Ming He refletia sobre essa resposta em seu coração e a confirmou; com o aparecimento do gato preto, o próximo momento deveria ser—
—O que eu faço não é da sua conta! — uma voz fria e distante ecoou de longe, chegando quase ao mesmo tempo em que a Espadachim de Preto era arremessada para fora do altar.
Essa voz carregava um frio ainda mais cortante que o da própria Espadachim de Preto; penetrava fundo na alma, congelando o coração de todos apenas com o som. Representava um poder inalcançável, muito além do que podiam imaginar.
Era também uma força que Ming He já ouvira falar — e que já havia visto antes.
Ela ergueu o olhar e viu uma mulher de olhos vermelho-sangue e cabelos brancos descendo graciosamente pelo vazio, passo a passo, como se caminhasse sobre as próprias nuvens, pressionando o coração dos cultivadores ao redor.
Ela irradiava um brilho que ofuscava tudo ao seu redor; Ming He não conseguia captar muito mais apenas observando, mas sentia, instintivamente, que aquela mulher era poderosa — mais forte do que qualquer um que já tivesse encontrado, uma força tão esmagadora que nem mesmo a morada da caverna era capaz de contê-la.
Mais forte que Qin Chu Yi. Mais forte que Ji Wu Xu. Mais forte que a Espadachim de Preto. Mais forte, até mesmo, que o ancião Lin, aquele que havia invocado a caverna à força com as formações.
A mulher de olhos vermelho-sangue e cabelos brancos exalava uma aura de solidão e desprezo pelo mundo, lançando um olhar para a multidão como se fosse uma divindade observando meras formigas.
Seu olhar, feito de sangue, parecia desprovido de emoção — e, ainda assim, escondia profundezas incontáveis, uma profundidade grande demais para que alguém da idade de Ming He pudesse compreender.
Em um instante fugaz, Ming He escaneou seus traços e os gravou em sua mente. Ela era incrivelmente bela, de uma beleza que não seguia nenhum padrão típico, mas não era, necessariamente, a mulher mais bonita que já havia visto.
Ela já havia se deparado com a beleza gélida e arrebatadora de Qin Chu Yi, com a elegância livre de Lou Qing Shang, com a sedutora Ji Wu Xu, capaz de prender almas com o olhar, e com a Espadachim de Preto, cuja presença parecia ressoar com os ritmos do céu e da terra…
Todas eram deslumbrantes à sua maneira, cada uma com sua própria luz. Mas nenhuma podia se comparar à mulher que agora estava diante dela.
Embora seus traços fossem marcantes, não eram tão refinados quanto os de Qin Chu Yi, nem tão encantadores quanto os de Ji Wu Xu. Porém, a aura que ela emanava tornava impossível ignorá-la.
Uma força magnífica, intoxicante e arrebatadora — ela se erguia sobre o altar como uma verdadeira divindade.
Mas ela não era uma divindade. Ming He tinha certeza disso. Talvez fosse até mesmo o oposto dos deuses.
Ming He olhou para a Espadachim de Preto, cuja boca estava manchada de sangue. Ela apertava o cabo da espada com força, apontando-a para a mulher de olhos vermelho-sangue, e disse em voz baixa:
— Esta é a morada dos nossos ancestrais. Já que eles a selaram aqui, agora que o selo se rompeu, eu a selarei novamente.
Se pudesse, ela a mataria também.
— Só você? — a mulher de olhos vermelho-sangue olhou para a Espadachim de Preto com desprezo. — Mas quanta força ainda lhe resta?
Ela parecia desinteressada na Espadachim de Preto. Seu olhar percorreu o altar até encontrar Ming He e Ji Wu Xu, que segurava o artefato espiritual em forma de estrela ao seu lado. Um leve sorriso surgiu em seus lábios — perfeito, a isca estava toda reunida.
Os cultivadores ao redor estavam presos por vinhas vermelho-sangue, com o sangue escorrendo enquanto olhavam para a mulher com medo e desespero. Abriram a boca em súplica, mas perceberam que suas cordas vocais estavam doloridas demais para emitir som. E foi nesse momento que entenderam — não haveria misericórdia.
Essa constatação aprofundou ainda mais o terror em seus corações. Não havia mais esperança. Eles só podiam olhar para o altar.
No topo do altar estavam outras três pessoas — provavelmente as únicas na floresta profunda da caverna que não haviam sido enredadas pelas vinhas de sangue: a Espadachim de Preto, que ninguém ali reconhecia; a mulher de vermelho, estranha a todos; e Ming He.
Ela era discípula hereditária da Seita Liu Yun. A mesma que havia matado o Açougueiro das Mãos Ensanguentadas. Para eles, um fio de esperança.
Ming He encontrou os olhares esperançosos, mas não sentiu emoção alguma. Em vez disso, focava intensamente no gato preto, que subia pelo altar com postura submissa, parando aos pés da mulher de olhos vermelho-sangue. Ergueu a cabeça com um miado fofo:
— Miau~
— Amiga, essa mulher se chama Mu Xuan Ye, a Enviada da Esquerda da raça demoníaca, selada aqui por nossos ancestrais. Agora que o selo foi rompido e ela escapou, por favor, ajude-me a selá-la novamente — disse a Espadachim de Preto com seriedade, curvando-se profundamente diante de Ming He.
Mu Xuan Ye?
O coração de Ming He bateu mais forte, invadido por uma estranha sensação de familiaridade. A Enviada da Esquerda da raça demoníaca — não era ela uma das esposas do Herói Dragão, Su Yu?
Sim. Uma das concubinas.
O harém do Herói Dragão reunia todas as mulheres extraordinárias e belas do Continente Tianwu: amigas de infância gentis e bondosas, Irmãzinhas Júnior mimadas e encantadoras, Irmãs Sênior frias e orgulhosas, pequenas garotas demoníacas ferozes e atrevidas, mulheres deslumbrantes… esses eram os clichês. E Mu Xuan Ye, por acaso, era uma delas.
Ming He lançou um olhar à mulher de olhos vermelho-sangue que se erguia com ar de superioridade, imaginando-a como uma das belezas encantadoras do harém do Herói Dragão, possuidora de uma cultivação profunda e ainda assim devotando favoritismo a aquele humano, Su Yu. Esse pensamento a incomodou.
Não era uma questão de idade ou status. Era apenas que, por mais extraordinário que Su Yu fosse, ele não era digno de Mu Xuan Ye — uma mulher que deveria permanecer sozinha, acima de todos.
Como ela conheceu o protagonista, mesmo, na história original? Parece que… também foi em uma antiga morada ou reino secreto?
Ming He, subitamente percebendo, abriu levemente os lábios, surpresa com o pensamento. Não pode ser… será que eu roubei o protagonismo do herói?
Seita Liu Yun, antiga morada, Trava Estelar — se ela não tivesse aceitado o pedido de Qin Chu Yi, talvez a exploração da caverna nem tivesse começado. Sem isso, Mu Xuan Ye não teria aparecido tão cedo — muito menos teria quebrado o selo.
Então, o verdadeiro momento em que essa caverna deveria emergir seria… daqui a vinte anos?
Mas isso não faz sentido! Como Qin Chu Yi desistiria de abrir a caverna só porque não encontrou um candidato adequado?
Talvez, na história original, Qin Chu Yi estivesse procurando por Su Cheng Feng?
Ming He mergulhou em pensamentos, reunindo as peças do quebra-cabeça em silêncio. A Espadachim de Preto, vendo seu silêncio, pensou que ela não queria ajudar — ou que estava ressentida pelas ações anteriores. Hesitou por um momento e, então, abaixou seu orgulho e disse:
— Amiga, se minha perseguição anterior lhe causou incômodo, peço sinceras desculpas.
Ming He saiu de seu devaneio e olhou para a Espadachim de Preto, que abaixava a cabeça em sinal de arrependimento. Pensou no que seria necessário para selar Mu Xuan Ye novamente. Poderia mesmo ser tão simples assim?
Agora ela compreendia quem era Mu Xuan Ye — e se lembrava dos eventos sangrentos que precederam seu selamento, bem como do que havia feito após se libertar. Se não fosse por Su Yu, talvez ela nunca tivesse tomado o lado da raça humana, podendo até ter se tornado sua inimiga.
Uma personagem fria e impiedosa, capaz de tais atrocidades… será mesmo possível selá-la apenas com a força dela e da Espadachim de Preto?
Ming He achava improvável — e por isso, hesitou.
Infelizmente, Ming He se esqueceu de que já tinha um “histórico” com a mulher de olhos vermelho-sangue.
— Hmph…
A mulher de olhos vermelho-sangue, Mu Xuan Ye, soltou uma risadinha diante das palavras da Cultivadora de Espada de Preto. Ela ergueu a mão delicada e, no momento seguinte, Ji Wu Xu arfou ao perceber que não conseguia segurar o artefato espiritual em forma de estrela, deixando-o escapar de seus dedos e voar direto para a palma da mão de Mu Xuan Ye.
A mão dela era branca e lisa, e o artefato espiritual brilhava suavemente, complementando sua beleza de forma encantadora.
Enquanto Ming He assistia ao artefato voar, Ji Wu Xu, vestida de vermelho, inevitavelmente foi envolvida pelas vinhas vermelho-sangue que brotaram do chão, puxando-a até o tronco da árvore e a prendendo, roubando-lhe a liberdade. Por alguma razão, Ming He sentiu um traço de divertimento com aquilo.
Ji Wu Xu ergueu os olhos e viu o sorriso se formando nos lábios de Ming He, cerrando os dentes em frustração — sem entender por que as vinhas não atacaram Ming He.
Quanto ao motivo de as vinhas não atacarem a Cultivadora de Espada de Preto, ela não era tola. Depois de ouvir o diálogo entre ele e Mu Xuan Ye, compreendeu que a caverna tinha alguma ligação com ela.
A caverna dos nossos ancestrais possui raízes profundas; naturalmente não o atacaria — isso faz sentido.
Mas qual era o passado de Ming He? Ela era apenas uma discípula herdada da Seita Liu Yun!
Ji Wu Xu se sentiu derrotada, abaixando a cabeça como se estivesse revivendo todos os fracassos de sua vida dentro daquela caverna.
Naquele momento, Ji Wu Xu ainda não sabia que a jornada dentro da antiga morada era apenas o começo.
Ming He, por sua vez, estava alheia aos pensamentos de Ji Wu Xu. Apenas lançou um olhar frio para a árvore antes de erguer os olhos para Mu Xuan Ye. Os olhos vermelho-sangue da mulher a fitavam com evidente interesse — parecendo-se com um pesquisador de sua vida passada olhando para um ratinho branco de laboratório prestes a ser dissecado.
Era um olhar ainda mais zombeteiro do que o que se lança a um rato.
O coração de Ming He disparou por um instante ao fitar o artefato espiritual em forma de estrela que brilhava em sua mão direita, seus olhos perdendo o brilho. Se Ji Wu Xu conseguiu pensar nisso, eu também posso — o motivo de as vinhas não atacarem a Cultivadora de Preto era sua ligação com a caverna ancestral; porém, ela mesma não possuía conexão alguma e ainda assim não fora atacada. Restava apenas uma possibilidade.
Estava relacionado com o Trava-Estrelas.
Que tipo de conexão seria essa? Seria possível que…
Ming He se lembrou do momento em que arrancou o artefato espiritual da mão do gato preto meses atrás, e uma clareza repentina lhe atingiu.
— Esta amiga…
Ela olhou para a Cultivadora de Espada de Preto e escolheu cuidadosamente as palavras:
— Eu posso matar demônios e eliminar o mal; é meu dever.
— …Quer dizer que os demônios não têm direito à humanidade? — murmurou Ji Wu Xu.
“Apenas, estou curiosa… quão confiante ela está?” — pensou Ming He. A Cultivadora de Espada de Preto não parecia alguém sem inteligência, então não deveria tentar algo precipitado… certo?
— Amiga, para ser honesta, não tenho muita confiança — respondeu ela com franqueza. — Mas, com o selo rompido e ela escapando, não consigo imaginar o caos que pode se seguir… então, preciso agir.
Ela limpou a poeira cinzenta do manto e empunhou uma espada que, aos olhos de Ming He, carregava uma cultivação insondável.
— Certas coisas precisam ser feitas mesmo sem garantias.
— Mas não precisa se preocupar. Mesmo que essa caverna tenha surgido por obra dela, há limitações. Quem entrar aqui só poderá usar a cultivação do nono nível do estágio de Guiamento Espiritual.
Então a caverna só surgiu por causa das tramas de Mu Xuan Ye?
Ming He soltou um suspiro de alívio. Isso faz sentido — assim, todas as discrepâncias com a linha do tempo original podem ser explicadas.
— Embora só se possa usar a cultivação do nono nível do Guiamento Espiritual, vocês duas ainda não serão páreo para mim — comentou Mu Xuan Ye casualmente, seus olhos fixos em Ming He com intensidade.
— Ouvi dizer que seu nome é Ming He.
Quem disse isso? Só poderia ser alguém que a conhecesse e tivesse interagido com ela — Su Cheng Feng, os discípulos da Seita Liu Yun, Ji Wu Xu. Em outras palavras, tudo o que havia acontecido na caverna durante as últimas duas semanas… ela sabia.
Ming He sentiu um arrepio. Sua Técnica de Controle da Respiração e o pingente de jade não tiveram efeito algum diante dela — era uma supressão absoluta de cultivação.
— Ming He — Mu Xuan Ye falou lentamente. — Você sabia? Esta caverna foi aberta para você.
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