Capítulo 85 a 87


 Lá fora, Wei Chi Die e An Ge pareciam estar conversando com aquelas pessoas, que seguravam lampiões nas mãos e tinham tirado um monte de retratos, comparando-os com dificuldade.

Essa onda atrás de onda parecia interminável. A raiva cresceu em seu coração e, sem dizer uma palavra, Wei Chi Li saltou da carruagem. Sua figura desapareceu tão rapidamente na escuridão que os outros só conseguiram ver um borrão.

Quando Wei Chi Die e os outros reagiram, aquelas pessoas já haviam caído silenciosamente no chão, com os retratos espalhados por todo lado. Wei Chi Li caiu do ar, curvando levemente as costas para aterrissar firmemente.

Vista por trás, sua figura era magra, alta e emanava uma aura que afastava qualquer tentativa de aproximação.

Wei Chi Die abriu levemente a boca, paralisada. Ela também saltou da carruagem e disse, ansiosa:

— Wei Chi Li, o que você está fazendo? E se tivéssemos alertado os inimigos?

— Não vamos. Se esperássemos eles reagirem para atacar, temo que os soldados os seguiriam e nos alcançariam. — Wei Chi Li respondeu, inclinando-se para pegar um dos homens pelo pé e arrastá-lo diretamente para os arbustos ao lado da estrada, cobrindo-o cuidadosamente com a vegetação.

— Venham ajudar. — Wei Chi Li virou a cabeça e ergueu o queixo para os outros.

— Princesa, deixa comigo, deixa comigo! — Xin Ran finalmente encontrou uma chance de “despertar”. Ela ergueu a cortina, saiu da carruagem e rapidamente escondeu os outros homens nos arbustos.

Wei Chi Die observou os movimentos ágeis de Wei Chi Li e pareceu se lembrar de algo. Seus olhos se tornaram um pouco sombrios.

— Vamos sair rápido. Eles só vão acordar de manhã cedo, então precisamos nos apressar. — Wei Chi Li disse enquanto voltava para o assento da carruagem. Suas sobrancelhas franziram levemente, tentando pensar no que fazer a seguir. Ainda precisavam atravessar o território do Reino Yan por um bom tempo, e havia várias prefeituras maiores no caminho. Haveria, sem dúvida, postos de controle e inspeções. Não poderiam simplesmente lutar contra todos que encontrassem, isso consumiria muita energia e poderiam se ferir, o que seria um grande problema.

Talvez pudessem se disfarçar, mas como esconder cinco mulheres tão chamativas?

— Irmã, você sabe como se disfarçar? — Wei Chi Li não teve escolha senão pedir ajuda a Wei Chi Die.

Naquele momento, Xin Ran já havia saído para substituir An Ge na condução. An Ge e Wei Chi Die voltaram para a carruagem para descansar. Ao ouvir a pergunta, Wei Chi Die pensou por um momento e balançou a cabeça:

— Já ouvi rumores sobre isso no JiangHu, mas nunca vi com meus próprios olhos. A chamada técnica de disfarce basicamente apenas esconde a aparência original da pessoa. Por quê? Você quer disfarçar todas nós?

— Tem outra escolha? — Wei Chi Li encostou-se à parede da carruagem, impotente.

Wei Chi Die refletiu novamente e, no final, suspirou, balançando a cabeça.

— Agora há pouco, vi que eles estavam segurando retratos de três de nós. Não tinham nenhum de An Ge e Xin Ran, então, se formos nos disfarçar, só precisamos fazer isso com três. Mas como? — Wei Chi Die tocou seu rosto refinado, ainda um pouco relutante.

Wei Chi Li voltou seu olhar para Liu Luo Yi. Liu Luo Yi encontrou seu olhar repentinamente e ficou paralisada. Piscou algumas vezes e apontou para si mesma:

— Eu?

— Pequena Liu’er, você é excelente em pintura. Acredito que não seja difícil nos maquiar, certo? — Wei Chi Li sugeriu.

Liu Luo Yi ficou em um dilema e mordeu o lábio inferior. Sob o olhar ansioso de Wei Chi Li, assentiu com dificuldade e respondeu suavemente:

— Posso tentar.

Na verdade, ela não tinha certeza de que conseguiria, mas era raro Wei Chi Li pedir sua ajuda, e ela não queria recusar quando finalmente poderia ser útil.

— Está bem. Tente o seu melhor. Se não der certo, deixamos pra lá. — Wei Chi Li sorriu ao ouvir a resposta e pegou um pacote debaixo do assento, entregando-o a Liu Luo Yi.

Wei Chi Die imediatamente arregalou os olhos. Deu um tapa forte em Wei Chi Li e rangeu os dentes:

— Isso é o meu rouge gouache…

— Quando voltarmos para o Território do Norte, eu compro outro para você. — Wei Chi Li respondeu distraidamente e então olhou ansiosamente para Liu Luo Yi.

Liu Luo Yi pegou o pacote e analisou Wei Chi Li e Wei Chi Die. Então, sem dizer uma palavra, pegou Luo Zi Dai e começou a esfregar no rosto de Wei Chi Li.

— Pequena Liu’er, por que eu sinto que tem algo errado? O que você está desenhando no meu rosto...? — Assim que Wei Chi Li perguntou, viu Liu Luo Yi lançar um olhar indiferente para ela. Imediatamente fechou a boca e fechou os olhos, aceitando seu destino.

Com o passar do tempo, as ferramentas nas mãos de Liu Luo Yi mudaram uma após a outra. Wei Chi Li pareceu ouvir Wei Chi Die rindo ao lado. Sentindo um mau pressentimento, olhou para ela, desconfiada.

Esse pressentimento ruim atingiu o ápice quando Liu Luo Yi cobriu sua cabeça com um pano azul feio, que originalmente servia para embrulhar roupas.

— Pronto. Agora vocês precisam trocar de roupa também. Compramos algumas quando passarmos por uma fazenda ao amanhecer. — Liu Luo Yi disse, espalhando as mãos sujas e chamando Wei Chi Die.

O sorriso de Wei Chi Die desapareceu na hora. Ela cobriu o rosto, que tanto prezava, e disse embaraçada:

— Que tal eu não me disfarçar? Só vocês duas já é suficiente.

Wei Chi Li empurrou-a por trás.

Wei Chi Die olhou para An Ge, depois para Liu Luo Yi, que afiava a faca como se fosse abater porcos e ovelhas, então suspirou e aceitou seu destino, sentando-se.

Felizmente, dessa vez, Liu Luo Yi foi mais misericordiosa. Apenas penteou o cabelo dela em um estilo masculino. No caminho, encontraram uma fazenda e bateram à porta, comprando cola de bexiga de peixe e um conjunto de roupas camponesas femininas.

— O que é isso? — Wei Chi Li perguntou, apontando para alguns fios de cabelo cortados por Liu Luo Yi.

— Barba. — Liu Luo Yi respondeu, colando cuidadosamente os fios no rosto de Wei Chi Die, inclusive perto das orelhas. Sua expressão era extremamente séria, como se estivesse lidando com uma obra de arte.

Logo, Wei Chi Die passou de uma mulher bela e sedutora para um homem com barba por fazer. Liu Luo Yi também pegou um traje masculino emprestado de An Ge e vestiu Wei Chi Die.

Wei Chi Li olhou para a nova aparência de Wei Chi Die, agora forte e rude, e não conseguiu conter uma gargalhada. Mas levou um tapa na testa. Wei Chi Die atirou-lhe um espelho de bronze e zombou:

— Olhe para si mesma.

Wei Chi Li pegou o espelho e levou um susto ao ver seu próprio reflexo. Tinha se transformado numa velha enrugada, e o pano azul na cabeça só tornava tudo ainda mais realista.

Liu Luo Yi pareceu lembrar-se de algo e pegou o restante da cola de peixe, espalhando-a pelo rosto de Wei Chi Li. Dessa vez, as rugas ficaram tridimensionais e ainda mais convincentes.

Wei Chi Li olhou para o espelho e quase chorou. Mas, ao mesmo tempo, admirou a habilidade de Liu Luo Yi. Com esse talento, se estivesse nos tempos modernos, mesmo que não fosse pintora, com certeza seria uma maquiadora profissional.

Liu Luo Yi não se tratou com tanto esmero ao se maquiar, apenas desenhou as sobrancelhas mais grossas e fez algo a mais. Em resumo, quando Wei Chi Li olhou para ela novamente, sentiu que havia se transformado em outra pessoa. As sobrancelhas originalmente delicadas e gentis tornaram-se frias e elegantes.

— Então, você é um homem, você é uma mulher e eu sou uma velha? — Wei Chi Li olhou para cada uma delas, uma por uma, e então se inclinou descaradamente ao lado de Liu Luo Yi. — Não, você tem que me disfarçar de homem, assim podemos fingir ser marido e mulher.

— Somos uma família visitando parentes na fronteira. O retrato da princesa é o mais detalhado, então, apenas dessa forma, não despertaremos suspeitas — disse Liu Luo Yi seriamente.

— A pequena Liu’er está certa — Wei Chi Die disse com um sorriso. Estendeu seus longos braços, puxou Liu Luo Yi para seu lado e acariciou sua cabeça com intimidade. — Esposa, vamos sentar juntas.

Quando Wei Chi Li viu isso, sentiu uma onda de ciúmes subir à cabeça. Ela cerrou os punhos, estalando os dedos.

Wei Chi Die ergueu as sobrancelhas com uma expressão vitoriosa. Irritada, Wei Chi Li puxou An Ge, que assistia à cena, e de repente lhe mandou um beijo.

O canto da boca de Wei Chi Die tremeu levemente.

Wei Chi Li e Wei Chi Die brigaram por um tempo e, exaustas, finalmente pararam. O som dos insetos enchia o ar, misturado ao farfalhar das folhas e ao aroma da grama e da terra que flutuava até a carroça. Ao longe, a fumaça pairava pesada e nebulosa. A carruagem sacudia ocasionalmente, mas ainda seguia estável.

Liu Luo Yi permanecia sentada ereta no assento. Olhou para baixo, onde Wei Chi Li repousava sobre seu colo, e então estendeu a mão para afastar suavemente os fios de cabelo do rosto dela. O semblante envelhecido já não era belo, mas ela ainda assim se sentia encantada.

Se alguém estivesse observando naquele momento, ficaria surpreso com a expressão em seus olhos. Eram límpidos como um lago primaveril após a chuva, repletos de ternura, e por vezes, transbordantes.

Ela não fechou os olhos durante toda a noite. Ficou ali, velando por Wei Chi Li, mantendo a postura reta de tempos em tempos. Mesmo quando suas pernas ficaram doloridas e dormentes, não pronunciou uma única queixa.

Alguns dias depois, a técnica de disfarce provou ser extremamente útil. Eles passaram por diversos postos de controle sem levantar suspeitas e seguiram tranquilamente para o norte. A paisagem diante deles mudou: o verde esporádico deu lugar a um vasto tapete de vegetação amarelada que se estendia até o horizonte, fundindo-se ao céu azul. A grama, que chegava à altura da cintura, tornava-se mais densa e, às vezes, se abria ao vento, como ondas se afastando. Entre elas, surgiam de repente chifres de gado e ovelhas.

Liu Luo Yi nunca havia visto um mundo assim. Sentia-se leve e, quando tinha tempo, corria pela grama para perseguir os rebanhos, que não temiam a presença humana.

Wei Chi Li até quis comprar um cordeirinho para ela brincar, mas foi impedida por Wei Chi Die.

À medida que se aproximavam da fronteira, aceleraram o ritmo novamente. Mas, depois de tantos dias de viagem, estavam exaustos tanto física quanto mentalmente. Sem escolha, pararam temporariamente em uma pequena cidade fronteiriça e entraram em uma taverna para beber e descansar.

O povo dali era simples e honesto, com vestes diferentes das das planícies centrais. Muitos estavam enrolados em mantos corta vento e falavam em um idioma que Wei Chi Li não conseguia entender completamente. Bebiam em grandes tigelas e comiam pedaços de carne cortados diretamente de uma perna de cordeiro.

— Não vão para a fronteira nesses dias. A guerra começou por lá e dizem que o Reino de Yan começou a mover seu exército para a região. Acho que não há como evitar essa batalha — disse um homem robusto, balançando a cabeça enquanto comia.

Wei Chi Li parou de comer e prestou atenção. Um mau presságio surgiu em seu peito. De fato, a guerra começou inevitavelmente e antes do tempo previsto no livro. Na história, a guerra entre o Reino de Yan e o Território do Norte acontecia em um período mais frio. Agora, embora fosse outono, ainda fazia calor.

O desfecho do livro permaneceria o mesmo? Ela franziu as sobrancelhas com força, sem nem notar que a carne escorregava de seus hashis.

— Sangue e lágrimas dos camponeses foram derramados naquela guerra. E agora começou de novo. Estamos aqui e não podemos escapar. Devemos ir para a capital o quanto antes, para salvar nossas vidas.

— Capital? Que ilusão. Todos nós da fronteira vivemos da criação de ovelhas. Se chegarmos à capital, seremos apenas refugiados sem nada. Desde quando a corte já se importou conosco? — O homem robusto cortou um pedaço de carne com força, com raiva contida na voz.

— A guerra começou? — Wei Chi Die sussurrou. — Por que aconteceu tão de repente? Isso é ruim, será problemático atravessarmos a fronteira.
Wei Chi Li balançou a cabeça em silêncio. Franziu a testa ao ouvir a conversa das pessoas ao redor e largou os hashis, perdendo a vontade de continuar comendo.
— Vamos nos apressar primeiro. Ainda há uma certa distância até a verdadeira fronteira. Daremos uma olhada na situação antes de discutir. — Wei Chi Li colocou os hashis sobre a mesa, pegou rapidamente sua bagagem e estendeu a mão por hábito para puxar Liu Luo Yi, mas foi interrompida por Wei Chi Die.
— Curve-se um pouco, agora você é uma velha. — Wei Chi Die disse enquanto segurava naturalmente a mão de Liu Luo Yi e saía em direção à porta. Liu Luo Yi lançou um olhar para Wei Chi Li antes de seguir adiante.
Wei Chi Li rangeu os dentes. Balançou a cabeça, se curvou e apoiou-se na mão estendida de Xin Ran.
A carruagem seguiu viagem novamente, mas desta vez ninguém mais conversava ou ria. Todos estavam sérios e preocupados. À medida que se aproximavam da fronteira, Wei Chi Li, por ter uma audição aguçada, conseguia ouvir de tempos em tempos o barulho desordenado de cascos de cavalos e o choque de espadas e alabardas.
Wei Chi Li gritou para que a carruagem parasse. Xin Ran puxou as rédeas com força e disse:
— Princesa, parece que não podemos passar por aqui. Há uma vila ali, por que não damos uma olhada?
Wei Chi Li assentiu. Trocaram olhares e ambas viram a preocupação nos olhos uma da outra.
De longe, a vila parecia normal, mas ao se aproximarem, perceberam que estava arruinada. Havia destroços espalhados pelo chão, e os aldeões haviam trancado portas e janelas ou simplesmente deixado as casas abertas, pois não havia ninguém dentro.
Wei Chi Li bateu em várias portas consecutivamente, mas ninguém respondeu. Não teve escolha a não ser entrar aleatoriamente em uma casa. O lugar estava limpo, mas vazio; todos os objetos de valor e comida haviam sido levados, restando apenas mesas, cadeiras e bancos.
— Não há ninguém aqui. Pelo estado das coisas, eles provavelmente fugiram. — Wei Chi Li pegou as bagagens de todos e as empilhou sobre a mesa. — Vamos usar este lugar por enquanto. Organizem tudo enquanto eu saio um pouco.
Liu Luo Yi, que estava em silêncio até então, de repente a segurou e ergueu os olhos, dizendo:
— Princesa, para onde você vai?
Wei Chi Li sorriu e respondeu:
— Não se preocupe. Só vou dar uma olhada na situação à frente e ver se há um jeito de contornar a fronteira.
Liu Luo Yi assentiu, mas continuou segurando a manga de Wei Chi Li, se recusando a soltar. Seus olhos límpidos pareciam ligeiramente úmidos e fixavam os de Wei Chi Li com insistência.
— Não posso levar você. É muito perigoso. — Wei Chi Li segurou as mãos dela com um suspiro. Vendo que Liu Luo Yi não se movia, abaixou a cabeça e sussurrou em seu ouvido: — Pequena Liu’er, seja boazinha. Juro que voltarei em uma hora.
Ao ouvir isso, Liu Luo Yi assentiu levemente e, só então, soltou as mãos. Wei Chi Li ergueu as sobrancelhas para Xin Ran e disse:
— Xin Ran, proteja a Pequena Liu’er.
Wei Chi Die, ao lado, revirou os olhos. Continuou acariciando a barba falsa em seu rosto enquanto observava Wei Chi Li caminhar até a porta. Depois de hesitar por um longo tempo, deu grandes passos à frente e deu um tapinha no ombro dela.
— Irmã? — Wei Chi Li virou-se e sorriu.
— Você nunca soube se orientar desde criança. E não conhece este lugar tão bem quanto eu. Vou com você. Vamos e voltamos rápido. — Wei Chi Die disse apressadamente, tomando a dianteira.
Wei Chi Li olhou para as costas da irmã, que escondia deliberadamente sua feminilidade, e sorriu, impotente. Estava prestes a segui-la quando, de repente, sentiu alguém se agarrar às suas costas. Um par de pulsos esguios a envolveu pela frente, prendendo-a pela cintura. Um perfume familiar e encantador a envolveu.
— Pequena Liu’er. — Wei Chi Li olhou para as mãos firmemente agarradas às suas e tentou adotar um tom repreensivo, mas o canto de sua boca se ergueu involuntariamente.
Liu Luo Yi estava tão próxima que só conseguia ver as costas retas de Wei Chi Li, exalando um leve aroma de grama. Mas aquele cheiro não era como o da relva comum, parecia misturado com ervas.
Desde o último incidente, se passasse mesmo que um momento sem ver Wei Chi Li, entrava em pânico.
Ela sabia que isso não era certo, mas não sabia como se conter.
Wei Chi Li pousou suas mãos sobre as dela, envolvendo-as completamente, e só então disse:
— Pequena Liu’er, eu preciso ir. Há coisas que não consigo me lembrar direito.
Liu Luo Yi lentamente encostou o rosto nas costas de Wei Chi Li, fechou os olhos e sentiu seu calor.
— É sobre aquele segredo que só nós sabemos? — Liu Luo Yi perguntou suavemente.
— Sim. — Wei Chi Li respondeu. As memórias em sua mente estavam confusas. Não conseguia recordar a causa exata da destruição do Território do Norte. Quando leu o livro, não prestou atenção nos detalhes, e agora era tarde demais para se arrepender.
Liu Luo Yi soltou as mãos, mas, de repente, agarrou o braço de Wei Chi Li e puxou com certa força. Pegando-a desprevenida, Wei Chi Li girou e ficou de frente para ela.
Então, um beijo suave e tímido tocou seu queixo. Era macio, úmido e um pouco seco pela falta de água, mas suficiente para deixá-la imersa em devaneios.
Num instante, o rosto de Liu Luo Yi ficou vermelho. Tentou ao máximo agir com indiferença, recuando dois passos, mas por dentro estava extremamente envergonhada. Seu plano original era beijar Wei Chi Li nos lábios com ousadia, mas não era alta o suficiente para alcançá-los.
Era humilhante demais. Liu Luo Yi não ousava olhar para Wei Chi Li.
Wei Chi Li tocou o próprio queixo com uma expressão confusa, depois riu e provocou:
— Então é assim que a Pequena Liu’er é ansiosa. Espere eu voltar e vou te satisfazer.
Liu Luo Yi ficou olhando para a barra do próprio vestido, sem conseguir dizer uma palavra.
Wei Chi Li ergueu os olhos e viu que An Ge e Xin Ran, que estavam ao lado, já haviam corrido para a casa ao lado com a desculpa de arrumá-la, mas ainda espiavam de tempos em tempos. Não pôde evitar rir. No fim, beliscou o nariz de Liu Luo Yi e saiu.
— Seu rosto ainda parece o mesmo, mas essa expressão apaixonada não combina nada com ele. — Wei Chi Die disse com desdém.
— Será que a irmã está com inveja? — Wei Chi Li não conseguia conter o sorriso.
— Inveja do quê? Quando voltarmos para o Território do Norte, acha que essa princesa terá falta de belas garotas interessadas em mim? — Wei Chi Die zombou.
Wei Chi Li não retrucou. As duas ocultaram sua presença, usaram Qing Gong e logo chegaram ao local de onde vinham os sons de batalha.
A fronteira não era como Wei Chi Li imaginava — uma vastidão plana. Em vez disso, era bloqueada por uma cadeia de colinas irregulares. Eram pequenas, mas se estendiam por uma grande área, cobertas por árvores densas, tornando impossível ver onde terminavam.
— Esta é a fronteira entre os dois países? — Wei Chi Li perguntou, surpresa.
— Sim. É o único caminho para o Território do Norte. Não sei se foi feito pelo homem ou se é uma grande vantagem natural. De qualquer forma, nosso pai sempre disse que o terreno aqui é complicado e, se alguém não souber o caminho, pode se perder.
— Então, como encontramos o caminho?
Wei Chi Die olhou para ela como se fosse uma tola e disse:
— Já esqueceu tudo?
Ouvindo isso, Wei Chi Li olhou com atenção. Wei Chi Die estava certa. O exército vestido com as armaduras do País Yan parecia vasto e poderoso, mas todos estavam apenas de guarda, e o chão estava coberto de cadáveres.
Enquanto Wei Chi Li continuava observando, um arrepio percorreu suas costas de repente. Sua mente trabalhou rapidamente, e finas gotas de suor começaram a escorrer de sua testa.
Wei Chi Die percebeu que havia algo errado com ela e rapidamente estendeu a mão para empurrá-la:
— Wei Chi Li?
Wei Chi Li a ignorou enquanto tentava desesperadamente lembrar-se da descrição no livro. Então, murmurou lentamente:
— Alguém revelou as estratégias de defesa do Território do Norte e o mapa da região. Esta guerra não foi um acidente, foi premeditada.
Foi apenas adiantada — disse para si mesma.
Wei Chi Die ficou surpresa:
— Quem? Como você sabe disso?
— Não importa como eu descobri. Aquele que está agora preso naquela floresta densa deve ser o pai real. — A voz de Wei Chi Li estava muito calma, mas seus punhos cerrados denunciavam que, no fundo, ela não estava nada tranquila.
— O quê?! — Ao ouvir isso, Wei Chi Die quase saiu correndo, mas, por sorte, Wei Chi Li a segurou e a pressionou contra o chão.
— Não aja impulsivamente. Vamos voltar primeiro e então encontrar uma maneira de salvar o pai real. — Wei Chi Li falou, mas, de repente, uma premonição ruim tomou conta de seu coração. Ela sentiu uma vontade incontrolável de voltar imediatamente para a vila aparentemente pacífica.
— Mas… se algo acontecer com o pai real, o que vamos fazer? — A voz de Wei Chi Die tremia. Ela encarava a direção da floresta densa, e seus olhos logo se encheram de lágrimas.
Wei Chi Li nunca a vira assim antes. Naquele par de belos olhos, havia apenas medo.
Wei Chi Die não sabia por que estava agindo daquele jeito. Embora o que Wei Chi Li dissesse não tivesse uma base concreta, ela não conseguia evitar acreditar nela. E, consequentemente, acreditava que seu pai real estava preso na floresta naquele momento.
Ela segurou com força a mão de Wei Chi Li, sua mente um verdadeiro turbilhão.
— Vai ficar tudo bem, vai ficar tudo bem. Relaxe, irmã. — Wei Chi Li apertou sua mão em um gesto reconfortante e falou suavemente. Embora a mente de Wei Chi Die fosse clara, ativa e inteligente, ela sempre se desestabilizava quando se tratava de alguém que lhe era querido.
— Confie em mim, está bem? Nada acontecerá com o pai real. Vamos voltar e discutir com An Ge e Xin Ran. Mesmo que queiramos invadir, não podemos agir de maneira imprudente agora. — Wei Chi Li disse, palavra por palavra, de forma firme, enquanto abraçava Wei Chi Die com delicadeza. — Irmã, eu estou aqui.
Os cílios de Wei Chi Die tremularam levemente. Ela expirou e virou o rosto para olhar para Wei Chi Li.
Embora Wei Chi Li também estivesse nervosa, seus olhos permaneciam claros e determinados.
— Certo. — Wei Chi Die disse.
As duas retornaram à vila na velocidade máxima. Há pouco, Wei Chi Li já se sentia desconfortável, mas agora a inquietação dentro dela crescia cada vez mais.
Ela segurou o pingente de jade em seu peito, repetindo mentalmente que tudo ficaria bem. A vila estava segura com An Ge e Xin Ran ao lado de Liu Luo Yi, então nada de ruim aconteceria.
Mas o destino não atende aos desejos de ninguém.
De longe, Wei Chi Li viu que a vila, que antes estava silenciosa e pacífica, agora estava cercada por pessoas. Eles vestiam armaduras diferentes, mas carregavam a bandeira do País Yan.
Era um exército de reforço. O coração de Wei Chi Li afundou no mesmo instante, e ela quis correr imediatamente, mas se conteve no último momento.
Ela se esgueirou até a parte de trás da casa onde estavam descansando e capturou um soldado que estava urinando.
O homem parecia jovem e ficou tão apavorado que suas calças caíram quando Wei Chi Li o agarrou. Sem perder tempo, ela estrangulou levemente o pescoço dele e perguntou:
— Onde estão as três mulheres que estavam aqui?
O soldado apontou com a mão trêmula na direção da fronteira:
— Para lá… elas correram naquela direção… eles perseguiram, perseguiram…
Ao ouvir isso, uma onda avassaladora de intenção assassina explodiu dentro de Wei Chi Li. Com um único golpe, ela fez o soldado desmaiar. Então, saltou para fora do pátio e correu em direção ao lado norte, com Wei Chi Die logo atrás.

Yuchi Li[1] mordeu o lábio com força, sentindo o gosto do sangue. O medo e o cheiro metálico invadiram sua mente, mas ela não se importou. Só queria ser mais rápida, ainda mais rápida.
Se algo acontecesse com Liu Luoyi, ela nunca se perdoaria.
Depois de caminhar por um tempo indefinido, avistou um grupo de pessoas em combate próximo. Corpos espalhavam-se pelo chão, formando poças de sangue ao redor. Yuchi Li imediatamente pousou e estendeu a mão, puxando An Ge do meio da luta.
— Onde está a Xiao Liu’er[2]? — perguntou rouca. Nem percebeu que seus olhos estavam vermelhos, mas assustou An Ge profundamente.
— Havia muitos perseguidores. Eu fiquei para trás aqui, Xin Ran levou ela adiante — gritou An Ge enquanto derrubava soldados ao mesmo tempo.
— Irmã, fique aqui. — Antes mesmo de terminar a frase, desapareceu como o vento.
Yuchi Die correu alguns passos atrás dela, mas não conseguiu alcançá-la. Só pôde bater o pé, frustrada, antes de se virar para ajudar An Ge.
Usando seu qinggong para se deslocar rapidamente, Yuchi Li escaneava os arredores, temendo perdê-la de vista.
Se Liu Luoyi e as outras tivessem fugido para as planícies, aquela imensidão sem fim, como ela a encontraria? O desespero cresceu em seu peito, e tudo o que pôde fazer foi acelerar ainda mais. Após percorrer uma grande distância, finalmente avistou algumas silhuetas. Mas, ao se aproximar, seu coração despencou.
Era Xin Ran. Ela estava caída no chão, imóvel, com pedaços de grama cobrindo seu corpo. Yuchi Li correu até ela, ajoelhando-se apressada para tomar seu pulso.
Felizmente, seu coração ainda batia. Seu corpo não apresentava ferimentos visíveis. Parecia apenas ter desmaiado.
— Xin Ran! Xin Ran! — Yuchi Li a sacudiu com força. Como ela não acordou, pegou o cantil em sua cintura e despejou água em seu rosto.
O método foi eficaz. O corpo de Xin Ran estremeceu, e seus olhos se abriram de repente.
Yuchi Li não esperou que ela despertasse completamente antes de puxá-la para cima e, articulando bem as palavras, perguntou:
— Onde está a Xiao Liu’er?
— Liu... Senhorita Liu, princesa... — Xin Ran balançou a cabeça, ainda atordoada. — Os perseguidores jogaram alguma substância no ar. Eu perdi a consciência. Eu... eu não sei para onde a senhorita Liu foi...
Ao ouvir isso, o coração de Yuchi Li ardeu de desespero. Quase desmaiou ali mesmo, apoiando-se no chão para não cair.
— Eu vou procurá-la — murmurou.
Levantou-se e pegou uma lâmina caída no chão. Apertou o cabo com força e avançou.
Xin Ran se ergueu com dificuldade, olhando ao redor. Só então percebeu a dimensão do desastre em que estavam metidas. Correu atrás de Yuchi Li, aflita, e choramingou:
— Princesa, me desculpe. Eu falhei em proteger a senhorita Liu. Eu vou com você!
— Não foi culpa sua — murmurou Yuchi Li.
Seus cílios tremiam, e seu cabelo caía sobre metade de seu rosto, escondendo sua expressão.
A paisagem verde e contínua à sua frente parecia infinita. A grama resistente balançava ao vento constante. Pequenas flores pontilhavam o cenário, que deveria ser belo, mas, pela primeira vez, Yuchi Li sentiu apenas vontade de queimá-lo por completo.
Ela procurou sem rumo, vasculhou cada área próxima e até entrou no campo de batalha coberto de cadáveres, em uma busca frenética por qualquer vestígio de um manto branco manchado.
Nada.
Yuchi Li não sabia se ria ou chorava. Apenas sentiu que sua sanidade se esvaía aos poucos. Continuou chamando o nome de Liu Luoyi sem parar.
No fim, sua voz se esgotou até ficar rouca. Felizmente, Yuchi Die a empurrou para o chão e forçou-a a beber um pouco de água.
Deitada, Yuchi Li sentiu o solo frio sob seus dedos. O cheiro fresco da grama a envolvia. Um pensamento atravessou sua mente como um raio.
Se Liu Luoyi tivesse caído nas mãos daqueles monstros... então ela...
Ela queria se estrangular ali mesmo.
Foi ela quem a trouxe. Foi ela quem a perdeu.
Yuchi Li cerrou o punho de repente e o levou à boca, mordendo com tanta força que sua mão ficou coberta de sangue. Yuchi Die arrancou sua mão para longe.
— Yuchi Li! Você enlouqueceu?! — O cabelo de Yuchi Die estava solto, e sua respiração era pesada enquanto gritava, sua voz perfurando os ouvidos de Yuchi Li.
— Ainda não a encontramos, o que significa que ela está bem! Além disso, Liu Luoyi é extremamente inteligente. Aqueles soldados não machucaram Xin Ran, o que prova que Liu Luoyi os atraiu para longe. Ela foi tão corajosa, e você está com esse medo todo?!
Vendo que Yuchi Li finalmente parou de lutar, Yuchi Die se jogou sobre ela, impedindo-a de fazer mais loucuras.
Xin Ran, que antes chorava baixinho ao lado, ao ouvir isso, enterrou o rosto nas costas de An Ge e começou a soluçar ainda mais alto.
— Eu sinto muito... — Mais lágrimas escorreram pelo rosto de Xin Ran, substituindo as que ela tentava limpar.
— Além disso, acabamos de voltar à vila onde os soldados estão aquartelados. Vasculhamos tudo e não a encontramos. Se tivessem capturado Liu Luoyi, já a teriam trazido para cá! — gritou Yuchi Die no ouvido de Yuchi Li, batendo em seus ombros. — Agora levante-se!
Yuchi Li fechou os olhos com força e então assentiu. Vendo isso, Yuchi Die se afastou.
Lentamente, Yuchi Li se sentou. Limpou o sangue de sua mão na roupa e usou a manga para enxugar o rosto sujo de suor e maquiagem borrada.
Manteve o rosto abaixado o tempo todo, sem dizer uma única palavra.
Seu corpo inteiro parecia carregado de um turbilhão de tristeza e fúria, uma visão angustiante. Yuchi Die quis estender a mão para tocar seu ombro, mas hesitou no meio do caminho, seus olhos reluzindo de preocupação.
— A floresta — disse Yuchi Li de repente.
— Que floresta? — Yuchi Die olhou para An Ge antes de franzir o cenho. — Você acha que Liu Luoyi correu para a floresta? Como sabe que ela não fugiu para as planícies?
— Ela não é tão tola — respondeu Yuchi Li com uma voz frágil e rouca.
Ela soltou o cabo da lâmina e sacou seu próprio punhal da cintura.
Liu Luoyi não era rápida. Seria burrice correr para uma área aberta. A floresta era próxima. Era a única opção para despistar os perseguidores.
— Mas a floresta é enorme e cheia de caminhos confusos. Se ela não conhece a área, vai se perder assim que entrar. Sem falar que os soldados do Reino Yan estão por toda parte... Liu Luoyi... — A preocupação no olhar de Yuchi Die se aprofundou conforme falava.
— Quando ela entrou, os reforços ainda não haviam chegado. O cerco é pequeno, servindo apenas para impedir que quem está dentro escape. Eles podem não conseguir impedir alguém de entrar. E eu sinto que Xiao Liu’er encontraria um jeito — disse Yuchi Li.
— Então você quer entrar agora? — As sobrancelhas de Yuchi Die se franziram.
— En — Yuchi Li respondeu com absoluta franqueza.

Ao mesmo tempo, na floresta.
O céu já estava escurecendo, e entre os galhos espessos das árvores acima e o sol poente, estava bem sombrio na floresta.
Um tronco de árvore morto jazia atravessado entre duas colinas, quase como uma ponte. Um grupo de pessoas, vestidas com roupas negras, estava em cima dele, imóveis. Outro grupo cercava um homem, que era alto, usava roupas luxuosas e estava adornado com jade e pedras preciosas ao redor de seu pescoço e pulsos. Ele não dizia uma palavra, mas cada um de seus gestos transbordava dignidade.
Uma mulher vestida de branco foi jogada casualmente aos pés dele. Várias outras pessoas se curvaram em saudação:
— Meu rei, esta é a mulher que acabou de correr para dentro. Uma mulher.
O Rei do Norte lançou um olhar para a mulher, sem se mover. Simplesmente virou a cabeça e continuou olhando para o céu, lamentando a passagem das estações[1].
Depois de esperar um momento, e vendo que ninguém fazia um movimento contra ela, virou-se para examinar os arredores. Pelo modo estranho como as pessoas ao seu redor estavam vestidas, não pareciam ser do Reino de Yan.
Liu Luoyi deu mais alguns passos para trás, depois começou a correr. Depois de um tempo, parou. Ninguém a seguira, e à sua frente só havia uma floresta densa. Ela não sabia onde ficava a estrada, nem para onde ir.
E sob o opressor dossel da floresta, quem saberia que perigos estavam à espreita.
Ela hesitou por um momento, então finalmente se virou e caminhou de volta com extremo cuidado. O homem com as roupas exageradas não havia se movido e continuava, como antes, olhando para o céu. Os outros soldados a observavam ocasionalmente, mas sem a ordem daquele homem, não falariam com ela.
Ela se sentou e abraçou os joelhos, encarando-os com vigilância.
— Meu rei, quais são as intenções da mulher? — O soldado que havia falado antes abaixou a cabeça e perguntou ao Rei do Norte.
O Rei do Norte respondeu friamente:
— Não se importem com ela. Vai escurecer em breve. Acendam uma fogueira.
— Sim, senhor!
Logo, uma fogueira ardente foi acesa. As noites no norte eram extremamente frias, mas com o fogo, ficavam muito mais confortáveis. O Rei do Norte se sentou ao lado do fogo, aquecendo-se e esfregando o estômago.
— Meu senhor, vasculhamos a área. Não há comida. Só conseguimos pegar dois coelhos. — O soldado levantou um coelho, o animal lutando pela vida enquanto tentava escapar.
O Rei do Norte franziu a testa, depois assentiu. Uma multidão se reuniu ao redor dos coelhos para discutir como despediçá-los. Enquanto o Rei do Norte os observava, o franzido em sua testa se aprofundava. Seus subordinados experientes haviam morrido tentando romper o cerco, restando apenas os novatos. Lealdade era uma coisa, mas não havia um rosto familiar entre eles.
Ao pensar nos soldados corajosos e bons generais que morreram em batalha ou foram separados deles, não pôde deixar de puxar um pouco mais sua capa de pele.
Estava realmente frio.
Liu Luoyi estava usando apenas um vestido fino. Ela estava tremendo de frio. Abraçou os joelhos para tentar se aquecer, mas isso não ajudava muito. O vento gelado da noite soprava, realmente difícil de suportar.
O Rei do Norte a olhou de relance, depois voltou a olhar para o fogo, em seguida voltou a olhá-la. Por fim, tirou a bela pele que usava e a passou para o soldado ao seu lado, com a expressão congelada. Fez um gesto com a cabeça para que ele a entregasse a Liu Luoyi.
— Mas meu rei, a identidade da mulher não é certa… — O soldado pequeno coçou a cabeça. Então, seus olhos brilharam de repente, — Já sei. Essa mulher é realmente bonita, então ela deve ser uma beleza rara!
— Você não entende nada. — O Rei do Norte repreendeu. Ele franziu a testa para ele, e isso foi suficiente para o soldado pequeno não ousar dizer mais nada.
— Ela parece ter a mesma idade que minha filha. — Quando falou a palavra "filha", seu tom suavizou e preocupação apareceu em seu olhar. Suspirou profundamente e não olhou mais para ela.
O soldado jogou a capa ao lado de Liu Luoyi, confuso, e então voltou. Liu Luoyi se assustou e tomou um susto. Ela agarrou a capa, sem saber o que fazer.
Olhou para o homem responsável. Ele não a olhava, mas não parecia ter intenções más. Cerrando os dentes, ela enfiou os braços e colocou a capa.
Ela se recusava a morrer congelada ali.
À sua frente, os pescoços dos coelhos foram quebrados e suas peles removidas, mas o grupo de homens não sabia o que fazer depois disso.
Liu Luoyi os observou, então reuniu coragem para dizer:
— Removam os órgãos internos, depois as assem.
Sua voz estava baixa, mas clara. Os homens viraram a cabeça para ela e a analisaram, depois se olharam sem saber o que fazer. Esse grupo de soldados nunca havia ido à batalha, nem tinham vivido ao ar livre. Cresceram matando gado e ovelhas como algo natural, mas para algo tão pequeno quanto um coelho, não tinham ideia de como começar.
Além disso, estavam cozinhando para seu rei. E se errassem e fossem decapitados? Depois de passar a tarefa uns aos outros, acabaram em um impasse.
O Rei do Norte já havia percebido esses pensamentos deles. Ele os olhou de relance, então perguntou:
— Vocês sabem cozinhar?
Liu Luoyi ficou atordoada por um momento antes de perceber que ele estava falando com ela. Ela assentiu.
— Venha aqui. — O Rei do Norte disse. Sua voz era firme e áspera, com um tom imponente, como se não aceitasse argumentos.
Liu Luoyi olhou para a floresta, que agora estava completamente escura. Sabia que não poderia sair sozinha e não pensava que eles tivessem más intenções contra ela. Então, ela se levantou com coragem e pegou os pobres coelhos.
Suas mãos tremeram ao tocar a carne dos coelhos, mas ela logo controlou o movimento e, fingindo estar acostumada a assar coelhos na selva, fez o seu melhor para remover os órgãos dos coelhos. Pegou um galho de árvore e usou-o como espeto para assar os coelhos.
Não havia temperos ou condimentos, mas à medida que a pele dos coelhos assados se tornava dourada, um cheiro saboroso se espalhou pelo ar. Todos os homens, famintos por não comerem o dia todo, começaram a salivar de antecipação.
Mesmo com apenas dois coelhos, e os soldados só podendo assistir enquanto o Rei do Norte os comia, eles estavam bastante satisfeitos.
Agora, os coelhos estavam prontos. Liu Luoyi passou os dois espetos para o Rei do Norte. O Rei do Norte os aceitou, os colocou perto do nariz e os cheirou, então assentiu, seus olhos cheios de aprovação.
— Quando este rei — ele fez uma pausa — era jovem, eu costumava cozinhar coelhos na selva. Eles cheiravam exatamente assim.
O Rei do Norte suspirou e deu uma mordida, seu rosto cheio de satisfação enquanto mastigava.
Ele passou o espeto restante para Liu Luoyi, fazendo um gesto com a cabeça.
Vendo sua expressão sincera, nem orgulhosa nem submissa, ele de repente explodiu em risadas. Deu um tapinha nos ombros dela, com tanta força que parecia que ia jogá-la direto no fogo.
— Bom trabalho, jovem mulher. — Ele sorriu, então mordeu a carne do coelho.
Os dois não disseram mais nada e comeram seus coelhos em tranquilidade. O Rei do Norte dormiu com suas roupas. Liu Luoyi permaneceu alerta, desconfiada deles, e no começo não ousou fechar os olhos. Conforme a noite avançava e ela observava o fogo se apagando, ela apertou o pingente de jade em sua mão e adormeceu.
Na manhã seguinte, Liu Luoyi foi acordada por gritos. Alguém a levantou e a jogou no chão. Liu Luoyi estava com dor por todo o corpo e agora estava completamente acordada. À sua frente, ela só conseguia ver uma bagunça. Muitas pessoas lutavam entre si, com sangue manchando a floresta, que antes era pacífica.
Seus olhos se abriram em terror, mas ela não fez um som. Ela se apressou para se levantar, esperando escapar, mas foi levantada pela gola de sua camisa e arrastada para uma direção diferente. Quando pensou em lutar, ouviu a voz rouca de um homem:
— Jovem, para onde você está indo?
Ela foi jogada sobre o ombro dele e carregada para longe. O homem era muito forte e a carregava como se fosse um filhote de galinha. A visão à sua frente balançava e oscilava, fazendo Liu Luoyi sentir um pouco de náusea.
Depois de correr por um longo tempo, ela foi jogada no chão. Ela viu o Rei do Norte parado lá, coberto de sangue fresco e com uma espada larga na mão. Um homem com armadura de Yan caiu à sua frente.
Liu Luoyi se assustou. Ela recuou alguns passos, seu coração batendo descontrolado.
— Aqueles que perseguem este rei estão buscando a morte! — O trabalho de espada do Rei do Norte era impressionante. Seus movimentos eram tão rápidos que eram quase invisíveis. Logo, o chão estava coberto de corpos. Ele segurava sua espada e ria. Seu corpo inteiro estava envolto por uma aura assassina, então, enquanto os soldados o cercavam, não ousavam se aproximar.
Liu Luoyi quase foi atingida, então correu alguns passos para longe e se escondeu atrás do Rei do Norte, com apenas a cabeça aparecendo.
O número de reforços nas costas dele aumentou. O Rei do Norte viu isso e levantou sua espada. Uma excitação que só existia nos campos de batalha iluminou seus olhos. Se fosse morrer ali naquele dia, ele os levaria com ele!
Mas em seu Território do Norte, ele não tinha sucessor. Pensou em suas duas filhas, das quais não sabia se estavam vivas ou mortas, e seus olhos claros revelaram um traço de tristeza.
No momento seguinte, alguém caiu do céu. Um grande vento varreu o centro, fazendo os soldados ao redor voarem para longe. As folhas farfalhavam, a areia sibilava, e aquela pessoa pousou diante do Rei do Norte.
Ela estava impassível, mas seus olhos estavam cheios de intenção assassina. Ela segurava apenas uma adaga, mas parecia estar empunhando a força de uma lâmina longa. Seu cabelo negro e espalhado cobria um dos seus olhos, revelando uma ponte nasal alta e lábios vermelhos.
Uma cena como essa fez os outros se maravilharem.
— L-Li’er! — O Rei do Norte não a reconheceu de imediato, mas depois de olhar com mais atenção, ele largou sua espada. Sem saber se ria ou chorava, correu para frente, esperando abraçar a filha que tanto desejava ver.
Quem diria que, ao não vê-lo, Yuchi Li esquivaria de seu abraço e o chutaria para longe, correndo para abraçar Liu Luoyi.
— Xiao Liu’er, Xiao Liu’er… — Ela repetia sem parar. Ela a segurava fortemente, como se quisesse unir seus corpos em um só. Ela chamava seu nome enquanto soluçava.
— Xiao Liu’er, eu te encontrei. Eu estava com medo, eu... — Yuchi Li não terminou suas palavras. Ela só segurou Liu Luoyi perto de si, seus olhos vermelhos. Lágrimas escorriam de seus olhos. Era a primeira vez que ela chorava desde que chegou a este mundo.
Ela nunca havia chorado na frente de outra pessoa antes, mas hoje, ela soluçava na frente de Liu Luoyi, com o rosto coberto de lágrimas.

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O autor tem algo a dizer:
Rei do Norte: Boohooohoo, minha preciosa filha não me ama mais, ela até me chutou…



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Notas de rodapé:

[1]: Seu sobrenome é composto por dois caracteres, 尉迟, pronunciado Yuchi, não Weichi.
[2]:小 (xiao) significa "pequeno", e o sufixo ‘er’ é uma forma de carinho.


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