Capítulo 96 – Autossuficiência
No início da primavera, Tang Shishi foi tomada por um suor frio repentino. Ela também sabia quem havia colocado o gancho de jade — muito provavelmente, alguém sob o comando da Imperatriz Viúva Yao.
Ao ver que o rosto de Tang Shishi estava pálido, a ama de leite pensou que tivesse dito algo errado e ajoelhou-se no chão, tremendo:
— Wangfei, o que houve? Há algum problema com esse gancho de jade?
Tang Shishi apertou a palma da mão com força, obrigando-se a recuperar a compostura. Forçando um sorriso, fingiu naturalidade:
— Não é nada, fui eu que fui descuidada. Coloquei esse enfeite no meu filho e, por estar ocupada com o banquete de lua cheia hoje, acabei esquecendo.
Depois disso, ela acrescentou como quem não queria nada:
— Quando se cuida de criança, é fácil esquecer as coisas. Não é necessário comentar isso com os outros, para não gerar complicações. De agora em diante, você deve ficar atenta a ele. Não pode faltar nem sobrar nada.
A ama de leite era uma mulher do povo comum, escolhida por ter bastante leite. Desde que entrou na mansão, estava apavorada. Ao ouvir o que Tang Shishi disse, nem ousou pensar muito e se apressou em responder afirmativamente.
Tang Shishi pediu que trouxessem um novo xale, desamarrou as roupas do bebê e o examinou de cima a baixo. Felizmente, dessa vez não encontrou mais nada, além do gancho de jade pendurado no bebê. Não havia manchas vermelhas, hematomas nem outros sinais no corpo da criança. Tang Shishi se aliviou e pediu ajuda à ama de leite para segurar a mãozinha dele e trocar a roupa por uma nova.
Apesar de seus movimentos serem cuidadosos, Zhao Zigao ainda assim acordou com o barulho. Ele chutou as perninhas e chorou de olhos fechados. Tang Shishi rapidamente se inclinou e o embalou suavemente:
— A mamãe está aqui. Não chore, continue dormindo.
Parecia que ele já reconhecia o cheiro da mãe. Após alguns soluços, o choro foi diminuindo. Tang Shishi o acariciou com paciência, embalando-o com palavras suaves.
Aos poucos, o choro cessou. Ele ficou com a boquinha entreaberta e voltou a dormir. Tang Shishi permaneceu sentada por um bom tempo, e quando viu que ele não se mexia mais, fez um gesto para que a ama de leite se aproximasse e continuasse a vigiá-lo.
A ama tomou o lugar de Tang Shishi e abanava o bebê com delicadeza. Tang Shishi então andou pelo quarto e notou que as flores do lado de fora haviam sido cortadas de forma aleatória. Ela perguntou:
— O que aconteceu?
A ama levantou a cabeça e respondeu:
— O pessoal do jardim veio podar os galhos e folhas. Disseram que o pequeno Junwang é muito delicado e atrai mosquitos, então cortaram todas as flores e plantas lá fora.
Tang Shishi soltou um “Oh” suave, pausou por um instante e disse:
— Cortaram de forma grosseira demais. Parece que foi mordido por um cachorro. Que indecoroso será se os convidados virem isso? Chame a responsável pela poda. Quero interrogá-la pessoalmente.
A ama pensou por um momento e disse:
— É uma velha muito competente. O sobrenome dela parece ser Wu.
Tang Shishi, é claro, sabia quem era. Pediu que a ama continuasse cuidando da criança e foi sozinha até o cômodo de serviço aos fundos, chamando com autoridade a velha Wu para uma conversa.
A velha Wu veio o mais rápido possível. Abaixou os olhos e ajoelhou-se para cumprimentar Tang Shishi:
— Saudações à Wangfei.
— Não precisa de formalidades, quero apenas fazer algumas perguntas. — Tang Shishi mandou que ela se levantasse e, com naturalidade, perguntou sobre a poda das plantas. A velha Wu respondeu calmamente, uma por uma. Tang Shishi então disse:
— Gao’er mora nesse pátio. À medida que o tempo esquenta, surgem mais insetos. A pele dele é muito sensível, não aguenta as picadas. Venha comigo, vou mostrar onde deve podar e onde deve preservar.
A velha Wu curvou-se respeitosamente com as mãos em concha:
— Sim.
Tang Shishi se levantou. As criadas estavam prestes a acompanhá-la, mas ela acenou:
— Só vou indicar umas coisas no pátio, não precisa de tanta gente. Voltem e fiquem de olho em Gao’er.
As criadas não acharam estranho e responderam ao mesmo tempo:
— Sim.
Tang Shishi levou a velha Wu para dar uma volta pelo pátio. Quando chegaram a um canto mais escuro, ela parou, fez um gesto e apontou para uma árvore à frente:
— A senhora Wu se deu tanto trabalho para me trazer até aqui. O que deseja?
A velha Wu mantinha a cabeça baixa, numa postura que de longe parecia respeitosa. Mexeu os lábios sem quase se ver e murmurou:
— É realmente difícil encontrar a Wangfei. Vim aqui arriscando a própria vida para lhe dar um aviso.
— Oh? — Tang Shishi respondeu com frieza. — E do que se trata esse aviso?
— Para que a Wangfei tome cuidado com a própria vida... e não siga os passos da Madame Gouyi.
— Por quê?
— Alguém sugeriu que o Jing Wang ficasse com o filho… e descartasse a mãe.
O silêncio caiu de repente. Como se não percebesse, a velha Wu continuou com calma:
— A Wangfei se dedicou tanto, passou por tantas dificuldades para dar à luz. Se a decisão for manter o filho e descartar a mãe, sua vida estará em risco. E o pior é que o filho ainda teria que chamar outra de mãe.
O coração de Tang Shishi afundou. Era exatamente o que eu imaginei...
Ela recolheu as mangas como se estivesse apenas observando as flores e plantas ao redor, e perguntou:
— Um assunto tão confidencial... como a senhora soube?
— Confidencial só para a Wangfei — respondeu a velha Wu, com um tom quase de zombaria. — Os oficiais do pátio da frente já discutem isso abertamente. Só a Wangfei é que ainda não sabia.
O coração de Tang Shishi afundou mais uma vez. Zhao Chengjun havia lhe dito que o pessoal do pátio da frente a reconhecia, que apoiavam ela e seu filho. Será que ele mentiu?
Esse pensamento passou por sua mente rapidamente. Mesmo assim, ela manteve a calma:
— Parece que meus ouvidos estão fechados, e meus olhos vendados. Quem propôs isso?
A velha Wu pareceu sorrir e respondeu:
— Não sei quem foi o instigador. Mas o Shizi também estava presente no dia em que sugeriram seguir os antigos e manter o filho, descartando a mãe.
Tang Shishi sabia que a velha Wu estava tentando semear discórdia, mas ainda assim não conseguiu conter a raiva. Zhao Zixun… então foi você! Um verdadeiro bastardo.
Ela sabia que a velha Wu esperava vê-la perder o controle. Se realmente corresse para confrontar Zhao Chengjun agora, cairia direto na armadilha da velha Wu e da Imperatriz Viúva Yao. Tang Shishi cravou as unhas nas palmas das mãos, forçando-se a manter a lucidez, e perguntou:
— Estive reclusa no pátio interno esse tempo todo, sem saber de nada. Quando foi que propuseram essa ideia?
— Bem no início — respondeu a velha Wu. — Provavelmente no dia em que a Wangfei deu à luz. Jing Wang convocou uma reunião e discutiu isso longamente com seus subordinados. Segundo quem me contou, desde aquele dia ele e o Shizi começaram a planejar essa questão.
No dia em que dei à luz? Tang Shishi contou silenciosamente os dias. Sim, parecia ser naquela mesma noite em que Zhao Chengjun lhe dissera que os oficiais do pátio da frente estavam gratos e que a avaliação dela havia mudado de ruim para boa. Ela achou estranho ele tocar nesse assunto de repente… agora entendia por quê. Era justamente naquele dia.
A velha Wu queria separá-la de Zhao Chengjun, mas acabou fornecendo uma certeza. Zhao Chengjun nunca hesita ao tomar decisões. Se ele tivesse mesmo decidido manter o filho e descartá-la, Tang Shishi teria morrido de febre puerperal naquela mesma noite. Nunca teria sobrevivido a toda a quarentena, muito menos se recuperado completamente.
Zhao Chengjun era objetivo demais para desperdiçar tempo com indecisão.
Ou seja, havia verdades e mentiras no discurso da velha Wu. Os oficiais da mansão do príncipe realmente sugeriram matá-la e manter o filho — isso provavelmente era verdade. Zhao Zixun ter liderado a proposta também parecia ser verdade. Mas Zhao Chengjun, no fim, rejeitou tudo.
Tang Shishi finalmente sentiu-se aliviada. A tensão em seu coração começou a relaxar. O que mais temia ouvir… não era que Zhao Zixun estivesse tramando contra ela. Era que Zhao Chengjun estivesse.
Ela não sabia por quê, mas assim que descobriu que Zhao Chengjun havia rejeitado aquela proposta, sentiu-se imediatamente aliviada — a sombra em seu coração dissipou-se no mesmo instante. Tang Shishi não demonstrou nada, apenas olhou para a velha Wu com uma expressão entristecida e disse:
— Agradeço à senhora Wu pelo aviso. Tomarei mais cuidado da próxima vez.
Ao ver a expressão assustada de Tang Shishi, a velha Wu ficou satisfeita, esboçou um leve sorriso e disse:
— Wangfei, não se preocupe. Comigo aqui, certamente protegerei sua vida sem dúvida alguma. Já deixei uma armadilha pronta no pátio da frente. Assim que Jing Wang e os outros planejarem agir, serei a primeira a saber. Wangfei, não precisa se preocupar.
Tang Shishi assentiu levemente, com tristeza:
— Agradeço por todo o trabalho, senhora Wu. Agora minha vida está em suas mãos. Peço que vigie tudo de perto. Agradeço de coração.
A velha Wu acenou com a mão:
— Wangfei, não diga essas palavras desanimadoras. Essa questão ainda está indefinida. Não precisa se desesperar tanto. Hoje é o banquete de lua cheia do seu filho. Ainda há muitas pessoas te observando. É preciso estar mais animada.
Tang Shishi esforçou-se para sorrir, ergueu um pouco a voz e disse:
— Lembrou-se de todos os lugares que mencionei há pouco?
Ela já havia conseguido a informação que queria, e não havia mais necessidade de continuar encenando diante da velha Wu. Se fingisse demais, acabaria se traindo. E se a velha Wu percebesse sua encenação, o prejuízo seria maior que o ganho.
A velha Wu voltou à postura subserviente num piscar de olhos e respondeu:
— Gravei tudo.
— Ótimo. Pode se retirar. Há muitos convidados hoje, tome cuidado para não esbarrar em ninguém. Volte amanhã para terminar a poda.
— Sim, obedeço.
A velha Wu recuou de costas antes de ir embora. Tang Shishi olhou ao redor no pátio e, ao ver que ninguém prestava atenção neles, retornou lentamente para o salão principal.
Lá dentro, as criadas e amas de leite estavam reunidas ao redor da criança, observando-a com cuidado. Ao verem Tang Shishi entrar, saudaram em uníssono:
— Wangfei.
Tang Shishi assentiu:
— Levantem-se, não acordem a criança.
As criadas obedeceram e se levantaram em silêncio. Tang Shishi se aproximou do bebê, observou o rostinho corado de Zhao Zigao enquanto ele dormia e sorriu sem perceber.
Por mais atribulações que houvesse, sempre que voltava para perto de seu filho, parecia que todos os problemas deixavam de existir. Ela perguntou à ama de leite:
— Ele acordou em algum momento?
— Não.
Tang Shishi continuou orientando:
— Fique de olho nele. Está quase na hora de mamar. Se acordar chorando mais tarde, provavelmente é fome. Pode dar o peito assim que ele acordar, entendeu?
A ama assentiu:
— Entendi.
Tang Shishi ainda deu mais algumas instruções e saiu acompanhada da criada. Ao vê-la tomar outra direção, a criada perguntou, curiosa:
— Wangfei, não vai voltar ao salão do banquete?
— O salão está abafado. Vou dar uma volta.
Tang Shishi andava sem rumo pela mansão. Seu coração estava uma bagunça. Se voltasse agora para o salão de recepção, com certeza alguém mais atento notaria algo. Era melhor tomar um pouco de ar fresco e esperar até que o humor se acalmasse por completo antes de retornar.
Ela andava sem direção até que parou de repente, ao ver uma pessoa inesperada.
Atrás do rochedo ornamental, entre as folhas, era possível ver vagamente Zhao Zixun discutindo com alguém que tinha aparência de estudioso, como se estivessem debatendo com certa exaltação.
Tang Shishi arqueou as sobrancelhas com interesse. Sobre o que estariam discutindo para ficarem tão empolgados?
Atrás do rochedo, o estudioso falava com Zhao Zixun num tom irritado:
— Shizi, Wangye nomeou a criança com o nome “Gao”, o que mostra que ele tem grandes expectativas para esse filho. Shizi, isso é um mau presságio. O senhor deve se preparar desde já.
Zhao Zixun franziu o cenho:
— Meu pai conversou comigo em particular. O carinho dele por Zhao Zigao é apenas o de um pai com um filho pequeno. Isso não afetará a sucessão da mansão. Ele prometeu pessoalmente que o posto de Shizi continuará sendo meu.
— Shizi! — O estudioso se desesperou e tentou persuadi-lo. — Como pode acreditar nas palavras de quem detém o poder? Agora que o segundo gongzi ainda é pequeno, é claro que Jing Wang dirá isso. Mas quando esse menino crescer, daqui a dez anos, como Wangye deixaria de passar o trono ao próprio filho para entregá-lo a um herdeiro que não tem laços de sangue?
Zhao Zixun ficou sério e perguntou friamente:
— E na sua opinião, o que eu deveria fazer?
Aquele estudioso era um conselheiro recrutado por Zhao Zixun e já estava comprometido com ele havia muito tempo. Sabia que palavras francas podiam soar duras, mas eram necessárias. Estava prestes a continuar, quando seus olhos se arregalaram subitamente. Ele engoliu as palavras na hora:
— Wangfei.
Zhao Zixun virou-se e viu Tang Shishi caminhando lentamente pela galeria, usando um manto branco refinado e vestido vermelho, acompanhada por várias criadas. Tang Shishi sorriu ao vê-los:
— Shizi, o que faz por aqui?
Zhao Zixun abaixou os olhos e cumprimentou:
— Saudações à Wangfei. Bebi demais e vim até aqui para clarear a mente. Não esperava incomodar a paz da Wangfei. Peço desculpas.
O estudioso apressou-se em fazer o mesmo:
— Saudações à Jing Wangfei.
Tang Shishi lançou um olhar ao estudioso e então se voltou para Zhao Zixun, como se tivesse acabado de entender:
— Então era isso. Shizi está aqui para se recuperar da bebida. Parece que tem uma tolerância baixa ao álcool. Vou mandar uma criada preparar uma sopa de gengibre imediatamente para o senhor.
— Não ouso incomodar a Wangfei. — Zhao Zixun recusou com a cabeça baixa. — Já estou quase sóbrio e voltarei em breve. Agradeço pela gentileza, Wangfei, mas não me atrevo a aceitar.
— Como assim? O álcool é traiçoeiro. A pessoa pode se sentir desperta, mas ainda está embriagada. — Tang Shishi arqueou as sobrancelhas com leveza e olhou para o lado. — Dujuan, por que não vai logo preparar a sopa para ressaca?
Dujuan se despediu com uma reverência e saiu. Vendo isso, Zhao Zixun achou deselegante continuar recusando e respondeu com as mãos unidas:
— Agradeço à Wangfei.
Tang Shishi permaneceu de pé na galeria, com um sorriso suave e voz mansa:
— Somos todos da mesma família. Não precisa de formalidades.
Desde que Tang Shishi se tornara Wangfei, Zhao Zixun raramente ficava a sós com ela. Naquele momento, Zhao Chengjun não estava presente, e ela estava cara a cara com ele. Zhao Zixun sentiu-se um pouco desconfortável e quebrou o silêncio:
— Hoje é o… o banquete de lua cheia do segundo irmão. Como ele está?
— Está dormindo. Fiquei suada de tanto carregá-lo, então vim tomar um pouco de ar. Não esperava encontrar o Shizi por aqui.
Hoje, todos falavam de Zhao Zigao, e mesmo que Zhao Zixun dissesse aos outros que não se importava, na verdade, sentia-se extremamente constrangido ao falar sobre a criança com Tang Shishi. Ela claramente tinha a mesma idade que ele, mas agora era sua mãe nominal. E aquele bebê sem dentes… era seu irmão mais novo.
Tudo isso era extremamente absurdo.
O estudioso acabara de passar um bom tempo falando mal de Tang Shishi para Zhao Zixun. Mas agora que a via pessoalmente, nem se atrevia a levantar os olhos. Sempre ouvira dizer que a Wangfei de Jing Wang era muito bela — mas isso… era beleza demais.
Não era de se admirar que Jing Wang se recusasse a matá-la. Nenhum homem abriria mão de algo assim.
Felizmente, o clima constrangedor não durou muito. Dujuan logo retornou com a sopa. Tang Shishi fez um gesto para que ela entregasse a bandeja a Zhao Zixun e disse:
— Ainda preciso recepcionar os convidados na frente. Não vou incomodar mais o Shizi. A sopa deve ser tomada enquanto quente. Sinta-se à vontade.
Depois que terminou de falar, ela se afastou com suas muitas acompanhantes, flutuando como um sonho lúcido, e logo sumiu de vista. Restou apenas uma fragrância sutil no jardim — algo entre o real e o ilusório, como se estivesse se espalhando, mas ao mesmo tempo permanecesse ali, imóvel —, lembrando constantemente Zhao Zixun do que acabara de acontecer.
Zhao Zixun segurava a caixa de comida nas mãos, sem saber ao certo se estava aliviado ou desanimado. O estudioso, perplexo, murmurou:
— Essa é a Wangfei de Jing Wang? Ela é jovem demais. Não parece nem um pouco que acabou de dar à luz.
— Pois é. — Zhao Zixun baixou a cabeça, encarando silenciosamente a caixa de comida requintada e elegante em suas mãos. — Não parece mesmo.
Tang Shishi já havia caminhado bastante, e a expressão em seu rosto continuava indiferente. Dujuan, observando atentamente seu humor e seus gestos, perguntou em voz baixa:
— Wangfei, está aborrecida?
— Claro que não. — Tang Shishi sorriu e respondeu de forma despreocupada: — Sou tão gentil e prestativa... Ora, por que eu não estaria feliz depois de ajudar o Shizi?
Dujuan também pensava o mesmo. Sentia que o humor da Wangfei estava estranho, mas não conseguia entender o motivo. Como não sabia o que dizer, apenas comentou:
— Wangfei ajudou o Shizi, e ele e a Shizifei certamente a respeitarão ainda mais em troca. Assim, a relação entre Wangfei e o Shizi ficará cada vez mais harmoniosa. É bom quando a mansão vive sempre em perfeita harmonia.
Tang Shishi sorriu e não respondeu. Harmonia perfeita? Como isso seria possível?
Zhao Zixun estava falando mal dela com o conselheiro e parou no instante em que a viu se aproximar. O desejo de matá-la ainda ardia em seu coração.
Ela admitia que, desde que se tornara Wangfei, sempre tratara Zhao Zixun com cortesia, sem jamais o difamar diante de Zhao Chengjun. Seu plano era construir um bom relacionamento com o protagonista masculino e, no futuro, tornar-se uma imperatriz viúva nominal, tranquila e respeitada. Mas quem diria… o protagonista não estava disposto a ter duas imperatrizes viúvas no palácio imperial.
Preservar o filho e descartar a mãe. Ah... Era assim que Zhao Zixun retribuía sua consideração.
Tang Shishi não entendia por que, mas naquele dia parecia sempre esbarrar em cenas de conspiração alheia. Quando voltou ao salão de recepção, não queria chamar atenção de todos, então entrou discretamente pela porta lateral, sem incomodar ninguém. No entanto, mal cruzara a entrada e já ouviu sussurros da sogra e cunhada da família Lu dirigidos a Lu Yufei.
A senhora Lu perguntava:
— Yufei, tem alguma novidade?
Tang Shishi parou imediatamente e sinalizou com a mão para que as criadas atrás dela ficassem em silêncio. Ela não ouviu a resposta de Lu Yufei, mas, pelo tom das palavras seguintes, presumiu que a resposta não havia sido animadora. A senhora Lu suspirou:
— Já adoramos o Bodhisattva, tomamos os remédios… Por que você não engravida? Você é piedosa e bondosa. O Bodhisattva concedeu um filho até para ela. Por que não te abençoa?
Não era preciso dizer — o “ela” das palavras da senhora Lu claramente se referia a Tang Shishi. Após um breve silêncio, a cunhada comentou:
— Mãe, não pressione tanto a Shizifei. Ela ainda é jovem. Talvez, se esperarmos mais um pouco, virá uma boa notícia.
— Esperar, esperar… Eu posso esperar, mas será que o Shizi pode? — disse a senhora Lu, impaciente. — O filho daquela mulher já está fazendo um mês. Ouvi dizer que Wangye anda sempre indo ao pátio interno e até carrega a criança no colo. Faz só um mês, e ele já mima mãe e filho desse jeito. Como vocês vão manter sua posição se continuarem apenas esperando?
A cunhada suspirou e disse a Lu Yufei:
— Shizifei, é melhor você dar à luz ao primogênito o quanto antes. Só assim poderá se firmar de verdade na mansão. Além disso, agora tem outra criança disputando o carinho. Você não pode deixar Wangye entregar todo o afeto para o outro lado.
Dujuan arregalou os olhos, furiosa, desejando avançar para discutir com elas. Tang Shishi, no entanto, fez um gesto com a mão, ordenando silêncio, e levou suas criadas consigo, contornando o muro externo até a entrada lateral, onde entrou outra vez — agora, com toda a pompa.
Dessa vez, uma criada correu à frente para anunciar sua chegada. Tang Shishi entrou no salão lateral e sorriu:
— Ora, por que a senhora Lu se escondeu aqui? Não é de se admirar que estive te procurando no salão principal e não a encontrei em lugar nenhum.
Ao ver Tang Shishi, todas as mulheres da família Lu se levantaram às pressas. A senhora Lu foi rapidamente até a porta para recepcioná-la com um sorriso e se sentou ao lado de Tang Shishi:
— Faz tempo que não vejo minha filha. Fiquei com medo de que ela fizesse alguma besteira na mansão, então procurei um canto mais reservado para dar uns conselhos. Wangfei, minha filha lhe causou algum incômodo nesses dias?
— O que a senhora está dizendo, Madame Lu? — Tang Shishi lançou um sorriso de lado para Lu Yufei, que ficou imediatamente tensa. Depois desviou o olhar e respondeu com naturalidade: — A Shizifei é culta, virtuosa e generosa. Tem me ajudado bastante. Como poderia causar problemas?
Madame Lu e Lu Yufei suspiraram aliviadas. Tang Shishi era, para Lu Yufei, sua sogra legítima — mesmo que de uma geração separada. Esse era, sem dúvida, o tipo mais difícil de relação entre sogra e nora. Se Tang Shishi dissesse qualquer coisa negativa sobre Lu Yufei, não só ela, mas toda a família Lu perderia a face e não teria mais como pisar nos portões da mansão.
Madame Lu respondeu:
— Wangfei é generosa por tolerar minha filha. Ela foi muito mimada pelo pai e age de forma impulsiva. Temo que leve isso para dentro da família do marido. Felizmente, Wangfei está aqui e tem boa vontade para guiá-la.
Dizer isso diante de Tang Shishi era constrangedor para Madame Lu. Tang Shishi era tão jovem que poderia muito bem ser sua filha. No entanto, agora precisava lisonjeá-la com cuidado apenas para que a vida da filha no novo lar fosse mais fácil.
Madame Lu quase chorou só de pensar nisso. Um ano atrás, Tang Shishi era apenas uma criada na mansão. Sempre que Madame Lu vinha visitar como parte da família da Shizifei, fazia isso com imponência. Quando é que ela deu atenção a uma criada? Inesperadamente, agora era ela quem precisava se curvar e bajular Tang Shishi.
Tang Shishi sorriu:
— Nora é como meia filha. Sendo assim, a Shizifei é como minha própria filha, e é meu dever orientá-la. A Shizifei é inteligente e compreende tudo com facilidade. Não há nada de errado com ela, exceto por…
Essa última frase fez os corações de Madame Lu e Lu Yufei dispararem. O rosto de Lu Yufei empalideceu. Madame Lu forçou um sorriso:
— O que há de errado com ela? Wangfei não precisa se preocupar comigo. Se ela fez algo de errado, por favor, diga.
— Talvez eu esteja sendo exigente demais. — Tang Shishi lançou um olhar a Lu Yufei, sorriu e balançou a cabeça. — Deixe pra lá. Madame Lu pode fingir que não ouviu nada.
Como fingir que não ouviu algo assim? Madame Lu não conseguiu mais se sentar. Lu Yufei se apressou a fazer uma reverência e disse com respeito:
— Estou aterrorizada. Wangfei, por favor, não hesite em me dar conselhos.
As outras mulheres cercaram Tang Shishi, tentando persuadi-la com boas palavras. Tang Shishi disse lentamente, com tom altivo:
— Pensando bem, não é culpa da Shizifei. Nos últimos dois anos, ela se esforçou em tudo. Só há um problema — ela ainda não tem filhos.
Lu Yufei ficou pasma. Tang Shishi suspirou e acrescentou:
— Madame Lu sabe que, para a família imperial, o mais importante é o herdeiro. O Shizi já tem dezenove anos e ainda não tem filhos. Para os padrões da família imperial, essa idade já está avançada demais.
Madame Lu e sua nora ficaram sem palavras. Se a filha de sua família não conseguia gerar filhos, como a mãe e a cunhada poderiam erguer a cabeça diante da família do marido?
Madame Lu forçou um sorriso e perguntou, em tom bajulador:
— Então, segundo a Wangfei, o que ela deveria fazer?
— Eu não sei o que fazer. — Tang Shishi cobriu a boca com o leque e riu suavemente. — Sou apenas uma jovem recém-casada. Embora seja mãe deles em termos de hierarquia, minha posição ainda é inferior. Como ousaria me intrometer nos assuntos do Shizi e da Shizifei? Naturalmente, tudo depende de como a própria Shizifei decidir organizar essas coisas.
Nesse momento, Tang Shishi notou que Lu Yufei ainda permanecia meio ajoelhada em saudação. Ela apressou-se a dizer:
— Shizifei, o que está fazendo? A culpa foi toda minha. Me empolguei na conversa e nem percebi que você ainda estava se curvando. Shizifei, levante-se logo!
Assim que Tang Shishi terminou de falar, uma criada do pátio de Yan’an ajudou Lu Yufei a se levantar. O rosto dela estava branco como a neve. Madame Lu sorriu sem graça e disse:
— As palavras da Wangfei me deixam envergonhada. Lu Yufei é da geração mais jovem. Quanto a coisas como herdeiros, mesmo que Wangfei a castigasse com severidade, eu só poderia aplaudir. Como poderia me opor? A culpa é minha, por não ser atenta como mãe. Ela ainda tem algumas criadas de dote que podem ser treinadas e oferecidas para servir o Shizi. Se alguma delas gerar um herdeiro, será mérito da própria Shizifei.
— Ah, então é assim. — Tang Shishi segurava o leque e disse lentamente: — Lembro que há quatro criadas de dote ao redor da Shizifei. Se todas forem preparadas para agradar, quem vai servir a Shizifei?
Madame Lu ficou atônita. Em outras palavras, Tang Shishi havia acabado de empurrar todas as criadas para servirem como concubinas. Lu Yufei já tinha três concubinas ao seu redor — se mais quatro fossem adicionadas, como ela conseguiria sobreviver?
No entanto, ao ver o sorriso tranquilo no rosto de Tang Shishi, Madame Lu não ousou recusar. Forçou um sorriso e disse:
— Não tem problema. Há muitas pessoas para servi-la. Tenho duas criadas sobrando aqui, é uma boa hora para mandá-las para lá.
O olhar de Tang Shishi percorreu lentamente as criadas atrás de Madame Lu. Seus olhos tinham um contraste marcante entre o preto e o branco, e naquele momento, encaravam as pessoas com um sorriso quase sedutor.
As duas criadas mal conseguiam respirar. Tang Shishi então recolheu o olhar de repente e assentiu com um sorriso:
— Muito bem. Já que Madame Lu já providenciou tudo, não me convém interferir. Que seja assim, então.
Logo após encerrar o assunto das concubinas, alguém veio do salão principal chamar Tang Shishi, dizendo que o pequeno Junwang havia acordado e chorava chamando pela mãe. Tang Shishi retornou ao pátio interno para ver o filho. A família Lu a acompanhou até a porta e a viram partir cercada por criadas, como estrelas ao redor da lua.
Lu Yufei perguntou em voz baixa:
— Mãe, será que ela ouviu alguma coisa?
— Não diga mais nada. — suspirou Madame Lu. — Subestimamos essa mulher. Tão jovem e bonita, sensata e imponente, e ainda deu à luz ao primeiro filho de Jing Wang. Temo que será favorecida por muito tempo. Já que você não pode vencê-la, só resta evitá-la.
Madame Lu percebeu que haviam julgado mal Tang Shishi. Por fora, ela não demonstrava suas armas, mas suas ações eram ferozes. Elas tinham acabado de falar mal dela, e pouco depois Tang Shishi apareceu para pressioná-las. A intenção por trás daquela chamada de atenção era direta demais.
Ela não apenas atingiu Lu Yufei, mas também a família por trás dela, deixando todos sem saída. Que tipo de “mulher de peito grande e sem cérebro” agiria assim? Não era só um enfeite bonito.
Madame Lu havia sido descuidada. A família Xi fora prestigiada por sete, oito anos, mas acabou derrotada por Tang Shishi e se tornou motivo de chacota. Naquela época, Madame Lu já devia ter entendido.
Lu Yufei ficou confusa por um tempo e perguntou:
— Aquelas quatro criadas… elas realmente vão…
Lu Yufei entendeu o silêncio da mãe e da cunhada. Madame Lu não teve coragem de olhar a filha de novo. Pegou o lenço e enxugou as lágrimas:
— Filha, todas as mulheres passam por isso. Apenas aguente por um tempo. Não se preocupe, os registros das criadas estão todos comigo. Depois que elas derem à luz, nós as venderemos imediatamente e traremos os filhos para você criar. Assim, também será como se você os tivesse gerado.
Lu Yufei baixou os olhos, sem dizer mais nada.
Na manhã seguinte, Tang Shishi estava tomando sol com Zhao Zigao no colo. Uma criada aproximou-se e comentou:
— A Shizifei é realmente virtuosa. Depois do banquete de ontem, ela chamou as quatro criadas de dote para o quarto. Com um pouco de incentivo, preparou todas de uma vez. Hoje, a mansão inteira só fala disso.
— É mesmo? — Tang Shishi respondeu sem muita expressão e perguntou: — E o que o Shizi disse?
— O Shizi não aceitou. Pelo contrário, aconselhou a Shizifei a não pensar demais. Depois disso, foi direto para o quarto da beleza Zhou.
Tang Shishi sorriu levemente. Como esperado… um homem apaixonado é sempre o mais volúvel. Já que Zhao Zixun disse isso, como Lu Yufei não pensaria demais? Mesmo que não quisesse, agora ela seria obrigada a mandar as quatro criadas para o Shizi.
Caso contrário, Zhou Shunhua estava cada vez mais favorecida — como Lu Yufei manteria seu lugar? Mas esse era justamente o objetivo de Tang Shishi. Ela mal podia esperar para que o pátio interno de Zhao Zixun mergulhasse no caos. Quanto mais caótico, melhor.
Tang Shishi pegou Zhao Zigao nos braços e o balançou com carinho até ele sorrir. O bebê achava que a mãe estava brincando e sorriu largamente.
As criadas exclamaram animadas:
— Wangfei, o pequeno Junwang sorriu!
Tang Shishi não conteve o riso. Sempre que olhava para Zhao Zigao, sentia uma alegria genuína, como se todos os problemas do mundo deixassem de importar. Agora eu entendo… por que preciso agradar o protagonista masculino? Quando me tornar imperatriz viúva, por que deveria apoiar o filho dos outros?
Naquela época, a mãe de Zhao Chengjun — a Consorte Imperial Guo Gonglie — foi extremamente favorecida, mas assim que a Imperatriz Viúva Yao assumiu o poder, mandou enterrá-la viva com o imperador falecido. E se, no futuro, Zhao Zixun seguisse o exemplo da Imperatriz Viúva Yao… e a enterrasse viva também?
Não importa o quanto eu o trate bem, ele nunca retribuirá. Então, era melhor lutar, derrubar o protagonista masculino… e fazer com que seu filho se tornasse imperador. Melhor do que apostar na consciência de Zhao Zixun.
Capítulo 97 – Aproveitando-se do Favor
Uma criança mudava a cada dia e, num piscar de olhos, Zhao Zigao já havia completado cem dias de vida.
Nem Tang Shishi nem Zhao Chengjun quiseram fazer um grande banquete de cem dias. No fim, chegaram a um acordo de apenas fazer uma refeição em casa.
As criadas arrumaram a mesa no pátio. Zhao Zigao foi colocado sobre o divã, que já estava cercado de gente. Todos disseram em uníssono:
— Vamos lá, força! Oh, ele virou!
A sala explodiu em risadas, animada. Tang Shishi pegou Zhao Zigao no colo sorrindo:
— Que incrível, já consegue se virar sozinho.
Liu Ji comentou em tom de brincadeira:
— Como dizem, com três meses se vira, com seis senta e com oito engatinha. Normalmente, os filhos de pessoas comuns demoram quatro ou cinco meses para se virar. O pequeno Junwang conseguiu com três. Isso mostra que ele é bem criado.
As criadas concordaram:
— É verdade. A Wangfei sempre cuida pessoalmente do pequeno Junwang. Que sorte ele tem por ter um pai como o Wangye e receber tanto carinho da Wangfei.
Tang Shishi sorriu e lançou um olhar para as criadas:
— Estão me bajulando agora. Normalmente não falam tanto assim.
— Bajulando nada! — protestou Dujuan. — Estou só dizendo a verdade. O pequeno Junwang se parece com o Wangye, nasceu com talento, tem braços e pernas fortes. Da última vez, ele puxou meu cabelo e eu não conseguia soltar por nada. Quase fiquei careca!
Enquanto falava, Dujuan afastou os fios para mostrar:
— Olhe aqui, Wangfei. Tá vendo? Não está faltando cabelo?
Tang Shishi arqueou as sobrancelhas, desconfiada:
— Ah, está me pedindo cabelo agora?
— Eu? Jamais! — Dujuan sorriu. — O cabelo da Wangfei é escuro e cheio, admiro há tempos. Mas se sentir pena da criada aqui, poderia me ensinar uma ou duas receitas de cuidado. Já ficaria plenamente satisfeita.
As criadas caíram na risada e começaram a beliscar Dujuan. Ela ria e pedia clemência, brincando com todas. Zhao Zigao não sabia por que riam, só entendia que aquelas irmãs estavam alegres. Então também apertou os olhos e soltou uma gargalhadinha.
Tang Shishi sorriu enquanto fazia cócegas no queixo de Zhao Zigao:
— Está rindo do quê, hein? Estão reclamando de você, e mesmo assim continua sorrindo?
Mais uma rodada de risos explodiu. Zhao Chengjun observava a cena com um sorriso sereno e olhar tolerante. Era curioso pensar que ele, que antes se irritava com barulho, agora não se incomodava com as risadas altas das criadas. Talvez fosse porque sua esposa e filho estavam entre elas.
Só de olhar para eles, sentia-se plenamente satisfeito. Como poderia se sentir incomodado?
Por ser um jantar em família, Zhao Zixun estava presente com sua esposa e concubinas. O harém de Zhao Zixun havia crescido de novo. Entre as sete mulheres, cada uma tinha sua beleza e suas qualidades. Era um espetáculo vê-las reunidas.
Independentemente de serem esposas ou concubinas, favorecidas ou ignoradas, todas olhavam com inveja para o bebê nos braços de Tang Shishi. Com três meses, era uma fase adorável. Até o coração mais frio se derretia ao vê-lo — quanto mais um grupo de mulheres confinadas em seus aposentos, todas ansiando por filhos. Lu Yufei estava isolada, Ji Xinxian estava com ciúmes, Ren Yujun estava amarga, e até Zhou Shunhua olhava com esperança.
Zhou Shunhua odiava Tang Shishi, mas não conseguia odiar seu filho. Quem não se encantaria com um garotinho branco, rechonchudo, com braços e pernas parecendo raízes de lótus e dedinhos fofos? Zhou Shunhua queria muito segurá-lo, mas sabia qual era sua posição como concubina do Shizi. Que direito tinha de tocar no filho da Wangfei? Ela sabia que era impossível, então não quis se humilhar tentando.
Zhou Shunhua não pôde deixar de olhar para seu próprio ventre. Era mais velha que Tang Shishi, mas Tang Shishi já tinha dado à luz, enquanto ela… nada. Zhou Shunhua também queria ser mãe, mas depois de cair na água e se machucar, e ser mandada à força para a vila nas montanhas por meio ano, temia que seu corpo tivesse sido danificado e que não pudesse mais conceber.
Se isso fosse verdade... Zhou Shunhua interrompeu os próprios pensamentos. Não ousava continuar. Se realmente fosse esse o caso, mesmo que matasse Lu Yufei e a reduzisse a cinzas, de que adiantaria?
O coração de Zhou Shunhua doía, azedo e apertado, como se estivesse encharcado em vinagre. Era um sofrimento difícil de descrever. A vida era mesmo imprevisível. Antes, Zhou Shunhua era confiante — em sua origem familiar, em seus talentos, e também no amor de Zhao Zixun. Ela sabia que ocupava um lugar especial no coração dele. Mesmo que passasse a noite com outras mulheres, era com ela que discutia história e política.
Ela era a única a entrar no coração de Zhao Zixun.
Por isso, nunca se importou com Lu Yufei, Ren Yujun ou as outras. Chegava até a sentir pena delas. No fim, tudo o que tinham era apenas o corpo.
Mas, ao encontrar Tang Shishi, toda a autoconfiança de Zhou Shunhua foi destruída. Tang Shishi tinha origem inferior, talento inferior, e seu jeito não parecia nem um pouco com o de uma mulher que cativaria um homem. Mas, mesmo assim, conseguiu o que Zhou Shunhua mais queria.
O que mais doía em Zhou Shunhua não era o fato de Zhao Zixun ter outras mulheres, ou de não amá-la o suficiente — era o status. Quando estudavam juntos, Zhao Zixun a admirava tanto que chegou a desafiar o pai por ela… e mesmo assim ela nunca se tornou esposa legítima. Era apenas uma concubina, vivendo à sombra do homem que amava.
Tang Shishi, por outro lado, conseguiu. Embora seu alvo não fosse Zhao Zixun, ela conquistou Jing Wang, que era ainda mais difícil de lidar, e resolveu tudo pela raiz. Não era surpreendente que a Imperatriz Viúva Yao tivesse consentido, mas o impressionante era que Jing Wang havia escolhido casar com Tang Shishi, reconhecendo-a publicamente, e não apenas apossando-se dela por poder.
Zhou Shunhua teve que engolir essa verdade. Até hoje, não entendia como Tang Shishi conseguira aquilo — Jing Wang não parecia ser um homem apaixonado.
Zhou Shunhua suspirou em silêncio: não se pode julgar uma pessoa pela aparência. Os assuntos dos homens… não tinham explicação.
Zhao Zixun também observava tudo quieto. Para ele, era um tanto constrangedor chamar aquele bebê sem dentes de “irmão mais novo”. Mas não podia negar — Zhao Zigao era realmente adorável.
Zhao Zixun olhou para Tang Shishi sentada no centro, cercada pelas criadas. Cada gesto, cada expressão, fosse um arqueio de sobrancelha ou um olhar de lado, exalava charme. Ela parecia uma rosa vermelha delicada, nascida para pertencer à nobreza, carregada de riqueza e glória.
Era o melhor adorno do poder.
Zhao Zixun sentiu uma pontada inexplicável no coração. Muitas vezes pensava que Tang Shishi deveria estar morta, mas ao vê-la… não conseguia evitar ser atraído.
Sem dúvida, Tang Shishi gostava dele no início. Corria atrás dele e fazia de tudo para chamar sua atenção. Mas depois, seu pai a tomou à força. E, quando engravidou, só lhe restava dedicar-se ao pai de seu filho e ser uma Wangfei obediente.
Uma mulher, depois de ter um filho, era completamente acorrentada.
Mesmo assim, Tang Shishi não havia esquecido seus objetivos. Carregando Zhao Zigao, aproveitou um momento livre para se voltar a Lu Yufei:
— Shizifei, não fique apenas olhando o bebê sorrir. Se realmente gosta de crianças, por que não dá à luz uma também? Alguma novidade?
O salão silenciou de repente. Lu Yufei ficou pasma, como se o peso do mundo desabasse sobre ela. Envergonhada, balançou a cabeça com fraqueza:
— Ainda não…
Tang Shishi pareceu suspirar com pesar e então olhou para a fileira de mulheres atrás dela:
— E vocês?
As poucas que restavam abaixaram a cabeça e sacudiram as mãos — tudo foi dito sem que uma só palavra precisasse ser dita. Tang Shishi finalmente teve a chance de ensinar como quem odeia o ferro por não virar aço, e disse:
— Todas vocês deveriam se apressar. O Shizi já não é mais jovem. Há muito tempo deveria ter filhos sob seus joelhos. Não é necessário que seja um menino. Contanto que seja filho do Shizi, mesmo uma menina já é bom.
Todas as mulheres assentiram uma a uma. E nem era só sufocante ter uma sogra jovem e bonita — o mais assustador era que a sogra conseguia dar à luz.
Tang Shishi segurava Zhao Zigao nos braços e disse com voz clara:
— Não estou pressionando vocês. Esse tipo de coisa deve seguir o curso natural. Não precisam ficar tensas. Vamos fazer assim: já que as vagas de Cefei do Shizi ainda estão abertas, duas ao todo, a que engravidar primeiro ocupará a vaga de Cefei. Shizi, Shizifei, o que acham?
(*Cefei: concubinas imperiais de patente elevada, acima das concubinas comuns.)
É claro que Lu Yufei não ousou dizer não. Zhao Zixun pensou por um instante e não pareceu encontrar motivo para se opor. Afinal, por qualquer ângulo, Tang Shishi estava fazendo isso pelo bem dele.
Zhao Chengjun moveu ligeiramente os olhos e ficou observando Tang Shishi em silêncio. Tang Shishi, por sua vez, não lhe deu atenção. Estava imersa na alegria de ver que ninguém havia se oposto ao plano de intriga no harém, e decretou:
— Ótimo, então está decidido. Vou esperar boas notícias de vocês.
Tang Shishi estava bem satisfeita consigo mesma depois de dizer isso. Duas pêssegos matam três eruditos — Zhao Zixun havia usado esse truque contra ela no passado. Agora, ela estava usando o mesmo método para dividir o pátio interno de Zhao Zixun.
(*“Duas pêssegos matam três eruditos” é uma tática clássica de eliminar adversários usando artifícios indiretos.)
Desde que Tang Shishi abandonou o pensamento habitual de agradar o protagonista masculino, sua mentalidade havia mudado, e seus métodos de lidar com Lu Yufei e as outras também. No passado, ela queria ficar à margem, para manter boas relações no futuro. Afinal, no fundo do palácio imperial, seriam Lu Yufei e Zhou Shunhua quem teriam a palavra final. Mesmo que Tang Shishi visasse o posto de imperatriz viúva, não havia necessidade de ofender as duas imperatrizes.
Por isso, não ousava contrariar Zhao Zixun, nem queria ofender Lu Yufei ou Zhou Shunhua. Mesmo quando Lu Yufei a provocava diversas vezes, Tang Shishi ainda suportava. No entanto, agora que ela havia se dado conta da situação, por que continuar engolindo desaforos sob o teto alheio? Por que não poderia ser a única dona do harém?
Ela decidira apoiar o próprio filho como imperador. Dessa forma, não haveria imperatriz nem duas imperatrizes viúvas. Tang Shishi seria a única mulher no topo da cadeia alimentar.
Seus sonhos eram grandiosos, mas o caminho precisava ser trilhado passo a passo. A grande ambição de Tang Shishi se dividia basicamente em dois pontos: primeiro, provocar discórdia entre Zhao Zixun e sua esposa, e impedir com firmeza que ele gerasse um herdeiro; segundo, desgastar a relação entre Jing Wang e Zhao Zixun, e tentar convencer Jing Wang, o quanto antes, a nomear seu próprio filho como Taizi.
(*Taizi: Príncipe Herdeiro.)
Essa missão seria difícil.
Tang Shishi estava prestes a complementar algo, demonstrando sua gentileza como sogra, quando de repente sentiu uma dor ao lado da orelha — uma mecha de cabelo havia sido puxada por Zhao Zigao.
Aquele garotinho tinha mesmo força, ninguém podia negar. Tang Shishi acreditava, agora, que Dujuan realmente tinha uma falha no couro cabeludo.
O rosto de Zhao Chengjun escureceu na hora. Ele avançou, segurou a mão de Zhao Zigao e o repreendeu levemente:
— Solte.
Quando os outros finalmente reagiram, todos correram para perto:
— Wangfei, está tudo bem? Pequeno Junwang, solte a mamãe!
Todos se aproximaram de uma vez, mas ninguém ousava tocar em Tang Shishi — muito menos em Zhao Zigao. Só puderam ficar ali, ansiosos. No fim, foi Zhao Chengjun quem precisou abrir um por um os dedinhos de Zhao Zigao para libertar o cabelo de Tang Shishi.
Tang Shishi suspirou de alívio, massageando a área dolorida sem conseguir dizer uma palavra. As criadas se apressaram ao redor dela, ajudando a massagear o couro cabeludo e arrumar seus cabelos:
— Wangfei, está doendo muito? Alguém, rápido, traga gelo!
Zhao Chengjun pegou Zhao Zigao nos braços. Ao ver aquela longa mecha de cabelo preto na mão do filho, ficou furioso:
— Danado, sua mãe cuida de você todos os dias com tanto carinho, e você ainda faz isso com ela?
Tang Shishi ainda estava sentindo dor, mas assim que ouviu Zhao Chengjun repreender o filho, não hesitou em repreender o pai:
— Ele é só um bebê! Vai brigar com ele por causa disso?
Zhao Chengjun ergueu as sobrancelhas e demorou alguns segundos para responder:
— Então agora a culpa é minha?
— Quantos meses ele tem? Como vai saber o que pode ou não fazer? Só estava brincando comigo. — Ao ver Zhao Chengjun bravo com o bebê, Tang Shishi estendeu os braços para pegá-lo de volta. — Só tem três meses e já sofre com sua braveza. Vamos, filhinho, deixa ele pra lá.
Tang Shishi saiu carregando Zhao Zigao nos braços. As criadas olharam surpresas para Zhao Chengjun, depois se entreolharam, e então correram atrás de Tang Shishi.
As criadas sabiam muito bem: a Wangfei podia ser ríspida com o Wangye, tudo bem. Mas se ela saísse sozinha e batesse em alguma coisa ou tropeçasse, todas elas estariam perdidas.
Depois que as criadas saíram, os poucos que ficaram na sala trocaram olhares atônitos. Ninguém conseguia acreditar que Tang Shishi tinha coragem de deixar Jing Wang envergonhado na frente de todos.
Liu Ji olhou ao redor e disse:
— Wangye, o pequeno Junwang tem crescido rápido ultimamente, e a Wangfei o carrega sozinha. Receio que ela não tenha força suficiente. Devo ir dar uma olhada?
Numa hora dessas, como confiar nas pessoas do palácio? Zhao Chengjun desceu os degraus e respondeu:
— Suas pernas e pés não estão bons. Melhor eu mesmo ir.
Capítulo 98 — Companheiro de Brincadeiras
À noite, depois do banquete, Zhao Zigao já havia adormecido há muito tempo. Tang Shishi pediu para a ama de leite levar o filho embora e voltou para o quarto, onde começou a remover a maquiagem sozinha.
Hoje era o centésimo dia de Zhao Zigao. Tang Shishi havia se arrumado por completo, com um conjunto completo de adornos. Depois de tanto tempo sem se enfeitar, colocar de repente todos aqueles acessórios de cabeça a deixava um pouco desconfortável com o peso sobre si.
Após passar o dia inteiro com aquilo na cabeça, Tang Shishi já estava exausta. Sentou-se em frente ao espelho de bronze adornado com pétalas nas bordas, desmontando os enfeites ao som de guizos. Com cuidado, soltou o rubi vermelho preso no coque, depois retirou as contas douradas pendentes dos dois lados, desatou as miçangas floridas presas atrás da cabeça e, por fim, puxou a presilha verde cravejada de jade branco — e seus cabelos negros e finos caíram em cascata, como uma cachoeira.
Tang Shishi não se preocupou com os cabelos soltos atrás, apenas levou a mão ao couro cabeludo para massageá-lo. Hoje, ela havia prendido o cabelo em um coque alto. A tensão no couro cabeludo ao longo do dia agora doía um pouco.
No espelho, uma silhueta vermelha se aproximava gradualmente. Zhao Chengjun parou atrás dela, colocou as mãos sobre as laterais da cabeça de Tang Shishi e começou a massagear suavemente:
— Está com dor de cabeça?
— Não é dor de cabeça, é dor dos enfeites — reclamou Tang Shishi. — Essas coisas são muito pesadas. Nem parecem chamar tanta atenção, mas quanto mais tempo ficam na cabeça, mais pesadas ficam.
Como não seriam pesadas, sendo feitas de ouro maciço e cravejadas de pedras preciosas verdadeiras? Zhao Chengjun aplicava a força certa com as mãos e disse com voz baixa:
— Se estiver muito cansada, não precisa usar tantos adornos da próxima vez. Você é a mulher mais respeitada de Xiping. Quem ousaria dizer algo?
— Isso não pode — retrucou Tang Shishi, pegando o pente de chifre de rinoceronte da caixa de maquiagem e penteando os cabelos devagar. — Como Wangfei, já sou jovem. Se minhas roupas e joias não forem suficientes para impor respeito, quem vai me levar a sério?
Zhao Chengjun não comentou. Olhou para os longos cabelos negros de Tang Shishi e, de repente, perguntou:
— Por que você teve a ideia de apressar Zhao Zixun para ter um filho?
A mão de Tang Shishi parou por um instante, mas logo voltou a se mover, penteando os cabelos enquanto respondia:
— Não sou eu que estou apressando, são os outros que me pressionam. Sou uma mãe adotiva jovem, que entrou por último na família. É muito difícil. Se me preocupo demais, dizem que não tolero o filho mais velho. Se não me envolvo, dizem que estou satisfeita demais com minha posição. O Shizi já está perto dos vinte e ainda não tem filhos. Lá fora, já estão me acusando de ser mesquinha e ciumenta, que não quero deixar o filho mais velho herdar a linhagem e por isso trato a Shizifei com dureza, impedindo o Shizi de ter herdeiros. Isso é uma grande injustiça. Só posso continuar sendo boa com eles, sem ousar dizer nada ou repreendê-los. Ainda tenho que encontrar meios de ajudar a Shizifei a dar descendência à família. Mesmo que a Shizifei não consiga engravidar, que alguma concubina do pátio interno dê à luz já serve.
Tang Shishi dizia isso enquanto observava Zhao Chengjun pelo espelho, discretamente. Era a primeira vez que falava mal de Zhao Zixun — ainda não tinha prática nisso e se perguntava se Zhao Chengjun acreditaria nela.
Zhao Chengjun permaneceu em silêncio, com os olhos baixos e as mãos ainda em seus cabelos. Do ponto de vista de Tang Shishi, era impossível adivinhar o que ele estava pensando. Ela insistiu, dizendo:
— Hoje, quando mencionei a elevação de Cefei, na verdade eu queria promover Zhou Shunhua. Eu sei que ela é a favorita do Shizi, e promovê-la seria fácil. Mas eu vim para a mansão junto com Zhou Shunhua, Ren Yujun e Ji Xinxian. Se eu promover só Zhou Shunhua e ignorar as outras duas, vão me acusar de ser injusta, e a própria Shizifei vai me culpar por me intrometer. Por isso, preferi não dizer nada e deixei claro que quem engravidar primeiro, assume a vaga de Cefei. Assim ninguém pode reclamar.
Zhao Chengjun sorriu levemente e perguntou:
— Por quê?
— Isso é meio complicado — disse Tang Shishi, colocando o pente de lado e levando a mão aos cabelos soltos. — O Shizi vive indo ao quarto de Zhou Shunhua. É só questão de tempo até ela engravidar. Quando isso acontecer, ela será promovida a Cefei, e ninguém poderá falar nada. Assim, ainda fico parecendo uma sogra generosa.
Zhao Chengjun sorriu, pegou uma mecha do cabelo dela e começou a brincar com ela entre os dedos:
— Você se importa até com isso?
— O que mais eu poderia fazer? — Tang Shishi tentava prender os cabelos, mas Zhao Chengjun a atrapalhava e ela falhou várias vezes. Incomodada, tomou o cabelo das mãos dele e lançou-lhe um olhar — Não atrapalha. Quero tomar banho depois de prender o cabelo. O relacionamento entre o Shizi e a Shizifei é como de inimigos. Se eu não me preocupar com isso, quem vai? Zhao Zigao ainda não consegue andar, mas no ano que vem já vai estar correndo por aí. Ele é muito solitário como filho único. Eu só queria que o Shizi tivesse logo um filho para ser companheiro de brincadeiras.
Zhao Chengjun ergueu as sobrancelhas, soltou os cabelos e deixou Tang Shishi prender num coque frouxo. Depois de arrumar os cabelos, ela se preparava para ir até o quarto de banho. Mas Zhao Chengjun não se afastou. Em vez disso, deslizou a mão esquerda por sua nuca e começou a massageá-la delicadamente.
Com os cabelos presos, o pescoço esguio e as linhas suaves dos ombros de Tang Shishi estavam completamente expostos. Ela se contorcia com cócegas por causa da massagem e segurou a mão de Zhao Chengjun, sorrindo:
— Saia do caminho, rápido. Vou tomar banho.
Zhao Chengjun deu um sorriso leve, inclinou-se devagar, encarou Tang Shishi através do espelho e disse em voz baixa:
— É melhor pedir por si mesma. A senhora não entende essa verdade?
Os olhos de Zhao Chengjun estavam escuros e cheios de intenções. Tang Shishi ficou tão nervosa com o olhar dele que se endireitou sem querer e perguntou:
— O que você quer dizer com isso?
Zhao Chengjun sorriu, passou o braço pela cintura de Tang Shishi e a ergueu da penteadeira. Ela se assustou, soltou um gritinho e rapidamente cobriu a boca. Já estava escuro. Se as criadas vissem aquilo, o que pensariam?
Tang Shishi abaixou a voz e repreendeu com suavidade:
— Me põe no chão. A criada está do lado de fora. O que você está fazendo?
Os braços de Zhao Chengjun pareciam muralhas de ferro, sem a menor intenção de soltá-la. Sua voz, agora rouca, soou junto ao ouvido dela:
— Se está mesmo preocupada com a solidão de Zhao Zigao, por que não dá à luz mais um e vira você mesma o companheiro de brincadeiras dele, ao invés de se preocupar com os outros?
Tang Shishi entendeu exatamente o que ele queria dizer. Corou até a nuca, envergonhada e furiosa, e começou a bater no peito de Zhao Chengjun:
— Sem-vergonha, pervertido! Você está pensando nisso a noite toda! Me põe no chão, eu preciso tomar banho!
Como isso seria um problema? Zhao Chengjun simplesmente mudou de direção, como se aceitasse a sugestão com prazer, e carregou Tang Shishi até o quarto de banho:
— Eu te acompanho. Você não está cansada? Ótimo, eu te ajudo.
— Não precisa!
Quando Tang Shishi acordou na manhã seguinte, as cortinas da cama estavam fechadas por todos os lados e a luz era fraca. Não dava para saber que horas eram. O lado da cama ao seu lado já havia esfriado, o que indicava que Zhao Chengjun havia saído fazia tempo.
Ótimo, pensou Tang Shishi. Ela sabia que já não era cedo e imaginava que todas as criadas e velhas da mansão inteira já deviam saber que ela acordou tarde hoje. De qualquer forma, já havia perdido a compostura mesmo, então decidiu deitar de novo.
Ao olhar para o próprio corpo coberto de manchas roxas e azuis, ela se jogou no travesseiro, sem querer se mover.
Tinha certeza mais uma vez de que não gostava nada desse tipo de coisa. Da primeira vez, estava sob efeito de remédio e fora tomada pela inconsciência, por isso não sentiu tanto. Mas ontem à noite, ela estava completamente sóbria — e foi forçada a aguentar aquilo madrugada adentro, algo que jamais esqueceria.
Apesar de já terem tido um filho, tecnicamente, aquela era apenas a segunda vez de Tang Shishi. Ficava evidente que Zhao Chengjun havia se contido por muito tempo — quando finalmente teve chance, foi selvagem. Murmurou ao pé do ouvido dela: “Desculpe, você vai ter que aguentar por enquanto.” Mas de gentileza, não teve nada.
Tang Shishi corava só de lembrar daquelas cenas. Rapidamente cobriu o rosto com as mãos e deu leves tapinhas, na esperança de fazer o calor do rosto desaparecer.
Lá fora, ao ouvirem sons vindos de dentro, uma criada bateu à porta e perguntou com suavidade:
— Wangfei, já acordou?
Tang Shishi não teve escolha a não ser fingir que estava despertando naquele momento e pediu que a criada entrasse para ajudá-la a se arrumar.
Na noite anterior, antes de dormir, Tang Shishi havia trocado para suas roupas de baixo. Antes de sair da cama, ela deliberadamente ergueu a gola para cobrir as marcas sob a roupa. Tang Shishi achava que estava calma e recatada o suficiente, digna e solene, mas não esperava que, ao ser vista pelas criadas, todas ruborizassem e abaixassem a cabeça em silêncio.
Tang Shishi também ficou corada. Ela não sabia que, embora tivesse escondido as marcas, seu rosto estava como flor de pessegueiro, as sobrancelhas carregadas de primavera, os olhos úmidos e brilhantes. Só de olhar para ela, já fazia qualquer um se perder em devaneios. Havia realmente diferença entre ver ou não ver as marcas?
A criada manteve a cabeça baixa, sem ousar encarar Tang Shishi. Trouxe as roupas e perguntou:
— Wangfei, qual deseja vestir hoje?
Tang Shishi se esforçou muito para se acalmar, deu uma olhada rápida e respondeu:
— A azul.
As criadas assentiram e começaram a trocá-la de roupa com ordem e cuidado. Tang Shishi vestiu uma saia pendente azul-vivo, com fios de prata bordados que cintilavam a cada movimento. Depois de cuidar da saia, duas criadas se aproximaram com a blusa branca de jade. Tang Shishi se virou, passou os braços pelas mangas e estendeu as mãos para abotoar.
As criadas se ajoelharam para ajeitar as pontas da saia e prenderam os pingentes de jade para mantê-la no lugar. Como Tang Shishi não receberia visitas naquele dia, não precisava se arrumar demais. Prendeu o cabelo em um coque lateral simples, inseriu um pendente de jade azul e escolheu um par de brincos azul-claro translúcidos da caixa de maquiagem. Assim, já estava pronta.
O clima ficava mais quente a cada dia, e Tang Shishi ainda precisava acalmar o filho o tempo todo, o que tornava impraticável usar penteados elaborados. Ela se arrumou de forma bem simples, mas como era naturalmente bela — e cada joia que usava valia uma pequena fortuna —, os adornos serviam como toque final. Era como uma brisa passando pelas montanhas ou uma lua clara pairando sobre elas. Seu ar fresco e elegante iluminava todo o ambiente.
As criadas elogiaram sinceramente:
— Wangfei, está deslumbrante.
Tang Shishi já ouvira elogios assim tantas vezes que nem se deu ao trabalho de distinguir o que era sincero ou não, e perguntou:
— Onde está Zhao Zigao? Já mamou?
— Acabou de mamar. O pequeno Junwang estava chamando pela senhora, mas como estava dormindo, Wangye não deixou ninguém incomodá-la, então a ama o levou para brincar em outro lugar.
Tang Shishi ficou penalizada ao ouvir isso e disse rapidamente:
— Tragam ele pra mim, depressa. A partir de agora, não importa o que eu estiver fazendo, me avisem assim que ele chorar.
— Mas Wangye disse...
— Não importa o que ele disse — retrucou Tang Shishi sem sequer pensar. — Me escutem e ignorem ele.
As criadas se entreolharam surpresas, mas logo se curvaram em saudação:
— Sim.
A ama logo trouxe Zhao Zigao. Tang Shishi o colocou sobre o divã, segurando um tambor de chocalho na mão e fazendo sons de “ploc ploc” para brincar com ele:
— Gao’er, mamãe está aqui. Venha logo.
Zhao Zigao foi imediatamente atraído pelo tambor. Vendo Tang Shishi ali perto, começou a agitar mãos e pés, querendo que a mãe o pegasse no colo. No entanto, ela se recusava a ir até ele de qualquer forma. Ansioso, Zhao Zigao se esforçou mais, chutando com força até conseguir se virar no divã, passando da posição deitado de costas para de bruços.
As criadas exclamaram animadas:
— Junwang virou sozinho!
Depois de se virar, Zhao Zigao não conseguiu mais engatinhar. Esticou a mão na direção de Tang Shishi, os lábios tremeram e ele desatou a chorar de repente. Tang Shishi largou o tambor e o pegou no colo:
— Não chore, mamãe está aqui.
Tang Shishi o embalou suavemente. Zhao Zigao encostou no ombro da mãe, soluçou algumas vezes e logo parou de chorar. A mudança foi rápida demais — antes que as lágrimas fossem enxugadas, ele já estava sorrindo de novo. Tang Shishi limpou o rostinho com um lenço e deu um peteleco leve em sua testa:
— E você, hein? Como é que sendo homem gosta tanto de mimo?
Dujuan se aproximou de Tang Shishi e zombou:
— Wangfei, nisso o pequeno Junwang puxou a senhora.
Tang Shishi fingiu que ia bater nela, mas Dujuan correu na hora. Como Tang Shishi segurava Zhao Zigao no colo, era difícil se mover, então ordenou às criadas ao redor:
— Peguem ela por mim e deem uma surra!
As criadas partiram para cima. Dujuan não conseguiu enfrentar quatro ao mesmo tempo e logo estava implorando por piedade, chamando-as de “boas irmãs”. Uma delas respondeu sorrindo:
— Wangfei mandou. Não adianta me chamar de boa irmã. Nem se me chamar de “tia-avó” vai funcionar.
As criadas riram alto. Zhao Zigao, vendo todos correndo e rindo, também batia palmas e gargalhava.
Quando Zhao Zixun passou pelo pátio de Yan’an e ouviu as risadas vindas de dentro, não pôde evitar de parar e olhar de longe para a construção imponente. O acompanhante também ouviu e comentou, com inveja:
— Não sei o que Wangfei está fazendo com o pequeno Junwang, mas o pátio de Yan’an vive em festa. Hoje em dia é um ótimo trabalho servir Wangfei: além de não ser pesado nem exigente, ainda rende recompensas o tempo todo. Wangye é muito generoso. Basta agradar Wangfei, e o dinheiro flui como água. Dá até pra perder a conta.
Zhao Zixun lançou mais alguns olhares, depois desviou o olhar e disse friamente:
— Vamos.
— Hein?! — o acompanhante não conseguiu acompanhá-lo de imediato. Zhao Zixun parecia estar observando tranquilamente. Por que mudou de humor de repente? Sem ousar se atrasar, correu atrás dele:
— Sim!
Capítulo 99 – Intimidade e Distanciamento
Ao entardecer do sétimo mês, o sol já havia se posto, e o céu assumia um tom azul enevoado. A brisa fresca passava pelas janelas, fazendo as cortinas de contas balançarem suavemente, enquanto os vidros coloridos colidiam entre si com sons de tilintar.
Tang Shishi apoiava o braço no parapeito da janela, abanando-se com um leque enquanto observava Zhao Zigao sendo treinado de forma impiedosa por seu pai. Ela assistiu por um tempo e comentou:
— Não é fácil para ele sentar. Precisa mesmo fazê-lo manter a postura pelo tempo de um bastão de incenso?
Zhao Chengjun ajudou Zhao Zigao a se sentar direito, depois soltou suas mãos e o deixou sentado sozinho sobre o divã. Em pouco tempo, Zhao Zigao tombava para trás. Zhao Chengjun o segurava no meio da queda e o colocava de volta, reiniciando a contagem do tempo.
Zhao Zigao já tinha caído incontáveis vezes. Percebeu que, sempre que tombava para trás, seu pai o pegava e o ajudava a levantar novamente. Como não entendia que aquilo era um treinamento, achava apenas que o pai estava brincando com ele — e ria alegremente.
Tang Shishi suspirou suavemente:
— Ai, menino bobo... ainda ri quando os outros te maltratam.
Zhao Chengjun também ficou impotente ao perceber que Zhao Zigao estava se divertindo. Toda vez que o ajudava a sentar, Zhao Zigao propositalmente caía de novo. E, ao ser segurado, aplaudia feliz. Quanto mais brincava, mais feliz ficava.
Zhao Chengjun não pôde deixar de endurecer o rosto um pouco e disse:
— Não estou brincando com você. Sente-se direito. Só pode se deitar depois de passar o tempo do bastão de incenso.
Zhao Zigao sorria para Zhao Chengjun enquanto babava. Tang Shishi, que comia uvas ao fundo, viu a baba escorrendo e caiu na risada — quase se engasgou.
Zhao Chengjun limpou as mãos com um lenço, impotente. Ao colocar o lenço de lado, viu Tang Shishi ainda tossindo e lhe entregou pessoalmente uma xícara de água morna:
— Ele ainda é pequeno, deixe pra lá. O que houve com você?
Tang Shishi bebeu a água da mão de Zhao Chengjun. Depois de conter a coceira na garganta, conseguiu falar com mais facilidade e zombou:
— Wangye realmente é admirável. Depois de cuidar do seu filho, vem cuidar de mim. Mas eu não sou soldado do seu acampamento, por que está me dando bronca?
Com uma única frase de Zhao Chengjun, Tang Shishi já devolvia dez em resposta. Com o tempo, sua arrogância só crescia. Zhao Chengjun se sentia impotente, mas também sabia que a culpa era dele mesmo por mimá-la tanto.
Zhao Chengjun disse:
— Está bem. Ainda tem água na sua boca. Limpe com um lenço.
Tang Shishi procurou um lenço em volta. Zhao Chengjun entregou um de forma prática. Ao usá-lo, Tang Shishi sentiu um cheiro estranho de leite, franziu a testa e perguntou:
— Esse é o mesmo que você usou pra limpar a baba do Zhao Zigao?
Zhao Chengjun olhou para o lenço e pareceu confirmar. Tentou conter o riso. Tang Shishi percebeu na hora pela expressão dele. Ficou furiosa, jogou o lenço de volta nele e gritou:
— Ainda tem coragem de rir? Vá pegar água pra mim agora!
Zhao Chengjun segurou o lenço, virou-se e apontou para Zhao Zigao:
— Ouviu isso? Sua mãe está com nojo de você.
Tang Shishi o empurrou com força:
— Vai logo!
Apesar de provocá-la, Zhao Chengjun ainda saiu para buscar um lenço úmido. Liu Ji já havia trazido água morna; Zhao Chengjun torceu o lenço na bacia de cobre e voltou ao quarto para limpar o rosto de Tang Shishi.
— Vem cá. Não se mexa.
A pele de Tang Shishi era delicada, o rosto macio e firme como creme de leite. Zhao Chengjun segurou seu queixo com uma mão e com a outra limpou cuidadosamente as marcas de água.
— Pronto. — Zhao Chengjun se aproximou, olhou atentamente para o rosto dela e disse: — Agora limpei de verdade.
Ele se virou para largar o lenço. Tang Shishi cheirou por si mesma, ainda desconfiada de que havia cheiro de leite ou baba.
— Tem certeza de que limpou direito? Por que ainda consigo sentir o cheiro?
Ao ouvir isso, Zhao Chengjun não disse nada. Levantou o queixo dela, cheirou de perto e respondeu com expressão séria:
— Eu não senti nada. Será que não cheirei direito?
Tang Shishi não esperava esse truque e ficou completamente atônita. Quando recobrou a razão, lançou um olhar rápido para a criada atrás, beliscou discretamente o braço de Zhao Chengjun e sussurrou:
— Pervertido!
Zhao Chengjun segurou ambas as mãos dela com um sorriso, sentou-se ao lado no divã e disse:
— Isso que você chama de pervertido? Então é porque ainda não viu nada.
As palavras de Zhao Chengjun eram diretas, revelando claramente seu desejo. Tang Shishi corou na hora. Respirou fundo e o xingou:
— Tarado!
Zhao Chengjun suspirou, decepcionado:
— Por que sempre repete os mesmos xingamentos? Vou te ensinar uns novos.
Assim que disse isso, sua mão começou a se comportar de forma indecente. Tang Shishi fugiu rapidamente para dentro do divã e o encarou com raiva:
— Quem quer aprender?
Tinha medo de que ele realmente fizesse algo ali. Apesar de sua boca ser dura, ela discretamente engatinhou até Zhao Zigao e fingiu pegá-lo no colo. Com o filho por perto, Zhao Chengjun não poderia fazer aquelas coisas com ela.
Zhao Chengjun só queria assustá-la e não pretendia ir além — pelo menos, não naquele momento.
A luz do lado de fora escurecia aos poucos, e era hora de acender as lâmpadas. As criadas entraram uma após a outra e acenderam os castiçais com habilidade. Através de uma lanterna de palácio translúcida, Zhao Chengjun viu a luz amarela suave iluminar Tang Shishi. Ela e a criança pareciam envoltas por uma aura quente, brilhando como uma pérola luminosa na noite.
Zhao Chengjun suspirou com sinceridade. Não era à toa que se dizia que todos os dedos da mão tinham comprimentos diferentes. Criar uma criança com as próprias mãos era, de fato, uma experiência emocional completamente distinta. Zhao Zigao tinha apenas cinco meses, mas o carinho de Zhao Chengjun por ele já superava o que sentira ao criar Zhao Zixun durante dez anos.
E isso era só o começo. Quando Zhao Zigao aprendesse a andar, falar, estudar e praticar artes marciais... quanto mais ele crescesse, mais Zhao Chengjun se dedicaria a ele. Além disso, o bônus de ter Tang Shishi como mãe da criança era imenso.
Zhao Chengjun não entendia isso antes. Agora, como pai, finalmente compreendia por que seu pai, o Imperador, favorecia tanto seus dois irmãos e a ele próprio, ignorando completamente o par de irmãos nascidos da Imperatriz Viúva Yao. Colocando-se no lugar deles, talvez Zhao Chengting e a Princesa Nanyang realmente não tenham vivido bem naqueles anos.
Não era surpreendente que, ao chegar ao poder, a Imperatriz Viúva Yao guardasse tanto ódio de sua mãe, de seus dois irmãos e dele mesmo. Zhao Chengjun pensou que, se alguém ousasse prejudicar Tang Shishi e seu filho, ele também ficaria louco de vontade de arrancar a pele dessa pessoa.
Ele conseguia entender a loucura da Imperatriz Viúva Yao na época, mas isso não significava que poderia perdoá-la. Zhao Chengjun ainda queria cobrar da Imperatriz Viúva Yao as vidas de sua mãe, dos irmãos mais novos e talvez de outras duas mulheres inocentes.
Ao pensar nisso, o olhar de Zhao Chengjun suavizou. Aqueles momentos de paz se tornavam especialmente preciosos porque prenunciavam a tempestade. Essa vida tranquila — uma noite fresca de verão, com a esposa e o filho ao redor da luz — não era exatamente o que muitos homens sonhavam?
Tang Shishi carregava Zhao Zigao nos braços e chamou Zhao Chengjun com um gesto:
— Olha, as unhas dele cresceram de novo.
Zhao Chengjun confirmou que era verdade.
— A luz está fraca agora. Amanhã de dia, peça para alguém cortá-las. Por enquanto não é grave — ele não vai se arranhar.
Enquanto falava, Zhao Chengjun segurou a mão de Tang Shishi e observou suas unhas com atenção:
— As suas também precisam ser cortadas.
Tang Shishi puxou a mão com um estalo e o encarou com desconfiança:
— Não. Eu não me arranho de qualquer forma. Então por que deveria cortar as minhas?
Zhao Chengjun parecia sorrir sem sorrir, com um olhar cheio de significados ocultos. Tang Shishi reagiu de repente, suas bochechas coraram, e ela estava prestes a retrucar quando, de repente, ouviu-se um som apressado de passos do lado de fora.
As palavras de Tang Shishi pararam naturalmente. A criada correu até a porta e saudou Zhao Chengjun e Tang Shishi:
— Saudações ao Wangye e à Wangfei.
Tang Shishi perguntou:
— Está escurecendo. O que houve?
— Wangfei, é uma boa notícia. — A criada observou cuidadosamente a expressão de Tang Shishi e disse: — Há pouco, a concubina Lizhi teve náuseas. O médico imperial examinou e disse que é pulso de alegria*.
Tang Shishi ficou ligeiramente surpresa. Ela tinha dito há poucos dias que quem engravidasse primeiro seria promovida a Cefei. E agora, alguém já estava grávida? Depois de se recuperar da surpresa, Tang Shishi sorriu imediatamente e disse:
— É realmente uma boa notícia e merece recompensa. Alguém, tragam meu par de pulseiras de jade com padrão de uva incrustadas em ouro e deem a Lizhi para celebrar o momento. Transmitam à concubina Lizhi que, como já escureceu, é inconveniente para mim visitá-la agora, mas irei amanhã. Lembrem-na de cuidar bem de si mesma e que peça diretamente à cozinha tudo o que quiser comer, sem se privar. Contanto que dê à luz com segurança, independentemente do sexo da criança, concederei imediatamente o título de Cefei do Shizi a ela.
A criada ficou radiante, recebeu as pulseiras com um "sim" e saiu feliz. Depois que ela se foi, Zhao Chengjun perguntou a Tang Shishi:
— Quem é Lizhi?
Tang Shishi respondeu:
— É uma das criadas do dote da Shizifei. Ela andou se arrumando ultimamente. Não lembra?
Zhao Chengjun realmente não lembrava. No início, ele ficou confuso como uma lichia — uma fruta — podia se tornar concubina, mas depois foi entendendo, pela conversa, que era uma concubina de Zhao Zixun.
Zhao Chengjun franziu a testa e disse friamente:
— Quantas concubinas Zhao Zixun tem? Só me lembro de Zhou Shunhua, Ren Yujun e uma com sobrenome Ji. Como assim tem mais uma chamada Lizhi agora?
— Não é só Lizhi. — Tang Shishi corrigiu suavemente. — Além dela, ainda tem Yingtao, Shiliu e Sangshen.
Zhao Chengjun já estava tonto só de ouvir. Incluindo a Shizifei, Zhao Zixun tinha oito mulheres no pátio dos fundos. E isso contando apenas as que tinham algum status. As que não tinham nem foram contabilizadas. Com tantas mulheres para lidar, não era surpresa que ele não progredisse nos estudos e vivesse disperso nos assuntos de estado.
Zhao Chengjun não escondeu sua insatisfação e perguntou:
— Por que tem tantas mulheres no pátio dele?
Tang Shishi segurava Zhao Zigao nos braços e respondeu sem entusiasmo:
— Homem, né? Ter três esposas e quatro concubinas é algo comum. Me diga, quem não invejaria o Shizi por ter uma esposa legítima tão virtuosa?
As sobrancelhas de Zhao Chengjun se moveram levemente. Ele sabia que essas palavras eram mais uma indireta. Levantou-se e foi para o outro lado do divã brincar com Zhao Zigao:
— Você ainda é pequeno, uma folha em branco. Não aprenda com sua mãe, ela não é assim tão esperta, mas usa tudo que tem só pra lidar comigo.
Tang Shishi arregalou os olhos e protestou:
— O que foi que eu fiz pra você me ridicularizar assim?
— Ainda quer me testar? — Zhao Chengjun beliscou de leve a pontinha do nariz de Tang Shishi e disse: — Você ainda não entendeu qual é minha atitude? Não se preocupe, não tomarei concubinas. Ter você e nossos filhos já basta pra essa vida.
Os olhos de Tang Shishi se encheram de sorrisos, mas sua boca continuava dura:
— Agora você fala isso. Mas quem garante que, no futuro, você não vai se ressentir por ter poucos filhos e me culpar por não ter permitido que tomasse concubinas, o que impediu você de “abrir ramos e espalhar folhas”?
Zhao Chengjun não respondeu. Apenas fez um gesto para que a criada viesse pegar Zhao Zigao. Assim que Tang Shishi viu a movimentação, sentiu um mau pressentimento e recuou, vigilante:
— Ainda está cedo. Por que está tirando a criança daqui?
— Abrir ramos e espalhar folhas. — Não importava o quanto Tang Shishi tentasse fugir, ela não era mais rápida do que o braço estendido de Zhao Chengjun, que logo a envolveu por completo. Ele segurou suas mãos rebeldes, a pegou no colo e seguiu em direção à cama com passos largos: — Já que você está amargurada por termos poucos filhos, então vamos trabalhar nisso agora mesmo pra que não me acuse injustamente depois.
Tang Shishi achava que Lizhi tinha engravidado rápido demais. Mas, para sua surpresa, apenas meio mês depois, outra criada, Shiliu, também foi diagnosticada com gravidez.
Quando soube da notícia, Tang Shishi achou tudo muito estranho. Zhao Zixun não tinha falta de mulheres. Nos dois anos desde o casamento, ele vivia se divertindo com elas, e nunca nenhuma engravidava. Mas agora, apenas um mês e meio depois de Tang Shishi propor estabelecer uma Cefei, duas criadas engravidaram uma após a outra?
Será que a infertilidade anterior era controlada de propósito?
Tang Shishi não parava de remoer isso por dentro, mas não podia expressar suas dúvidas. Do contrário, pareceria que ela odiava o Shizi e não queria que ele tivesse um herdeiro. Ela premiou as duas criadas com grande estardalhaço. Todo o tratamento foi igual: tudo o que Lizhi recebesse, Shiliu também teria. Nunca permitiria que nenhuma fosse negligenciada.
De repente, a mansão ficou animada. Todos sabiam que duas criadas estavam prestes a ascender aos céus em um único passo. Tang Shishi havia saltado de criada do Wangye para Wangfei, tornando-se a única favorecida do pátio dos fundos. Agora, essas duas criadas ficariam um pouco abaixo, pois apenas se tornariam Cefei do Shizi. Ainda assim, em comparação com seus status originais, tornar-se Cefei era como alcançar o céu. Quem sabia se não acabariam se tornando outra Tang Shishi?
Lizhi e Shiliu se inspiraram no exemplo dela e esperavam com alegria pelo nascimento do bebê. O ideal era conquistar o homem de uma vez só — a mãe seria honrada pela nobreza do filho.
A mansão ficou agitada por um mês inteiro. A Wangfei deu à luz o pequeno Junwang, e as duas criadas do Shizi engravidaram uma após a outra. Todos ficaram atônitos com essas sucessivas boas notícias, como se até o ar estivesse inquieto.
Ao final do oitavo mês, uma tempestade caiu com força, vigorosa e impiedosa. Tang Shishi estava sentada no quarto, bordando roupas pequenas para Zhao Zigao. Lá fora, trovões ribombavam. Por alguma razão, o barulho a deixou inquieta, como se algo ruim estivesse prestes a acontecer. Tang Shishi se culpou em silêncio por estar sendo sensível demais. Estava prestes a voltar ao bordado quando, de repente, um grito choroso de mulher soou do lado de fora. Tang Shishi se assustou, sua mão tremeu e ela furou o dedo.
Ela soltou um "ai" baixinho. Dujuan viu e correu para pegar um pano de algodão para enrolar o dedo de Tang Shishi. Mas Tang Shishi a impediu, levou o dedo à boca e o sugou. Por sorte, o ferimento não era grave e o sangue logo parou de sair.
Ao ver isso, Dujuan pegou um lenço e limpou o dedo de Tang Shishi, resmungando furiosa:
— Quem foi tão ousada pra fazer escândalo e perturbar a Wangfei? Alguém, prendam-na agora!
Tang Shishi ouviu a voz da mulher parar do lado de fora do portão do pátio de Yan’an. Mas, infelizmente, foi interrompida antes mesmo de se aproximar da porta. Já não dava pra ouvir nada. Ela sabia que tinham a detido. Zhao Chengjun prezava imensamente pela segurança. Como alguém conseguiria invadir correndo?
Mesmo assim, Tang Shishi teve uma intuição diferente e ordenou:
— Ela chorava com tanto desespero... talvez seja algo importante. Tragam-na até aqui.
As criadas hesitaram um pouco. Mas, diante da insistência de Tang Shishi, não tiveram escolha a não ser obedecer. A mulher que chorava foi logo trazida. Seu corpo estava encharcado, os cabelos soltos, escorrendo água pelo corpo — parecia um fantasma d’água.
Tang Shishi franziu a testa. Não era Yingtao? Uma das criadas do dote de Lu Yufei, que havia se tornado concubina de Zhao Zixun há poucos dias? Não importava para onde fosse, ainda era considerada uma “meia senhora”. Como podia estar naquele estado?
Assim que viu Tang Shishi, Yingtao se ajoelhou imediatamente e bateu com a testa no chão, chorando:
— Wangfei, por favor, tenha misericórdia e salve Lizhi!
Tang Shishi franziu ainda mais a testa ao ouvir isso:
— Lizhi? Ela não estava cuidando da gravidez? O que aconteceu?
Nota:
Pulso de alegria (喜脉 – xǐ mài): na medicina tradicional chinesa, refere-se ao pulso de uma mulher grávida.
Capítulo 100 — Gravidez Falsa
Yingtao permanecia ajoelhada no chão, com gotas d’água escorrendo das pontas dos cabelos e formando uma pequena poça no piso. Estava completamente encharcada, e seu rosto molhado não permitia distinguir se o que escorria eram lágrimas ou apenas chuva.
Apesar da aparência miserável, Yingtao se prostrou diante de Tang Shishi:
— Wangfei, por favor, salve Lizhi. Eu cresci com ela e sei o quanto é tola e medrosa. Ela jamais teria coragem de fazer intrigas ou enganar o Wangye e o Shizi de propósito!
Tang Shishi franziu lentamente a testa. Pelo que Yingtao dizia, parecia que havia algo errado com a gravidez de Lizhi. Tang Shishi fez um gesto para Dujuan pegar um pano de algodão seco para Yingtao e disse:
— Não se exalte. Seque-se primeiro. O que aconteceu?
Yingtao pegou o pano passivamente e, atordoada, enxugou o rosto. As gotas dos olhos foram apagadas, e aos poucos seu coração se acalmou.
Ela sabia que viera ao lugar certo. Na imensa mansão, apenas a Wangfei tinha poder para interferir num caso assim. Lizhi ainda podia ser salva.
Apertando o pano nas mãos, Yingtao avançou dois passos de joelhos e falou com amargura:
— Wangfei, o médico imperial descobriu que a gravidez de Lizhi era falsa. Mas peço que investigue com cuidado, pois Lizhi... ela não tem coragem de enganar o Shizi! Quando o médico fez o primeiro diagnóstico, ele realmente sentiu o pulso de alegria. Lizhi é tão boba... quando o médico disse que ela estava grávida, ela acreditou sem questionar e ficou esperando tola até agora. Só percebeu que algo estava errado quando a menstruação veio há alguns dias... então veio falar comigo, pedindo ajuda. Eu a aconselhei a confessar à Shizifei, mas antes que pudesse falar qualquer coisa, foi descoberta pelo Shizi.
À medida que ouvia, Tang Shishi franzia cada vez mais a testa. Lizhi havia feito um alarde com essa história de gravidez, e depois de tanto tempo... era tudo mentira?
Lizhi e Yingtao eram boas amigas. Tang Shishi não acreditava totalmente nas palavras dela. Pensou um pouco e decidiu confirmar com outras pessoas, por precaução.
— Como o Shizi descobriu que era uma gravidez falsa? Além de você, mais alguém sabe disso?
— Eu não sei. Mas juro pela minha vida que nunca contei a ninguém! — Yingtao estava aflita e olhou para Tang Shishi com súplica nos olhos. — Wangfei, por favor, tenha piedade e salve Lizhi. Não sei quem envenenou os ouvidos do Shizi, mas ele acha que Lizhi fingiu estar grávida para ganhar o título de Cefei. Ele ficou furioso e disse que queria espancá-la até a morte!
— Ganhar o título de Cefei... — Tang Shishi repetiu lentamente essas palavras e, de repente, seus olhos se arregalaram com um lampejo de compreensão. — Isso é ruim!
Ela ordenou que redobrassem a vigilância sobre Zhao Zigao e correu para o Pátio Yinian com suas criadas. No início, Tang Shishi também suspeitava que aquelas duas criadas estivessem agindo em conjunto, fingindo uma gravidez para enganá-la e, depois de descobertas, quisessem usar sua influência para se salvarem.
Mas ao ouvir Yingtao mencionar o título de Cefei, Tang Shishi se lembrou repentinamente de que as duas concubinas que haviam sido diagnosticadas com gravidez eram ambas criadas do dote de Lu Yufei. E se o verdadeiro alvo não fosse Lizhi nem as outras criadas... mas sim Lu Yufei?
A chuva continuava forte quando Tang Shishi chegou ao pátio. A barra de sua saia já estava molhada. Assim que atravessou o portão, se deparou com uma cena inesperada:
— Shizifei?
Lu Yufei estava ajoelhada sob a chuva. Zhang Momo também se ajoelhava atrás dela, tentando protegê-la com um guarda-chuva. No entanto, o guarda-chuva cobria apenas o tronco — os joelhos de Lu Yufei estavam encharcados.
Zhang Momo estava tão aflita que mal sabia o que fazer. Ao ouvir uma voz atrás de si, virou-se e viu Tang Shishi. Ficou imediatamente aliviada:
— Wangfei! Wangfei, por favor, interceda pela Shizifei!
Tang Shishi franziu a testa e se aproximou devagar pelo corredor. Parou diante do pórtico e perguntou, do outro lado do caminho de pedras:
— O que está acontecendo aqui? Por que a Shizifei está ajoelhada assim?
— Wangfei, o Shizi foi envenenado por aquelas vadias e entendeu tudo errado. Achou que a Shizifei estava tramando para se tornar Cefei. Por favor, investigue. A Shizifei já é esposa legítima. Pra que ela tramaria por esse título? Ela não sabia nada sobre a gravidez falsa de Lizhi e Shiliu!
Tang Shishi arqueou uma sobrancelha discretamente. Oh? Então não foi só Lizhi — Shiliu também estava fingindo? O golpe contra Lu Yufei fora realmente cruel. Um plano tão maligno só podia ter sido arquitetado por alguém íntimo da casa.
Tang Shishi pensou imediatamente em Zhou Shunhua. Mas agora não era hora de levantar suspeitas. Ela nada demonstrou e disse friamente:
— Em dias chuvosos como hoje faz muito frio. Como uma mulher vai aguentar ajoelhar-se desse jeito? Levante-se, Shizifei.
O rosto de Lu Yufei estava pálido e sua voz rouca:
— Mas o Shizi está furioso. Ele mandou que eu refletisse aqui fora.
— O Shizi é mesmo impressionante. — Tang Shishi lançou um olhar para Lu Yufei, ajustou seu manto e disse: — Por mais inútil que esta Wangfei seja, ainda sou a mãe dele. Isso ainda posso resolver. Levante-se.
— Obrigada, Wangfei! — Zhang Momo respondeu apressada e correu para ajudar Lu Yufei a se levantar. Com a palavra da Wangfei, mesmo que Zhao Zixun pedisse explicações depois, poderiam jogar a culpa nela.
Quanto a como Tang Shishi lidaria com isso depois, Zhang Momo não se importava.
Lu Yufei se ergueu cambaleante, enquanto uma criada a envolvia com um manto. Seu rosto estava branco como papel. Tang Shishi perguntou:
— Onde está o Shizi?
— Ele está interrogando Lizhi e Shiliu nos fundos. — Zhang Momo enxugou a chuva do rosto e prontamente se ofereceu para guiar o caminho. — Está chovendo forte. O Shizi não sabe que a Wangfei veio. Por favor, por aqui.
O Pátio Yinian era como uma versão menor da mansão principal, com eixo central reto e estrutura completa de salão frontal, central e posterior. Lu Yufei vivia no quarto da frente, e os quartos nos fundos, alas laterais e pátios adjacentes serviam para abrigar as concubinas de Zhao Zixun.
Tang Shishi seguiu até o fundo. Assim que entrou no pátio lateral, ouviu o som seco de uma xícara de chá se estilhaçando:
— E agora, o que mais vocês duas têm a dizer?
Dentro do quarto, a súplica angustiada de uma mulher ecoou:
— Shizi, por favor, tenha piedade. Eu realmente não sabia de nada! Eu não fingi de propósito... O médico imperial não disse isso no mês passado!
Só se ouvia a voz de uma das mulheres. A outra parecia ter ficado em choque. Zhao Zixun, ao ouvir a súplica, não demonstrou qualquer compaixão. Pelo contrário, ficou ainda mais furioso:
— Então está dizendo que o médico imperial mentiu?
A mulher soluçava e dizia que não ousava afirmar isso. O médico imperial se adiantou e saudou respeitosamente:
— Shizi, por favor, investigue com imparcialidade. Eu pratico medicina há muitos anos, com ética rígida e consciência limpa. Não tenho rancores nem relação alguma com a concubina Shiliu — foi a primeira vez que a vi hoje. Como poderia caluniá-la? Ambas as concubinas, Shiliu e Lizhi, de fato não estão grávidas. Se o Shizi não acredita em mim, pode chamar outro médico para confirmar.
Zhao Zixun respondeu:
— Não precisa continuar. Naturalmente, confio em você. São essas duas criadas desprezíveis que foram ousadas demais. Alguém, levem-nas e espanquem até a morte.
De repente, ouviu-se um choro desesperado. Shiliu gritava por justiça. A outra mulher pareceu finalmente reagir, chorando e implorando:
— Shizi, toda a culpa é minha! Por favor, não desconte nos outros! A Shizifei é inocente!
Mas Zhao Zixun, já saturado, não tinha mais paciência para sentimentalismos. Nem olhou para as criadas caídas no chão e disse friamente:
— Arrastem-nas e matem-nas a pauladas.
As criadas mais velhas atenderam prontamente e começaram a arrastar as duas para fora. As jovens lutavam e choravam de dor, mas as mulheres mais velhas nem hesitaram ao arrastá-las com brutalidade até a porta.
— Duas vadias desprezíveis, aprendam seu lugar! Como ousam gritar por justiça depois de enganarem o Shizi? Hoje vocês vão conhecer as regras desta mansão... Ah! Wangfei?!
Tang Shishi estava parada sob o alpendre, com as mãos cruzadas, observando silenciosamente a cena caótica:
— Que regras são essas? Como é que eu não conheço?
Ao ouvirem sua voz, todos no interior correram para fora. Zhao Zixun saiu da porta com o rosto fechado e, ao ver que era mesmo Tang Shishi ali parada, franziu ainda mais a testa:
— Wangfei, por que está aqui?
Um grupo de mulheres o seguiu e, ao ver Tang Shishi, cada uma reagiu de uma forma. Contudo, todas suprimiram seus verdadeiros sentimentos e se curvaram com reverência:
— Saudações à Wangfei.
— Seus gritos já chegaram até o Pátio Yan’an e o Shizi ainda me pergunta por que vim? — Tang Shishi vestia um manto enquanto subia os degraus. Dujuan segurava o guarda-chuva ao seu lado. Assim que ela entrou sob o beiral, Dujuan virou-se para apoiar o guarda-chuva na coluna do corredor.
Outra criada lhe entregou um lenço. Tang Shishi o pegou, enxugou a água das mãos e perguntou com calma:
— A Shizifei ajoelhou-se sob a chuva para refletir, e essas duas criadas estão prestes a ser espancadas até a morte. O Shizi não deveria me explicar o que está acontecendo?
Zhao Zixun apertou os lábios, relutante em permitir que Tang Shishi se envolvesse. Com um tom frio e cheio de resistência velada, respondeu:
— Isso é assunto interno da minha casa. Não ouso incomodar a Wangfei.
Tang Shishi soltou uma risada baixa, devolveu o lenço à criada e cruzou as mãos à frente do corpo — alvas e frias como jade lapidado:
— Há algo nesta mansão que esta Wangfei não possa administrar?
Tang Shishi normalmente se referia a si mesma como “eu”, mas agora usava “esta Wangfei”. O clima no pátio ficou tenso. Mestres e criados baixaram as cabeças, paralisados, sem se mover.
Por um momento, tudo o que se ouvia no fundo da mansão era o som da chuva.
Zhao Zixun ficou em silêncio por um instante, então curvou-se em saudação:
— A Wangfei certamente não tem restrições. Mas esses assuntos imundos podem poluir seus ouvidos. Peço que tenha magnanimidade e perdoe minhas falhas.
— Não faz mal. — Tang Shishi lançou um olhar de canto e apontou para alguém aleatoriamente. — Você aí. Conte exatamente o que aconteceu desde o começo.
A pequena criada entrou em pânico ao ser apontada e gaguejou:
— W-Wangfei, o pessoal da lavanderia recolheu as roupas hoje e encontrou, por acaso, sangue na saia da concubina Lizhi. A lavadeira achou que ela tivesse sofrido um aborto e correu para informar o Shizi. Mas, depois de questionarem, descobriram que não era sangue de aborto… era sangue menstrual. O Shizi ficou furioso e mandou chamar imediatamente o médico imperial para verificar o pulso da concubina Lizhi. Enquanto esperavam, a expressão da concubina Shiliu estava estranha. O Shizi percebeu que ela também estava mentindo e ficou ainda mais furioso. A Shizifei tentou interceder pelas duas concubinas, e, num acesso de raiva, o Shizi a mandou ajoelhar na chuva… Depois que o médico imperial chegou, ele verificou o pulso das duas concubinas e… nenhuma das duas estava grávida…
A explicação da criada parecia, à primeira vista, razoável — afinal, menstruação não ocorre durante uma gravidez. Ver sangue na roupa de Lizhi e descobrir que era menstruação explicaria tudo de forma justa e lógica. No entanto, aí também residia o problema: se Lizhi realmente estivesse fingindo uma gravidez, por que enviaria, voluntariamente, uma roupa manchada de sangue para a lavanderia? Ela não era completamente ignorante. E como uma simples lavadeira teria contato direto com o Shizi?
É claro que o ponto mais crucial era: Lizhi e Shiliu mentiram sobre estarem grávidas. Com que objetivo? Uma gravidez não poderia ser falsificada por muito tempo. Se, após dez meses, nenhuma criança nascesse, o resultado seria a morte. Mesmo no harém, até a concubina mais favorecida não ousaria fazer algo tão temerário. Como duas criadas sem nenhum respaldo ousariam tanto?
Por isso, Tang Shishi estava mais inclinada a acreditar que Lizhi e Shiliu realmente pensaram estar grávidas e, entusiasmadas, relataram a notícia. No fim, caíram na armadilha de alguém. Tang Shishi não entendia de farmacologia, mas em mansões abastadas havia todo tipo de pessoa. Não era impossível que existisse um medicamento que causasse sintomas semelhantes aos da gravidez — talvez até alterasse o pulso.
Nos primeiros três meses, era fácil errar no diagnóstico. E não era difícil imaginar que um médico imperial, ansioso por agradar, interpretasse um pulso semelhante como o pulso da alegria. Os autores por trás da trama haviam arquitetado tudo com minúcia, conduzindo Lizhi e Shiliu passo a passo até a armadilha. Agora, o golpe claramente se voltava contra Lu Yufei.
Afinal, Tang Shishi havia dito que a primeira a engravidar seria promovida a Cefei, e justo duas criadas do dote de Lu Yufei foram as que “engravidaram”. Era impossível que as pessoas não suspeitassem que tudo tivesse sido instruído por ela.
Tang Shishi organizou as ideias mentalmente e entendeu a situação. Lançou um olhar discreto para Zhou Shunhua e viu que ela abaixava a cabeça, com um ar de tristeza e inocência. Tang Shishi zombou interiormente e declarou com frieza:
— Eu disse que quem engravidasse seria promovida a Cefei. Era uma intenção generosa, mas não esperava que acabasse assim. Lizhi e Shiliu relataram gravidez falsa, mas são apenas duas criadas indefesas. Por que fariam isso? Compreendo a raiva e o desgosto do Shizi, mas, no fim, são duas vidas. Na minha opinião, não há mal algum em investigar cuidadosamente antes de puni-las.
Ao ouvir isso, Zhang Momo apressou-se em concordar:
— O que a Wangfei disse é verdade! Shizi, a Shizifei é quem mais deseja ter um herdeiro. O senhor não sabe quantos remédios ela tomou, quanta dor ela sofreu para tentar engravidar! A Shizifei tem um coração bondoso e gentil. Como ela recorreria a uma fraude dessas? Alguém deve ter tramado tudo isso. Shizi, por favor, investigue com atenção.
— Bondosa e gentil? — Zhao Zixun lançou um olhar frio para Lu Yufei e zombou — Eu não acho.
Houve um alvoroço entre os presentes. Pelo tom de Zhao Zixun, estava claro que ele não acreditava na inocência de Lu Yufei. Seu rosto, já pálido, perdeu todo o resto de cor. Ela ergueu a cabeça de súbito:
— Shizi… Você desconfia de mim?
Zhao Zixun não respondeu, mas o silêncio já era resposta suficiente. Toda a força de Lu Yufei parecia ter sido drenada. Seu corpo cedeu e ela quase caiu:
— Somos marido e mulher há dois anos… e você não confia em mim?
Uma velha criada correu para ampará-la. Zhou Shunhua, que estava ao lado de Zhao Zixun, suspirou levemente e disse em tom conciliador:
— Shizifei, sei que lhe dói ver suas criadas nessa situação. Mas não pode culpar o Shizi. Ele fez algo errado ao desmascarar uma farsa?
Teria sido melhor se Zhou Shunhua ficasse calada. Assim que ela falou, Lu Yufei pareceu ainda mais inflamada. Com raiva, retrucou:
— Não precisamos de uma concubina se intrometendo em assuntos entre marido e mulher!
Zhao Zixun já havia se acalmado, mas as palavras de Lu Yufei fizeram sua expressão azedar novamente:
— Insolente! Shunhua só estava pensando no seu bem. Mesmo que não seja grata, como ousa insultá-la? Você simplesmente não sabe reconhecer o valor das coisas. É uma vergonha como esposa.
As lágrimas de Lu Yufei caíram.
— Eu não sirvo, então? Pois me repudie e a torne sua esposa legítima!
Assim que terminou de falar, empurrou Zhang Momo com força, virou-se e saiu correndo. Mas a chuva continuava, e a escada estava escorregadia. Seu corpo já estava debilitado. Tomada pela emoção, nem percebeu onde pisava e, num instante, escorregou nos degraus, caindo com força.
As mulheres gritaram em choque. Zhang Momo deu um berro e correu escada abaixo. As criadas ficaram estáticas por um momento antes de cercar Tang Shishi às pressas. Com o rosto fechado, ela disse com raiva:
— Absurdo!
Tang Shishi caminhou depressa até a porta. Assim que olhou para baixo, ofegou em choque.
Havia sangue nos degraus, misturado com a chuva, formando manchas espalhadas no chão. Zhang Momo segurava Lu Yufei no colo, com as mãos cobertas de sangue, e gritava desesperada:
— Alguém, rápido, chamem o médico imperial!
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