Capítulo 88: A Cerimônia
A cerimônia de concessão do título de Consorte Imperial não foi um evento muito animado, mas foi extremamente grandiosa. Havia muitos rituais e etiquetas a serem seguidos. Liyou acompanhou pacientemente Anhui em cada um deles. No fundo, Liyou era uma pessoa tradicional, com um forte senso de responsabilidade e etiqueta. Embora, pessoalmente, achasse os costumes matrimoniais locais muito trabalhosos, já que queria conceder a ele um título, faria isso da forma adequada, entregando-lhe tudo o que ele merecia. Não queria que Anhui se sentisse injustiçado de forma alguma.
Na verdade, não era algo tão grandioso a Imperatriz tomar um consorte como esposo. Muitos consortes no harém nem sequer recebiam uma cerimônia formal. Normalmente, bastava um decreto imperial após uma noite de graça para que alguém fosse considerado consorte. Mas, se a Imperatriz realmente se importasse com alguém, talvez ela conduzisse a cerimônia completa de casamento: adoração no templo ancestral, visita à Rainha Mãe e aos demais anciãos, além da troca de taças de vinho entre o casal no quarto nupcial. Após toda essa movimentação, Anhui sentia-se um pouco tonto, mas um leve sorriso persistia no canto de seus lábios o tempo todo, tornando sua presença muito mais suave.
Nesse momento, Liyou vestia um manto de brocado vermelho-escuro com desenhos auspiciosos de dragões e fênix, enquanto Anhui usava uma túnica nupcial vermelha brilhante no mesmo estilo. Os dois estavam de pé diante do templo ancestral para prestar reverência aos ancestrais, acompanhados por todos do harém, com Luo Yu à frente. Luo Yu ainda vestia suas túnicas prateadas, mas sua expressão era muito mais fria do que antes. Diferente da frieza indiferente de Qin Ning, a frieza de Luo Yu parecia ter sido cravada até os ossos. Ninguém na sala ousava olhá-lo diretamente. Todos sentiam o frio que emanava dele e tinham suas próprias suposições sobre quem havia sido ousado o suficiente para provocar a ira da Rainha Mãe.
Liyou, naturalmente, percebeu a mudança em Luo Yu, mas o que ela sentiu foi diferente dos outros. A frieza de Luo Yu parecia um pequeno fragmento de gelo. Mas esse gelo não era algo congelado por dez mil anos — era um pedaço frágil, que poderia se despedaçar ao toque de um dedo. Parecia que, por não ter visitado Luo Yu nas últimas semanas, a vida dele não tinha sido muito boa. Talvez ela devesse arrumar um tempo para ele.
Liyou segurou a mão de Anhui, afastou seus pensamentos e concentrou sua atenção na pessoa diante dela.
— Vossa Majestade, Consorte Imperial Ying, a cerimônia de oferendas foi concluída. A próxima parte é prestar homenagem aos anciãos. Vossa Majestade deseja acompanhar o Consorte Imperial Ying? — perguntou Feng Ying.
Liyou olhou para Anhui. Logicamente, encontrar os anciãos era considerado uma forma de aprendizado. Era para que os jovens consortes aprendessem a respeitar os mais velhos. Se ela fosse junto, deixaria Luo Yu e Luo Weiqing desconfortáveis.
— Anhui, vá você. Zhen esperará aqui por você. — Liyou deu um leve tapinha na mão de Anhui, tranquilizando-o.
Anhui assentiu e caminhou sozinho na direção de Luo Yu e Luo Weiqing. Ajoelhando-se, saudou:
— Este consorte cumprimenta a Rainha Mãe. Que Vossa Majestade viva milênios! Saudações ao Rei Consorte. Que Vossa Majestade viva milênios!
Luo Yu apertou os lábios com força e seus olhos permaneceram sobre Anhui apenas por um momento antes de direcionar seu olhar para Qianhe Liyou!
Luo Weiqing, ao lado, estava nervoso. Queria dizer a Anhui para se levantar, mas, com o olhar atento da Imperatriz e mesmo que não houvesse outras pessoas presentes, ele não ousaria envergonhar o consorte recém-nomeado da Imperatriz. Ele não era mesquinho a esse ponto, mas, se a própria Rainha Mãe não fazia nada, como poderia ele se antecipar?
Quando Liyou cruzou o olhar com Luo Yu, pareceu detectar uma certa acusação em seus olhos. Liyou ficou confusa. O que ela tinha feito? Por que ele a olhava daquela forma? Como se ela tivesse feito algo para deixá-lo descontente. Ela já havia se afastado dele… isso não era o suficiente?
Por sentir que não havia feito nada de errado, Liyou retribuiu o olhar com frieza, sem demonstrar fraqueza alguma. Em sua mente, só havia uma certeza: se Luo Yu quisesse humilhar Anhui, ela não permitiria que seu homem fosse injustiçado.
Luo Yu conseguia ver claramente os olhos de Liyou — o olhar estranho e gelado era evidente, fazendo com que se sentisse sufocado. O que era aquele olhar? Por que ele se sentia ainda mais insatisfeito agora? Seria por causa do homem ajoelhado à sua frente...?
Luo Yu desviou o olhar de volta para Anhui, que ainda permanecia ajoelhado com respeito. Mas, quanto mais olhava, mais desconfortável se sentia! Ele devia ser um daqueles homens na fonte termal, naquela ocasião. Era o atual favorito da Imperatriz. Seria por causa dele que a Imperatriz estava tão indiferente, que já não o olhava mais com aquele brilho nos olhos que acelerava seu coração...?
— Pai, por favor, permita que Anhui se levante. Zhen está esperando — disse Liyou, que já havia se aproximado e agora falava em tom frio.
Assustado, Luo Yu respondeu instintivamente:
— E se bengong não quiser?
Assim que as palavras saíram de sua boca, Luo Yu se deu conta do que tinha dito. O tom, definitivamente, não era o habitual.
O rosto de Liyou empalideceu. Ela não conseguia entender quando exatamente Luo Yu se tornara tão voluntarioso, ao ponto de dizer algo tão inadequado numa ocasião como aquela.
— Anhui, levante-se. As saudações terminaram — disse Liyou, não apenas ordenando, mas também inclinando-se para ajudá-lo a se levantar. Anhui não ousou recusar, mas se sentiu um pouco envergonhado e sussurrou no ouvido da Imperatriz:
— Vossa Majestade, este consorte está bem... não há necessidade disso...
Naquela vez nas fontes termais, ele já havia percebido que havia algo estranho entre a Imperatriz e a Rainha Mãe. Antes, achava que a Imperatriz tinha pensamentos incomuns sobre Luo Yu, mas agora via que não era mais o caso. Ainda assim, não queria ser o fator que piorasse a relação entre os dois ou acirrasse o conflito. Afinal, eles eram pai e filha.
— Está tudo bem. Anhui, não precisa se preocupar — disse Liyou, percebendo a preocupação no tom dele. Ela então sorriu de forma reconfortante — e esse sorriso foi como uma lâmina nos olhos de Luo Yu.
Luo Yu não quis dizer mais nada inadequado, mas também não queria que Liyou sentisse que ele estava com raiva. Por isso, virou-se e saiu. Para que permanecer ali?
Liyou observou com indiferença Luo Yu se afastar. Em seguida, pegou a mão de Anhui e o levou de volta para os aposentos nupciais. Hoje era sua noite de núpcias. Não permitiria que nada estragasse seu humor.
— Vossa Majestade, Niangniang, as taças de vinho. — O quarto nupcial estava ricamente decorado, em tons alegres de vermelho. Um jarro de vinho, bolinhos meio assados recheados com amendoim e pratos de doces requintadamente preparados estavam dispostos sobre a mesa, formando um cenário luxuoso e deslumbrante. Liyou e Anhui estavam em pé diante da mesa. Feng Ying encheu duas taças com vinho e os convidou a beberem juntos.
Liyou e Anhui seguraram suas respectivas taças. Seus olhos se encontraram no ar, cada movimento carregado de ternura.
— Depois de beber isso, você será o homem de Zhen e nunca mais poderá se negligenciar. Entendido? — Foram essas as únicas palavras que ela dirigiu a Anhui.
— Este consorte compreende, e só espera que Vossa Majestade seja sempre feliz. — Ele entendeu. Claro que entendeu. Já tinha ouvido a Imperatriz dizer isso tantas vezes que seria um tolo se ainda não compreendesse. No fundo, ele apenas desejava que ela fosse feliz, que não precisasse mais se preocupar com os assuntos do Estado ou da família.
Liyou sorriu levemente, entrelaçou os braços com os de Anhui e beberam juntos. Com isso, a cerimônia chegava ao fim, e Feng Ying retirou-se com os servos do palácio, deixando o espaço reservado para a Imperatriz.
Enquanto as velas ardiam intensamente no quarto nupcial e os recém-casados passavam uma noite sem sono, a madrugada ainda se estendia. Alguns estavam em êxtase, outros preocupados...
…
Capítulo 89: A Retaliação dos Três Impérios
Qianhe rejeitou as negociações de paz propostas pelo Império Sang, e o mundo voltou a entrar em alvoroço. Todos começaram a especular quais eram as intenções de Qianhe. Ao não aceitar o tratado de paz depois do fim da guerra, o que exatamente eles pretendiam fazer?
No entanto, sob as ordens da Imperatriz, o exército de Qianhe lançou um ataque total, pegando o Império Sang completamente desprevenido. Todo o exército recuou, e, ao ver que a situação era desesperadora, a Imperatriz do Império Sang cometeu suicídio em seu próprio palácio. O exército de Qianhe então marchou direto até o palácio imperial. Toda a família imperial do Império Sang foi feita prisioneira. As consortes e concubinas do harém já haviam sido mortas pela Imperatriz para serem enterradas com ela. Mais de vinte príncipes e princesas restantes foram mantidos sob rigorosa vigilância pelo exército de Qianhe. Os ministros civis e militares do Império Sang também foram capturados e aprisionados juntos. Pouco depois, todas essas notícias foram enviadas com urgência por mensageiros a cavalo.
Todos os ministros civis e militares de Qianhe celebravam, mas apenas a Imperatriz, Sua Majestade, sentava-se no Trono do Dragão com uma expressão apreensiva, o rosto gélido.
Percebendo o desagrado da Imperatriz, Long Xizhao perguntou, com certa dúvida:
— Majestade, houve algo errado na maneira como nosso exército lidou com a situação? Este ministro sente que Vossa Majestade não parece estar feliz…
— Feliz? Acha que Zhen deveria estar feliz? — Liyou perguntou com indiferença, mas era fácil perceber por sua aparência que ela estava de péssimo humor.
— E-este ministro… nosso exército obteve uma grande vitória e todo o império celebra… por que Vossa Majestade está infeliz? — Long Xizhao percebeu, de repente, que talvez não devesse ter feito essa pergunta. Estava apenas empolgada demais naquele momento e agiu por impulso.
— Este Império Sang… quem de vocês vai? — Liyou lançou um olhar ao redor da corte. Estava repleta de ministros civis e militares, e embora fosse bom que o Império Sang tivesse sido derrotado, isso também significava que ela havia atraído mais problemas para si. Além disso, a culpa era dela — como poderia estar feliz ao falar sobre isso?
— Majestade, o que quer dizer com isso? — Long Xizhao sentiu que sua mente estava lenta. O que exatamente a Imperatriz quis dizer?
— A família imperial do Império Sang, todas as cidades e vilarejos em seu território, e os oficiais da corte… quem vai lidar com tudo isso? — Liyou foi direta, deixando claro que alguém teria que tomar conta desses assuntos.
Long Xizhao ficou surpresa. Naturalmente, alguém teria que lidar com tudo aquilo. Mas quem? Era um assunto de tamanha importância para um império, então é claro que deveria ser tratado pela própria Imperatriz…
— Ouçam o decreto de Zhen… — Liyou lançou outro olhar pelos ministros antes de emitir diversas ordens: — Escoltem imediatamente toda a família imperial do Império Sang para apresentar seus cumprimentos. Quanto aos assuntos civis e militares, Li Yao, Long Xizhao e os outros seis ministros dos seis ministérios, todos vocês participarão da investigação. Usem os que puderem ser usados, mantenham os que puderem ser mantidos, e lidem com os oficiais corruptos que não servirem. Não entrem em pânico ao agir. Zhen cuidará de tudo o que precisar ser resolvido. Se alguém causar problemas para Zhen, não me culpem por ser impiedosa!
— Sim, esta ministra obedece à ordem! — Li Yao não demonstrou qualquer surpresa. Pelo contrário, parecia que já esperava por isso. Sua Imperatriz sempre delegara esse tipo de poder, e ela já nem sabia mais o que era se surpreender.
Long Xizhao ficou atônita por um momento, depois exibiu um sorriso amargo. Então era isso que a Imperatriz queria dizer. Até mesmo assuntos tão importantes quanto atacar um inimigo e lidar com as consequências eram deixados a cargo delas. Com o que mais a Imperatriz se preocuparia?
No entanto, ela ouvira dizer que havia problemas recentes no harém, e que a encantadora guifei exilada no Palácio Frio parecia estar prestes a dar à luz. Se fosse uma princesa…
Havia também a atitude da Imperatriz em relação à Rainha-Mãe. No banquete de aniversário dela, ventos e chuvas varreram a cidade, e o evento se tornara assunto entre todos. Agora, o relacionamento entre a Imperatriz e a Rainha-Mãe parecia ainda mais estranho. Mas, ah, não se podia falar demais sobre assuntos do harém.
As forças civis e militares começaram a se ocupar, mas isso não se limitava a Qianhe. Além do Império Sang, praticamente apagado da história, os outros três países estavam em estado de alerta total. Até as batalhas em andamento cessaram, e o que Liyou, Imperatriz de Qianhe, havia anunciado na corte era agora de conhecimento geral entre os outros impérios. Após esse breve silêncio, todos os impérios enviaram enviados diplomáticos para Qianhe ao mesmo tempo.
Lutar era aceitável, mas ao perder uma guerra, naturalmente era necessário buscar a paz. Talvez, nem mesmo o Império Sang tivesse previsto que o desfecho da guerra seria esse. Qianhe se recusou a negociar e decidiu aniquilar completamente o Império Sang. Isso fez com que muitos se lembrassem dos rumores — as poderosas declarações feitas pela Imperatriz de Qianhe na corte. E, de fato, não eram meras palavras.
Quanto aos enviados enviados por esses países, os ministros tinham opiniões e estratégias diferentes sobre como lidar com eles. No entanto, durante esses dias de discussão, os enviados já haviam chegado aos arredores da cidade imperial.
— Majestade, a situação desses países ainda é incerta neste momento. A postura desses enviados é de extrema importância. Acredito que devemos ser cautelosos para não permitir que os três impérios interpretem mal as ambições de nossa dinastia. É provável que estejam preocupados com o crescimento do nosso império e com o impacto que isso terá no equilíbrio mundial. — Havia um leve tom de desprezo na voz de Long Xizhao, mas era difícil de notar. Antes, ela teria ficado preocupada com o futuro de Qianhe, mas agora tinha plena confiança na Imperatriz. Só que, ai, talvez fosse problemático que a Imperatriz fosse poderosa demais. Nos últimos dias, ela estivera correndo de um lado para o outro no território do antigo Império Sang e, agora, estava prestes a retornar ao país derrotado. Não, não era mais chamado de Império Sang — agora era território de Qianhe. O que ela precisava fazer agora era apagar por completo o Império Sang da mente das pessoas, para que todos os seus antigos súditos passassem a pertencer a Qianhe, reconhecendo-se como cidadãos do novo império.
— Má interpretação? Ministra Long, diga-me, o que eles poderiam interpretar mal? — As palavras de Liyou deixaram claro que ela sabia perfeitamente do desagrado de sua conselheira. Como poderia não saber o que Long Xizhao quis dizer? Mas Liyou não simpatizava com aqueles enviados. O que significava os outros países mandarem representantes logo após o fim da guerra com o Império Sang? Era uma ameaça? Um aviso? Hmph, será que achavam mesmo que ela teria medo?
— Majestade, Vossa Graça sabe que nosso exército é forte e poderoso, avançando sobre os inimigos como uma faca quente na manteiga. Nosso poder de combate e glória militar intimidam o mundo todo. Se os três impérios não temessem nossa dinastia, teriam enviado enviados? Suas intenções são óbvias. Esta ministra é tola e não consegue compreender as intenções de Vossa Majestade. Peço que Vossa Graça as esclareça, para que esta ministra possa receber os enviados conforme sua vontade!
Os enviados já estavam na porta do palácio, e mesmo assim a Imperatriz mantinha-se calma — o que deixava Long Xizhao ainda mais ansiosa.
— Faça como quiser. Zhen não deseja repetir sempre as mesmas palavras. Ninguém pode me ameaçar, entendeu? — Ela já havia deixado suas intenções claras muitas vezes na corte, e não queria repetir. Mesmo que agora a ameaça fosse composta de três impérios, e não apenas um, suas ambições não mudariam.
Ela era uma majestosa zumbi milenar — como poderia ser intimidada por meros humanos? Se alguém realmente não soubesse distinguir o certo do errado… que não a culpassem por ser impiedosa.
— Sim, esta ministra compreende! — Não se sabia se era bom ou ruim ter uma Imperatriz tão poderosa. Embora falasse e agisse com dureza, às vezes também poderia assustar. Afinal, uma decisão dela poderia afetar a situação de todos os impérios do mundo num instante. Se não fosse bem conduzido, poderia provocar uma guerra a qualquer momento. E embora Long Xizhao não temesse a guerra, milhões de vidas estavam em jogo — como não agir com cautela?
— Que bom que entendeu. A recepção dos enviados dos três impérios será deixada a seu encargo. Zhen está cansada, vou me retirar da corte. — Nos últimos dias, os únicos assuntos discutidos na corte diziam respeito aos outros impérios, o que começava a irritar Liyou.
Após se retirar e os ministros se dispersarem, Liyou caminhou sem pressa pelo palácio. A figura de Anhui apareceu atrás dela. Essa era a ordem da Imperatriz: ele deveria continuar seguindo-a, mas não como um Guarda Sombrio. Todos na corte sabiam da existência de Anhui. Embora fosse incomum um consorte ser também guarda-costas, ninguém ousava criticar as ordens da Imperatriz.
— Anhui, o Médico Imperial disse que a encantadora guifei está prestes a dar à luz?
Como se fosse apenas uma conversa trivial, Liyou perguntou a Anhui, que andava ao seu lado.
— Sim. O que Vossa Majestade deseja que este consorte faça?
Quanto à guifei encantadora, Anhui não sentia nada pelo homem. Mas a criança em seu ventre era carne de sua carne, e ele não sabia como a Imperatriz planejava lidar com isso.
— O que você acha que Zhen deveria fazer com essa criança? — A pergunta de Liyou soava quase cruel, como se não estivesse falando de algo relacionado a ela mesma — muito menos sobre uma criança que era seu próprio sangue.
— Como este consorte ousaria falar levianamente?
Anhui sentia que não tinha o direito de opinar.
— Zhen permite. Diga o que vier naturalmente à sua mente.
— Entendido. Este consorte acredita que a criança não tem culpa de nada, mas cada um tem seu próprio destino e deve seguir o ciclo do carma. O que Vossa Majestade decidir será o melhor. Este consorte confia plenamente que Vossa Majestade arranjará tudo da melhor forma.
— Depois de arrumar tudo, Zhen estava pensando… vamos fazer uma visita à guifei encantadora. Também quero ouvir a opinião dele.
Afinal, era filho dele também. Ela poderia lhe dar uma nova chance de opinar. Além disso, nunca havia visto como era um homem grávido…
— Sim.
Os dois seguiram rumo ao Palácio Frio, com os criados os acompanhando silenciosamente. Era a estação das brisas primaveris, e as flores estavam em plena floração. O palácio estava repleto de flores e raras espécies de plantas e ervas exóticas podiam ser vistas por toda parte. Ao longo do caminho, o perfume intenso das flores dominava o ar. No entanto, à medida que se aproximavam do Palácio Frio, esse cenário vibrante sumia rapidamente — até restarem apenas árvores secas e ervas daninhas, formando um ambiente extremamente desolado.
— Majestade, deseja que esta serva anuncie sua presença? — Feng Ying observou o estado lamentável do Palácio Frio e perguntou.
— Não precisa. Todos vocês fiquem aqui. Zhen e o Consorte Imperial Ying serão o suficiente.
— Entendido.
Acompanhada por Anhui, Liyou entrou no Palácio Frio, já um tanto degradado. Os dois homens que estavam no interior da sala comiam naquele momento e, ao verem os visitantes, ergueram o olhar, surpresos…
— M-Majestade! — Situ Hongyu se levantou, assustado. Já bastante inchado pela gravidez, foi difícil se levantar. E ao fazê-lo tão repentinamente, sentiu-se tonto e prestes a cair. O atendente ao seu lado tentou ajudá-lo, mas estava atrasado demais. Ambos acabaram caindo no chão…
— Anhui. — Liyou não queria se aproximar demais de alguém com quem não tinha intimidade, então chamou por Anhui. Ele rapidamente avançou para amparar os dois, ajudando-os a sentar-se de volta às cadeiras.
— Não precisa de tanta formalidade — disse Liyou ao mesmo tempo, impedindo os movimentos apressados de Situ Hongyu.
Situ Hongyu sentou-se novamente às pressas, olhando para a Imperatriz com ansiedade. Não sabia por que ela havia vindo sem aviso, tampouco quais eram suas intenções. Mas, de repente, pensou: ele não tinha se arrumado, seu corpo estava inchado pela gravidez… será que estava feio demais naquele momento…?
**Capítulo 90: Laços de Sangue
Situ Hongyu foi forçado a se sentar. Ele sabia que estava debilitado e não insistiu em prestar suas reverências. Contudo, o atendente já estava ajoelhado no chão, tremendo de medo. Anhui permanecia ao lado, com a cabeça silenciosamente abaixada, parecendo um servo obediente. Liyou se sentou aleatoriamente em um lugar.
— O médico imperial disse que você dará à luz em alguns dias. — Ao observar o comportamento desajeitado de Situ Hongyu, um olhar divertido surgiu nos olhos de Liyou. Era a primeira vez que via um homem grávido, e parecia bastante semelhante às mulheres do seu antigo mundo. Mas, se fosse assim, as dores da gestação deviam ser igualmente desconfortáveis. Aquele homem devia estar sofrendo bastante nos últimos tempos. Quando o vira pela primeira vez, ele vestia roupas delicadas e requintadas, digno de ser chamado de inigualável. Agora, trajava roupas simples. Estava não apenas inchado, como também com o semblante levemente abatido. No entanto, tirando o susto com sua súbita chegada, sua expressão parecia bastante tranquila.
— Sim. — Ao falar de seu filho, o rosto de Situ Hongyu suavizou e um olhar amoroso surgiu em seus olhos. Inconscientemente, acariciou o próprio ventre, imaginando como seria a aparência do bebê. Embora estivesse sendo atormentado por aquela pequena vida ainda por nascer, seu amor pela criança era inquestionável. Sentia que seria capaz de abrir mão de tudo por ela.
— Você tem algum plano? — Liyou observava a mudança na expressão de Situ Hongyu e concluiu que ele já devia ter pensado nisso em algum momento.
O rosto de Situ Hongyu escureceu e ele levantou os olhos para encarar Liyou. Claro que tinha planos para o filho, mas... de que adiantava? No Palácio Frio, seu futuro já estava selado, e ele apenas lamentava pela criança...
— Majestade, é inútil para este consorte fazer planos próprios. Tudo depende da vontade de Vossa Majestade. Já que a senhora está aqui, pode dizer diretamente o que deseja. — Cerrou os dentes ao falar, revelando sua personalidade por um instante. Embora seu temperamento impaciente tivesse sido suavizado pelas experiências, sua natureza voluntariosa ainda era difícil de esconder.
— Dê à luz à criança e deixe que eu a crie. A vida no Palácio Frio não é adequada para uma criança. — Já que o outro havia expressado sua posição, Liyou não pretendia dar mais voltas no assunto.
Situ Hongyu empalideceu. Nenhum pai desejava ser separado do próprio filho. Mas, no harém, especialmente no Palácio Frio, era impossível que um consorte vivesse com sua criança após certa idade. Talvez, ao fim, seria melhor que a criança fosse levada dali.
— Este consorte agradece à Imperatriz! — Após refletir, Situ Hongyu agradeceu de imediato. Ele não era do tipo hesitante. Se havia um caminho melhor para o filho, ele não o rejeitaria. Acreditava que a Imperatriz não trataria mal o próprio filho.
Liyou se surpreendeu com a franqueza de Situ Hongyu, mas, pensando melhor, entendeu o motivo.
— Situ Hongyu, você odeia Zhen? — Sua chegada havia feito com que aquele belo homem perdesse tudo.
Se ele soubesse o motivo, certamente a odiaria. Embora não se importasse com os sentimentos dele em relação a ela, ao ver o quanto ele amava o próprio filho, não pôde deixar de perguntar.
Situ Hongyu ficou visivelmente surpreso com a pergunta. Odiar? Como não odiaria? No entanto, com o passar do tempo, aquele sentimento havia se dissipado bastante. Ele já não tinha mais forças para odiar. Em vez disso, sentia que aquela vida simples não era de todo ruim. Ao menos, não precisava mais temer intrigas antes de dormir, nem sentir ciúmes ou se preocupar em disputar favores. Podia dormir tranquilo à noite. Talvez aquilo fosse uma bênção disfarçada. Antes, não acreditava em carma, mas agora... talvez acreditasse um pouco. Se você estiver disposto a abrir mão de certas coisas, pode ganhar muito em troca. Ele havia aprendido a ampliar sua visão de mundo.
— Este consorte culpado não ousa. Este consorte não guarda ressentimentos no coração. Apenas espera que a Imperatriz trate bem esta criança. O que passou, deve permanecer no passado.
As palavras de Situ Hongyu mudaram a opinião de Liyou sobre ele. Agora, parecia que aquela pessoa não era tão desagradável assim.
— Que assim seja. — Liyou se levantou. Já havia alcançado seu objetivo com aquela visita, e não havia mais necessidade de permanecer ali.
Ao vê-la partir, Situ Hongyu se apressou em levantar-se e a acompanhou até a saída. Observando a figura de Liyou se afastando, havia um traço de solidão em seus olhos, embora passageiro. Logo foi substituído por um olhar resoluto. Não havia ódio em seu coração, mas sim dor, solidão e tristeza. Contudo, nada disso importava. O mais importante agora era a criança que carregava, e que nasceria em poucos dias. Ele aguardava ansioso por seu nascimento e, ao mesmo tempo, esperava que tivesse um futuro brilhante...
Do lado de fora do palácio, Fengying aguardava a Imperatriz e se aproximou para saudá-la assim que ela saiu.
— Majestade, que ordens tem para esta serva? — Naturalmente, Fengying se referia aos assuntos relacionados à Guifei Encantadora. Afinal, era muito perigoso ter um filho naquele lugar, e aquele seria o primogênito da Imperatriz. Mesmo nascido no Palácio Frio, já era o suficiente para atrair todos os olhares.
— Os antigos aposentos da Guifei Encantadora ainda estão desocupados?
— Sim! — Ao ouvir a pergunta, Fengying respondeu de imediato, já pressentindo o que viria.
— Mande que os preparem e permita que a Guifei Encantadora retorne. — Além de sombrio, o Palácio Frio era remoto. A segurança era fraca, e não era um local seguro. Agora que a Guifei havia se arrependido, não havia motivo para Liyou dificultar ainda mais a vida de alguém prestes a dar à luz.
— Entendido! — Fengying ordenou imediatamente que o Palácio Yaoyu, onde a Guifei Encantadora costumava viver, fosse limpo e preparado. Sempre sentira que havia margem para mudança nesse assunto, e agora parecia que isso se confirmava. A Imperatriz finalmente permitira a saída da Guifei do Palácio Frio. Esse desfecho não a surpreendia exatamente, mas era difícil prever o que aconteceria a seguir. O harém já não era um lugar tranquilo, e agora a Guifei voltaria. Só podia esperar que, desta vez, nada ocorresse.
Fengying foi cuidar dos preparativos e Liyou já havia partido com Anhui. No caminho de volta, Anhui manteve-se em silêncio, como se pensasse em algo. Percebendo isso, Liyou perguntou com preocupação:
— Anhui, em que está pensando?
Anhui ergueu a cabeça e lançou a Liyou um olhar apreensivo, como se hesitasse em responder. Afinal, o que ocupava seus pensamentos não era algo fácil de dizer. Mas, como a Imperatriz havia perguntado, não havia como esconder.
— Majestade... gosta de crianças? — Após pensar um pouco, Anhui resolveu perguntar de forma mais sutil.
Crianças? Por que Anhui pensava nisso? Ao ouvir a pergunta, Liyou pensou: “Zhen não gosta”. Mas, como ele havia perguntado, respondeu com sinceridade:
— Embora Zhen não goste, também não chega a detestá-las.
Afinal, nunca teve filhos em sua vida para desenvolver qualquer sentimento a respeito.
O coração de Anhui passou por uma montanha-russa com aquelas palavras. A princípio, ela não gostava, mas também não as odiava. Ficou sem palavras por um momento. Afinal, o que ele desejava era...
— Anhui, você perguntou isso porque quer ter um filho? — Liyou não era tola. Com uma breve análise, entendeu o que Anhui pensava.
Ao se lembrar do que passava por sua mente, Anhui corou e assentiu com vergonha. Conceber um herdeiro para quem se ama talvez fosse um pensamento comum a todos os homens do mundo — e ele não era exceção.
— O que um filho pode lhe trazer? Anhui, dar à luz é um trabalho árduo. Você viu o estado da Guifei Encantadora, não se sente aliviado? — Liyou estava intrigada. Sabia que Anhui queria isso, mas não conseguia entender por quê. Estava curiosa para ouvir sua explicação.
— Este consorte não acha difícil. Acredita que esse desejo não é apenas seu, mas também dos demais consortes do harém. É uma grande honra para um consorte gerar um herdeiro da Imperatriz. Como poderia ser um fardo? Mas, já que a Imperatriz perguntou o que um filho pode trazer, este consorte acredita que uma criança pode trazer muito à sua mãe.
Na verdade, Anhui também não gostava muito de crianças. Sempre as achou frágeis demais, ao ponto de não se sentir à vontade nem para tocá-las com firmeza. Contudo, se pudesse gerar um herdeiro para a mulher que amava, só de pensar já se sentia emocionado. A criança representaria a continuidade do sangue dele e da Imperatriz. Mesmo que o processo fosse difícil, comparado ao significado de ter um filho assim, qualquer sofrimento era insignificante.
— Será que todos no harém pensam da mesma forma? — Luo Yu já havia dito uma vez que a descendência era algo importante. Além disso, a Guifei Encantadora também havia mudado muito por causa da gravidez, e agora até Anhui ansiava por isso. Sem contar os outros. Isso deixou Liyou um tanto confusa.
— Este consorte não pode afirmar, pois os outros consortes nunca compartilharam seus pensamentos comigo. Mas acredita que todos os homens do mundo são parecidos, e todos desejam gerar filhos para a mulher que amam — é algo feliz. Majestade... este consorte tem chance de alcançar essa felicidade?
Se fosse possível, esperava que esse desejo não fosse um exagero. A Imperatriz já lhe dera tudo o que queria, e até mais. Achava que entendia o significado de contentamento, mas as pessoas sempre querem mais. Sabia que era ganancioso, mas ainda assim, esperava que a Imperatriz satisfizesse essa ganância.
— Felicidade? Você se sentiria infeliz sem filhos? Anhui, você está infeliz agora? — Ela achava que Anhui havia se tornado muito mais alegre. Apesar do rosto ainda sério, não era difícil perceber a ternura em seu olhar. Teria ela se enganado?
— Este consorte não está infeliz. Majestade, este consorte não está insatisfeito. A Imperatriz concedeu tamanha graça... como poderia estar infeliz? — Anhui apressou-se em explicar. Não queria que a Imperatriz interpretasse mal sua cobiça. Ela já lhe dera tanto, como poderia ele se sentir infeliz?
— Não se preocupe, Zhen não quis te censurar. Levante-se, não fique ajoelhado. — Para ela, além do senso de dever, ter filhos parecia sem sentido. Mas, não desejava contrariar o desejo dos homens que a amavam. Se era isso que queriam, ela os permitiria.
— Anhui, diga a Fengying que, depois que Zhen te favorecer, não será mais necessário tomar aquele remédio. Deixe as coisas acontecerem naturalmente. — O motivo de o harém permanecer sem filhos era uma regra da família imperial: todos os consortes que recebiam os favores da Imperatriz deviam tomar um medicamento. Não era qualquer um que podia conceber um príncipe ou princesa imperial. As palavras de Liyou soaram simples, mas aquilo era uma oportunidade para Anhui — ou talvez um favor supremo. O significado da descendência para os homens do harém era muito maior do que para uma pessoa comum.
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