoa era, de fato, problemática por dizer tais coisas. Rong Ke também perguntou:

— O que você disse naquela hora?

— Eu disse que quando levei Zhihong de volta ao dormitório ontem, ele estava bem. Como poderia, depois de apenas uma noite, ter encontrado um destino tão cruel? Fiz questão de parecer profundamente entristecido. Não havia erro.

Rong Ke suspirou e o olhou com decepção:

— Como você passou na avaliação do Tribunal de Revisão Judicial cometendo um erro tão básico?

— Tribunal de Revisão Judicial? — Xiao Jingduo ficou surpreso. Ele então olhou para Li Qingfeng, atônito. — Você é do Tribunal de Revisão Judicial? Você não é Li Qingfeng?

Li Qingfeng suspirou:

— Ai… para ser honesto, meu nome é Li Qingyun, e sou o Ministro-Chefe do Tribunal de Revisão Judicial. Irmão Xiao, eu realmente quero saber… onde foi que escorreguei?

— Você disse: ‘Como ele pôde encontrar um destino tão cruel depois de apenas uma noite?’ Naquele momento, você estava apenas entre a multidão e nem sequer havia se aproximado do corpo de Liang Zhihong. Como sabia que ele havia sido assassinado e não cometido suicídio?

Li Qingfeng ficou paralisado por um momento:

— Havia sangue por todo o chão. Se não fosse assassinato, o que mais poderia ser?

— Suicídio não envolve sangramento? — rebateu Xiao Jingduo com calma.

Li Qingfeng ficou sem palavras por um instante.

— Achei estranho na hora, e foi por isso que perguntei se você notou algo incomum ao escoltar Liang Zhihong de volta. De fato, você mencionou ter trocado de roupa por causa da neve. Fiquei desconfiado ali, e depois de ouvi-lo, tive ainda mais certeza. Você já sabia que Liang Zhihong estava morto e havia examinado cuidadosamente o corpo, sabendo que foi morto com um único golpe. E as roupas que trocou provavelmente não estavam molhadas de neve, mas manchadas de sangue — por isso teve que destruí-las. Inicialmente, suspeitei que você fosse o assassino de Liang Zhihong.

Xiao Jingduo lançou um olhar para Rong Ke e continuou:

— Agora vejo que, embora você não seja o assassino, está profundamente envolvido com Liang Zhihong. Naquela noite, por algum motivo, você voltou ao quarto dele e o encontrou morto. Surpreso, examinou cuidadosamente o corpo, notando muitos detalhes, e então voltou ao seu próprio dormitório e trocou as roupas manchadas de sangue. Mas não queria que os outros soubessem disso. No dia seguinte, passou propositalmente diante da porta de Liang Zhihong, fingindo ter acabado de saber do ocorrido, assim limpando-se de suspeitas. Infelizmente, você já tinha uma ideia formada, sabendo que ele havia sido assassinado, e isso acabou escapando nas suas palavras.

— Entendi… ser esperto demais acabou me prejudicando — Li Qingfeng sorriu amargamente, então se curvou para Xiao Jingduo. — Irmão Xiao, você é jovem, mas incrivelmente perspicaz. Admiro muito. Teria interesse em trabalhar no Tribunal de Revisão Judicial? Eu não valho tanto, mas talvez possa puxar alguns cordões por você...

Sentada na posição principal, Rong Ke não se irritou ao ouvir as palavras de Li Qingfeng. Apenas sorriu levemente, os olhos cintilando enquanto observava Xiao Jingduo e Li Qingfeng.

Xiao Jingduo achou o sorriso de Rong Ke assustador. Recusou apressadamente:

— Eu não ousaria. Irmão Li, por favor, não brinque com isso.

Li Qingfeng suspirou de maneira afetada:

— Tudo bem. Mas se mudar de ideia, venha me procurar!

Xiao Jingduo percebeu que continuar a falar sobre “puxar cordões” na frente de Rong Ke causaria problemas. Rapidamente mudou de assunto:

— Princesa, já expliquei minha situação. Poderia, por gentileza, esclarecer algumas coisas? Por que o Irmão Li — digo, o Irmão Li Qingyun — estava à espreita na Academia Imperial? Por que Liang Zhihong encontrou tal destino? E...

Por que você, uma jovem dama, está saindo furtivamente do Palácio Leste no meio da noite, tomando um caminho tão indireto... e o que exatamente está planejando?

Rong Ke apoiou o queixo na mão, ainda com uma expressão preguiçosa e casual. De repente, mudou de assunto:

— Lembra da epidemia no verão passado?

Xiao Jingduo suspirou:

— Claro que lembro. Eu participei da fórmula do remédio… como esquecer?

— Aquela epidemia chegou com força, e sua origem estava na água dos poços. Se fosse apenas um poço infectado, seria uma coisa. Mas vários poços na parte sul da cidade manifestaram a doença ao mesmo tempo. Como isso poderia ser algo natural?

O rosto de Xiao Jingduo se tornou sério:

— Princesa, está dizendo que alguém envenenou os poços deliberadamente?

— Sim. Jogaram aves doentes nos poços, espalhando a praga entre os moradores pela água. Hah… não satisfeitos com a surra que levaram, agora recorrem a esses truques baixos.

Se a epidemia tivesse sido causada intencionalmente, aquilo era extremamente grave. Talvez os rumores posteriores sobre o Príncipe Benevolente e os soldados fantasmas também tivessem sido orquestrados por alguém nos bastidores. Xiao Jingduo perguntou:

— O que o povo fez para merecer um destino tão cruel? Já sabemos quem está por trás disso?

Rong Ke não respondeu. Li Qingfeng falou por ela:

— O Tribunal de Revisão Judicial e o Palácio Leste investigam isso há muito tempo. Suspeitamos que foi obra de pessoas vindas de fora de nossas fronteiras.

Os olhos de Xiao Jingduo se arregalaram:

— Quem?

— Os Uigures[1].

Assim que essas duas palavras foram ditas, a sala inteira caiu em silêncio. Após um momento, foi a voz de Xiao Jingduo que quebrou o silêncio:

— Então… quem exatamente era Liang Zhihong?

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[1] “回纥” (Huíhé) refere-se aos Uigures, especificamente ao Caganato Uigur, um poderoso império nômade que existiu no que hoje é a Mongólia e partes da Ásia Central, entre os séculos VIII e IX. Os Uigures frequentemente entravam em conflito com a Dinastia Tang da China nesse período, alternando entre alianças e hostilidades.


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