Capítulo 35: Acertando as Contas Após o Outono


 Tang Xinyi ainda estava ajoelhado no chão quando ouviu aquelas palavras, e uma expressão surpresa surgiu em seu rosto. Pensamentos passaram rapidamente por sua mente. Será que havia alguma pessoa incrível em Taiyuan? Caso contrário, como alguém conseguiria provocar tamanha fúria em Sua Alteza? No entanto, em sua viagem a Taiyuan, ele não havia desrespeitado ninguém...

Sem conseguir entender o motivo, Tang Xinyi permaneceu prostrado no chão e confessou humildemente sua culpa:

— Este servo é o culpado. Este servo é tolo e não sabe qual erro cometeu. Peço que Sua Alteza esclareça.

— Quando esteve na cidade, encontrou-se com... uma criança?

Tang Xinyi pensou por um momento e se lembrou vagamente:

— Sua Alteza está se referindo a esse incidente? — agora estava ainda mais surpreso. Sua surpresa era tamanha que não encontrava palavras, e ao ver isso, o rosto de Qin Yi esfriou, encarando-o sem dizer uma única palavra.

As mãos e os pés de Tang Xinyi ficaram gelados, e o suor escorria por suas costas sem parar. Ele voltou a baixar a cabeça, encostando quase o rosto no chão:

— Este servo estava desesperado procurando por Vossa Alteza e, por isso, foi negligente. A culpa é deste servo. Se uma vida humana foi posta em risco, isso manchará a reputação de Vossa Alteza.

— Tang Xinyi, você costuma me acompanhar até a fronteira e perseguir aqueles bárbaros tártaros. Então, sabe que não é fácil para os plebeus que vivem nessas regiões. Eu vigio a fronteira de Grande Yan para garantir a paz do povo, então não quero ver ninguém do Palácio Oriental tratando vidas com leviandade dentro do país. Caso contrário, vou tratá-los da mesma forma que trato os tártaros.

Naquele instante, nenhum dos servos na sala conseguiu permanecer de pé. Todos se ajoelharam onde estavam. Tang Xinyi encostou a testa no chão três vezes e falou com a voz embargada:

— Este servo merece morrer. Irei agora mesmo receber meu castigo.

Tang Xinyi, afinal, era um subordinado meritório, então, depois de testar sua postura, Qin Yi não o fez perder ainda mais a dignidade. Voltou a se concentrar nos relatórios militares e, ao ver os documentos entregues por dois subordinados, falou com leveza:

— Levante-se.

Tang Xinyi agradeceu e se levantou lentamente. Os demais o seguiram. Curvado, Tang Xinyi permaneceu à espera, sem ousar tomar iniciativa, pois Sua Alteza ainda não dissera mais nada. E, de fato, após aprovar alguns relatórios, Qin Yi perguntou de forma casual:

— Quem mais você encontrou quando esteve em Taiyuan?

Tang Xinyi ponderou com cuidado sobre a intenção de Qin Yi. Será que Sua Alteza estava testando se ele havia formado alianças? Respondeu com cautela:

— Este servo encontrou apenas o Marquês de Changxing. Aquele dia, este servo esbarrou na jovem donzela do Marquês, então não seria apropriado não fazer nada.

Qin Yi zombou:

— Ainda bem que sabe disso. O que o Marquês de Changxing disse?

Ah? Tang Xinyi ficou ainda mais confuso. O que está acontecendo? O que Sua Alteza quer ouvir? Mesmo sendo alguém que servia na Cidade Proibida há anos, ele não conseguia decifrar os pensamentos de seu mestre. Apenas arriscou:

— O Marquês de Changxing disse que tudo estava bem, e também perguntou sobre Vossa Alteza.

Qin Yi pousou o pincel com força e ergueu a cabeça, encarando Tang Xinyi friamente. Esses servos só sabem repetir as mesmas coisas e não vão direto ao ponto. Então ele mesmo perguntou:

— Você mencionou que esbarrou na jovem donzela do Marquês de Changxing. O que aconteceu?

— É o mesmo incidente com a criança — explicou Tang Xinyi rapidamente, achando que Sua Alteza não havia percebido a conexão. — Este servo cavalgava depressa quando uma criança saiu correndo para o meio da rua. Este servo não conseguiu parar a tempo e foi forçado a puxar as rédeas. A jovem donzela da família agiu rapidamente e puxou a criança para longe. Essa jovem do Marquês de Changxing é interessante. Quando este servo partia, ela ainda teve a ousadia de me lançar um olhar severo.

— Ha. — Qin Yi riu e retrucou — Por quê? Não pode ser encarado?

Chu Jinyao até ousou encará-lo. Como Tang Xinyi ousaria ter qualquer objeção?

Tang Xinyi percebeu que o tom de seu mestre não era comum. O suor começou a escorrer como um rio. Ele abaixou rapidamente a cabeça e curvou-se tanto que quase tocava o chão com a cintura:

— Naturalmente posso ser encarado. A culpa é deste servo. Este servo deve ser punido.

Ao ouvir a postura submissa de Tang Xinyi, Qin Yi finalmente cedeu e o autorizou a cumprir sua punição:

— Está bem, pode se retirar. Vá receber os vinte bastões militares. Se eu descobrir que estão conspirando entre si para me enganar...

Qin Yi não concluiu a frase, mas Tang Xinyi já entendeu perfeitamente.

— Este servo não ousaria. Este servo se despede de Vossa Alteza. Que Vossa Alteza receba dez mil bênçãos.

Xiao Linzi, parado ao lado, estava atônito. O que Tang Xinyi teria feito para deixar o Príncipe Herdeiro tão furioso? De acordo com as regras do Palácio, havia bastões verdadeiros e bastões de aparências. Com a posição de Tang Xinyi, o eunuco responsável pela punição jamais ousaria bater de verdade — tudo seria apenas encenação. Na prática, além do Príncipe Herdeiro, ninguém no Palácio ousava impor dificuldade alguma ao Tang GongGong.

Mas se fosse para receber os vinte bastões militares com toda a força, mesmo que Tang GongGong tivesse cultivação interna, não seria algo fácil de suportar.

Tang Xinyi recuou da sala de frente para o Príncipe Herdeiro, pois virar as costas seria desrespeitoso. Só após se afastar o suficiente, virou-se discretamente e apressou os passos em direção à saída.

No instante em que Tang Xinyi estava prestes a cruzar a porta, ouviu a voz do Príncipe Herdeiro soar de repente:

— Pare.

Tang Xinyi parou imediatamente e se virou, respondendo com respeito:

— Que ordens tem Vossa Alteza?

— Receba os vinte bastões ao retornar. Vá para Taiyuan agora e faça algo por mim.


Qi Desheng observou pessoalmente enquanto o trabalhador trancava o depósito e voltava à loja para inspecioná-la novamente. Depois de garantir que não havia nenhuma falha, colocou as mãos atrás das costas e caminhou lentamente para sua residência.

Mandou os servos trocarem suas roupas antes de perguntar pelo seu precioso filho e dispensou todos para poder ir ao escritório acertar as contas.

Ele era comerciante há muitos anos, e a fortuna ancestral havia mais do que dobrado sob suas mãos. Na geração do seu avô, a família Qi era apenas um pequeno comerciante de tecidos nas ruas, mas agora tinham filiais espalhadas por toda Shanxi, com três lojas somente em Taiyuan. O talento de Qi Desheng nos negócios superava o do avô e do pai, a ponto de conquistar aquilo que seus antepassados jamais ousaram sonhar. Pena que, embora pudesse se movimentar livremente no mundo dos negócios e fosse figura conhecida, ele estava travado na questão dos herdeiros.

Tinha mais de quarenta anos e não tinha nenhum filho. Nem sequer uma filha, o que o deixava desesperado. Felizmente, aquelas dez mil taéis de doações ao templo não foram em vão. Quando Qi Desheng tinha quarenta e dois anos, sua quarta concubina engravidou de repente. Ele ficou radiante, e, quando o filho nasceu e a linhagem foi confirmada, promoveu imediatamente a quarta concubina a sua oficial Madame. A honra da mãe aumenta à medida que a posição do filho sobe. Como poderia seu único filho ser criado por uma concubina?

Pensando nisso, Qi Desheng ficou um pouco assustado ao lembrar que sua única semente quase fora levada de volta pelos Céus dois dias atrás. Felizmente, aquela jovem da residência do Marquês Changxing foi ágil e agiu rápido; caso contrário, ele também teria partido junto. Aliás, aquele eunuco sem raízes devia ser cruel para ousar ameaçar sua única semente. Até agora, Bao-er ainda tinha pesadelos à noite.

Qi Desheng suspirou ao abrir as portas. Estalou a língua: — Por que as luzes não estão acesas? Esses servos estão cada vez mais desleixados...

Depois que Qi Desheng se acostumou com a escuridão da sala e conseguiu enxergar, seus olhos varreram o ambiente e pararam no som da porta batendo com força, enquanto suas pernas fraquejavam.

— … Eunuco?

Tang Xinyi estava sentado na cadeira central, com o rosto imóvel na escuridão, o que tornava a cena bastante estranha. Qi Desheng ficou apavorado ao vê-lo e falou, trêmulo: — GongGong Eunuco, por que está aqui? Veio buscar sua demonstração de respeito filial? Por favor, espere um instante, eu já trago!

Qi Desheng estava prestes a abrir as portas para buscar ouro e tesouros quando Tang Xinyi disse:

— Pare.

Com aquela palavra, Qi Desheng não ousou se mover e olhou para Tang Xinyi, tremendo. Todos os mercadores experientes daquela dinastia poderiam chorar de medo naquele momento. Tang Xinyi disse:

— Eu não estou interessado nas suas coisas. Venha aqui, tenho algumas instruções para você.

— O eunuco não quer dinheiro? — Qi Desheng não sabia se devia se preocupar ou não e só conseguiu sorrir, dizendo: — Poder fazer algo para o Eunuco já é uma sorte desta pobre pessoa! Só não sei o que o Eunuco deseja.

No dia seguinte, Chu Jinyao foi até a casa da Madame Zhao para se apresentar, antes de voltar para seu quarto e fazer trabalhos manuais perto da janela. Agora que suas mãos já não estavam mais tão rígidas, ela não só tinha dinheiro, como também muitas sedas, linhas e tecidos coloridos para preencher dois baús inteiros. Antes, não tinha nada e por isso não podia fazer nada; agora, com a riqueza repentina, Chu Jinyao tinha vontade de costurar as roupas que gostava.

Ela costumava mexer nessas coisas no passado, mas infelizmente a família Su era pobre e as roupas das irmãs tinham que ser costuradas e remendadas até não poderem mais ser usadas. Quando voltou para a residência do Marquês Changxing, a família Chu tinha dinheiro, mas nada disso era dela, pois dependia do fundo comum; como poderia então ter tecidos sobrando para brincar? Agora, finalmente a situação melhorou. Ela tinha dois baús cheios de tecidos, e ninguém poderia criticar o que ela fizesse.

Chu Jinyao suspirou ao enfiar a linha na agulha. Há apenas dois meses, ela talvez nem ousasse imaginar que um dia teria trinta taéis de prata e dois baús de tecidos. Pena que Qin Yi já não estava por perto e ela não podia contar isso a ele. O mais triste era que, além de Qin Yi, Chu Jinyao não tinha mais ninguém naquele grande casarão com quem compartilhar tais coisas.

Enquanto pensava, ela se perdeu um pouco em devaneios. A cortina se abriu de repente e a voz de Jiegeng soou:

— Senhorita, a Velha Madame Chu enviou alguém para chamá-la.

Chu Jinyao voltou à realidade imediatamente. Guardou a agulha na cesta de linhas e ajeitou as roupas antes de sair.

— Por que a vovó quer me ver de repente? É alguma coisa importante?

A criada que trouxe a mensagem sorriu e disse:

— A senhorita vai saber quando chegar lá.

Chu Jinyao ficou cheia de dúvidas no estômago ao entrar no Salão Rong Ning. Ao chegar no pátio, notou uma pilha de coisas empilhadas. As criadas cercavam os baús de madeira vermelha e, ao vê-la, chamaram em voz clara:

— Velha Madame, a Quinta Senhorita chegou!

Gu Momo já tinha escutado as vozes e abriu a cortina para Chu Jinyao, sorrindo:

— A Quinta Senhorita chegou! A Velha Madame estava justamente falando de você.

Chu Jinyao olhou para a disposição do Salão Rong Ning. Por mais que observasse, parecia haver convidados. Se haviam visitantes, por que falariam dela? Entrou na sala e viu o convidado, dizendo, surpresa:

— Gerente Qi?

— Sim, sou eu! — o Gerente Qi levantou-se e fez uma reverência com as mãos em concha. Chu Jinyao também retribuiu o cumprimento. A Velha Madame Chu sorriu e fez um gesto para que ela se aproximasse.

— O Gerente Qi veio especialmente para visitar e insistiu em agradecer pessoalmente.

Quando Chu Jinyao ouviu que era por causa disso, respondeu rapidamente:

— O Gerente Qi está sendo muito gentil. Foi só um pequeno favor, não precisa ficar se preocupando com isso.

— A Senhorita salvou meu único filho, que foi a bênção da minha velhice. Para a Senhorita, foi só um pequeno gesto de levantar a mão, mas para mim é uma bondade tão grande quanto o Céu — disse Qi Desheng, com um sorriso agradecido no rosto. Não era de se admirar que ele tivesse conseguido expandir tanto seus negócios. Continuou: — Riqueza é coisa mundana, mas a Senhorita salvou meu pequeno filho, como poderia alguns baús de coisas pagar por isso? Sei que a Senhorita tem status nobre e não precisa dessas coisas, mas eu, como mero comerciante, não tenho outra coisa além desses itens simples. Se a Senhorita não desprezar, por favor, aceite-os.

Chu Jinyao seguiu o gesto da mão de Qi Desheng e olhou pela janela. Só então percebeu que todos aqueles baús aparentemente pesados lá fora eram para ela! Assustada, disse rapidamente:

— Não pode ser. Já recebi os pertences do Gerente Qi, como poderia aceitar presentes tão valiosos?

Qi Desheng respondeu:

— Se a Senhorita recusar, vou me sentir realmente desprezado. Mesmo eu, Qi Desheng, sendo comerciante, sei que uma gota d’água deve ser retribuída com uma fonte jorrando. Sem falar que a Senhorita mostrou imensa bondade à minha família! Se não aceitar, serei mesmo um ingrato sem coração.

(Uma gota d’água deve ser retribuída com uma fonte jorrando: mesmo uma pequena ajuda recebida deve ser devolvida com toda generosidade quando o outro precisar.)

Com tais palavras ditas com tanta convicção, o que mais poderia Chu Jinyao dizer? A Velha Madame Chu viu que Qi Desheng estava muito determinado a presentear Chu Jinyao e apenas lamentou em seu coração que ele realmente era o gerente geral da família Qi, capaz de manter essa postura na hora de retribuir favores. A Velha Madame então falou:

— Já que é a intenção sincera do Gerente Qi, pode aceitar.

Como a Velha Madame falou, Chu Jinyao só pôde concordar. Ela observou, com o coração apertado, enquanto os ajudantes organizavam os baús e os carregavam para seu pátio. Quando Qi Desheng viu que Chu Jinyao finalmente aceitou, respirou aliviado em segredo. Esfregou as mãos e disse para a Velha Madame Chu:

— Velha Madame, tenho outro assunto para falar com a Quinta Senhorita.

Velha Madame Chu ficou surpresa. Ainda não tinha acabado? Ao ver a postura de Qi Desheng, que parecia sincero, ela assentiu levemente:

— Leve o Gerente Qi e a Quinta Senhorita para a salinha menor e conversem.

Gu Momo concordou e os conduziu até a salinha. Chu Jinyao e o Gerente Qi se sentaram ali. Embora solteiras não pudessem se encontrar com homens de fora, Qi Desheng era comerciante e tinha mais de quarenta anos, então era considerado mais velho que ela. Além disso, era pleno dia, com criadas por perto e a Velha Madame vigiando lá fora, ninguém poderia fofocar. Sentando-se, Qi Desheng disse:

— Quinta Senhorita, para ser sincero, depois que salvou meu filho, não consegui dormir direito nos dias seguintes e sonhava com funerais. Depois de conversar com minha esposa, decidimos que eu precisava fazer uma visita à residência do Marquês. Peço que a Quinta Senhorita não me culpe pelo incômodo.

Chu Jinyao levantou-se e fez uma leve reverência:

— Como alguém ousaria reclamar?

Qi Desheng continuou:

— Aquilo que trouxe agora saiu do depósito para compor o enxoval da Senhorita. Como ainda não está noiva, é até inconveniente falar dessas coisas. Mas, independente do que digam, a razão é essa: nunca é demais ter mais dinheiro ao lado. Peço que a Senhorita não ria de minha simplicidade.

Chu Jinyao sorriu:

— O Gerente Qi falou com razão. Entendo.

O Gerente Qi era realmente uma pessoa esperta. Naquela época, muitos literatos desprezavam comerciantes, achando-os cheios do cheiro do cobre e até envergonhados de falar em dinheiro. Mas Chu Jinyao tinha passado por dificuldades, como não entender a importância do dinheiro? Independentemente do que os santos dissessem, dinheiro no bolso era o que mais importava.

— Já que a Senhorita entende, fica mais fácil — disse Qi Desheng. — Dei esses tesouros à Senhorita e, para ser direto, sou grato pela sua bondade e por isso quis presentear com um pouco de riqueza. Porém, tem um ditado: quem fica parado só comendo, no fim consome toda a fortuna. Então abri uma nova loja e quero convidar a Senhorita para ser sócia.

Chu Jinyao ficou surpresa por um instante e perguntou:

— Gerente Qi está brincando?

— Como poderia? — respondeu ele. — Estou falando sério. Mesmo que o lucro mensal não seja grande, vai garantir uma mesada para a Senhorita. Não precisa se preocupar com o capital, porque antes de vir para a residência do Marquês, dividi os presentes da Senhorita em duas partes: uma entregue à Velha Madame Chu e a outra convertida em ações. Trouxe os papéis — disse, tirando um maço de documentos. — Veja, Senhorita, está tudo aqui.

Chu Jinyao olhou para Qi Desheng, desconfiada. Quase achou que o gerente tinha enlouquecido. Comerciantes eram exigentes, e alguns gostavam de retribuir favores, então entendeu quando Qi Desheng quis presenteá-la generosamente. Mas quem daria uma parte da própria renda para outro? E ainda mais para uma estranha que, por acaso, salvou o filho dele? Mesmo que o irmão do gerente ajudasse, duvidava que fizesse algo assim.

Ela se sentiu incomodada, sem saber o que dizer, e acabou sorrindo:

— O Gerente deve estar brincando.

Chu Jinyao achava que Qi Desheng falava aquilo de propósito, para mostrar que sabia como retribuir, e se ela aceitasse, estaria aceitando uma brincadeira. Ao ver que ela não levava a sério, ele rapidamente disse:

— Senhorita, comerciante não brinca com essas coisas! Você deve levar a sério, pois quero mesmo lhe dar essas ações. A nova loja trabalha com tecidos, tem um ótimo funcionamento, gerente e contador. Só que eu não consigo pensar em novas ideias e a loja vem sendo ofuscada pelas concorrentes, então quero convidar a Senhorita para ajudar. Ouvi dizer que a Senhorita tem mãos ágeis e sabe lidar com tecidos. Justamente porque não tem renda, isso resolve os dois problemas. É bom para ambos!

O raciocínio parecia lógico, mas Chu Jinyao não acreditava em coisa boa assim. Não precisava colocar recursos, esforço ou dinheiro, e ainda teria alguém querendo dividir lucros com ela? Não acreditava que houvesse gente tão tola. Qi Desheng viu que ela ainda duvidava e ficou tão ansioso que quase pulou da cadeira. Chu Jinyao olhou nos olhos sinceros dele e, vendo que não parecia brincadeira, levantou-se e disse:

— Não me atrevo a agir sozinha. Preciso consultar os mais velhos.

Qi Desheng concordou depressa. Chu Jinyao saiu para falar com a Velha Madame Chu, que ficou surpresa ao ouvir a proposta. Qi Desheng estava louco? Quem usaria uma loja generosamente para retribuir um favor?

Qi Desheng explicou tudo novamente à Velha Madame Chu, mostrando o contrato. Ela leu várias vezes para garantir que ele não estava pregando alguma peça. Parecia sério em fazer Chu Jinyao sócia, dando dinheiro de graça. Velha Madame Chu hesitou e perguntou:

— Fico tocada pelo entusiasmo do Gerente Qi, mas não sei quais são seus planos?

— Nenhum plano, só quero retribuir à Quinta Senhorita — respondeu o gerente, com medo que ela suspeitasse de algo maior, e rapidamente jurou: — Velha Madame Chu e a Senhorita podem ficar tranquilas. Juro pela loja da família Qi que, se eu usar isso para armar alguma coisa contra a Quinta Senhorita, merecerei ser xingado por todos e perder o negócio da família.

A reputação de um comerciante era o juramento mais sério. Velha Madame Chu e Chu Jinyao se entreolharam, sem saber o que fazer. Velha Madame Chu não teve escolha a não ser dizer:

— Se o Gerente Qi insiste, aceito em nome dela. Se mudar de ideia, que venha me procurar.

— Sou comerciante, como faria isso? — respondeu Qi Desheng, olhando para o contrato nas mãos da Velha Madame. — Sou mesmo grato à Quinta Senhorita e quero fazer o melhor para melhorar a vida da minha benfeitora. Não falo de outras coisas, mas pelo menos não ficarei com mágoas por dinheiro.

Ao ouvir isso, Velha Madame Chu entendeu o recado de Qi Desheng, que tudo aquilo era para Chu Jinyao. Ela ficou um pouco chateada por ser vista assim, mas achava normal o cuidado de um comerciante. Então entregou os documentos a Chu Jinyao:

— O Gerente Qi deu isso a você, guarde bem. Não decepcione a gratidão dele.

Chu Jinyao sentia as palmas das mãos esquentando ao segurar aqueles papéis. Na última vez que saiu, viu a loja de tecidos da família Qi e pensou quando teria uma própria de seda e cetim. Agora estava acontecendo assim?

À noite, Velha Madame Chu discutiu o assunto com o Marquês Changxing. Ele leu o contrato com atenção e esperou vários dias, mas Qi Desheng não mexeu em nada, parecia mesmo sério em dar o dinheiro a Chu Jinyao.

Teriam o gerente da família Qi trocado de ramo para uma instituição de caridade?

A notícia de que Qi Desheng presenteara Chu Jinyao logo se espalhou pela residência do Marquês. Para evitar problemas, Velha Madame Chu pediu especialmente que ela não comentasse sobre a loja. Chu Jinyao não era boba. Aqueles baús eram enormes, impossível esconder, e quanto aos documentos da loja, como contaria para os outros?

Só os baús de mogno já deixavam os outros com inveja, sem saber o que tinha dentro. Se soubessem que ela tinha uma renda vitalícia, não estaria pedindo confusão? Chu Jinyao sabia que a riqueza não podia ser exibida.

À luz, os dedos de Chu Jinyao se moviam com destreza e, em pouco tempo, ela terminou uma rede de nós. Usou os fios novos para trocar o pingente de jade:

— Qi Zi, sabia que existe uma pessoa verdadeira tola neste mundo? Essa pessoa me deu muitas coisas! Agradeço suas palavras de sorte e realmente troquei os fios por ouro!

Enquanto falava, Chu Jinyao começou a rir. Colocou o pingente de jade em pé sobre a mesa e, sob a luz, os fios dourados cintilavam, fazendo o jade reluzente parecer ainda mais atraente. Olhou para o pingente, mas o sorriso no rosto começou a desaparecer rápido.

— Finalmente tenho habilidade para fazer um novo nó para você, mas você não está mais aqui. Gostaria que ainda estivesse. Veja, agora tem muito mais gente no pátio interno me vigiando. Ganhei uma herança repentina, como não chamar atenção? No pátio, Momo Sun e algumas criadas estão prontas para agir, a atitude da vovó comigo está estranha, e Chu Jinmiao nem tenta mais esconder suas intenções maliciosas. Agora sou como uma criança de três anos, andando no mercado com mil taéis de ouro nas mãos. Qi Zi, estou com muito medo. Onde você está?

Depois que Chu Jinyao terminou de falar, o quarto ficou silencioso, só a luz da vela dançava sozinha. Ela deu uma risadinha, autoirônica, e falou baixinho:

— Eu devia saber que esse pingente de jade já é uma coisa morta. Quando eu era negligenciada pela criada, você sempre aparecia para me ajudar. Como pôde ficar parado enquanto eu enfrentava um perigo de vida? Para onde foi que nem se despediu?

Ela fez uma pausa e continuou:

— Se você estivesse aqui, certamente diria que eu tenho que resolver as coisas sozinha, usando a cabeça. Sempre dizia isso, mas na verdade queria resolver tudo por mim. Eu sempre soube disso. Mas, além de ser vigiada e conspirarem pela minha riqueza agora, no futuro vou enfrentar dificuldades para administrar a casa, problemas com a sogra, marido tomando concubinas... Será que tenho que passar por tudo isso sozinha?

Chu Jinyao sabia que não haveria resposta para suas palavras. A breve aparição de Qin Yi ao seu lado lhe permitiu ver a imensidão do céu, mas ele desapareceu do seu mundo sem olhar para trás. Para ele, ela foi só um pequeno erro na vida, mas para ela, Qin Yi era a salvação na longa e silenciosa vida no seu quarto.

— Embora eu ainda não saiba para onde você foi, sei que vai viver bem — finalmente guardou o pingente de jade, colocando-o perto do coração. — Eu também vou viver bem. Você me ensinou tanto, como poderia desperdiçar seu esforço? Finalmente tenho minha própria loja. Mesmo que sejam só algumas ações, já sou dona pela metade. Posso finalmente trazer a irmã Su Hui comigo.

— Veja. Meu desejo se realizou. O seu também vai se realizar.

Chu Jinyao sentiu as chamas à sua frente tremularem, e rapidamente desviou o olhar. Quando tudo clareou de novo, ela se levantou e falou baixinho:

— Zi Ze, boa noite.

Na noite ventosa da Grande Yan, as muralhas da cidade estavam iluminadas por tochas e rigidamente vigiadas.

— Alteza, percebemos o ataque noturno dos tártaros, então achamos que não ousariam se aproximar hoje. Como o vento está forte, volte para descansar — disseram.

Qin Yi olhava o deserto sem fundo com expressão séria. Hoje, os tártaros atacaram com uma pequena cavalaria e tentaram invadir os portões à noite. Se ele não tivesse feito uma ronda inesperada nas muralhas, teriam caído na armadilha. Qin Yi queria esperar até o meio da noite, mas os tártaros eram espertos e descarados. Atacavam desprevenidos e fugiam assim que terminavam. Era realmente irritante. Porém, como Qin Yi havia acabado de se recuperar de uma doença, não conseguia vigiar a noite toda. Por isso, por mais que relutasse, só pôde concordar:

— Está bem. Cuidem-se para não deixarem que eles se aproveitem.

— Sim, acompanharemos a Alteza.

Qin Yi caminhava pela muralha escura como uma fera oculta. A tocha ao seu lado estalou de repente e ele parou, parecendo absorto em pensamentos.

— Alteza, o que houve?

Qin Yi voltou à realidade. Por que achou que ouviu a voz de Chu Jinyao? Ele balançou a cabeça e sua voz foi levada pelo vento noturno assim que falou:

— Não é nada. Talvez seja mesmo hora de descansar.


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