Capítulo 6 ao 10


 Capítulo 6: Adeus

Ao acordar pela manhã, Yue Lingxi sentou-se na cama com uma manta fina enrolada ao redor do corpo. A primeira coisa que lhe veio à mente foi, surpreendentemente, aquele assunto — de fato, eles não pagaram prata ao entrar no posto de controle.

Na noite anterior, Chu Xiang havia retornado às pressas com ela a cavalo. Quando chegaram ao portão, o gigantesco portão da cidade, forjado em ferro, já estava completamente aberto, com bandeiras ostentando o caractere de Chu tremulando ao vento. Os guardas abaixo da muralha permaneciam eretos como bambus, e mesmo com o vento sibilando, não se ouvia um som. Quando Chu Xiang passou montado, todos se ajoelharam em uníssono, com expressões solenes e moral elevado. Embora nenhum som fosse emitido, havia uma reverência incomparável no ar.

De modo geral, é assim que se manifesta o moral de um exército.

Diante de uma formação tão imponente, Yue Lingxi não pôde evitar o impulso de querer se esconder. Felizmente, estava protegida entre os altos e robustos soldados da cavalaria, o que impedia que chamasse atenção. No momento em que atravessaram o corredor estreito, ela ergueu os olhos para o céu escuro e sem fim, incapaz de conter as ondas que se agitavam em seu coração.

Reino de Chu — ela finalmente havia retornado.

O país que deixara aos oito anos agora lhe parecia quase completamente estranho, com construções de estilos diferentes, um povo especialmente hospitaleiro — tudo fazia suas emoções oscilarem. Havia também uma oficial médica no acampamento militar do Estado de Yan que falava num belo dialeto de Wu. Ela se lembrava vagamente da entonação, mas já não conseguia mais reproduzi-la.

Dez anos se passaram, e a invasão do tempo não consegue impedir o que deve ser esquecido — nem o que não deve. Ela é uma pessoa do Reino de Chu, mas se sente completamente deslocada.

Yue Lingxi reprimiu um suspiro no peito. Levantou-se e começou a se arrumar.

Depois de entrar na cidade na noite anterior, foi levada para essa pequena tenda pelos Guardas das Sombras. A razão de não ter sido enviada ao campo de refugiados provavelmente era porque o Exército de Chu havia capturado Mengcheng no dia anterior, e o número de refugiados aumentara drasticamente, fazendo com que o acampamento ficasse lotado, sem lugar para ela.

Desde então, Chu Xiang não teve mais contato com ela. Estava cercado por oficiais e seguiu para a tenda principal do acampamento central. Era uma zona militar fortemente vigiada, onde pessoas não autorizadas não podiam entrar. Ela ficou em um ponto alto e observou de longe, vendo dois homens altos e imponentes se cumprimentando na entrada. Um deles parecia ferido, e Chu Xiang o ajudava. Em seguida, os três entraram na tenda.

Aquele “obrigada” não dito ficou guardado até agora.

Yue Lingxi largou a toalha. A água fria em seu rosto a fez se sentir mais desperta. Pensou por um momento e decidiu sair para dar uma olhada. Era um hábito antigo: sempre que chegava a um novo lugar, fazia questão de observar cuidadosamente o ambiente ao redor.

Ao sair da tenda, a vista se abriu de repente. Acima, o céu azul e o sol escaldante brilhavam intensamente. Abaixo, montanhas verdes acompanhavam a elevação contínua das muralhas e fortalezas da cidade, tingindo a paisagem com uma cor fria e imponente. Havia campos de treinamento por todos os lados, e uma massa escura de soldados em armaduras negras praticava com suas armas — uma cena de tirar o fôlego.

Há soldados feridos indo e vindo por toda parte onde ela está. Deve ser o lado da equipe médica. Acredita-se que uma oficial médica tenha vindo tratar o ferimento em sua perna logo após sua chegada ao acampamento na noite anterior, mas um dos medicamentos estava faltando. Ela levou menos de meio momento para voltar e buscá-lo. No fim das contas, Yue Lingxi havia sido colocada bem perto dali.

Yue Lingxi recordava isso em silêncio, quando de repente uma voz infantil e suave soou atrás dela:

— Irmão Yanxiu, você não vai deixar a irmã enfermeira me fazer tomar aquele remédio amargo e sufocante de novo, né? Eu juro que não estou machucado, acredita em mim?

O menino fazia beicinho e dava passinhos curtos, arrastando-se atrás de Yanxiu como um rabinho. Estava claramente resistente à ideia de ver um médico e tomar remédio. Yanxiu riu e o observou por um tempo, depois parou de andar ao perceber que ele realmente não queria ir.

— Chang’an, você foi sequestrado por Yi Ocidental por meio ano. Nem vou falar sobre como era a vida por lá, mas só nessa fuga você já sofreu bastante. Se não cuidar direito de si mesmo e algo acontecer, como vou explicar isso ao seu irmão?

— Mas eu tô mesmo bem...

Gu Chang’an tentou se defender, mas sua voz foi enfraquecendo aos poucos, até desaparecer completamente sob o olhar gentil, porém firme, de Ye Yanxiu. Ele abaixou a cabeça, resignado, e deixou-se ser conduzido de volta à tenda médica. No entanto, um olhar ao acaso chamou sua atenção e ele parou de repente, antes de sair correndo em direção à bela figura à sua frente.

— Irmã!

Yue Lingxi entendeu essas duas palavras e reconheceu a voz que se aproximava. Não pôde evitar de se virar e, ao ver quem era, seus olhos se iluminaram.

Era o garotinho que ela havia salvado em Mengcheng anteontem!

Yue Lingxi permaneceu parada, sem reagir, mas Gu Chang’an já havia dado dois passos e se atirado em seus braços. Ela cambaleou para trás, mas foi amparada por Ye Yanxiu, que correu até ela com velocidade impressionante e a segurou com o braço, impedindo que caísse.

Assim que ela se firmou, Ye Yanxiu retirou a mão com cortesia e se virou, repreendendo suavemente:

— Chang’an, não pode ser tão rude.

Gu Chang’an pareceu perceber sua falta de educação e imediatamente coçou a nuca, envergonhado:

— Desculpa, irmã. Esqueci do seu machucado na perna. Você tá bem?

Yue Lingxi entendeu apenas metade do que ele disse, mas conseguiu captar o sentido geral pela expressão dele, então balançou a cabeça suavemente.

— Que bom! — Gu Chang’an ficou radiante e empolgado. Sua boca disparou uma enxurrada de palavras como uma metralhadora. — Depois que nos separamos no campo de batalha aquele dia, fiquei muito preocupado. Depois ouvi dizer que você caiu na água, e eu só queria ir até o rio Dongli te procurar! Ainda bem que, com a ajuda do Príncipe Ning, eu soube que com as habilidades dele, você com certeza voltaria em segurança!

Ele tagarelava sem parar, mesmo que Yue Lingxi não entendesse uma palavra — mas Ye Yanxiu compreendia cada sílaba.

Ela era a garota que o Imperador havia salvado.

Na noite anterior, quando Chu Jun conversou com ele em particular e mencionou esse assunto, seu rosto se fechou com insatisfação em relação a Yue Lingxi, que havia colocado Chu Xiang em uma situação perigosa. Pediu que ela fosse enviada ao campo de refugiados o quanto antes. Como supervisor militar, ele sabia que a presença de Yue Lingxi no acampamento não era apropriada. No entanto, não esperava que ela tivesse uma relação tão próxima com Gu Chang’an — o que complicava as coisas.

As famílias Ye e Gu sempre mantiveram boas relações. Sua prima, Ye Sitian, havia se casado com Gu Jingyi, o filho mais velho da Família Gu. Gu Chang’an era seu irmão mais novo — também seu meio-irmão. Ele deveria retribuir essa gentileza em nome da Família Gu. No mínimo, como poderia deixá-la ser enviada para um lugar caótico como o campo de refugiados?

Parece que teria que bater de frente com Chu Jun.

Com isso em mente, Ye Yanxiu juntou as mãos em saudação a Yue Lingxi. Um sorriso gentil surgiu em seu rosto de jade, tornando-o ainda mais acessível.

— Obrigado por salvar Chang’an. Nunca esqueceremos sua bondade. Se algum dia precisar de algo, não hesite em me procurar. Por ora, por favor, descanse aqui. Se precisar de qualquer coisa, é só avisar.

Há um motivo para um cavalheiro saudar alguém de repente. Yue Lingxi olhou para seu rosto bonito e refletiu em silêncio sobre as palavras que acabara de ouvir — algo sobre salvar vidas e curar ferimentos. Ainda não havia compreendido o sentido exato quando, de repente, uma trombeta soou à distância. Ela olhou para Ye Yanxiu com expressão confusa, mas ele a tranquilizou com calma:

— Está tudo bem. Só estão se preparando para sitiar uma cidade.

Cerco!

Dessa vez, Yue Lingxi entendeu — e muitas coisas passaram por sua mente num instante.

Desde que Mengcheng foi destruída, o próximo alvo do exército de Chu só poderia ser Zhacheng, a oeste. Ela havia passado por lá em sua jornada e tinha alguma lembrança do terreno ao redor e dos locais onde os refugiados estavam detidos. Se conseguisse desenhar um mapa e entregá-lo a Chu Xiang, talvez pudesse ser útil. Pensando nisso, fez uma reverência apressada a Ye Yanxiu e voltou rapidamente para sua tenda.

Ye Yanxiu apenas pensou que ela estivesse com medo, curvou-se diante da cortina e depois convenceu Gu Chang’an a ir embora.

Meia hora depois, Yue Lingxi estava diante da tenda central do exército.

Sua tenda estava equipada com todos os materiais de escrita necessários, mas ela havia usado pena de ganso durante o tempo em que esteve em Yi Ocidental. Voltar de repente ao pincel de pelos de lobo causou certo desconforto, então levou mais tempo para concluir o desenho. Felizmente, apenas o exército de vanguarda havia deixado o acampamento — Chu Xiang ainda estava em sua tenda, então ela ainda tinha uma chance de entregar o mapa. Se pudesse ser de alguma ajuda, já seria uma forma de retribuir a gentileza dele.

Perdida em pensamentos, Yue Lingxi apertou inconscientemente o papel de arroz em suas mãos. Só voltou à realidade quando um guarda das sombras se aproximou e sussurrou seu nome:

— Senhorita Yue, pode entrar agora.

Ela assentiu e subiu lentamente os degraus de pedra. Ao se aproximar da cortina de seda escura feita de brocado de Shu, os soldados dos dois lados abriram caminho automaticamente. Deu mais dois passos, e a cortina caiu atrás dela com um leve som. A tenda permanecia iluminada como antes. Ela ergueu os olhos e viu Chu Xiang de pé no centro da mesa de areia, de costas para a luz. Seu braço estava semi-erguido, segurando uma bandeira enquanto procurava um ponto adequado para posicioná-la.

Parecia ele — e ao mesmo tempo, não parecia.

Hoje ele vestia uma túnica de brocado azul-celeste, bordada com ondas e pedras nas golas e punhos, extremamente requintada. Usava um cinto largo com padrão de nuvens na cintura, de onde pendia um simples, porém luxuoso, pingente de jade branco. O adorno balançava suavemente com sua silhueta esguia enquanto ele caminhava, tornando-o ainda mais elegante e imponente.

De repente, o jade branco parou de balançar, e ela ergueu o olhar — bem a tempo de encontrar os olhos estrelados dele, profundos como um abismo, com uma cor intensa como tinta, quase a sugando para dentro.

Sim, ele estava diferente agora. Deixando para trás a aparência desalinhada de antes, agora era uma figura altiva e majestosa, exalando uma aura imponente que não podia ser ignorada.

Yue Lingxi se esforçou para lembrar as lições de etiqueta que aprendera quando criança no Estado de Chu. Então, fez uma saudação cerimonial padrão e disse suavemente:

— Esta plebeia presta respeitos a Vossa Senhoria.

Como nunca havia falado antes, sua voz saiu surpreendentemente rouca. Uma leve ruga surgiu entre as sobrancelhas de Chu Xiang. Em seguida, ele chamou em voz baixa:

— Venha aqui.

Ela obedeceu e se aproximou, parando a três passos de distância.

A expressão de Chu Xiang pareceu ter uma leve oscilação emocional, mas foi tão rápida que era difícil perceber. Ele deu um passo à frente com o pé esquerdo e veio diretamente até ela. Ao olhar para baixo e ver o que ela segurava nas mãos, não pôde deixar de perguntar:

— O que é isso?

— É um mapa topográfico de Zhacheng e informações sobre os locais onde os refugiados estão detidos...

As palavras de Yue Lingxi ficaram suspensas no ar. Ao se aproximar, viu que havia vários mapas já dispostos sobre a longa mesa de madeira de roseira, atrás da mesa de areia. As direções das montanhas, rios e a disposição das fortalezas estavam todas ali, sem omissões. Eram muito detalhados — e muito superiores ao mapa que ela segurava.

Instintivamente, ela puxou a mão de volta.

Os olhos de Chu Xiang se ergueram levemente. Ele estendeu a mão, segurou o pulso dela e puxou o papel de arroz com calma, alisando-o sobre a mesa com um peso de papel em forma de dragão verde. Ignorando a expressão dela, virou-se e examinou o conteúdo por um tempo antes de dizer:

— É um bom desenho. Deixe comigo.

Yue Lingxi ficou atônita. Seu rosto escureceu levemente, e ela quis pegar o mapa de volta. Mas Chu Xiang o empurrou para longe, fora de seu alcance. Permaneceu ali, de braços cruzados, olhando para ela com um leve brilho de satisfação nos olhos. Diante da identidade dele, ela não ousou ultrapassar os limites, então teve que conter o impulso de estender a mão.

— Pode ir.

Chu Xiang a dispensou com apenas essas palavras, depois se virou para pegar a armadura no cabide, aparentemente pronto para se preparar e partir. O guarda das sombras na porta, com ouvidos mais atentos que todos, entrou imediatamente para pedir que Yue Lingxi se retirasse. Ela olhou silenciosamente para o mapa, engoliu toda a frustração e se virou para sair. No meio do caminho, de repente se virou novamente.

— Espadas e fogo não têm olhos... cuide-se, meu lorde.

Chu Xiang parou, virou-se de lado e a olhou à distância. Só depois de um tempo respondeu com duas palavras, a voz clara como água corrente batendo na pedra, espalhando-se lentamente até o fundo dos ouvidos dela:

— Eu entendo.

Capítulo 7: Triunfo

Há mais de vinte anos, o Reino de Chu era tão pobre e fraco que havia se tornado uma casca vazia. Após muitos anos de recuperação, agora renasceu como uma nação rica e poderosa. Esta batalha contra Yi Ocidental é tanto uma demonstração de prestígio nacional quanto uma prova de fogo. Chu Xiang não pretendia travar uma guerra longa e arrastada — seu objetivo final nesta campanha era a cidade de Zhacheng, na margem sul do rio Dongli.

Cem anos atrás, a cidade hoje conhecida como Zhacheng ainda não tinha esse nome. Ela fazia parte do território do Reino de Chu e era chamada de Cidade Zhulang — um ponto turístico pitoresco na região norte, em harmonia com as águas ondulantes do rio Dongli. Mais tarde, foi ocupada pelo povo de Yi Ocidental e rapidamente se tornou uma cidade estratégica para armazenamento de mantimentos e posicionamento de tropas. Por qualquer que fosse o motivo, era um alvo que não podia ser ignorado.

No entanto, a eficácia de combate está diretamente ligada à sua importância. Hoje, a linha de defesa de Zhacheng é sólida como rocha, com oito armas defensivas de grande escala que nem mesmo os pássaros conseguem se aproximar. É tão impenetrável quanto uma fortaleza. O exército de Chu já vinha atacando há muito tempo, mas sem sucesso — a guerra havia entrado em um impasse.

Chu Xiang estava fora há meia quinzena e ainda não havia retornado.

Até mesmo Ye Yanxiu, que estava estacionado na retaguarda, não se sentia tranquilo. Saía cedo e voltava tarde todos os dias, recebendo relatórios de guerra que chegavam como flocos de neve, enquanto organizava o transporte constante de alimentos, forragem e tropas. Parecia calmo e sereno, mas se isso continuasse por mais alguns dias, talvez tivesse que ir pessoalmente à linha de frente e pedir a Chu Xiang que voltasse. A Grande Imperatriz Viúva e sua tia eram os únicos laços de sangue restantes. Se algo semelhante ao que aconteceu na Batalha de Mengcheng voltasse a ocorrer, ele só poderia se desculpar com a própria vida.

Mas ele também sabia que isso era improvável. Para dar o primeiro golpe e intimidar Yi Ocidental, Zhacheng era uma cidade que Chu Xiang estava determinado a conquistar.

Claro, por razões de segurança, a identidade de Chu Xiang ainda era mantida em sigilo dentro do exército. Na superfície, era Chu Jun quem liderava os três exércitos.

Naquela noite, o vento uivava. Na margem sul do rio Dongli, milhares de tendas se estendiam, com chamas altas e fogueiras de sinalização ardendo. Ao longe, via-se apenas o contorno de corvos pairando no céu, indistintos. À medida que se aproximava, o som de espadas sendo afiadas e passos de marcha ecoava sem parar, criando uma atmosfera fria e solene de ferro e sangue — o tipo de ambiente que fazia o coração estremecer.

Logo depois, os portões de ferro se abriram um a um, e a cavalaria de armadura negra irrompeu do acampamento, liderando o ataque contra a cidade sitiada.

Na colina não muito distante, uma figura permanecia de braços cruzados, observando os dois exércitos passarem do silêncio ao estrondo, com soldados invadindo o centro do campo de batalha como formigas. Então, a figura fixou o olhar em um ponto específico e franziu as sobrancelhas.

— Tragam o Príncipe Ning para mim.

A silhueta do guarda das sombras ao lado desapareceu como um raio, com um assobio cortante. Quando retornou, ouvia-se claramente o som de passos adicionais. Embora parecesse quase irreal, a postura do recém-chegado era ereta como uma lâmina afiada, cortando a vastidão da noite, trazendo consigo um traço de imponência ao se aproximar de Chu Xiang e curvar-se respeitosamente.

— Irmão imperial.

Chu Xiang resmungou friamente:

— Ainda sabe que sou seu irmão imperial. Parece que não está delirando de febre, então por que desobedeceu à ordem militar e foi para o campo de batalha?

Chu Jun permaneceu em silêncio, ajoelhado, imóvel.

Ele era filho do Príncipe Rong. Devido aos laços profundos entre seus ancestrais e à relação próxima com o Rei de Chu desde a infância, chamava-o afetuosamente de “irmão imperial”. A família real de Chu sempre teve poucos herdeiros e, nesta geração, restavam apenas dois legítimos — sem outros primos —, por isso não havia grandes conflitos ou tabus.

Atualmente, o imperador aposentado, a imperatriz viúva, o Príncipe Rong e sua esposa estavam todos no Palácio de Xianyang, fugindo do calor do verão. No entanto, esses dois — Chu Xiang e Chu Jun — lideraram tropas rumo ao norte, causando grande alvoroço. Um controlava a situação geral, enquanto o outro avançava no campo de batalha. Cooperavam com perfeição. Mas desde que Chu Jun foi emboscado em Mengcheng, Chu Xiang passou a liderar pessoalmente as tropas, vestindo a armadura de Chu Jun. Após o ocorrido, Chu Jun se recusava terminantemente a deixá-lo ir à linha de frente. Mesmo ferido, voltou ao campo de batalha — apenas para ser surpreendido e capturado por Chu Xiang.

— Não consegue se levantar?

Chu Xiang lançou-lhe um olhar. Chu Jun se levantou lentamente e olhou para os milhares de soldados abaixo da colina, franzindo a testa:

— A batalha desta noite é extremamente crítica. Se não me deixar ir, como Wei Jie poderá lidar com tudo sozinho?

— As pessoas são fixas, mas estratégias não. Embora Wei Jie não tenha tanta experiência, compensa com sua calma. Já o transferi para a linha de frente. Com seu estilo metódico e estável, lutar contra o exército de Yi por uma noite inteira não será problema.

Pelo tom, parecia que Chu Xiang havia designado outras pessoas para algo. Mas para quê?

Chu Jun olhou ao redor do acampamento com expressão desconfiada e, de repente, percebeu que os Guardas das Sombras não estavam ali. Virou-se e viu apenas uns dez soldados dispersos — nem mesmo Liu Yin estava presente. Um choque de raiva e preocupação tomou conta dele:

— Alteza, os Guardas das Sombras devem protegê-lo o tempo todo. Onde os enviou?

Chu Xiang ergueu levemente o queixo e apontou para a área iluminada da cidade:

— Para o campo de refugiados.

Essas três palavras quase causaram um colapso em Chu Jun.

Havia ainda mais refugiados do Reino de Chu em Zhacheng do que em Mengcheng. Era impossível salvar todos — por que tanta pressa? Estava prestes a aconselhar Chu Xiang a revogar a ordem, mas então pensou: “Quando foi que Chu Xiang fez algo sem lógica?” Havia, com certeza, um propósito mais profundo, apenas ainda não revelado. Com isso em mente, uma lembrança lhe veio à tona, e ele perguntou:

— Quem está liderando a missão?

— Melhor perguntar onde está Liu Yin — respondeu Chu Xiang, com um leve sorriso nos lábios, antes de se virar e encará-lo. — Ele tem tarefas mais importantes a cumprir. Não está aqui.

Ele não disse mais nada, e Chu Jun também não insistiu. Mas os sons da batalha, cada vez mais intensos, chegavam até eles, e sua expressão se tornava cada vez mais tensa.

— Irmão imperial, este lugar não é seguro. Deveria recuar para o acampamento de retaguarda.

Mal terminou de falar, um Guarda das Sombras gritou:

— Majestade! Algo estranho está acontecendo com o exército central!

Chu Jun virou-se imediatamente e viu que quatro grandes bestas e catapultas haviam surgido das muralhas da cidade. Suas vigas de suspensão se erguiam até os céus, chamando a atenção. Em teoria, o exército central deveria ter recuado temporariamente, aguardando que as flechas e pedras se esgotassem antes de lançar novo ataque. No entanto, o exército liderado por Wei Jie parecia não ter percebido — ainda estava engajado com o inimigo, sem sinais de retirada.

Havia algo errado.

— Alguém, ordene imediatamente ao mensageiro que acenda o fogo de alerta!

Após dar a ordem, Chu Jun olhou para Chu Xiang. Seu olhar se tornava cada vez mais afiado — indicava que já havia percebido algo, mas não mencionou a ordem que acabara de dar. Parecia estar refletindo sobre algo.

Aquela situação lhe era estranhamente familiar — como formigas presas num pote de mel, correndo em círculos, sem luz...

Num instante, a luz morna que tocava os olhos e sobrancelhas de Chu Xiang perdeu sua temperatura diante da frieza de sua expressão. Uma rajada de vento maligno soprou, e todas as fontes de luz se apagaram. Sua voz enevoada soou na escuridão:

— Enviem rapidamente uma coluna de cavaleiros de elite em prontidão para entrar no cerco inimigo e notificar Wei Jie para mudar para formação defensiva.

Os Guardas das Sombras partiram conforme a ordem, mas Chu Jun estava cheio de dúvidas — com mensageiros transmitindo ordens pelo ar, por que arriscar enviando mais tropas e cavalos?

Num lampejo de percepção, ele compreendeu de imediato. Sua expressão também se tornou séria, e ele se virou, dizendo em voz grave:

— Irmão imperial, o exército central caiu na formação do exército de Yi Ocidental!

Chu Xiang não respondeu, mas sua expressão já dizia tudo.

O povo de Yi sempre teve fascínio pelo estudo das artes de formação — algo muito além das simples mudanças táticas de um exército comum. Eles utilizam a vegetação, pedras, relevo, até mesmo o clima e as estrelas para criar ilusões, capazes de fazer com que quem entre na formação se perca, se fira ou até enlouqueça e morra. Seu poder não pode ser subestimado. Chu Xiang sabia disso. No entanto, como os Yi se entregavam cegamente à feitiçaria, cometiam atos imorais — como o sacrifício de bebês para extrair sangue para seus rituais. Por isso, a corte havia ordenado a supressão dessa prática há muito tempo. Era realmente inesperado vê-la ressurgir ali, naquele momento.

Felizmente, pela reação do exército central, parecia que a formação não era tão poderosa — apenas uma ilusão comum. Por isso, Wei Jie e os demais não conseguiam ver os equipamentos pesados ou os sinais de fumaça usados para transmitir mensagens. Eles haviam enviado alguém para avisar, e ainda havia tempo.

Vendo uma coluna de cavalaria blindada disparar pelo campo de batalha como flechas, rompendo rapidamente o cerco e chegando sob a bandeira do general, os olhos de Chu Xiang se obscureceram por um breve momento, mas logo se voltaram para a imponente Zhacheng.

A formação precisava ser quebrada — mas onde estava o ponto-chave?

Ele examinou cada detalhe das montanhas, florestas e da cidade, até que, de repente, viu uma luz intensa brilhar no oeste. Incontáveis flechas incendiárias traçaram um rio brilhante no céu e desapareceram na torre mais alta em questão de segundos, causando alvoroço dentro da cidade.

Os Guardas das Sombras e os arqueiros iniciaram o ataque.

Uma fagulha acendeu um incêndio. Enquanto os equipamentos pesados ainda estavam engajados no combate direto e não podiam ser realocados, aproveitaram a brecha para atacar e romper o Portão Oeste. Chu Jun esboçou um sorriso de alegria e estava prestes a falar, mas Chu Xiang ordenou de repente:

— Enviem uma mensagem à equipe de arqueiros: concentrem o fogo na torre e suspendam temporariamente a entrada na cidade.

Uma pipa vermelha subiu em espiral ao céu e, após um breve intervalo, incontáveis flechas flamejantes foram disparadas em direção à torre mais alta da cidade. Sob um ataque tão poderoso, logo surgiu uma espessa fumaça da torre, subindo como nuvens e cobrindo metade do céu.

— Irmão imperial, isso...

Chu Jun não compreendia a situação e temia perder a oportunidade, então tentou alertá-lo. No entanto, foi interrompido por um gesto casual da mão de Chu Xiang. Ambos olharam para a torre — agora uma ruína suspensa no céu, com tábuas de madeira se desprendendo uma a uma. Após um estrondo ensurdecedor, ela desapareceu completamente de vista. Ao mesmo tempo, o exército central parecia ter recuperado o vigor, rompendo as linhas defensivas do inimigo e avançando diretamente rumo à cidade!

A formação havia sido quebrada.

Naquele momento, o rosto frio e esculpido como jade de Chu Jun finalmente revelou um traço de surpresa. Ele então se virou e perguntou:

— Irmão imperial, como soube que o olho da formação estava dentro da cidade?

— Alguém desenhou.

Os lábios de Chu Xiang se curvaram levemente, delineando um prazer indescritível. Chu Jun ainda não havia percebido que ele já havia partido, e o som de sua capa roçando pela trilha silenciosa da montanha foi rapidamente engolido pelo trovejar dos cascos de seu cavalo impetuoso.

Era hora de retornar ao acampamento e aguardar boas notícias.

À medida que a meia-noite se aproximava, o exército de Chu retornou vitorioso. O jovem general Wei Jie apressou-se em direção à tenda. De repente, o som de uma xícara se estilhaçando o fez parar no meio do caminho. Ele perguntou ao Guarda das Sombras:

— Quem está lá dentro?

— Respondendo ao general: o lorde Liu Yin acaba de retornar e está em audiência com o imperador.

Wei Jie hesitou por um momento, olhou para dentro através das cortinas finas e viu uma figura ereta como um pinheiro, mas que exalava um frio inexplicável até os ossos. Já era oficial há três anos e vira o imperador muitas vezes, mas nunca o vira tão furioso. Após refletir com cuidado, decidiu apenas fazer uma reverência e se retirar, indo primeiro preparar os assuntos militares.

A pressão dentro da tenda não havia diminuído nem um pouco. Liu Yin estava ajoelhado no chão, sem ousar levantar a cabeça, tentando manter a voz firme:

— Majestade, este assunto... deve continuar sendo investigado?

Chu Xiang segurava o documento — uma cópia dos arquivos do governo de Jiangzhou — com os lábios finos cerrados numa linha rígida. Permaneceu em silêncio por um longo tempo, enquanto as chamas tremeluzentes dançavam sobre suas mangas e ombros, projetando sombras partidas. Era como se queimassem até o fundo do abismo em seus olhos escuros, acendendo uma fúria impossível de apagar.

Era uma lei de dez anos atrás, relacionada a um caso de rebelião...

Ele reconhecia todas as palavras no papel, mas juntas, pareciam estranhas e gélidas.

Aquele era o caso que ele mesmo havia supervisionado anos atrás — nunca o delegara a ninguém — e, ainda assim, o conteúdo do decreto imperial estava completamente distorcido! Havia uma coluna abaixo com cerca de vinte nomes, e cada um deles o deixava mais furioso. Ele os encarou por um momento, depois cerrou os punhos de repente. Quando os abriu, o papel havia se transformado em pó, que caiu lentamente ao chão.

— Majestade, isso...

— Isso é falso.

Liu Yin ficou surpreso. Falso? Impossível! Ele havia se infiltrado secretamente no governo de Jiangzhou para obtê-lo... Antes que pudesse entender, houve um movimento repentino de sombra ao lado da mesa. Ele ergueu os olhos e viu Chu Xiang vestindo o manto e caminhando para fora com uma expressão carregada.

— Preparem os cavalos. Vamos retornar ao Desfiladeiro Yanmen.


Capítulo 8: Dar Conselho

Por causa do ferimento na perna, Yue Lingxi não podia circular muito pelo acampamento e passava a maior parte do tempo sozinha em sua tenda. Sem perceber, já havia se passado mais de meia quinzena.

Talvez tivesse se acostumado com a solidão, pois esses dias de recuperação lhe traziam uma sensação de tranquilidade. Não precisava mais correr dia e noite, nem ficar em constante estado de alerta em cada lugar desconhecido. Os imponentes desfiladeiros do Reino de Chu eram como uma barreira, proporcionando-lhe uma paz e segurança que há muito não sentia.

Mesmo sem ter um lar, era como um pássaro cansado buscando abrigo na floresta.

A língua de Chu era agora seu maior obstáculo. Costumava encontrar maneiras de evitar se comunicar com os outros — como nas visitas de Gu Chang’an —, mas as visitas periódicas da médica militar para entregar os remédios eram inevitáveis. Felizmente, a oficial médica era muito compreensiva, nunca fazia muitas perguntas nem comentava nada com os outros, e até a acobertava quando necessário.

— O ferimento está cicatrizando bem. Amanhã já não precisa aplicar o remédio. Parabéns, pode correr e pular à vontade!

Com um sorriso, Lu Mingrui colocou o último frasco de remédio sobre a mesinha de chá e se virou para guardar os instrumentos usados na inspeção do ferimento. Ao terminar, percebeu que Yue Lingxi a observava com expressão confusa e imediatamente bateu na própria testa.

— Olha só minha cabeça! Eu sabia que você não entenderia, e mesmo assim fiquei tagarelando...

Ela então passou a se comunicar por gestos, e logo Yue Lingxi entendeu o que queria dizer. Murmurou suavemente duas palavras ainda estranhas para ela:

— Obrigada.

— Não precisa agradecer — Lu Mingrui acenou com a mão, despreocupada, e continuou com mais instruções e gestos. — Acabamos de conquistar Zhacheng na linha de frente, há muitos soldados feridos, preciso voltar correndo para ajudar. Lembre-se de aplicar o remédio sozinha.

Seus gestos eram extremamente exagerados. Num momento, fingia cortar alguém com uma faca; no outro, se contorcia como um ferido gemendo. Yue Lingxi não pôde deixar de sorrir ao entender e assentiu, indicando que ela podia ir tranquila. Lu Mingrui não insistiu mais. Levantou a cortina e saiu, acenando de costas, deixando para trás sua figura leve e despreocupada ao longe.

Depois de vê-la partir, Yue Lingxi voltou para dentro da tenda e começou a aplicar o remédio sozinha.

Duas xícaras de água quente sobre a mesa ainda soltavam vapor branco. Ela as afastou e abriu o frasco estreito de vidro. Assim que retirou a rolha, um aroma refrescante se espalhou pelo ar, e a pomada branco-leitosa preencheu o frasco como uma geleia cristalina. Arregaçou a barra da calça e, com o dedo indicador, aplicou uma pequena porção sobre o ferimento, espalhando-a lentamente em movimentos circulares. O toque gelado se espalhou por toda a panturrilha.

Embora não entendesse de farmacologia, sabia muito bem que aquilo era uma substância rara e valiosa. Sem falar na eficácia milagrosa e no efeito de remoção de cicatrizes, os próprios frascos de vidro com reflexos iridescentes já eram algo que pessoas comuns jamais poderiam comprar. Durante a última quinzena, Lu Mingrui viera várias vezes e lhe trouxera cinco ou seis frascos — sem sequer hesitar.

Ela não pôde deixar de refletir profundamente sobre isso.

Mesmo que os cofres militares do Reino de Chu fossem abundantes, como uma simples médica teria acesso a tantos recursos?

Franziu o cenho, pensativa, e seus movimentos foram diminuindo até parar. Sentou-se ali, abraçando os joelhos, mergulhada em pensamentos por um longo tempo.

Foi essa a cena que Chu Xiang encontrou ao chegar.

Havia não apenas feridas novas — mas também cicatrizes antigas.

Ele ficou parado à porta por um longo tempo, encarando a cicatriz na perna dela e esquecendo-se de cumprimentá-la. Lembrou-se do documento oficial falso que recebera na noite anterior, e o fogo sombrio em seu peito voltou a arder — mas ele não demonstrou. Levantou a cortina com firmeza e entrou.

Yue Lingxi ouviu passos atrás de si, rapidamente abaixou a barra da calça e se levantou. Ao ver que era Chu Xiang, curvou-se instintivamente.

— Meu lorde.

Depois de um mês e meio sem se verem, não havia qualquer estranhamento entre eles. Chu Xiang respondeu com um leve som de reconhecimento. Ergueu casualmente a túnica e sentou-se, perguntando:

— O ferimento melhorou?

Yue Lingxi assentiu:

— Já está tudo ótimo, graças às mãos milagrosas da médica Lu.

— Médicos se guiam por observação, olfato, questionamento e pulsação. Todos são indispensáveis. É admirável que vocês duas passem o dia inteiro sem se entenderem e ainda assim consigam tratar o ferimento. Ela merece mesmo tantos elogios.

Na superfície, parecia elogiá-la, mas, ao ouvir com atenção, havia outro tom por trás. Yue Lingxi não pôde deixar de erguer os olhos para ele — e viu que, embora seu rosto estivesse calmo, os olhos profundos brilhavam com um leve traço de divertimento. Ele claramente estava zombando dela. Mas ela não se envergonhou. Ao contrário, respondeu com seriedade:

— De fato, não consigo me comunicar com a médica Lu com a mesma facilidade com que falo com o senhor, meu lorde.

Essas palavras deixaram Chu Xiang extremamente satisfeito por um instante, e sua voz se tornou mais leve:

— Nesse caso, vamos retomar nossa língua materna a partir de hoje. Com sua capacidade de observação e aprendizado, não deve ser difícil.

A proposta era bastante razoável — e atingiu em cheio o coração de Yue Lingxi. Atualmente, o Reino de Chu e Yi Ocidental estavam em pé de guerra. Se alguém percebesse seu sotaque de Yi Ocidental, poderia haver problemas. Além disso, ela estava prestes a partir em busca de Duan Muzheng. A longa jornada seria cheia de montanhas e rios — não poderia mais depender de adivinhações e gestos, certo?

Ao ouvir isso, ela assentiu com alegria:

— O lorde tem razão. Eu realmente devo reaprender a língua de Chu.

— Quando sairmos do Desfiladeiro Yanmen, passaremos no mercado da cidade e compraremos alguns dicionários para estudar — disse Chu Xiang, servindo-se de uma xícara de água do bule de argila roxa sobre a mesa de chá. Depois lançou-lhe um olhar tranquilo e acrescentou: — Eu vou cobrar seus estudos.

— E como o príncipe pretende cobrar?

Chu Xiang curvou levemente os lábios:

— A partir de hoje, falarei com você apenas na língua de Chu, e você deverá me responder também em Chu. Se não entender, pode perguntar. Se não souber falar, eu mesmo ensinarei.

Yue Lingxi hesitou um pouco:

— Mas eu partirei do acampamento militar em dois dias.

Ela foi direta em suas palavras.

Os olhos de Chu Xiang se contraíram levemente, e suas mãos sobre a mesa pareceram ficar um pouco rígidas. Após um momento, respondeu com calma:

— Vai procurar sua irmã de criação? Onde ela mora?

Yue Lingxi lembrou-se de tudo o que havia acontecido, hesitou por um instante e, por fim, disse a verdade:

— Na capital.

A expressão de Chu Xiang mudou sutilmente. Sua voz, no entanto, continuava suave — tão suave que não deixava transparecer nenhuma emoção:

— Parece que estamos na mesma jornada.

— Mesma jornada? — Yue Lingxi ergueu de repente os longos cílios, e seus olhos úmidos mostraram um traço de confusão. Num instante, compreendeu: — Não vamos mais lutar? Mas acabamos de conquistar Zhacheng, a situação está favorável... Isso é ordem do imperador?

À medida que falava, sua voz foi se tornando mais baixa, como se percebesse que estava sendo ousada demais. No entanto, Chu Xiang apenas a encarou, com um leve sorriso nos lábios, e algumas palavras cheias de significado sussurraram em seu ouvido:

— É minha decisão.

Se Yue Lingxi prestasse um pouco mais de atenção naquele momento, perceberia algo estranho em sua expressão. Mas ela apenas abaixou o olhar em silêncio, como se estivesse perdida em pensamentos, e só depois de muito tempo murmurou:

— Achei que o meu lorde continuaria o ataque a Shicheng.

Com uma frase simples, Chu Xiang captou um significado diferente. Seu olhar afiado como o de uma águia percorreu lentamente os objetos da tenda, até repousar sobre a pequena caixa de madeira de cipreste a alguns passos de distância. Após encará-la por um momento, levantou-se de repente e pegou o papel de arroz branco com o selo de tinta ainda úmido — antes que Yue Lingxi pudesse impedi-lo.

Era, de fato, o mapa de formação de Shicheng.

Yue Lingxi não esperava que ele fosse tão sensível, capaz de adivinhar com tanta precisão. Num momento de desespero, estendeu a mão para tentar tomá-lo de volta, mas Chu Xiang já havia colocado a mão esquerda atrás das costas e segurado o pulso dela com a direita. Aproveitando-se da diferença de altura e força, manteve-a longe do mapa e ainda riu levemente.

— Por que está tentando pegar? Não foi feito pra mim?

Seu rosto bonito estava a poucos centímetros de distância, o que já era suficiente para deixar qualquer um tonto e encantado. Quando sorria, era ainda mais deslumbrante. Yue Lingxi foi pega de surpresa e ficou paralisada por um instante antes de reagir. No entanto, não demonstrou a timidez que se esperaria de uma jovem. Em vez disso, o encarou e disse com firmeza:

— O senhor vai retornar à corte. Pra que precisa disso?

— Um dia, vamos precisar. Não custa nada guardar por enquanto — respondeu Chu Xiang, com um tom dominador.

Yue Lingxi não conseguiu refutar, então o acusou diretamente:

— O senhor está sendo irracional.

— Irracional? — Chu Xiang riu de repente, apertou o pulso dela e a puxou para perto, olhando-a de cima e perguntando: — Você claramente desenhou, mas não me entregou. Quando eu encontrei sozinho, ainda tentou esconder. Me diga, quem está sendo irracional?

— Discutir não adianta. Não podia simplesmente fingir que não viu?

— Quem disse que não adianta? — Chu Xiang a encarou, os olhos negros ocultando uma chama que inexplicavelmente a queimava. — Você marcou deliberadamente apenas os pontos de detenção de refugiados no mapa que me entregou da última vez. Acha mesmo que eu não percebi onde está o centro da rota principal deles?

O coração de Yue Lingxi se apertou de repente.

Ao longo dos anos, ela havia lido muito em Yi Ocidental e tinha algum conhecimento sobre formações. No entanto, essa habilidade era proibida — e poderia ser perigosa se os outros descobrissem. Por isso, sempre a manteve em segredo. Infelizmente, o exército de Chu havia montado uma formação para atacar Zhacheng. Ela não suportava ver tantos soldados morrerem, então marcou diversos pontos no mapa sob o pretexto de ajudar os refugiados. Pensou que Chu Xiang destruiria a torre ao resgatá-los, quebrando assim a formação sem perceber. Mas ele entendeu sua intenção!

Naquele momento, ela parecia congelada, incapaz de falar ou se mover. Um arrepio percorreu suas costas, e o vento parecia soprar direto por seu peito.

Agora que ele sabia desse segredo... o que faria com ela?

Yue Lingxi não sabia o que esperar. Com a consciência pesada, temia que suspeitassem ainda mais de suas intenções. Sentia-se cada vez mais desanimada — mas, inesperadamente, Chu Xiang soltou sua mão, segurou-a com firmeza e a conduziu para fora.

— Há um ditado no Reino de Chu que diz: “Aprenda com os pontos fortes dos estrangeiros para derrotá-los”. Parece que você ainda se lembra disso — e aplicou muito bem.

A palma dele estava quente, dissipando o frio em seu coração. Os calos em seus dedos roçavam contra a pele delicada dela enquanto caminhavam, mas ela não sentia dor alguma. Apenas olhava para suas costas e murmurava:

— O senhor não tem medo de usar essa técnica?

— Nos tempos antigos, o povo de Yi Ocidental usou essas técnicas perversas para destruir seis reinos. Quem não teria receio delas? — disse Chu Xiang, caminhando ao longo da fronteira. Sua voz foi se tornando mais lenta e profunda: — Mas eu confio em você.

Yue Lingxi diminuiu o passo, sentindo como se seu coração estivesse submerso em água — encharcado e transbordando.

Como uma condenada de baixa estirpe, ela sempre viveu sob desprezo e desdém desde jovem. Agora que conquistara a confiança de alguém tão talentoso, quão precioso isso era! Por muitos anos, acreditou que não precisava de mais nada — mas agora que, de repente, experimentava o que era ter algo, sentia-se perdida.

Chu Xiang a viu parada ali, hesitante, com marcas profundas entre as sobrancelhas, e se perguntou no que ela estaria pensando. Decidiu interromper o silêncio e disse:

— Se demorarmos mais, o general Wei terá que voltar para a Cidade Zhulang.

Os nomes haviam sido alterados. Parecia que ele definitivamente não permitiria que Yi Ocidental retomasse as cidades ao sul do rio Dongli. Wei Jie provavelmente seria enviado para guarnecer a região — mas o que isso tinha a ver com ela? Yue Lingxi ficou atônita por um momento, até ver o que ele segurava nas mãos — e então compreendeu de repente.

Agora que a Cidade Zhulang se tornara a linha de frente do conflito, era muito provável que fosse atacada por Shicheng. Com esse mapa nas mãos de Wei Jie, poderiam se preparar para o pior.

Pensando nisso, ela se apressou em dizer:

— Eu posso ir entregar pessoalmente. O senhor não precisa me acompanhar.

Chu Xiang a olhou, incapaz de conter o sorriso nos lábios:

— Acha mesmo que Wei Jie entende a língua de Yi? Ou que consegue decifrar seus gestos estranhos?

Yue Lingxi congelou no lugar, desejando poder se acertar com um martelo — como pôde esquecer disso?


Capítulo 9: Entoando Juntos

Tenda central do exército.

Wei Jie já estava de pé diante da mesa havia algum tempo, ouvindo as duas pessoas à sua frente conversarem em língua de Yi por um longo período, sem qualquer sinal de que iriam lhe designar alguma tarefa. Não pôde evitar de erguer os olhos e lançar um olhar naquela direção, mas logo desviou o olhar e soltou um suspiro em silêncio.

Estava cada vez mais difícil entender os pensamentos de Sua Majestade.

Quando entrou para a corte, os ministros mais antigos lhe disseram que o imperador subira ao trono aos dezoito anos — um verdadeiro jovem soberano. Embora agisse com ousadia, seu temperamento era profundo e firme como o do antigo imperador. Especialmente nos assuntos políticos e militares, sempre demonstrava mão de ferro. Esta expedição ao norte não era exceção. Como um dos poucos que sabiam que o imperador estava na linha de frente, Wei Jie testemunhara pessoalmente como ele traçava estratégias e comandava o exército de Chu para retomar cidade após cidade. Era, de fato, corajoso e sábio.

Como súdito, esse era o soberano ideal em sua mente.

No entanto, ao ser convocado hoje, sentia-se um tanto confuso com a cena diante de si. Sua Majestade ignorava o mapa militar especialmente preparado pelo Ministério da Guerra e passava um longo tempo discutindo com uma mulher de Yi usando um papel branco grosseiro. Qual era o significado disso?

Tinha dúvidas no coração, mas não ousava perguntar. A majestade do céu não era algo que se pudesse ofender. Ainda assim, pensava: aquilo era claramente diferente das discussões habituais. Sua Majestade nunca fora tão acessível no exército — exceto com aquela mulher. Era realmente surpreendente.

Enquanto ainda especulava sobre as intenções por trás daquilo, uma voz levemente grave soou à frente:

— General Wei.

Wei Jie se sobressaltou e respondeu rapidamente:

— Às ordens!

— Este é o mapa de formação ao redor de Shicheng. Observe com atenção e pergunte agora se não entender algo — disse Chu Xiang, erguendo a mão e entregando o rolo branco. Wei Jie imediatamente avançou e o recebeu com ambas as mãos.

— Sim, Majestade.

Wei Jie prendeu a respiração e concentrou toda a atenção no plano à sua frente. De repente, seu rosto revelou surpresa — o que pensava ser apenas um esboço de distribuição de tropas, na verdade, era uma formação maliciosa!

Lembrou-se da sensação de estar preso num labirinto naquele dia e sentiu um calafrio. Examinou cuidadosamente o diagrama da formação e, após um longo tempo, disse com seriedade:

— Então, Shicheng também está protegido por esse tipo de magia maligna.

Assim que terminou de falar, Chu Xiang virou-se e sussurrou algo. Yue Lingxi gradualmente mostrou um olhar de compreensão no rosto e então assentiu:

— De fato, no início não percebi, mas quando ficamos presos por uma hora no Vale Lingfeng durante uma corrida noturna, percebi que havia uma formação ali.

Era evidente que Wei Jie não prestava atenção ao que ela dizia — apenas a encarava, chocado, completamente alheio à expressão de ofensa que exibia.

— Sua Majestade está... traduzindo para ela?

No entanto, Chu Xiang não o repreendeu. Em vez disso, franziu levemente a testa e disse a Yue Lingxi:

— Há guerras lá fora e bandidos espreitando nas montanhas e florestas, esperando a chance de causar problemas. Você foi muito ousada em viajar à noite.

Yue Lingxi permaneceu em silêncio. Seu rosto de jade escureceu, como se houvesse algo difícil de dizer.

Os olhos de Chu Xiang não deixaram escapar essa expressão sutil, mas ele não perguntou mais nada. Virou-se, trocando para a língua de Chu, e disse:

— O Vale Lingfeng fica ao sul de Shicheng, a dezenas de milhas da Cidade Zhulang. O exército de Yi certamente tentará de tudo para atrair nossas tropas até lá. Lembre-se de não persegui-los levianamente. A prioridade agora é consolidar a linha de defesa. Se a Cidade Zhulang for perdida, eu o responsabilizarei pessoalmente.

Seu tom era tão calmo quanto a água, fluindo lentamente por todos os cantos da tenda — mas deixando uma marca profunda no coração de Wei Jie. Ele despertou de repente, mas ainda sentia um arrepio percorrendo seu corpo, como se estivesse envolto por uma pressão imensa.

Esse era o imperador que ele conhecia — direto, sem rodeios. Bastavam poucas palavras para fazê-lo suar frio.

Aquele olhar afiado ainda pairava sobre sua cabeça. Wei Jie conteve as batidas aceleradas do coração e respondeu com solenidade:

— Cumprirei suas ordens, Majestade!

A tensão criada por esse breve diálogo não passou despercebida por Yue Lingxi, embora ela não soubesse o motivo. Chu Xiang também não traduziu aquelas últimas frases para ela e apenas perguntou:

— Há mais alguma coisa a explicar?

Ela pensou por um momento e disse a Wei Jie:

— Essas formações têm aparência antiga e provavelmente foram montadas há muitos anos, então pode ser que nem haja mestres de formação no acampamento de Yi. No geral, não é preciso ficar tão nervoso. Se alguém for pego por engano, não entre em pânico. É apenas uma combinação de plantas, montanhas, pedras e os cinco elementos. Não é nenhum fenômeno sobrenatural. Se mantiver a calma, com certeza encontrará uma brecha.

A tradução de Chu Xiang foi bem mais direta:

— Quem espalhar rumores de fantasmas e deuses no exército para abalar o moral será punido conforme a lei militar.

Só isso?

Yue Lingxi o olhou com desconfiança, sentindo que ele estava sendo evasivo, mas Wei Jie respondeu com seriedade e até se curvou diante dela:

— Agradeço pela orientação, senhorita.

Ela ainda conseguia entender a palavra “obrigado” e respondeu com leveza:

— General, não precisa ser tão formal. Eu... tenho mais um pedido a fazer.

Chu Xiang arqueou uma sobrancelha e disse:

— Vá fazer algo por zhen (por mim).

Embora fosse claramente a garota quem havia falado primeiro, por que aquilo virou “fazer algo por ele” na boca de Sua Majestade? Wei Jie ficou confuso, mas sabiamente não fez perguntas. Apenas abaixou a cabeça com respeito:

— Majestade, por favor, dê suas ordens.

Yue Lingxi falou algumas palavras imediatamente, e Chu Xiang fez uma pausa ao ouvir. Seu olhar tornou-se ainda mais profundo e difícil de decifrar.

— É isso que você está pedindo?

Ela assentiu suavemente.

— Como quiser — prometeu Chu Xiang em voz baixa, antes de se virar para Wei Jie. — Há muitas crianças entre os refugiados de Zhulang e Mengcheng. A maioria foi sequestrada por bandidos perto do Desfiladeiro Yanmen para trabalhar como mão de obra infantil. Acomode-as adequadamente e envie um grupo para eliminar os bandidos. Recompense conforme o número de cabeças. Não deixe escapar nenhum.

A segunda metade da ordem era claramente a vontade de Chu Xiang. Wei Jie nunca o vira tão furioso e não pôde evitar de estremecer.

Sim, a Imperatriz Viúva também havia sido sequestrada quando jovem. Depois de resgatada, desenvolveu uma doença crônica que lhe causou grande sofrimento ao dar à luz Sua Majestade. Por isso, o imperador havia emitido um decreto a todas as prefeituras e condados, ordenando a prisão rigorosa de organizações de tráfico infantil. Desde então, tudo parecia estar em paz — mas era inesperado que esse mal tivesse ressurgido nos últimos anos e ainda colaborasse com forças malignas além da fronteira. Não era de se admirar que Sua Majestade estivesse tão furioso.

— Sim, irei cuidar disso imediatamente. Restaurarei a segurança pública para o povo das duas cidades.

Após dizer isso, Wei Jie se curvou e se retirou, mobilizando rapidamente seus subordinados rumo à Cidade Zhulang.

Restaram apenas Chu Xiang e Yue Lingxi na tenda. Com todos os assuntos resolvidos, Yue Lingxi sentiu que também deveria se retirar. Fez uma reverência e caminhou em direção à saída. No meio do caminho, ouviu Chu Xiang dizer atrás dela:

— Volte e arrume suas coisas. Partiremos esta tarde.

Partir à tarde? E não viajar com o exército principal, com tanta pressa?

Yue Lingxi tinha muitas dúvidas no coração, mas respondeu suavemente com um “sim”, pois estava ansiosa para saber notícias recentes de Duan Muzheng. Já fazia três meses que haviam perdido contato, e ela torcia para que ainda estivesse segura...

Ao pensar nisso, seu coração se apertou. Queria voltar logo à tenda, arrumar tudo e partir. No entanto, Chu Xiang era imprevisível — e a chamou novamente. Quando ela se virou, viu o olhar dele pousar sobre ela como fios de seda, atravessando a luz e a poeira da tenda, profundo e insondável, fazendo seu coração estremecer.

— Desde que nos conhecemos, ainda não sei seu nome.

Yue Lingxi hesitou por um momento, e seu corpo virou-se inconscientemente para ele. A luz suave engoliu as bordas de suas roupas e do prendedor de cabelo, deixando apenas uma sombra tênue e persistente — que ele enxergava com clareza.

Ela não queria responder.

Os olhos escuros de Chu Xiang se estreitaram levemente, e a mão que repousava sobre o joelho já havia se erguido até a metade, prestes a deixá-la ir — mas então viu os lábios de lótus dela se moverem suavemente.

— Yue Lingxi. Esse é o meu nome.

Os lábios de Chu Xiang se contraíram imperceptivelmente, e algumas palavras roucas escaparam:

— Certo. Entendido. Pode voltar.

Ela se despediu com graça e atravessou silenciosamente o movimentado acampamento da cavalaria. Ao retornar à própria tenda, foi surpreendida por um visitante inesperado. Ele vestia uma jaqueta azul combinando e usava um pingente de jade da mesma cor, parecendo exatamente um jovem nobre de família proeminente, com uma postura elegante.

Yue Lingxi teve vontade de rir — dias atrás ele viera visitá-la e ela recusara, e agora aparecia com essa pose para assustar alguém?

Como era de se esperar, assim que ouviu sua risada, o ímpeto de Gu Chang’an desmoronou. Ele tropeçou até ela e disse:

— Hã... já que seu pé melhorou, quer sair pra brincar comigo?

Yue Lingxi não fazia ideia de onde ele aprendera aquele Yi tão mal falado. Depois de ouvir por um tempo, sorriu e perguntou:

— E pra onde você quer ir nessas montanhas remotas?

Gu Chang’an inclinou a cabeça e pensou por um bom tempo. Não entendeu o que ela disse, então apenas segurou sua mão e disse:

— Vamos pro campo de treinamento! O Príncipe Ning e o Irmão Yanxiu estão lutando com espadas. Tá emocionante! Vamos assistir juntos!

Foi um golpe de sorte.

Yue Lingxi entendeu algumas palavras, e uma leve dúvida surgiu em seu rosto pálido.

Ele estava lidando com assuntos militares na tenda há pouco, com pilhas de relatórios e documentos sobre a mesa, empilhados até a altura de meia pessoa. Será que já havia revisado tudo tão rápido?

Ela ficou curiosa com a tal “brincadeira” por um momento, mas ao lembrar das palavras de Chu Xiang, decidiu recusar Gu Chang’an sem piedade:

— Não vou. Vou partir esta tarde e preciso arrumar minhas coisas.

Fez um gesto familiar, e o esperto Gu Chang’an entendeu na hora. Olhou para ela, aflito, e perguntou:

— Vai embora? Pra onde?

Yue Lingxi pensou por um instante, mas não conseguiu lembrar como se dizia “capital” em Chu. Só conseguiu usar uma metáfora:

— Um lugar muito, muito distante.

Ao ouvir isso, Gu Chang’an abaixou os ombros, desapontado:

— Mas onde exatamente... Eu ainda não te agradeci por ter salvo minha vida. Eu podia te procurar no futuro...

Yue Lingxi não respondeu. Ficou de frente para Gu Chang’an, com as mangas esvoaçando. Seu olhar suavizou-se, tentando acalmar a tristeza dele.

— Tudo bem! — Gu Chang’an sacudiu as roupas como um pequeno adulto e disse com naturalidade: — Eu sei que minha irmã não é uma refugiada e tem pra onde ir, então não vou te prender aqui. Adeus por agora, e espero que nos encontremos de novo no futuro!

Suas palavras estavam cheias de heroísmo, demonstrando maturidade. Embora Yue Lingxi não entendesse, afagou a cabeça dele para confortá-lo e sussurrou suavemente:

— Adeus.

Gu Chang’an apertou os lábios, virou-se e saiu correndo.

Capítulo 10: A Jornada de Retorno

Os dois viajavam de carruagem rumo ao sul. Embora não fosse tão rápida quanto cavalgar, a carruagem era leve e fácil de conduzir. A paisagem ao longo do caminho — com flores voando e folhas caindo — era bela e agradável. Podia-se dizer que a viagem era bastante prazerosa.

Durante os dez anos em Yi Ocidental, Yue Lingxi nunca saíra de casa. Quando decidiu retornar ao Reino de Chu, basicamente correu da capital até a fronteira, sem nunca ter tido o luxo de apreciar a paisagem como agora. Por isso, costumava passar meio dia sentada junto à janela da carruagem, observando em silêncio as montanhas verdes e os rios que outros considerariam monótonos.

Chu Xiang geralmente a deixava à vontade, mas naquele dia a tempestade de areia lá fora estava forte demais, então Liu Yin fechou a janela. A carruagem ficou subitamente escura, e Yue Lingxi também se virou e sentou-se, com a cabeça baixa, sem saber no que pensava. Ao vê-la assim, Chu Xiang fechou o livro que tinha nas mãos e disse:

— Se estiver entediada, pode praticar a língua de Chu.

— Tenho praticado bastante ultimamente.

E era verdade. Após dez dias de treinamento intensivo com Chu Xiang, Yue Lingxi havia progredido rapidamente. Algumas frases comuns do dia a dia já não eram problema, embora ainda gaguejasse um pouco.

No entanto, a pessoa que normalmente se mostrava tão disposta a aprender, naquele dia se recusava a cooperar — o que deixou Chu Xiang intrigado. Ele franziu a testa e a observou por um tempo, testando-a de propósito:

— Então me diga, em língua de Chu, por que gosta tanto de olhar para fora?

Ele esperava ouvir como ela descreveria a paisagem de Mo Bei, mas ela abaixou a cabeça, pensou por um momento e respondeu com um poema:

— A lua é brilhante na minha terra natal.

A luz nos olhos de Chu Xiang brilhou por um instante e depois se dissipou, deixando apenas um brilho ainda intimidador.

— Você ficou longe de Chu por dez anos, e sua família já sofreu. Por que ainda se importa com este lugar?

Yue Lingxi abaixou o olhar, e sua voz era leve e flutuante como um fio de fumaça:

— Tudo o que aconteceu foi por causa dos crimes hediondos cometidos pelos anciãos do clã. Nós não temos culpa. Por isso, esta terra sempre foi minha pátria, e todo o tempo que passei com minha família está selado aqui. Mesmo que eu não volte agora, minha alma ainda retornará para cá quando eu morrer.

Essas palavras deixaram Chu Xiang sem resposta.

Ele pensava que ela carregava algum ressentimento no coração.

Antes que pudesse dizer qualquer coisa, o cavalo relinchou e parou. Liu Yin bateu levemente na porta da carruagem do lado de fora:

— Jovem mestre, chegamos à estalagem.

O vento lá fora havia diminuído, e o burburinho das pessoas podia ser ouvido — sinal de que já haviam entrado na cidade. Segundo o itinerário, descansariam ali por uma noite. O motivo de não ficarem na estação oficial era para evitar problemas desnecessários. Seus títulos também precisavam ser alterados, apresentando-se como jovens nobres em passeio diante de estranhos.

Chu Xiang desceu da carruagem primeiro, seguido por Yue Lingxi, e os dois entraram na estalagem um após o outro, sem mencionar o assunto anterior.

Era hora do almoço, e a estalagem estava lotada. Todos os assentos estavam ocupados, e os atendentes corriam de um lado para o outro como piões. Liu Yin afastou calmamente as pessoas, tirou dois lingotes de prata e os jogou sobre o balcão:

— Estalajadeiro, nos arrume dois quartos no andar de cima.

Ao ver tamanha generosidade, os olhos do estalajadeiro brilharam. Sem hesitar, virou-se para pegar as chaves. Mas no meio do caminho, sua mão congelou de repente. Forçou um sorriso e disse:

— Perdão, senhor. Acabei de me lembrar... hoje só temos um quarto disponível no andar de cima. No entanto, ainda há alguns quartos no térreo. Os senhores se importariam em ficar lá?

Liu Yin não ousou tomar a decisão por conta própria, então voltou para informar Chu Xiang. Este apenas acenou levemente com a mão, indicando que estava tudo bem, e então se virou para Yue Lingxi:

— Você pode subir depois.

— Sua Majestade quer ceder o quarto de cima para a senhorita Yue dormir? — perguntou Liu Yin, franzindo a testa. Mas antes que pudesse impedir, ouviu Yue Lingxi perguntar:

— É contra a lei em Chu que homens e mulheres dividam um quarto?

A boca de Chu Xiang se contraiu levemente antes de responder:

— …Não existe tal lei.

— Então por que não podemos dividir um quarto como fazíamos em Yi Ocidental?

Yue Lingxi olhou à distância para a localização do quarto térreo através da multidão, achando-o abafado, frio e úmido — cada vez mais inadequado para ela. Estava prestes a sugerir que poderia ficar no quarto de baixo, quando ergueu os olhos e viu Chu Xiang a encarando fixamente, o corpo parecendo enrijecido.

Será que disse algo errado?

Ao se virar, Yue Lingxi notou que a expressão de Liu Yin se tornara ainda mais complicada — parecia conter cautela, surpresa, suspeita e outros significados — o que a fez ter ainda mais certeza de que havia falado algo impróprio. Estava prestes a pegar sua bagagem e correr para o quarto ao lado para resolver a situação, quando Chu Xiang falou em voz baixa:

— Então vamos dividir o quarto.

Yue Lingxi ficou atônita por um momento, depois assentiu:

— Desta vez, você pode dormir na cama.

Num instante, o coração de Liu Yin foi tomado por um redemoinho. Ele quase não conseguiu conter o choque — o imperador dormia no chão quando estavam em Yi Ocidental?

Logo, sua suspeita foi confirmada ao ver Chu Xiang sorrir com os lábios cerrados e dizer:

— Está bem. Eu fico com a cama.

Naquele momento, os dois olharam para ele, e Liu Yin congelou, sem ousar pensar em mais nada. Virou-se rapidamente e foi reservar o quarto, mas a inquietação em seu peito não se dissipava.

— Sua Majestade está mesmo... fora de controle...

Por isso, Liu Yin não conseguiu se acalmar nem mesmo durante a refeição, lançando olhares constantes para a mesa do andar de cima, com medo de que Yue Lingxi dissesse algo chocante e entrasse em conflito com Chu Xiang novamente. No entanto, os rostos dos dois estavam calmos, sem qualquer sinal de tensão causada pelo episódio anterior. Liu Yin ficou um pouco surpreso e então se lembrou de algo.

Dizem que o povo de Yi Ocidental é de mente aberta e não faz distinção entre homens e mulheres. Agora parecia ser verdade. Essa senhorita Yue provavelmente já sofreu tanto que sua coragem não conhece limites.

Pensando nisso, Liu Yin lançou outro olhar para o andar de cima, onde os dois discutiam o que comer.

— Você aprendeu muitas palavras novas recentemente. Que tal escolher os pratos de hoje? — disse Chu Xiang, empurrando o cardápio para Yue Lingxi.

Ela pegou o cardápio com as duas mãos e o examinou rapidamente. No entanto, ficou confusa ao ver nomes como “O Buda Salta o Muro”, “Três Facas com Mel” e “Neve Branca da Primavera Yangchun”.

Sem mudar a expressão, empurrou o cardápio de volta:

— Pode escolher você.

— Depois de tanto tempo te ensinando, eu deveria ao menos ver o quanto aprendeu — disse Chu Xiang, calmo e relaxado, sem qualquer pressão. — Peça o que quiser. Eu como o mesmo.

Já que ele disse isso, o que mais ela poderia fazer?

Yue Lingxi hesitou por um momento, depois apontou decisivamente para o cardápio algumas vezes e o devolveu ao atendente. O rosto do atendente demonstrou certo desdém, mas ele não disse nada — apenas se afastou. Yue Lingxi percebeu claramente a expressão dele. Virou-se e perguntou a Chu Xiang:

— Pedi pouca comida?

— O que você acha? — Chu Xiang manteve a calma e devolveu a pergunta, embora já soubesse a resposta.

— Acho que é o suficiente — disse Yue Lingxi, passando os dedos inconscientemente pelos padrões antigos da mesa e murmurando: — No Ano Novo, minha família costumava preparar só três pratos. Minha mãe refogava alguns vegetais da horta e os cozinhava no vapor com peixinhos secos e vagens secas. Ela colocava um pouco de pimenta e óleo de gergelim, e o cheiro ficava delicioso quando saía da panela. Minha irmã adorava e sempre brigava por eles. Meu pai ficava ao lado dela, observando, e de vez em quando pegava um pedaço de pulmão de porco cozido para acompanhar o vinho.

Chu Xiang manteve a expressão serena enquanto ouvia, mas os cinco dedos apoiados no braço da cadeira se fecharam lentamente. Quando a casa de Yue Qunchuan foi investigada anos atrás, encontraram não apenas milhares, mas dezenas de milhares em dinheiro e bens. Ainda assim, seus parentes próximos viviam em extrema pobreza. Se não fosse por aquele caso, talvez tivessem desaparecido para sempre na longínqua Jiangzhou.

Ele realmente merecia morrer.

Chu Xiang estava imerso nas lembranças de um antigo caso, mas as palavras que saíram de sua boca não tinham relação alguma:

— Então, o que você gosta de comer?

— Eu também gosto de peixinhos secos, mas minha mãe dizia que minha irmãzinha estava crescendo, então eu tinha que deixar todos para ela.

Yue Lingxi estava mergulhada em suas próprias memórias, mas Chu Xiang não disse mais nada, porque compreendia — mesmo que ela desejasse reviver aquela felicidade, jamais poderia provar novamente a comida feita por sua mãe, e sua irmã nunca mais cresceria.

Tudo era irrecuperável.

Após um longo silêncio, o atendente trouxe os pratos para os dois clientes.

— Aproveitem a refeição — disse ele.

Yue Lingxi despertou de seus pensamentos ao som dos pratos e utensílios sendo colocados sobre a mesa. Ao olhar para a comida, de repente congelou. O que ela havia pedido? Um prato de macarrão simples, uma tigela de sopa de cogumelos e meia porção de massa doce torcida — tudo vegetariano, sem um único pedaço de carne!

Infelizmente, Chu Xiang, do outro lado, já havia começado a usar os hashis. Primeiro provou o macarrão, depois serviu uma pequena tigela para ela e disse:

— O sabor é bem leve, você deveria experimentar.

Ela deu uma mordida e achou insosso, sem gosto. Perguntou-se como alguém acostumado com comidas apimentadas como ele conseguia suportar aquilo.

— Não coma isso — disse Yue Lingxi, tirando a tigela com um gesto embaraçado. — “Yangchun Bai Xue” não é uma música refinada? Como virou macarrão com tofu...

— Nos últimos anos, os restaurantes de Chu têm gostado de dar nomes elegantes aos pratos. “Yangchun Bai Xue” ainda é simples. Quando chegarmos à capital, haverá nomes ainda mais inimagináveis — disse Chu Xiang, vendo-a segurar a tigela. Seus lábios finos se curvaram levemente. Ele pegou outro pedaço da massa torcida e ofereceu a ela: — Este é bom, é um petisco típico daqui.

Yue Lingxi já não tinha esperanças quanto aos pratos que havia escolhido. Mas, depois do que ele disse, resolveu experimentar com espírito de curiosidade. Para sua surpresa, a massa torcida era perfumada, crocante e coberta com uma camada de maltose doce, mas não enjoativa. Derretia-se em camadas na ponta da língua, como se estivesse bebendo mel.

Era realmente muito boa.

Embora Yue Lingxi tivesse pouca resistência a doces, ela tinha bastante autocontrole. Comeu apenas um pedaço e largou os hashis. Em vez disso, olhou para Chu Xiang com curiosidade e disse:

— Você parece conhecer bem este lugar.

— Quando era jovem, acompanhei meu tio até a fronteira para treinamento e fiquei aqui por meia quinzena — respondeu Chu Xiang, com naturalidade.

Não era de se admirar que ele não tivesse a arrogância típica da realeza. Saboreava essas comidas simples como qualquer um. A verdade é que ele estava longe de casa desde pequeno.

Pensando nisso, Yue Lingxi serviu uma tigela de sopa para si e outra para Chu Xiang, depois abaixou a cabeça e bebeu em silêncio.

Após a refeição, a estalagem ficou praticamente vazia. O grupo havia viajado por meio dia e estava pronto para descansar e recuperar as energias. Chu Xiang não era exceção. No entanto, assim que entrou no quarto, viu que Yue Lingxi estava prestes a sair. Instintivamente, estendeu a mão e a deteve.

— Aonde você vai?

— À livraria no sul da cidade comprar um dicionário.

Não era coincidência — todas as cidades por onde haviam passado até então eram pequenas, e a compra do dicionário fora adiada. Hoje, finalmente haviam entrado numa cidade de verdade, e ela precisava aproveitar a oportunidade para ir à livraria e dar uma olhada, para não ser criticada por Chu Xiang de tempos em tempos e evitar passar vergonha como naquele dia...

Chu Xiang apenas a olhou e já sabia o que ela estava pensando. Sem dizer muito, perguntou:

— Trouxe prata? Lembra-se do que eu te disse?

Yue Lingxi foi muito obediente:

— Sim, trouxe. Lembro que um liǎng de prata em Chu equivale a 770 qián, não aos 1000 qián de Yi Ocidental.

Chu Xiang assentiu, satisfeito:

— Vá, mas volte logo.

— Está bem — respondeu Yue Lingxi com leveza, antes de se virar e partir.


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