Capítulo 82: Tão Indiferente Como Sempre
— Se remover essa cicatriz vai te fazer feliz, zhen pode fazê-la desaparecer. Mas, o que você realmente se importa… é com a cicatriz? — Ao ver os movimentos de Anhui, Liyou conseguiu discernir o que ele estava pensando.
Anhui levantou a cabeça, e havia um traço de hesitação em sua expressão. Claro que o que ele realmente se importava não era apenas a cicatriz, mas sim o medo de não conseguir apresentar uma versão perfeita de si mesmo para a Imperatriz. Mesmo que fosse dez vezes mais bonito do que era agora, ele não conseguiria se livrar dessa hesitação. Porque ele se importava demais — e sempre sentiria que não era digno.
— Anhui é assim mesmo. Anhui não quer mudar. Está frio lá fora, Imperatriz, Anhui vai cuidar de você no banho…
O questionamento da Imperatriz o fez perceber que ela sempre o observava e parecia saber de sua insegurança. Isso era o suficiente. Além disso, a Imperatriz não o havia escolhido apenas por sua aparência… Só que, ao pensar nisso, Anhui de repente teve outra dúvida: o que exatamente a Imperatriz via nele?
Liyou entrou na fonte termal, e a temperatura ligeiramente alta da água a deixou um pouco desconfortável. Sua temperatura corporal base era baixa, e ela não gostava muito de águas termais. Se não fosse por Anhui e Feng Xue, ela nem teria posto os pés ali.
Liyou se recostou na borda da piscina e relaxou as emoções tensas depois de se acostumar com a temperatura. Embora não estivesse fisicamente cansada, sentia uma fadiga mental. Ela não gostava de viver uma vida estressante. Estava mais acostumada com a tranquilidade e preferia um ritmo mais calmo.
Anhui e Feng Xue se reclinaram ao lado de Liyou, massageando seus braços e ombros para que ela se sentisse mais confortável. Mas… Liyou começou a se sentir inquieta, porque a respiração dos dois estava próxima demais! Ela estava com fome!
Liyou abriu os olhos, seu olhar vagando entre os dois enquanto pensava qual deles provaria primeiro. No fim, depois de muito considerar, sentiu que Feng Xue tinha mais resistência física. Afinal, Anhui era uma pessoa comum. Ele tinha corrido sem parar por alguns dias e, se perdesse sangue agora, era bem possível que desmaiasse.
— Feng Xue, aguente firme. — A mão de Liyou pousou sobre o ombro de Feng Xue e ela o puxou com um pouco de força. Então, inclinou a cabeça e mordeu o pescoço dele. Em seu rastro, ficaram as marcas de suas presas — marcas que nunca desapareceriam e pertenciam unicamente a ela.
O sangue doce e levemente ácido escorreu, despertando o apetite insaciável de Liyou e, como o alvo era Feng Xue, não havia necessidade de reprimir seus desejos. Ela simplesmente desfrutou da refeição deliciosa ao máximo.
Nesse momento, um grande alvoroço irrompeu do lado de fora da fonte termal. Os gritos de “A Rainha Mãe chegou!” deixaram todos presentes em choque. Anhui e Feng Xue olharam para Liyou, que ainda estava se alimentando, perdidos e sem saber o que fazer. Queriam se levantar e cumprimentar, mas como um estava sendo mordido por Liyou e o outro estava sendo segurado, nenhum dos dois podia se mover.
Durante essa hesitação, Luo Yu já havia entrado na fonte com passos apressados — e ficou paralisado no local. Embora soubesse que Liyou estava tomando banho, jamais imaginou que presenciaria tal cena.
Quando Liyou se sentiu saciada, soltou Feng Xue, lambeu o sangue no canto dos lábios e olhou para Luo Yu com um olhar malicioso, perguntando:
— Pai Imperial, veio procurar este humilde súdito?
Luo Yu ainda não tinha recobrado totalmente os sentidos e revivia a cena de Liyou abraçando os dois homens à sua esquerda e direita. Ao ouvir o “Pai Imperial” de Liyou, sentiu como se todo o seu corpo tivesse congelado. Liyou já o havia chamado assim antes, e ele não achava estranho. Mais tarde, quando ela deixou de chamá-lo dessa forma, também não viu problema. Mas agora… esse “Pai Imperial” parecia deixá-lo em transe e gelado por dentro. Mas por quê?
— Pai Imperial, tem algo a dizer? — Desde aquela noite, ter feito uma pessoa tão fria ficar tão inquieta… era culpa dela. Além disso, ao seu lado, ela tinha Feng Xue, Anhui, Luo Weiqing e inúmeros outros no harém. Por que mais alguém deveria se sentir infeliz por causa dela? E mais: ela não estava disposta a se irritar por causa dos outros.
Liyou olhou para Luo Yu de forma diferente — reservada e distante, sem um traço do calor e possessividade de antes.
Luo Yu também percebeu que Liyou o olhava diferente. Aquele olhar o fez se sentir ainda mais frio, e ao abrir a boca, não conseguiu dizer nada.
— Se não tem nada a dizer, por favor, se retire. Como pode ver, este não é um lugar apropriado para conversas. — Liyou olhou para Anhui e Feng Xue. Os dois ficaram um pouco envergonhados com a aparição repentina de Luo Yu. Seus corpos recuaram para dentro da água, com as cabeças abaixadas para diminuir sua presença. Embora estivessem um pouco constrangidos, pareciam bastante adoráveis.
Quando Liyou olhou para eles, havia uma ternura natural em seus olhos. Ela estendeu a mão e acariciou os longos cabelos prateados de Feng Xue e, ao ver o sangue em seu pescoço, usou o dedo para limpá-lo com delicadeza — incrivelmente gentil.
Luo Yu observou o gesto de Liyou e seus olhos se encheram de tristeza, mas ele não deixou transparecer. Apenas tentou restaurar sua expressão neutra e reprimiu o desconforto em seu coração, respondendo com uma voz rouca e estranha até para si mesmo:
— Já que a Imperatriz retornou, descanse bem. Como seu pai, não a incomodarei mais.
Depois de falar, Luo Yu se virou e saiu, com um andar apressado como se estivesse fugindo de algo. Liyou o observou até que ele desaparecesse de vista, e então lentamente desviou o olhar.
— Dói? — Liyou perguntou suavemente enquanto suas mãos pairavam sobre as marcas das presas no pescoço de Feng Xue.
Feng Xue balançou a cabeça, um pouco assustado. Sentia que essa mestra parecia um pouco diferente — como se estivesse se contendo.
Vendo a reação fofa de Feng Xue, Liyou sorriu. A malícia anterior desapareceu e, em seu lugar, surgiu uma ternura solitária. Ela sussurrou:
— Vamos continuar.
Dessa vez, nem Anhui nem Feng Xue ousaram dizer mais nada. Anhui massageou levemente os ombros de Liyou e então descansou a cabeça ali.
— Não importa o que você seja, ou qual decisão tome, eu sempre estarei ao seu lado. Por favor, não fique… — Anhui queria dizer “não fique triste”, mas ao ver o semblante calmo da Imperatriz, achou melhor não. De repente, percebeu o quão desajeitado era — nem sabia como consolar alguém. Ele conseguia sentir claramente que a Imperatriz não estava feliz, mas não conseguia encontrar palavras adequadas.
— Anhui, você realmente não serve para consolar as pessoas. Mas estou bem. — Liyou virou o rosto e deu um beijo leve na testa de Anhui. Então, olhou diretamente nos olhos dele e disse com seriedade:
— Anhui, eu quero me casar com você!
Talvez ela não tivesse pensado direito no que acabara de dizer, apenas deixou escapar sem pensar. Mas, depois de dizer, não sentiu o menor arrependimento. Anhui já era dela — e ela queria lhe dar um título. Caso contrário, sentiria que o estava negligenciando. E Anhui era digno do seu carinho e cuidado.
— E-eu… — Anhui gaguejou. Aquela declaração foi tão repentina que ele nem sabia como reagir.
— Hehe, Anhui, você ficou bobo de novo. — Liyou sorriu, cheia de ternura.
Feng Xue ficou um pouco decepcionado e com inveja, mas naquele momento, Liyou sussurrou algo em seu ouvido, fazendo seus olhos se arregalarem e uma expressão surpresa surgir em seu rosto.
Liyou havia dito:
— Não fique triste. Eu já vi seu corpo. Você acha que vou permitir que ele pertença a outra pessoa?
Como essa pequena raposa poderia não entender? Desde que ela o chamara para servi-la e tomar banho juntos hoje, já havia aceitado sua existência. Não havia motivo para sentir tristeza ou solidão pelo fato de ela tratar bem Anhui. Ao ver isso, Liyou só teve mais vontade de provocá-lo.
Os olhos prateados de Feng Xue brilharam como uma joia preciosa. Ele sabia que não tinha ouvido errado — e que não era um sonho. Ele esperava por esse dia há muito tempo.
Quando os três terminaram o banho e trocaram de roupa, já passava do meio-dia. Liyou levou Anhui e Feng Xue de volta aos seus aposentos. Depois de ver Anhui almoçar, mandou os dois descansarem. Ambos tinham sofrido bastante e precisavam de tempo para se acalmar — então, foram dispensados e partiram.
Depois de se alimentar com o sangue espiritualmente potente de Feng Xue, Liyou se sentiu sonolenta. Pensando que não via Luo Weiqing há muitos dias, levou Feng Ying até o Palácio Fengqing.
Luo Weiqing já sabia que a Imperatriz havia retornado ao Palácio Imperial, mas não ousava encontrá-la sem um chamado. Estava cheio de saudade enquanto olhava pela janela. Mas, não esperava realmente ver a silhueta da Imperatriz se aproximando.
— Esta consorte saúda a Imperatriz! Vida longa à Imperatriz, vida longa! — A voz de Luo Weiqing estava cheia de emoção e ele quase correu até Liyou. Seus olhos estavam repletos da pessoa por quem ansiava tanto. Se não fossem pelas regras de etiqueta, ele teria corrido para abraçá-la e dito o quanto sentia sua falta.
— Weiqing, sentiu falta de zhen? — Liyou segurou a mão dele e se sentou ao seu lado, perguntando num tom divertido.
— Muita. Muita mesmo. — Sentia tanto que nem conseguia comer ou dormir — só conseguia pensar nela!
— Hehe, que ótimo. Então, aqui está sua recompensa. — Liyou sorriu levemente diante da sinceridade de Luo Weiqing e o puxou para um beijo profundo, intenso e apaixonado. Não deixou nenhum canto dos lábios de Luo Weiqing sem explorar, saboreando tudo com voracidade, fazendo-o até perder o fôlego.
— Zhen está com sono. Vamos dormir juntos. — Embora não parecesse muito apropriado puxar alguém para a cama assim que se reencontravam, Liyou não se importava. Puxou Luo Weiqing pela mão até a cama e dispensou todos os servos com um aceno.
O rosto de Luo Weiqing ficou muito vermelho e ele perguntou timidamente:
— Sua Majestade, a senhora já almoçou? Fazer esse tipo de coisa durante o dia…
Claro que ele não recusaria de verdade, mas ainda assim estava muito envergonhado.
— O que você está pensando? É só uma soneca. Se quiser, zhen pode te dar o que deseja quando acordar… — Liyou lançou um olhar provocativo para o rosto corado de Luo Weiqing e o puxou para a cama. Enlaçou a cintura dele com um braço e fechou os olhos suavemente.
Ela estava realmente com sono — e o resto poderia esperar até depois de acordar.
Luo Weiqing corou intensamente por ter entendido tudo errado. Estava envergonhado, com o coração batendo descompassado. Mas, vendo a expressão serena da Imperatriz, como poderia apenas dormir depois do que ela dissera? Ainda assim, não ousou se mover muito, temendo atrapalhar seu descanso. Apenas ficou ali, observando em silêncio o rosto adormecido da Imperatriz.
A pessoa por quem ansiava estava bem ali, e ele precisava aproveitar a oportunidade para olhar o quanto quisesse.
Capítulo 83: Temperamento Doce, Sentimentos Delicados
Luo Weiqing despertou com um beijo. Tinha adormecido sem perceber ao contemplar o rosto adormecido da Imperatriz. Quando finalmente achou difícil respirar, abriu os olhos de repente, apenas para se deparar com um par de olhos profundos e sorridentes.
— Majestade! — chamou Luo Weiqing timidamente, com afeto transbordando no tom.
— Weiqing, esses últimos dias foram difíceis para você. — Ela estivera longe do Palácio Imperial por muito tempo, e tudo no harém provavelmente havia sido administrado por Weiqing.
Luo Weiqing balançou a cabeça. Não sentia que tivesse sido difícil. Sem a Imperatriz no harém, parecia que o lugar inteiro estava sem espírito. Os que costumavam rir ficaram calados, e todos apenas seguiam com seus próprios afazeres, esperando silenciosamente por algo.
— Não foi difícil. É só que todos estão esperando seu retorno. — Ele não era o único que ansiava pelo retorno da Imperatriz. — Imperatriz, este consorte tem um pedido um tanto indelicado, não sabe se pode dizê-lo ou não...
— Diga o que quiser dizer.
— A Majestade está fora do palácio há muitos dias, e meus irmãos nos diversos palácios sentem muito sua falta. Podemos organizar um banquete para todos esta noite, para que possam vê-la? Assim, se sentirão mais tranquilos. — Como Consorte Real, ele precisava considerar as coisas do ponto de vista da monarca, não apenas como marido. Comparado aos outros concubinos do harém, já se sentia extremamente satisfeito. Afinal, a Imperatriz estava com ele agora — e isso era mais do que suficiente.
Após refletir, Liyou consentiu e disse:
— Pode organizar. Realize-o em seu palácio.
— Quanto à Rainha Mãe, este consorte deve também enviar um convite? — A relação entre a Imperatriz e a Rainha Mãe havia se tornado um dos assuntos tabus do palácio. Quase ninguém ousava mencionar sequer uma palavra. Porém, para um evento de confraternização no harém, não convidar a Rainha Mãe pareceria um pouco desrespeitoso. Mas convidá-la exigia a aprovação da pessoa diante dele.
— Não precisa. Zhen se reunirá com os concubinos do harém, não há necessidade de convidar a Rainha Mãe. — Liyou hesitou antes de responder. Já havia visto Luo Yu naquele dia — e isso era suficiente.
— Entendido. — Luo Weiqing não ousou dizer mais nada e respondeu que precisava se levantar para preparar o jantar. Mas ainda estava sendo mantido no lugar por Liyou.
— Majestade, não vai se levantar? — Faltava menos de uma hora para o jantar. Precisava começar a preparar imediatamente, ou seria tarde demais.
— Me beije e Zhen deixará você se levantar. — Liyou riu e continuou pressionando Luo Weiqing.
Luo Weiqing piscou. Por que parecia que a Imperatriz estava diferente desde que retornara? Nunca a tinha visto agir de maneira tão travessa antes, e isso o deixava um pouco atordoado.
Vendo Luo Weiqing distraído, Liyou estendeu a mão, insatisfeita, e deu um leve soco na bochecha dele:
— Não fique aí parado.
— Majestade, está provocando este consorte... — Luo Weiqing levou a mão até o local onde fora beliscado e, em seguida, segurou a mão de Liyou e depositou nela um beijo suave.
— Está bom assim, Majestade? — A Imperatriz havia pedido um beijo, mas não especificara onde. Seria aceitável fazê-lo assim...? Luo Weiqing sorriu secretamente por dentro — e aquele sorriso se espalhou até seus olhos.
Luo Weiqing já era bonito e gentil por natureza, mas aquele sorriso tornava toda sua presença ainda mais suave. Liyou não conseguiu se conter e o puxou para um beijo ardente. Aquele sorriso, exibido só para ela, era simplesmente tentador demais. Ela não sabia que, mesmo que criaturas da escuridão tivessem aversão à luz, havia nelas um anseio irresistível por ela também.
— Vá se preparar, e volte para acompanhar Zhen quando estiver pronto. — Liyou se levantou de cima de Luo Weiqing. Se não o deixasse ir agora, talvez não o deixasse mais. Aquele sorriso lhe dava uma vontade absurda de possuí-lo!
— Sim, este consorte irá agora mesmo.
Luo Weiqing ordenou que os atendentes do palácio fossem aos diversos palácios para avisar que a Imperatriz convidava todos os concubinos para jantarem no palácio real. Os notificados foram: a guifei Ning, Qin Ning; a guifei An, Murong Xianhe; a Consorte Nobre Yun, Yun Tailing; a Consorte Nobre Li, Li Qujun; e a Consorte Nobre Luo, Luo Xingchen. Todos esses tinham recebido títulos legítimos conferidos pela Imperatriz.
Além disso, Luo Weiqing enviou convites para Feng Xue, Anhui e Sang Zixin. Embora os três não tivessem títulos, na concepção de Luo Weiqing, já eram claramente homens da Imperatriz. Portanto, para esse tipo de ocasião, eram mais do que elegíveis para participar.
Se alguém ficou de fora, foi a Envolvente guifei, Situ Hongyu, que ainda estava no Palácio Frio. Em relação a essa pessoa, Luo Weiqing hesitou por um bom tempo, mas decidiu não enviar convite. Embora o Palácio Frio não fosse um local proibido, ainda era o Palácio Frio. Uma consorte banida para lá era equivalente a ter sido "divorciada" — e convidar tal pessoa não era apropriado para a ocasião.
Na véspera do jantar, todos os consortes e concubinos chegaram, um após o outro. Esses consortes não tinham laços profundos entre si, e todos vieram acompanhados por seus atendentes. O mais curioso era que todos se encontraram na entrada e, após acenos breves, entraram juntos no Palácio Fengqing. Se havia alguém com quem os outros eram mais familiarizados, esse alguém era o mais jovem, a guifei An, Murong Xuanhe. Ele foi o primeiro a chegar e, ao ver a Imperatriz, abriu um largo sorriso.
— Este consorte saúda a Imperatriz e o Consorte Real. Saudações à Imperatriz e ao Consorte Real. Já faz muitos dias que este consorte não via a Imperatriz e tem sentido muito sua falta. Espero que esteja tudo bem com Vossa Majestade? — As palavras de Murong Xuanhe estavam carregadas de preocupação genuína, e seus olhos vagavam por Liyou como se quisesse confirmar que ela realmente estava bem.
Sentia muita falta da Imperatriz. Sentia falta do tom gentil com que ela o ninava para dormir, das suas palmadas desajeitadas nas costas, do som da respiração dela... até da sua sombra.
Se pudesse, desejaria crescer logo, tornar-se um homem de verdade aos olhos dela — e não uma criança ainda imatura, mesmo sabendo, no fundo, que já havia amadurecido.
— Venha, acompanhe Zhen para ver a pintura. — Quando Murong Xuanhe chegou, Liyou estava em pé, admirando uma pintura de Luo Weiqing. Na imagem, havia a silhueta de uma figura de costas, debaixo de uma árvore, olhando para o horizonte. Aquele olhar distante parecia esperar por algo, e a figura lembrava muito Luo Weiqing. Pintar tal cena não era difícil, mas muitos artistas não conseguiam transmitir sua própria essência na arte — e a pintura de Luo Weiqing fazia quem a olhava sentir como se estivesse dentro daquele palácio retratado. Especialmente o sentimento de saudade que exalava... ela pensou que Luo Weiqing deveria ter estado pensando nela todo esse tempo.
— Sim. — Murong Xuanhe estava muito curioso para ver a pintura que a Imperatriz admirava, mas ao vê-la, sorriu de forma compreensiva. — Foi meu irmão mais velho quem desenhou. Meu irmão sentia falta da Imperatriz.
Liyou ficou surpresa por Murong Xuanhe ter compreendido tão rapidamente o conteúdo da pintura e perguntou, curiosa:
— Como você sabe?
Luo Weiqing manteve um sorriso gentil o tempo todo, mas estava um pouco constrangido. Sentia vergonha de ter seus sentimentos revelados assim. E a pergunta da Imperatriz nem precisava ser respondida por An guifei — ele mesmo já sabia a resposta, pois seus corações pensavam da mesma forma.
— O irmão mais velho sentia falta da Imperatriz, por isso desenhou esta pintura. Da mesma forma, este consorte também sentia sua falta — e por isso conseguiu entender à primeira vista. Mas este consorte não é bom em pintura, e não conseguiria expressar esse tipo de sentimento em uma obra. — Quando Murong Xuanhe disse isso, havia uma clara melancolia em sua voz. A palavra “saudade” tinha um poder mágico. Até mesmo a pessoa mais alegre e radiante podia se tornar melancólica por causa dela.
— Se sabe que não é bom em pintura, deveria praticar mais. — Ela nunca sentira saudade de alguém. Sempre podia ver quem queria ver, então não entendia como era esse sentimento. Mas achava que não devia ser algo bom — do contrário, por que esse pequeno parecia tão amargurado?
— Sorria. Zhen gosta de ver você sorrir. — Murong Xuanhe tinha uma personalidade alegre, otimista, simples e de coração aberto — algo que ela nunca havia visto antes. Mesmo sendo tratado com crueldade, ele ainda conseguia abrir o coração para aceitar quem o feriu. Era capaz de esquecer mágoas e recomeçar. Nem todos tinham esse estado de espírito. Mas alguém assim certamente seria uma pessoa feliz — porque sabia o que era deixar ir.
Ao ouvir as palavras de Liyou, Murong Xuanhe naturalmente mostrou um sorriso radiante. Mas, como se lembrasse de algo, rapidamente o escondeu, assumiu uma expressão séria e disse:
— Majestade, este consorte não sorrirá mais no futuro. Não quero que pense que sou apenas uma criança.
Liyou ficou surpresa por um instante e então caiu na risada:
— Hahaha, mesmo que diga que não é uma criança, esse tipo de coisa só pode ser dita por uma criança. — Liyou estendeu a mão e bagunçou os longos fios de cabelo de Murong Xuanhe.
— Majestade, não estrague! Este consorte levou um tempão arrumando isso. Se os outros irmãos chegarem e me virem assim, vai parecer que fui desleixado. — Murong Xuanhe protestou com desagrado, tentando escapar da mão travessa da Imperatriz — mas foi envolvido pela cintura por Liyou e não conseguiu se mover. Ainda assim, no fundo, ele não queria mesmo recusar aquele raro momento de carinho.
Nesse instante, veio um anúncio da entrada, feito por um atendente:
— A Consorte Nobre Li chegou!
Antes mesmo de o anúncio terminar, Li Qujun entrou com um sorriso caloroso. Ao ver a Imperatriz, ajoelhou-se calmamente e disse:
— Este consorte saúda a Imperatriz! Vida longa à Imperatriz!
— Levante-se. Trouxe um qin hoje? — Liyou tinha uma lembrança vívida do som do qin de Li Qujun — e gostava muito. Quem o via, naturalmente se lembrava de sua música.
— Este consorte trouxe sim, mas não sabia se a Imperatriz teria uma inclinação tão refinada e elegante esta noite. Por isso, há pessoas esperando do lado de fora com o qin. — Li Qujun não ficou surpreso com as palavras da Imperatriz. Ela realmente gostava de sua música — e todos no palácio sabiam disso.
— Deixe-os entrar. Toque uma melodia para Zhen.
— Sim!
Depois de um tempo, o som melodioso do qin começou a ecoar. Liyou puxou Murong Xuanhe para o lado e se sentaram para ouvir. Luo Weiqing serviu uma xícara de chá para eles. Murong Xuanhe tentou servir seu próprio chá, mas Luo Weiqing impediu, balançando a cabeça, e continuou servindo-o enquanto se sentava do outro lado da Imperatriz.
Ao final da música, Liyou comentou com admiração:
— O som do seu qin está mais encorpado.
No passado, a música de Li Qujun era leve e clara, sempre animada. Mas agora, dentro dessas notas vivas, havia um toque de suavidade melodiosa. O ritmo ondulante não havia perdido sua vivacidade, mas transmitia um certo sabor — como se a música contasse uma história, e essa história ganhasse cada vez mais profundidade.
— Agradeço o elogio da Imperatriz. É bom saber que Vossa Majestade gostou. — Aquela canção era uma composição nova, criada enquanto a Imperatriz estava ausente do palácio. Inevitavelmente, continha alguns de seus sentimentos não ditos — e tocá-la agora, para a Imperatriz, era como declarar seu coração. Mesmo que ela não compreendesse, ele não se arrependia.
Capítulo 84: A Reunião do Harém – Parte I
Li Qujun tocava outra melodia quando, nesse meio tempo, o Nobre Consorte Luo, Luo Xingcheng, também chegou. Ele já havia ouvido o som do qin à distância e, ao ver a Imperatriz escutando a música, saudou-a em silêncio e ficou de pé ao lado. Inclinou levemente a cabeça e todo o seu corpo exalava uma aura melancólica.
Liyou franziu levemente as sobrancelhas, mas não disse nada. Com um olhar, sinalizou para que Li Qujun continuasse tocando o qin.
Logo depois, o Nobre Consorte Yun, Yun Tailing, também chegou. Em sua expressão havia traços de pressa e, ao ver que a Imperatriz ainda escutava a melodia ao entrar, soltou um suspiro de alívio. Foi então posicionar-se ao lado de Luo Xingcheng para ouvir a música.
Liyou lançou um olhar a Yun Tailing e notou que ele não estava usando vestes imperiais, mas sim roupas de passeio. Parecia ter retornado recentemente de fora do Palácio Imperial. Nos últimos dias, ele estivera encarregado da Academia de Medicina e estava extremamente atarefado. Ainda assim, entre todos os membros do harém, ele era o mais sólido. Além de muito inteligente, sabia o que queria e era a pessoa que mais transmitia confiança a Liyou.
Quando a música chegou ao fim, Liyou aplaudiu suavemente e anunciou aos presentes:
— Sentem-se. Vamos apreciar a música juntos.
Em seguida, fez sinal para Li Qujun continuar, pois gostava muito do som que ele tirava do qin.
Luo Xingcheng e Yun Tailing se sentaram e continuaram a escutar a melodia. As notas suaves e harmoniosas fluíam, e a expressão de Li Qujun se tornava cada vez mais concentrada.
Feng Xue, Anhui e Sang Zixin também chegaram um após o outro. De repente, o espaçoso Palácio Qin pareceu um pouco cheio. O banquete fora preparado no salão externo e ainda faltava um quarto de hora para ficar pronto. Apenas a Consorte Imperial Qin, Qin Ning, ainda não havia aparecido.
— Majestade, esta consorte irá verificar — disse Luo Weiqing, um pouco preocupado, querendo dar uma olhada nos preparativos do lado de fora.
— O que há para ver?
— Esta consorte só quer confirmar se o banquete está sendo preparado corretamente. Já está quase na hora do jantar e esta consorte tem receio de que algo esteja fora do esperado.
Luo Weiqing achou que seria ruim mencionar que Qin Ning ainda não havia chegado e que queria verificar. A Imperatriz não costumava demonstrar simpatia por Consorte Imperial Ning.
— Não precisa ir. Os servos irão informá-lo assim que tudo estiver pronto. Ouça o qin em paz — disse ela, percebendo que Luo Weiqing vinha se ocupando de muitas tarefas e não queria sobrecarregá-lo.
— Bem… sim — respondeu Luo Weiqing, sem poder recusar, mas seu olhar ainda assim se dirigia insistentemente à porta. Talvez os servos não tivessem entregue o convite corretamente?
Liyou notou o olhar de Luo Weiqing e também olhou para a porta. Então, lançou um olhar geral aos presentes e percebeu que Qin Ning estava ausente.
— Daqui a um quarto de hora, o banquete começará.
A imagem etérea de uma figura altiva surgiu em sua mente. Aquele herói excepcional era extremamente orgulhoso e distante. Provavelmente, Weiqing estava inquieto por Qin Ning não ter aparecido.
Liyou não gostava de esperar por ninguém e sempre achava que se devia cumprir os horários estabelecidos. Mas, tinha a sensação de que Qin Ning logo apareceria.
De fato, antes mesmo da música terminar, a figura de Qin Ning surgiu na entrada e seu olhar se voltou diretamente para Liyou.
— Esta consorte saúda a Imperatriz. Vida longa à Imperatriz!
Ao contrário dos outros, Qin Ning não esperou o som do qin cessar para fazer sua saudação. Em vez disso, caminhou diretamente até Liyou, anunciando sua chegada com uma voz clara e firme como um céu sem nuvens.
O som do qin parou, e todos os olhares se voltaram para Qin Ning.
— Levante-se. É hora do jantar. Vamos comer — disse Liyou, sem se alongar. Podia-se dizer que era com Qin Ning que ela era mais implacável. Mas quem mandou Qin Ning ter aquele temperamento que sempre despertava nela o desejo de provocá-lo? Queria ver se ele conseguiria ter outras expressões além daquela frieza arrogante. Ela admitia que não era boa com ele, mas, contanto que ele não a provocasse de novo, também não pretendia incomodá-lo. Pensava que, depois de deixá-lo no fundo do precipício, ele teria aprendido alguma lição — mas, ao que tudo indicava, Qin Ning ainda não sabia o que significava brincar com fogo. No entanto, ela estava de bom humor agora e não queria discutir com ele.
Liyou deu a ordem e todos se dirigiram ao salão externo. O banquete já estava servido, com porcelanas tão delicadas que chegavam a ofuscar os olhos.
— Podem se sentar — disse Liyou, tomando naturalmente o assento principal. Os demais sentaram-se conforme a hierarquia. Dez pessoas exatamente se acomodaram ao redor da mesa.
— Sirvam as refeições — ordenou Luo Weiqing aos atendentes ao lado, e os pratos preparados foram trazidos.
— Vamos comer. Não precisam se sentir constrangidos.
Em teoria, aquele banquete deveria ser como uma refeição em família. Afinal, todos aqueles homens eram seus consortes. Mas, ao ver o quanto estavam cautelosos e contidos, era como se ela tivesse anunciado que devoraria alguém. Ninguém ousava pronunciar uma única palavra.
— Sim — responderam todos, agindo com rigidez, exceto por Qin Ning, que destoava dos demais. Assim que viu Liyou movimentar seus hashis, ele também pegou um pedaço do prato à sua frente e comeu com elegância.
Naturalmente, Liyou não estava com fome. Comeu algumas garfadas antes de pousar os hashis e levar à boca o vinho à sua frente. Após sentir o aroma... percebeu que não tinha afinidade com álcool e raramente bebia. Aquela bebida era realmente mágica para ela, porque o álcool conseguia romper sua autocontenção. Mesmo com seu alto cultivo, ela era impotente diante disso.
— Imperatriz, não gostou do vinho? Esta consorte pode pedir aos atendentes para trazer outro.
Na verdade, não só Luo Weiqing — todos ali, apesar de comerem, prestavam atenção a cada movimento da Imperatriz.
— Não precisa — respondeu Liyou, e já havia virado o vinho do copo de uma só vez. Fazia muito tempo que não bebia e o sabor ainda era intenso demais. — Vocês também podem beber. Não fiquem só me observando.
Ao colocar a taça sobre a mesa, Liyou notou todos a olhando. Talvez ela fosse mesmo péssima com álcool, pois, após um único copo, seu rosto ficou levemente corado e sua beleza fulgurante deixou todos emudecidos. E aquelas expressões abobalhadas a agradaram muito. Um sorriso malicioso surgiu em seus lábios. Assim que abriu a boca, foi justamente para incitar os outros a beberem.
Todos ainda estavam absorvidos pela aparência deslumbrante de Liyou e, ao ouvirem suas palavras, nem hesitaram: levantaram seus copos e beberam! O ardor queimando a garganta fez metade deles tossirem violentamente. Apenas Anhui e Qin Ning mantiveram a compostura. Luo Weiqing sorria levemente, observando a todos. Por outro lado, Li Qujun abriu um sorriso caloroso e até deu uma risada alta.
Liyou observou todas aquelas reações distintas e, de repente, sentiu que aquilo devia ser o sentimento de uma reunião familiar. Ela nunca tivera uma família, nunca se sentira solitária, nunca esperara nada — tampouco conhecia o sabor da decepção. Mas agora era diferente. Aqueles homens pertenciam a ela, eram sua família. E ela não queria que se tratassem como estranhos.
— Cof, cof, é muito forte... — disse Murong Xuanhe, o mais jovem e animado, tossindo alto. Colocou a língua para fora e arfou com força. Seu rosto estava corado, e após virar um copo inteiro, já começava a sentir-se tonto.
A pele alva de Feng Xue ganhara um leve tom rosado, exalando um ar encantador; os olhos melancólicos de Luo Xingcheng tornaram-se um pouco mais vivos, com um brilho lacrimoso sedutor; Sang Zixin, que sempre fora reservado, estava com o rosto ruborizado e piscava com um leve sorriso nos olhos; embora Yun Tailing fingisse estar calmo, já estava visivelmente bêbado e encarava Liyou fixamente...
Liyou começou a achar que aquele vinho era mesmo algo maravilhoso e mandou os atendentes reabastecerem os copos. Ergueu novamente sua taça e disse:
— Mais um!
As palavras de Liyou caíram no ar, sem se importar com a reação alheia. Ela virou o copo outra vez e lançou a todos um olhar profundo e cheio de significado.
Quem ousaria recusar? Até mesmo Murong Xuanhe, meio desorientado, entendeu que não podia dizer não a mais uma rodada!
Todos ergueram os copos novamente e brindaram à Imperatriz, que parecia determinada a afogá-los em vinho, com mais uma dose! Depois dessa, os limites de tolerância de cada um ficaram claros. Anhui e Qin Ning mantinham a expressão serena. Luo Weiqing estava corado, mas sorria gentilmente e claramente ainda estava sóbrio. Os demais, em maior ou menor grau, já estavam atordoados.
— Imperatriz... Imperatriz... esta consorte não consegue mais beber... estou zonza! — disse Murong Xuanhe, com a voz três vezes mais doce que o normal, o rosto completamente vermelho e um sorriso nos lábios.
Liyou piscou e não sentiu muito efeito do álcool. Apenas um calor leve... e a voz das pessoas parecia mais alta ao seu redor.
— Não tem problema. Se bebeu demais, Zhen pode mandar alguém escoltá-lo de volta — disse ela. Murong Xuanhe parecia ainda mais adorável naquele estado, sua pele clara e macia fazia Liyou ter uma súbita vontade de mordê-lo. Mas ela não gostava de carne humana — como poderia ter tal impulso? Liyou balançou a cabeça e desviou o olhar dos olhos dele.
— Não, não quero voltar — respondeu Murong Xuanhe, e ao ouvir que a Imperatriz queria mandá-lo embora, sentiu como se jamais a veria novamente. Havia uma mágoa indescritível por trás de seu olhar ao encará-la.
— Zhen não gosta de crianças desobedientes — disse Liyou com o rosto impassível, embora o olhar ainda fosse gentil. Ela não se incomodaria de verdade com alguém meio bêbado. Aquilo era tanto para Murong Xuanhe quanto para todos os presentes. Ela não gostava de pessoas insubordinadas — e, se não quisessem entediá-la, era melhor se adaptarem ao seu temperamento.
Liyou ergueu a terceira taça de vinho, não disse nada, apenas fitou um por um nos olhos, com o olhar pousando demoradamente em cada um, e então virou o copo de uma só vez!
A mensagem de Liyou era clara. Todos os presentes, exceto o tonto Murong Xuanhe, entenderam e também levantaram seus copos, virando a terceira taça! E, mesmo sem compreender o que Liyou queria, Murong Xuanhe viu que todos estavam bebendo novamente. Como ainda tinha o espírito de uma criança, naturalmente seguiu o exemplo e bebeu também!
Após três rodadas, as reações variavam, mas Murong Xuanhe já havia apagado e, num movimento desastrado, derrubou um prato. Seu atendente pessoal se atrapalhou, quis ajudá-lo, mas foi empurrado pelo outro num gesto inconsciente. O atendente, sem coragem de fazer muito barulho na frente da Imperatriz, olhou para ela como se pedisse permissão.
— Levem-no para descansar — disse Liyou, observando o rosto corado de Murong Xuanhe. Queria esperar até o dia seguinte, quando ele estivesse sóbrio. Como ele reagiria? Não seria adorável...?
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