Capítulos 76 a 78


 Capítulo 76: O Homem Desolado

Quando o homem ouviu as palavras da criança, pareceu ter vontade de chorar. Embora Liyou estivesse muito distante, ainda conseguiu perceber a expressão emocionada do homem. Ela viu seus olhos ficarem vermelhos e, depois de se acalmar, ele disse gentilmente:

— Coma, quando meu tesouro estiver de barriguinha cheia, o papai vai comer.

"Piedade no coração dos pais de todo o mundo" — tal pensamento surgiu naquele instante. Existiam injustiças demais no mundo, e quando um homem enfrentava algo assim, era de partir o coração. No entanto, havia situações ainda mais miseráveis por aí. Ao menos, o filho daquele homem ainda estava vivo — o que já era uma sorte se comparado a outros infortúnios. Não era que Anhui fosse desprovido de compaixão; ele apenas entendia que, se fosse só da boca pra fora, nenhuma piedade adiantaria.

Mas, ao observar a cena do homem com a criança, Anhui se viu pensando em algo que nunca ousara antes. Ninguém deixaria de sonhar em ter um filho com a pessoa que ama, e ele não era diferente. Mas... será que a Imperatriz desejaria ter um filho com ele?

— Papai não vai comer? Então eu também não vou! — disse a criança, mostrando-se surpreendentemente esperta e sensata, balançando a cabecinha enquanto estendia o pão cozido ao homem com todas as forças.

O homem parecia já estar acostumado com esse tipo de cena e não insistiu em recusar. Sorriu e deu uma pequena mordida no pão, dizendo à criança:

— Certo, vamos comer juntos. O papai come, e depois o bebê também come.

Ao ver os gestos do homem e ouvir suas palavras, a criança pareceu entender e abriu um largo sorriso. Quando o homem levou o pão à boca, a criança deu uma mordida feliz, saboreando com doçura.

Liyou se moveu. Caminhou até o homem e agachou-se diante dele, perguntando de forma curiosa:

— Se eu pudesse te conceder um desejo, o que você mais gostaria?

Algumas pessoas não desejavam muita coisa, enquanto outras queriam demais. Algumas, que não tinham nada, desejavam apenas um punhado de coisas. Liyou vinha se perguntando, se pudesse conceder um desejo àquele homem... o que ele pediria?

Quanto à presença de Liyou, o homem não demonstrou surpresa. Apenas levantou a cabeça com apatia. Primeiro olhou para Liyou, depois para Anhui. Em relação à pergunta dela, esboçou uma reação, mas franziu a testa, como se não quisesse responder.

O homem permaneceu em silêncio e Liyou não teve pressa. Continuou a encará-lo, como se estivessem competindo para ver quem mantinha o olhar firme por mais tempo.

Por fim, o homem pareceu ceder e perguntou lentamente:

— Você não tem nada a ver comigo. Por que eu deveria te contar meu desejo? Contando ou não, por acaso vai realizá-lo?

Ele não se surpreendeu com o surgimento daquelas duas pessoas porque já as havia notado há algum tempo. Dava pra imaginar que não era só ele que as tinha visto, mas outros ao redor também. Afinal, aquele era um campo de refugiados. Por mais discretos que tentassem ser, pelas vestes e postura, estava claro que não eram refugiados. Em outros tempos, alguém certamente teria se aproximado para perguntar algo, mas agora... ninguém conseguia proteger nem a si mesmo. Melhor não se envolver. Mesmo nas circunstâncias mais difíceis, ele havia notado os dois. Sempre acreditara que sabia avaliar bem as pessoas e tinha certeza de que aqueles dois não eram locais. Mas não entendia por que tinham ido até ele com uma pergunta daquelas. Qual era a intenção?

— Talvez. — Liyou respondeu. Como o homem havia despertado seu interesse, ela não se importava em realizar um desejo só por curiosidade.

Um brilho agressivo passou pelos olhos do homem, mas logo se apagou. Ele balançou a cabeça, sentindo que, na idade em que estava, ainda acreditar em “presentes do céu” era pura ingenuidade. Não era à toa que havia sido enganado e reduzido àquela condição.

— O que você quer que eu faça? — perguntou diretamente. Embora questionasse, não conseguia imaginar o que teria de valor. Estava tão empobrecido que nem tinha mais roupas próprias. A última peça havia sido rasgada pelas pessoas há pouco. Agora, restava apenas um trapo que antes usava para forrar o chão. O que mais poderia oferecer a alguém?

— O que você acha que ainda pode fazer? — Todos têm algum valor, mas muitos não reconhecem o próprio. E quem se acha demais, no fundo, é quem não tem confiança para se menosprezar.

O homem ficou sem palavras. O que mais ele podia fazer? Naquela condição, mal conseguia garantir comida e abrigo pro filho… o que mais podia oferecer? Incapaz de encontrar uma resposta, sorriu de forma impotente e olhou de novo para a estranha diante dele:

— Como você pode ver, não posso fazer nada. Então por que me procurar? Já se divertiu bastante?

— Talvez eu esteja interessada no seu corpo? — Liyou disse isso como uma piada, depois de achar aquele homem interessante e querer provocá-lo um pouco. Ele parecia ter pouco mais de vinte anos e, apesar da profissão, sua aparência era acima da média. Para gente comum, era fácil gostar dele. Mas todos ali sabiam que Liyou estava apenas brincando.

O homem esboçou um sorriso extremamente sarcástico, mas não direcionado a Liyou — e sim a si mesmo.

— O jovem ao lado dessa senhora é cem vezes melhor do que eu. Por que fazer uma piada dessas e se humilhar à toa? — Até gente do povo considerava alguém como ele sujo. E ela, que claramente não era do povo... como poderia se interessar por ele?

— Isso é verdade. Vejo que seu filho é bem esperto. Venda-o pra mim. Peça o preço que quiser, eu pago. — Apesar de não gostar da conotação autodepreciativa nas palavras do homem, os elogios a Anhui a agradaram. Lançou-lhe um olhar de satisfação. Os olhares de ambos se cruzaram no ar e Anhui abaixou a cabeça, constrangido.

Os olhos do homem se arregalaram de repente, e os braços ao redor da criança se apertaram. Seu rosto antes calmo ficou sério:

— Embora eu seja pobre, jamais venderei meu filho. Se for esse seu pensamento, por favor, vá embora imediatamente e não perca mais tempo.

Então era isso. Agora tudo fazia sentido. Aquela mulher o procurara por causa da criança. Mas, mesmo que morresse, ele nunca a venderia! Nunca!

— Existem muitas crianças por aí, eu não preciso da sua. Mas... você deseja que seu filho tenha uma vida melhor? Comigo, ao menos ele não passaria fome. — Liyou tentou outro caminho.

O homem ficou em silêncio. A negativa estava prestes a sair de sua boca, mas não conseguiu dizê-la. Pensando em tudo o que passaram nos últimos dias, não pôde deixar de se preocupar com o futuro do filho. Ele próprio podia aguentar dias sem comer, mas a criança ainda era tão pequena… até agora, não havia outra escolha senão deixá-la sofrer com ele. Mas se alguém estivesse disposto a dar ao menino um futuro diferente... ele deveria deixar ir? Só que...

— Como posso acreditar nas suas palavras? — A pessoa à sua frente era apenas uma estranha. Como poderia entregar o filho assim, de mãos beijadas, com base apenas no que ela dizia?

— Cabe a você acreditar ou não. Não preciso fazer você acreditar. — Liyou respondeu com indiferença, uma atitude fria que frustrava.

A raiva do homem cresceu diante daquela frieza. Apertou a criança nos braços e respondeu, furioso:

— A menos que eu possa ter certeza de que meu filho terá uma boa vida, jamais o venderei!

Ao ouvir as palavras da mulher, seu coração havia balançado. Mas ele não confiaria em ninguém com tanta facilidade. Não podia apostar o futuro de seu filho. Não podia perder.

— Mil taéis. — Liyou não desistiu diante da recusa e decidiu testá-lo. Acreditava que todo mundo tinha um limite. Havia um ditado que dizia que ninguém era completamente leal — apenas o preço da traição é que era baixo. Queria ver qual era o preço daquele homem.

O homem apertou os lábios com força. Por mais serena que fosse sua expressão, não conseguiu esconder o choque no olhar. Mil taéis permitiriam que vivesse uma vida inteira sem se preocupar com comida ou roupas...

— Ouro. — Liyou pareceu achar que ainda era pouco e acrescentou a palavra “ouro” após os mil taéis. Os humanos têm desejos e sentimentos. Usam seus desejos para medir vantagens e fazer escolhas que lhes tragam mais benefícios — seja em interesses ou expectativas emocionais.

— ...Hehe, mil taéis de ouro. Nem precisa ser uma criança — em tempos de guerra, é possível comprar milhares. Seria mentira dizer que não estou tentado, mas não posso concordar. Se no seu coração meu filho vale tanto dinheiro, para mim, como pai, ele vale muito mais... — Mesmo sentindo que aquela mulher não machucaria a criança, ainda assim, não queria concordar. Havia vacilado por um instante, pensando que talvez, vendendo o menino, ele pudesse ter uma vida melhor. Mas isso era só uma possibilidade incerta. E havia outras possibilidades que ele não suportaria. Não podia apostar com o futuro do próprio filho.

— Que chato. Anhui, acho que esse sujeito é adequado para entrar no Anbu Black Ops. — Esse homem era firme e inteligente, com um senso de observação muito claro. O mais importante era que, na visão dela, ele era bastante moldável e adequado para a organização.

Ela também possuía sua própria bondade, mas essa dependia do humor. Embora a cena de hoje não tenha sido das mais agradáveis, só por ter encontrado alguém tão interessante, já havia valido a pena.

— Sim. — Anhui assentiu. Já esperava que a Imperatriz não ficasse de braços cruzados, mas também concordava que aquele homem era perfeito para os Anbu Black Ops. Esperava que o outro conseguisse recomeçar — e quanto ao menino, também era bastante promissor.

Anbu...? O homem hesitou e refletiu. Parecia ser algum tipo de organização, embora não soubesse exatamente do quê. Mas, não importava o que fizesse, se fosse algo que permitisse criar seu filho, ele estaria disposto. Já havia perdido sua dignidade há muito tempo — não se importava de perder a humanidade também, contanto que o filho sobrevivesse…

**

Capítulo 77: Indo Pessoalmente ao Campo de Batalha

O homem pegou a criança no colo e seguiu atrás de Liyou e Anhui, vestido em trapos. Não perguntou para onde iam, mas já havia decidido entregar seu destino àquelas duas pessoas. Ele também entendeu que o chamado ato de "compra" daquela mulher não passava de um teste de tentação. Não sabia o que teria acontecido se de fato tivesse aceitado. Mas sentia que aquilo já era muito bom — ao menos poderia ficar com seu filho, não importava o que o futuro lhes reservasse.

No entanto, quando tentaram sair, foram impedidos. Muitos olhos os haviam observado entrar, sem se revelarem, apenas para ver o que aconteceria. Mas não esperavam que aquelas duas pessoas tentassem levar o “brinquedo” deles embora — como poderiam aceitar isso?

— Ei, o que vocês dois estão fazendo? Por que estão levando esse homem embora? — A mulher que falou primeiro foi a mesma que havia intimidado o homem momentos atrás. Ela parecia ter certa influência por ali, com quatro ou cinco mulheres atrás dela que a tratavam como se fosse a líder. E o olhar delas para o homem carregava uma pitada de vulgaridade.

A expressão do homem mudou, mas ele não disse nada, apenas olhou para Liyou. Naquele momento, sentia que aquilo era algo que deveria ser resolvido por ela.

— Sem motivo. Só quero levar ele. E o que você pode fazer a respeito? — O tom indiferente de Liyou era bastante irritante, e o jeito como ela não levava ninguém a sério deixava a outra parte ainda mais enfurecida.

— Mas que tom arrogante! Quero ver se você tem mesmo essa capacidade toda. Vai lá, me mata então! — Como esperado, a líder do grupo perdeu a razão de tanto ódio e avançou depois de gritar.

Liyou deu dois passos para trás e Anhui se colocou à sua frente. Num piscar de olhos, a mulher que havia atacado foi chutada para longe por Anhui.

Tudo aconteceu tão rápido que os espectadores ficaram um pouco atônitos, como se não entendessem como aquela pessoa tinha sido jogada para trás com tanta facilidade.

— Ei, você... quem são vocês, afinal?! — A líder gritou, segurando o maxilar dolorido por causa do chute. Ela ficou horrorizada ao perceber que provavelmente havia provocado pessoas que não deveria. Embora parecessem andarilhos, ainda assim sabiam distinguir algumas coisas. Ao verem a impressionante habilidade marcial de Anhui, entenderam que ele definitivamente não era uma pessoa comum — era um mestre do Jianghu!

— Isso não te diz respeito. — Anhui era muito reservado diante dos outros. Se pudesse falar menos, jamais diria uma palavra a mais do que o necessário.

Aquelas mulheres, assustadas com a frieza de Anhui, recuaram alguns passos, sem coragem de continuar questionando.

Vendo que elas ficaram submissas, Anhui voltou para trás de Liyou, esperando suas ordens. Liyou olhou para as mulheres, depois se virou para o homem que permanecia em silêncio e perguntou:

— Você se lembra dessas mulheres?

O homem não entendeu o significado das palavras de Liyou, mas mesmo assim assentiu. Claro que lembrava — como poderia esquecer os rostos daqueles que o insultaram usando seu corpo como justificativa?

— Se um dia você tiver a capacidade de se vingar, elas serão apenas cordeiros esperando o abate. Vai caber a você decidir se quer matá-las ou poupá-las. — O poder da palavra “ódio” era surpreendente. Ela podia fazer uma pessoa deixar de ser quem era — e até mesmo deixar de ser humana!

— Sim. — O homem assentiu. Ele entendeu o que Liyou queria dizer. Quanto a se teria ou não a capacidade de vingança no futuro, não queria pensar nisso agora. O que mais desejava era que aquela mulher o levasse dali. Liyou levou Anhui e saiu com o homem e a criança, deixando para trás inúmeras especulações sobre o que havia acontecido.

As figuras dos três adultos e uma criança chamaram ainda mais atenção ao voltarem. Liyou franziu o cenho e falou suavemente para Anhui:

— Leve os dois de volta para o Anbu por aqui. Eu vou andar um pouco mais sozinha.

Anhui hesitou por um momento, claramente preocupado com a segurança da Imperatriz. Mas, ao ver a expressão de desagrado dela, assentiu imediatamente e disse:

— Entendido!

Anhui saiu com o pai e o filho, e Liyou continuou a caminhar sozinha pelas ruas. As guarnições em meio ao caos da guerra tinham um toque de frieza. Geralmente, guerras não aconteciam no inverno, mas esta guerra havia estourado de forma tão urgente que acabara coincidindo com a estação. As telhas quebradas e a atmosfera ressecada tingiam essa guerra com um véu acinzentado. O cheiro de sangue tornava-se ainda mais melancólico e, naquele momento, uma trombeta soou fora da cidade — a batalha havia começado novamente…

Liyou sentia que tudo aquilo podia ser considerado um mero jogo, e que a guerra também não era diferente. No entanto, desde os comentários de Feng Xue da última vez, ela havia começado a nutrir certa curiosidade sobre a guerra. Muitos anos atrás, ela estivera sobre uma colina observando dois exércitos se confrontarem, o sangue correndo como rios. Na época, ela apenas se perguntava por que seres tão pequenos davam suas vidas por coisas tão insignificantes. Agora, parecia começar a entender — tanto ela quanto os humanos tinham desejos e existências que queriam proteger. Por isso havia batalhas, e em casos graves, guerras. Vidas incontáveis desapareciam. Ela não podia mais tratar tudo aquilo como um jogo. Essas pessoas tinham pensamentos e sentimentos e não deveriam perecer por algo tão banal quanto um jogo!

Contudo, a guerra era inevitável. Embora o Império Qianhe fosse um vasto império, rico em recursos naturais, enfrentava problemas internos e externos, e estava enfraquecido há muito tempo. Se a raiz do problema não fosse tratada, o colapso do Império Qianhe seria apenas uma questão de tempo. Mas isso era o passado. Agora que ela era a Imperatriz, jamais permitiria que o império ruísse. Desde lidar com Situ Changqin, até mudar os ministros e travar essa guerra, ela já havia feito muitas coisas por conta própria que poderiam mudar o curso da história de Qianhe. E tais ações transformariam Qianhe de dentro para fora. O império teria que lutar para se tornar mais forte e renascer nas chamas da guerra. Só que essa transformação exigia o sacrifício de muitas pessoas. Antes, ela aceitava esse fato com naturalidade. Para conquistar algo, era preciso abrir mão de algo. Mas agora, ao olhar para essas pessoas diretamente afetadas pela guerra, com vidas cheias de sofrimento, lutando apenas por comida e roupa, percebia que não havia nada mais trágico. As pessoas deixavam de parecer humanas, perdiam seus valores, sua dignidade — então qual valor restava em sua existência?

Embora Liyou não tenha feito nada com as mulheres que haviam maltratado o homem no campo de refugiados e nem tenha dito uma palavra, ela guardou profundamente aquela cena em seu coração. As pessoas se aproveitavam da virtude dos outros, e os malfeitores não recebiam punição alguma. Não apenas nesses tempos turbulentos — mesmo em tempos de paz, tais acontecimentos não diminuíam. O mundo sempre fora assim, e o mundo de onde ela viera também. Situações como essa jamais poderiam ser completamente erradicadas. Essa era a realidade...

Contudo, mesmo que não pudesse ser totalmente eliminada, dentro dessa regressão havia tanto o preto quanto o branco. Ela acreditava que, aos olhos do mundo, não era uma boa pessoa — mas tinha seus próprios princípios. Nessa guerra, faria de tudo para minimizar as baixas.

Depois de tomar sua decisão, não hesitou mais. A figura de Liyou desapareceu e, num piscar de olhos, ela apareceu sobre a muralha da cidade. Jiang Hanyang estava comandando os soldados para preparar a defesa da cidade, e Feng Xue estava ao seu lado. Ao ver Liyou surgir, ele veio até ela imediatamente.

— Mestra, o Império Sang começou a cercar a cidade. — O rosto de Feng Xue estava sério, e seus olhos prateados carregavam profunda preocupação.

— En. Você entregou a pessoa para Jiang Hanyang? — perguntou Liyou de repente, obviamente se referindo a Sang Ziyan.

— Sim.

— O que Jiang Hanyang fez?

— ...O general apenas colocou Sang Ziyan em prisão domiciliar. Fora a falta de liberdade, o tratamento tem sido muito bom. — Feng Xue relatou que Jiang Hanyang ficou realmente surpreso quando recebeu a pessoa. Depois de pensar por um bom tempo, ordenou que levassem Sang Ziyan e pediu com muito cuidado que seus subordinados o tratassem com respeito.

Liyou assentiu, aprovando a atitude de Jiang Hanyang. Parecia que ele também era um talento e bastante mente aberta para os padrões de sua vida.

— Este subordinado saúda a Imperatriz. Imperatriz, o Império Sang está sitiando a cidade. Aqui é muito perigoso, peço que a Imperatriz recue para a retaguarda! — Assim que soube da chegada da Imperatriz, Jiang Hanyang correu até lá. A segurança da Imperatriz era uma questão de estabilidade nacional — nenhum erro podia ser cometido.

— Está tudo bem, não se preocupe. Zhen está aqui apenas para assistir à batalha. Espero que, sem Sang Ziyan, o exército do Império Sang não seja mais páreo para você.

— Sim, este subordinado não decepcionará a Imperatriz, mas aqui é realmente muito perigoso... — Jiang Hanyang prometeu com firmeza ao ouvir as palavras da Imperatriz. Sem Sang Ziyan no comando, ele estava confiante na vitória! Só que a segurança da Imperatriz não podia ser ignorada — mas, se ela insistia em permanecer, o que se poderia fazer?

Liyou ergueu a mão, interrompendo as tentativas de Jiang Hanyang de dissuadi-la. Não apenas não recuou, como ainda foi até a beirada mais externa da muralha. De onde estava, podia ver claramente o exército do Império Sang se preparando para atacar, e aquela enorme bandeira com o brasão do Sang tremulando acima das tropas. Ela veria a queda daquela bandeira — e a destruição do Império Sang!

No mundo, não existia união ou divisão permanente. Ela não desejava dominar, mas proporcionar ao mundo uma paz temporária. Ao menos, não haveria mais guerras irritantes. Por isso, a palavra “unificação” surgiu em sua mente — uma ideia que poderia mudar o mundo inteiro!

A trombeta soou novamente, e o exército do Império Sang avançou em direção ao Passe Yuling, que já estava parcialmente destruído, mas ainda resistia. O exército do Império Qianhe também iniciou seu contra-ataque. Os soldados nas muralhas começaram a lançar flechas e pedras com catapultas — e assim, a cruel batalha de cerco da era das armas frias começou. Essa cena se desenrolava diante dos olhos de Qianhe Liyou.

Um quarto de hora depois, centenas de corpos já estavam empilhados do lado de fora da muralha do Passe Yuling. Embora o sangue ainda não tivesse formado um rio, já tingia o chão de vermelho. Suas emoções ficaram ligeiramente instáveis com a visão chocante do sangue. Nesse momento, após arrumar o homem e o menino, Anhui chegou correndo. Ele apressou o passo assim que ouviu o som da trombeta de convocação, imaginando que a Imperatriz teria ido até a muralha. E, de fato, encontrou-a.

— Imperatriz, o que deseja fazer? — Anhui sempre sentia que a expressão da Imperatriz parecia um pouco diferente, não tão indiferente como de costume.

— Que tal voar lá pra baixo? — disse Liyou num tom tão casual que deixou todos ao seu redor apavorados. Jiang Hanyang olhou para Liyou como se estivesse vendo uma louca...

***

Capítulo 78: Choque

Se a outra parte não fosse a Imperatriz, Jiang Hanyang certamente teria tomado essa frase como uma piada. Caso contrário, acharia que a outra era uma lunática e perguntaria: quem ousaria pular de um muro da cidade tão alto em meio a dezenas de milhares de tropas inimigas lá embaixo? Queriam morrer de verdade?

Mas Jiang Hanyang não podia dizer nada, e também não era adequado comentar sobre isso. Poderia dizer as palavras: “— Vossa Majestade, por favor, priorize sua segurança.” Mas, essas palavras serviam para persuadir pessoas comuns, não algo que se dizia para alguém que ela achava inconcebível... por isso, Jiang Hanyang permaneceu em silêncio.

Anhui podia ser considerado alguém que conhecia bem a Imperatriz — ao menos ele achava que sim —, por isso sabia que ela definitivamente não estava brincando. Era realmente algo que a Imperatriz havia considerado, mas, por ser uma ideia tão insana, ao ouvi-la, ele sentiu que era completamente inapropriada. Mesmo que a Imperatriz não fosse uma pessoa comum, os mais de 100 mil soldados abaixo dos muros não eram pouca coisa. Cada um cuspindo já criaria um mar capaz de afogar qualquer um. Se a Imperatriz realmente pulasse dali...

— Por que estão calados? Essa sugestão não é boa? — Ela olhou novamente para Anhui e Jiang Hanyang. A expressão de ambos não parecia boa. Será que discordavam de sua proposta?

Nesse momento, uma enorme pedra voou repentinamente em direção à cidade. Era uma catapulta inimiga, lançada de propósito ao avistarem o estandarte militar de Jiang Hanyang. Os soldados se dispersaram rapidamente, e os guardas responsáveis por proteger Jiang Hanyang correram para defendê-la, assim como os soldados suicidas que protegiam Liyou. Todos entraram em pânico por causa da situação da Imperatriz e de Jiang Hanyang...

— Não entrem em desordem! — Liyou rugiu. Com um movimento de sua manga esquerda, raios negros cintilaram e, de forma surpreendente, a enorme pedra foi desviada como por magia, traçando seu caminho de volta e esmagando a catapulta de onde havia vindo!

Todos olharam para a Imperatriz com espanto — aquilo era verdadeiramente estranho demais.

Após confirmar a segurança de todos, Liyou lançou seu olhar para fora das muralhas. A catapulta atingida pela pedra não podia mais ser usada, e os soldados responsáveis por ela — exceto os que haviam sido feridos — começaram a recuar, preparando-se para o próximo ataque.

Um brilho sedento por sangue surgiu nos olhos de Liyou, e logo se viu sua figura flutuar no ar estagnado — mesmo sem vento. A subida inicial foi extremamente lenta, e todos prenderam a respiração para assistir àquela cena ainda mais bizarra do que a anterior. Mas então Liyou voou, avançando do alto das muralhas para o meio do campo de batalha com a velocidade de uma flecha, e seu pouso foi algo jamais visto naquela era — como uma bomba!

Quando Liyou aterrissou, seu corpo estava envolto em poder mágico, e esse poder, ao encontrar qualquer obstáculo, explodia. Por conta dessas explosões, centenas de pessoas nas proximidades viraram cadáveres.

Houve um momento de silêncio no campo de batalha. Afinal, ninguém jamais havia visto uma arma tão destrutiva. Somente aqueles sobre os muros sabiam que a origem da explosão era sua Imperatriz. Para todos os demais, o choque reinava. Ambos os exércitos encaravam a origem da explosão atônitos — apenas resquícios de fumaça e uma névoa sangrenta giravam ao redor. Por um tempo, não conseguiam ver claramente a figura de Liyou ali, de pé — ou talvez flutuando — naquele local.

Um alvoroço tomou o campo de batalha. As tropas do Império Sang interromperam o ataque e se reagruparam com cautela. Mas seus olhos não estavam voltados para a fumaça, e sim fixos no topo das muralhas. Acreditavam que aquilo era uma nova arma de guerra desenvolvida pela Dinastia Qianhe, e que logo atacaria novamente...

No lado da Dinastia Qianhe, Anhui foi o primeiro a reagir. Para alguém com sua habilidade em artes marciais, pular das muralhas não era difícil, desde que usasse alguma força externa... Ele retirou as adagas das mangas e, antes que Jiang Hanyang pudesse detê-lo, já havia saltado. Ainda havia soldados do Império Sang por onde passava, mas ele os derrotava com facilidade. Então usou sua força para descer em segurança — e, inevitavelmente, se viu frente a frente com os soldados do Império Sang!

A reação dos soldados do Império Sang foi curiosa. Uma deles ficou atônita por um instante, como se não pudesse acreditar que alguém de fora tivesse saltado voluntariamente das muralhas. Embora não fosse incomum que pessoas caíssem durante cercos, esse homem havia pulado por vontade própria...

No entanto, passado o choque inicial, sua reação como soldado não foi lenta. Ela imediatamente brandiu a espada e a lançou em direção às costas de Anhui.

Embora estivesse cercada pela fumaça, Liyou conseguia ver cada movimento de Anhui com clareza. Ao vê-lo saltar das muralhas de forma imprudente, um brilho dourado e deslumbrante surgiu em seus olhos!

Anhui não deu chance a ninguém de feri-lo. Mesmo cercado por espadas, sua dança com a lâmina tirou dezenas de vidas e ele correu até onde estava Liyou.

Havia ali a pessoa que mais lhe era cara.

A fumaça se dissipou, e os soldados vigilantes ao redor se surpreenderam ao ver a figura de Liyou. Não esperavam encontrar alguém ali, mas Liyou apenas observava Anhui em silêncio e esperava, ignorando completamente o restante ao seu redor.

Naquele instante, seus olhos enxergavam apenas uma silhueta: Anhui, abrindo caminho por entre todos os obstáculos, correndo até ela!

Os soldados do Império Sang finalmente reagiram. Começaram a cercar Anhui e também a sondar Liyou. Embora a explosão tivesse assustado a todos, ao descobrirem que apenas duas pessoas haviam aparecido em meio a seus milhares de soldados, o pânico foi substituído pelo desprezo. Mesmo que fossem extremamente poderosos, ainda eram apenas dois. Será que podiam realmente enfrentar dezenas de milhares?

Liyou nunca pensou se podia ou não — ela simplesmente eliminava silenciosamente todos que a atacavam, até que segurou a mão de Anhui quando ele chegou, oferecendo-lhe um belo sorriso.

A leveza de Anhui era extraordinária — ele havia chegado sem sofrer danos, e com sua coragem, mesmo diante de milhares, não mostrava temor. Cada golpe seu era calmo e preciso. Mas, ao finalmente parar diante de Liyou e ver aquele sorriso que fazia o mundo perder sua cor, sua calma se desfez e sua frieza desapareceu. Ele até esqueceu que estavam em um campo de batalha, cercados por inimigos. Apenas olhava para Liyou, incrédulo, e aquele sorriso o fazia esquecer de tudo!

Os soldados do Império Sang atacaram novamente, e Liyou, com um movimento de mangas, voou para frente.

— Idiota, por que está parado? — Liyou, percebendo o estado atônito de Anhui, perguntou com leve dúvida.

— Imperatriz... a senhora sorriu... — Ao ouvir a pergunta, Anhui respondeu por impulso, mas, logo após falar, sentiu que havia dito algo estranho. A Imperatriz, é claro, já havia sorrido antes, mas seus sorrisos sempre carregavam malícia, nunca como aquele sorriso agora.

— Tolo, nunca sorri antes? — Liyou respondeu com certa frustração. Sobre seu próprio sorriso, ela não tinha muita consciência. No passado, sorria raramente, mas agora, ocasionalmente, sorria quando estava de bom humor. Havia algo de errado nisso?

— Claro que sim, mas esse foi diferente... — Anhui sentiu o perigo se aproximar enquanto falava, e mais um soldado do Império Sang avançou. Anhui posicionou-se diante de Liyou e brandiu sua espada, mas não foi mais rápido do que ela. Com um leve aceno de mangas, Liyou lançou todos os inimigos ao redor para longe. Em seguida, pegou a mão de Anhui na sua e, do nada, alçou voo, indo em direção ao estandarte militar do Império Sang com uma velocidade invisível a olhos nus!

Para capturar o inimigo, capture o rei primeiro. Por que perder tempo com soldados? Isso era o que ela havia decidido no momento em que desceu.

Os soldados do Império Sang gritaram para proteger o general, mas os movimentos de Liyou eram rápidos demais. Quando gritaram, já era tarde demais — e logo perceberam que o general havia desaparecido!

— O general... sumiu! — Soldados do Império Sang começaram a gritar em pânico, atordoados. A notícia se espalhou rapidamente de centenas para milhares, e logo todo o exército sabia que seu general havia sido levado!

Foram esmagados em um instante. A captura de um general de guerra era um evento grandioso — especialmente após o desaparecimento do estrategista militar deles. Agora que também haviam perdido o general, a vontade de lutar se dissipou. Começaram a recuar em desespero.

— Aqui, estou te entregando esta pessoa. Esta batalha tem que ser vencida! — Liyou já havia retornado às muralhas num piscar de olhos, e então jogou, inconsciente, a mulher aterrorizada diante de Jiang Hanyang. Quem disse que era necessário vencer guerras ao custo de incontáveis vidas? Se voltassem a provocá-la, ela voaria até a Cidade Imperial do Império Sang, subjugaria a Imperatriz de lá e veria se eles não se renderiam de uma vez!

Um pensamento sombrio surgiu no coração de Liyou. Ela não gostava muito de guerras — será que existia um jeito de fazer esse conflito acabar mais cedo?

Jiang Hanyang se sentia entorpecida. Ontem, ao saber que a Imperatriz viria, achou que nada demais aconteceria. Mas agora, um evento se seguia ao outro. Primeiro, uma ordem no meio da noite, dizendo que os homens da Imperatriz haviam capturado alguém e queriam interrogá-lo por uma noite. Ela não ousou perguntar, pensando que era assunto da Imperatriz e que o melhor era não se meter. No dia seguinte, a Imperatriz enviou a pessoa — e, ao perguntar, descobriu que era o estrategista militar do Império Sang, a pessoa que ela mais admirava. Mas ele havia sido torturado miseravelmente e foi entregue diretamente a ela pela Imperatriz, então não ousou fazer nada. Apenas um dia depois, a Imperatriz saltou do muro que ela mesma defendia contra o exército inimigo e capturou o general inimigo sob os olhos de milhares. Ela precisava perguntar: existia algo que a Imperatriz não podia fazer?

Mas aquele não era o momento para devaneios!

— Saiam da cidade, persigam! — Jiang Hanyang deu a ordem, e os soldados suicidas, preparados há muito tempo, abriram imediatamente os portões. O exército recuante do Império Sang foi rapidamente alcançado pelas tropas da Qianhe. Assim, iniciou-se uma carnificina impiedosa, e o ânimo vitorioso do Império Sang desabou, levando-os pelo caminho da destruição.

Quanto à batalha que se seguiu, Liyou não interveio — apenas ficou em silêncio sobre os muros, observando as massas se enfrentarem abaixo.

— Por que você pulou? — Liyou olhava para o campo de batalha à frente e perguntou a Anhui, que estava ao seu lado.

Depois de hesitar um pouco, ele mesmo não sabia direito o motivo — apenas havia seguido seu impulso.

— A senhora não disse que seus subordinados deviam ficar aqui.

Portanto, ele não havia desobedecido, e não achava que estivesse errado.

— Não estou dizendo que você errou, só queria saber o porquê de ter pulado.

— ...porque você estava lá embaixo. — Ao refletir, Anhui percebeu que essa era a única resposta verdadeira. Porque, lá embaixo, estava a pessoa que ele mais prezava — é claro que ele pularia!

Lealdade firme, mesmo em vida ou morte — essas oito palavras surgiram na mente de Liyou. Um sorriso caloroso se formou em seus lábios enquanto seus olhos permaneciam no campo de batalha, mas sua mão segurava a de quem estava ao seu lado, ambos sentindo o calor um do outro.


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